Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
A origem da filosofia Marcio Tadeu Girotti Introdução Estudaremos nesta aula a origem da filosofia em seu contexto histórico, desde o surgimento dos primeiros filósofos. Vamos compreender como foi a passagem de um conhecimento funda- mentado pelo viés mítico para um conhecimento com fundamento racional, guiado pela razão, pela investigação da natureza, a physis, a realidade que nos cerca. A filosofia possui sua origem nos povos gregos, que teriam sido os primeiros mercadores, comer- ciantes, negociadores, retóricos, matemáticos e filósofos. Acredita-se que na colônia grega surgiram os questionamentos que iriam emergir e constituir todo o pensamento base do conhecimento humano. Objetivos de aprendizagem Ao final desta aula, você será capaz de: • conhecer os primórdios da filosofia a partir do seu surgimento; • entender a mudança de pensamento com a passagem do Mito para a razão. 1 Origem da filosofia Historicamente, a filosofia teria nascido entre o final do século VII a.C e o início do século VI a.C., nas colônias gregas da Ásia Menor (Jônia, na cidade de Mileto). Filosoficamente, ela nasce já com um conteúdo determinado, a cosmologia. Os primeiros estudos filosóficos giram em torno do cosmos (kósmos), a ordem e organização do mundo; fundamentados pela logia (lógos), o pensa- mento racional, fazendo da filosofia um conhecimento racional da ordem do mundo (CHAUI, 2005). Muitos defendem que a filosofia teria sua origem por influência do pensamento oriental. Prin- cipalmente por conta da viagens de povos comerciantes, que tinham contato com a cultura do oriente, transportando tais conhecimentos para o ocidente, em especial, a Grécia. Exemplo disso seria o conhecimento da agrimensura, adquirido no Egito, e que posteriormente originaria entre os gregos as ciências da aritmética e da geometria. Também muito se diz que a filosofia foi um “milagre grego”. Que nada teria sido criado antes, sendo o povo grego algo excepcional, elevado, sem similares. Nem por um lado e nem por outro, a origem da filosofia viria das mudanças que os gregos impuseram aos conhecimentos da época, a partir do contato com a cultura oriental. Figura 1 – Grécia Antiga Fonte: ivan bastien/Shutterstock.com FIQUE ATENTO! Há interpretações que confirmam o surgimento da filosofia com base totalmente na cultura oriental, justificativa que passa por questões religiosas, por exemplo. Há outras que acreditam mesmo no “milagre grego”. 2 Primeiros filósofos Os primeiros pensadores desenvolveram certos conhecimentos acerca do mundo e das coi- sas. Didaticamente, é necessário segmentar o pensamento da antiguidade clássica, grega, em períodos, para melhor entender o desenvolvimento do conhecimento ocidental, que influencia todo o campo do saber até os dias atuais. Nesse sentido, costuma-se dividir o pensamento grego em quatro momentos (CHAUI, 2005): • Grécia homérica: narração da história grega pelo poeta Homero, representado nas obras “Ilíada” e “Odisseia”. • Grécia arcaica (sete sábios): do século VII ao século V a.C., com a criação das cidades gregas, advento do comércio e vida urbana (Atenas, Esparta, Samos entre outras). • Grécia clássica: entre V e IV a.C. até início do século III a.C., com o surgimento da democracia, da vida intelectual e artística, expansão comercial e apogeu militar. • Grécia helênica: meados do século III a.C., império de Alexandre da Macedônia, até a tomada da Grécia pelo povo romano. A historicidade grega não corresponde, diretamente, à divisão do pensamento filosófico, mas o influencia, constituindo também quatro momentos (CHAUI, 2005; ARANHA; MARTINS, 2003): • Período pré-socrático (cosmológico): entre os séculos VII e V a.C. Investiga-se a ori- gem do mundo e as causas das transformações da natureza. Abrange os filósofos das colônias gregas Jônia e Magna Grécia. • Período socrático (antropológico): séculos V e IV a.C. Investiga-se as questões huma- nas, a ética, a política e as técnicas, compreendendo qual o lugar do homem no mundo. O centro cultural da Grécia passa a ser Atenas. Os representantes do pensamento grego são Sócrates, Platão e Aristóteles, que iriam influenciar todo o pensamento posterior. • Período sistemático: séculos IV e III a.C. Busca-se reunir e sistematizar todo o pensa- mento anterior, desenvolvendo-se a teoria do conhecimento, a psicologia e a lógica. Constitui também os primeiros germes da metafísica, que busca o conhecimento último de todas as coisas. • Período helenístico (greco-romano): séculos III a.C. a VI d.C. A filosofia se preocupa com questões de ética, conhecimento humano, relações entre homem, natureza e Deus. Período de apogeu do império romano e influência do cristianismo. Entre esses momentos históricos, teria a filosofia surgido e se consolidado como o pensa- mento humano, com toda a investigação do mundo e da natureza. Porém, o pensamento dos primeiros filósofos já mostra um amadurecimento do conhecimento, passando de investigações voltadas para a origem do mundo e sua ordem, baseadas muitas vezes em mitos, para um conhe- cimento melhor fundamentado, com bases racionais. FIQUE ATENTO! As divisões históricas tomam por base períodos predefinidos de forma didática, sem uma precisão que marque ao certo a data exata de início e término de uma época, mas servem para orientar e organizar as informações. 3 Passagem do mito para a razão Como vimos na seção anterior, a filosofia, em um primeiro momento, teria sua origem nas epopeias narradas por Homero, nas obras “Ilíada” e “Odisseia”, uma narração de cunho mítico, que conta a história da Guerra de Troia e a volta para cada de seu grande herói, Ulisses. Nestas obras, temos a história sendo narrada com acontecimentos que mostram os primeiros passos de um pensamento emergente. Figura 2 – Homero Fonte: Kozlik/Shutterstock.com O pensamento filosófico tem sua base na mitologia, tomando o mito como uma explicação para o surgimento do mundo e para a manutenção do mesmo, como uma justificativa para a vida terrena. E o que é o Mito? Do grego mythos, o mito é um discurso proferido por ouvintes que receberam uma informação por aquele que narrou um acontecimento; e ao confiar nesta fonte, transmitem a informação para outros. Ou seja, o mito é uma narrativa sobre a origem de astros, da Terra, do vento, do mar, do bem e do mal, da vida e da morte. Uma narração que, por vezes, é fictícia, contando também grandes epopeias. Por falta de uma explicação contundente, o mito, ou a mitologia, por muito tempo foi um saber que justificava os acontecimentos. Justificava-se a origem das coisas por meio de lutas entre deu- ses, alianças ou relações sexuais entre forças sobrenaturais que governavam o mundo, mostrando ao homem que havia algo que estava acima de sua compreensão, mas que garantia sua vida terrena. Figura 3 – Zeus Fonte: Dearz/Shutterstock.com O mito, sendo uma ficção, não se sustentou por muito tempo. Com as primeiras investigações da natureza, na procura por um saber que explicasse o surgimento das coisas, na intenção de com- preender a passagem do caos ao cosmos, na busca pela arché (princípio, elemento primordial que constitui tudo), os primeiros filósofos promoveram o conhecimento da natureza, da physis, aquilo que emerge, que surge, que brota, rompendo com o mito, fundamentando o conhecimento na razão. EXEMPLO Para justificar um trovão, pela explicação mítica, bastava dizer que o deus do Olim- po, Zeus, estava bravo com os homens, mortais. Os primeiros filósofos irão em busca da arché, a unidade que poderia explicar a multiplicidade de coisas existentes no mundo. Para cada filósofo do período pré-socrático existiria uma arché. Para Tales de Mileto seria a água; para Anaxímenes era o ar; Demócrito acreditava que era o átomo; para Empédocles, os quatro elementos: água, ar, terra e fogo.A partir do rompimento com o pensamento mítico, a filosofia começa a se desenvolver com base na razão, por meio da busca de um saber que investigue a natureza e descubra, a partir dela, a origem de tudo e o desenvolvimento de todo saber. EXEMPLO A arché, como elemento primordial significa que todas as coisas que existem pos- suem um elemento comum. Se tudo que existe possui umidade, significa que o elemento comum é a água (Tales de Mileto, o primeiro filósofo, defendia essa tese). SAIBA MAIS! Para conhecer melhor a mitologia grega, leia “O livro de ouro da filosofia”, de Tho- mas Bulfich. Disponível em: <http://filosofianreapucarana.pbworks.com/f/O+LI- VRO+DE+OURO+DA+MITOLOGIA.pdf>. 4 O conhecimento da physis A mudança do conhecimento mitológico para o conhecimento da physis é um movimento que passa do tipo de escrita, poética, para uma escrita lógico-conceitual, em prosa. No tipo de investiga- ção, vai da aceitação de narrativas fictícias a formulações lógicas por meio de argumentos bem fun- damentados, a partir da investigação da natureza, na procura de provas para qualquer conhecimento. Os filósofos deixam de justificar a ordem do mundo advinda do sobrenatural, uma ordem divina calcada em deuses, e iniciam a busca por explicações de ordem racional. Iniciam a procura por elementos que seriam essenciais para a composição de tudo o que existe, tudo que é mutável e imutável, e que constituiu o que conhecemos como realidade. Portanto, o saber baseado na physis torna-se a investigação concreta da natureza, permi- tindo a evolução do conhecimento filosófico, deixando para trás um saber incipiente, buscando na razão o conhecimento do mundo. FIQUE ATENTO! A concepção de physis é o que, posteriormente, irá se entender como física ou filoso- fia da natureza. Na Grécia, este conceito é tomado como aquilo que é natureza, que brota, emergindo sem uma origem prévia, sem uma explicação pela causa (como um aparecer do nada). Figura 4 – O sobrenatural Fonte: Vuk Kostic/Shutterstock.com SAIBA MAIS! Conheça mais sobre a filosofia e seus mitos lendo o artigo: “O surgimento da filosofia e a evolução dos mitos: a importância da Escola Jônica para a construção da racionalidade”. Disponível em: <http://www.pucrs.br/edipucrs/XSalaoIC/Ciencias_ Humanas/Filosofia/71062-AGATHACRISTINEDEPINE.pdf>. Fechamento Nesta aula, você teve a oportunidade de: • conhecer a origem da filosofia; • entender a passagem do mito para a razão; • adquirir conhecimento sobre a mitologia. Referências ARANHA, Maria Lúcia de Arruda; MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: introdução à filosofia. 3. ed. São Paulo: Moderna, 2003. BULFINCH, Thomas. O livro de ouro da mitologia: história de deuses e heróis. 26. ed. Rio de Janeiro: Ediouro, 2002. Disponível em: <http://filosofianreapucarana.pbworks.com/f/O+LIVRO+- DE+OURO+DA+MITOLOGIA.pdf>. Acesso em: 16 jan. 2017. CHAUI, Marilena de Souza. Convite à filosofia. 13. ed. São Paulo: Ática, 2005. DEPINÉ, Ágatha Cristine; GOMES, Ariel Koch; SOARES, Josemar Sidinei. O surgimento da filosofia e a evolução dos mitos: a importância da Escola Jônica para a construção da racionalidade. In: SALÃO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA, X., Porto Alegre: PUCRS, 2009. Disponível em: < http://www. pucrs.br/edipucrs/XSalaoIC/Ciencias_Humanas/Filosofia/71062-AGATHACRISTINEDEPINE.pdf>. Acesso em: 11 jan. 2017.
Compartilhar