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As origens do portugues brasileiro

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BOTELHO, André; STOLBERG, Daiane. As origens do Português Brasileiro. Eletras, vol. 18, n.18, jul.2009. 
www.utp.br/eletras 
 
256 
Eletras, vol. 18, n.18, jul.2009 
 
AS ORIGENS DO PORTUGUÊS BRASILEIRO 
 
André Botelho 
Daiane Stolberg 
Alunos de Letras Português-Inglês – 6º período 
 
 
RESUMO: Neste artigo traçam-se paralelos intertextuais relativos às possíveis explicações 
para a origem do Português Brasileiro. São abordadas as contribuições das populações 
nativas e africanas. O pidgin e o crioulo são duas possíveis explicações, além das que 
tratam do arcaísmo, hipercorreção, e caminho próprio, entre outras. São apresentados um 
quadro evolutivo da distribuição étnica bem como exemplos de vocábulos oriundos de 
outras populações que foram incorporados pela comunidade de falantes do português 
brasileiro. 
 
PALAVRAS-CHAVE: pidgin; crioulo; nativos brasileiros; escravos africanos. 
 
1. Introdução 
 
 A busca das possíveis explicações para o surgimento do Português Brasileiro – ou 
simplesmente PB – e como ele se distanciou do Português Europeu – ou PE – tem sido 
tema de estudos de um sem número de lingüistas interessados em entender como este 
processo se configurou. À medida que novos textos que tratam deste assunto são 
publicados, novas perguntas surgem e novas explicações são propostas – sejam elas 
inéditas, sejam elas a exploração de aspectos ainda não estudados das outras teorias. 
 Este texto busca traçar paralelos, intertextualidades, entre três obras que discorrem 
sobre esse tema. A primeira delas é Ensaios para uma sócio-história do português 
brasileiro, de autoria de Rosa Virgínia Mattos e Silva (2004), na qual a autora sustenta a 
teoria da origem crioula do PB. A segunda é Origens do português brasileiro, de Anthony 
Julius Naro e Maria Marta Pereira Scherre (2007). Aqui, 
 
 “longe de negar a importância da influência africana e indígena para nossa cultura”, os 
 autores apresentam “evidências de que características morfossintáticas e fonológicas do 
 português brasileiro, atualmente envoltas em estigma e preconceito social, são heranças 
 românicas e portuguesas arcaicas e clássicas, e não modificações advindas das línguas 
 africanas, ou das línguas dos povos ameríndios.” (NARO & SCHERRE, 2007: 210) 
 
BOTELHO, André; STOLBERG, Daiane. As origens do Português Brasileiro. Eletras, vol. 18, n.18, jul.2009. 
www.utp.br/eletras 
 
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Eletras, vol. 18, n.18, jul.2009 
 
 
 Finalmente, a terceira publicação é O português da gente, de Rodolfo Ilari e Renato 
Basso (2007). Eles trabalham, assim como Mattos e Silva, com a contribuição 
determinante das populações indígenas e africanas na formação do PB – corrente na qual 
tendemos a nos filiar. Mas, sobretudo, com o aspecto sociolingüístico, comunal, e cultural 
da língua como construção coletiva, representação de um todo populacional variado e 
diversificado que constituiu originalmente nossa população. 
 Propomos, pois, uma primeira abordagem dos conceitos de pidgin e crioulo. Na 
sequência, expomos as possíveis contribuições das populações indígenas nativas seguidas 
pelas possíveis contribuições das populações africanas. Ao final, tratamos da re-
europeização do PB que nos trouxe à nossa língua atual. 
 
2. Contribuições ao Português Brasileiro 
 
2.1 Pidgin e Crioulo 
 
 Várias são as definições ao conceituar-se pidgin e crioulo, dependendo do autor 
consultado. De uma forma geral, considera-se pidgin um primeiro sistema verbal, ou de 
comunicação, uma primeira língua de contato entre povos falantes de diferentes línguas, 
que forneceriam o vocabulário para essa língua de contato, de forma que todos os falantes 
pudessem identificar elementos de sua língua materna nessa nova organização lexical. É 
interessante notar que as regras gramaticais não são necessariamente as mesmas das 
línguas que forneceram o vocabulário, mas essas regras podem ser do idioma considerado 
a língua de prestígio da região em questão, ou da maioria falante. “(...) O Tok Pisin, 
sistema de base lexical inglesa usado na Nova Guiné [está] (…) em uso na área pelo menos 
desde meados do século XIX” (NARO & SCHERRE, 2007: 51-52). Naquele país, em um 
processo considerado raro, os pais adquiriram esse pidgin já adultos, e o transmitiram para 
seus filhos como interface de contato em suas próprias casas, com status de segunda 
língua, e a nova geração a internalizou como sendo sua língua nativa, natural. Considera-se 
que a principal fonte de aquisição nos demais locais onde houve o fenômeno do pidgin seja 
o contexto comercial – nas relações de consumo e de trabalho, de um modo geral. 
 
BOTELHO, André; STOLBERG, Daiane. As origens do Português Brasileiro. Eletras, vol. 18, n.18, jul.2009. 
www.utp.br/eletras 
 
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 O pidgin tem como característica uma débil estabilidade estrutural: suas 
construções são variáveis, uma vez que não se configura como uma língua natural, mas 
uma língua adquirida e ainda em construção pelos próprios falantes. Este processo fomenta 
a fossilização do funcionamento da língua, pois à medida que o universo de falantes 
aumenta, aumenta seu prestígio, seu uso e, consequentemente, sua normatização pela 
identificação do grupo através de sua fala. As estruturas tornam-se, assim, mais estáveis. 
As regras ganham forma e começa a delimitar-se um conceito de certo e errado em relação 
a uma forma de falar que, antes, era variável e sempre aberta a muitas possibilidades. 
 Esse seria o momento quando o pidgin se tornaria um crioulo. Há uma população, 
uma nova geração que já o tem como língua nativa, natural. Suas estruturas de 
funcionamento e seu léxico começam a mostrar sinais de estabilidade. Há um contínuum 
comunicativo entre os indivíduos daquela comunidade que começam a valorar a forma 
com a qual se fala a língua. O senso de identificação de grupo cresce e engloba a nova 
língua como parte integrante e inseparável de sua cultura. Além disso, o grupo passa a ser 
identificado externamente como falante daquela língua, que continuará tendo elementos 
lexicais – e mesmo gramaticais – da língua ou das línguas que deram origem a esse novo 
sistema, como acontece atualmente com os crioulos falados nos países caribenhos, 
derivados do espanhol, alemão e inglês – línguas dos países que colonizaram a partir do 
século XVI estas regiões. Então, em um último estágio, esse sistema se torna a língua de 
prestígio, substituindo aquela ou aquelas que eram faladas originalmente, que se tornam – 
ou não – os vários dialetos ou línguas menores das populações isoladas, indígenas, pobres, 
em suma, de menor prestígio. 
 Notam-se no PB numerosos processos que teriam características similares àquelas 
de um processo de pidginização/crioulização como a simplificação das concordâncias de 
número e das flexões verbais. A saber: 
 
“(1) CONCORDÂNCIA VARIÁVEL DE NÚMERO VERBO/SUJEITO: 
eles ganhaM demais da conta, eles ganha demais.” 
“(2) CONCORDÂNCIA VARIÁVEL DE NÚMERO ENTRE OS ELEMENTOS DO 
SINTAGMA NOMINAL: 
os fregueseS, aS boaS açÕES, aS codorna, aS porta aberta, essaS estradaS nova, do meuS 
paiS.” 
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“(3) CONCORDÂNCIA VARIÁVEL DE NÚMERO NO SINTAGMA PREDICATIVO: 
as coisas tÃO muito caras, né? As coisas tÁ cara” (NARO & SCHERRE, 2007: 50). 
 
 Algumas das possíveis explicações para esses fenômenos são a necessidade de 
simplificação do sistema pelos novos falantes da língua que a adquirem já em idade adulta. 
Similar processo ocorreu nas línguas que surgiram a partir do Latim quandoda expansão 
do Império Romano, no conhecido processo de colonização que impunha a língua do 
imperador. Na realidade, a língua falada não era exatamente aquela modalidade que o 
próprio falava, mas um sistema rudimentar de comunicação se comparado com o léxico 
românico e algumas de suas regras gramaticais. Por isso, por tratar-se de um complexo 
sistema de declinações e casos, as populações locais acabaram por simplificá-lo – 
flexionando o verbo pela simples justaposição ao pronome, ou reduzindo os casos para os 
mais usados, ou ainda deixando de lado o registro formal necessário para contextos oficiais 
ou sofisticados e adotando somente os pronomes de tratamento informais. 
 
 
2.2 Tupinambás, guaranis, kayowaas, jês... 
 
 No Brasil, poderia-se creditar esta simplificação da língua aos índios que aqui 
viviam. Entretanto, tal suposição não goza de muito prestígio, pois os colonizadores 
adotaram línguas gerais como interface de contato entre eles e os nativos. Estas acabaram 
tornando-se as línguas mais faladas no Brasil em detrimento do PE. Oficiais ou 
funcionários da coroa portuguesa que viessem para a colônia tinham que ser 
acompanhados de intérpretes para que conseguissem comunicar-se com os locais (ILARI 
& BASSO, 2007: 62). Uma das línguas gerais, a língua geral paulista, tornou-se a mais 
popular de todas no Brasil meridional nos séculos XVII e XVIII. Uma outra língua geral 
era falada no Brasil setentrional e hoje é comumente conhecida como nheengatu e ainda 
pode ser encontrada nas comunidades isoladas do norte amazônico brasileiro. Obviamente, 
línguas gerais tiveram forte contribuição para o léxico do PB conforme vemos nos 
exemplos abaixo: 
 
 Quadro 1: Contribuições das Línguas Gerais para o PB 
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ABACAXI fruta cheirosa 
ANHANGABAÚ rio de águas maléficas 
BAURU cesto de frutas 
BURITI árvore que destila líquidos, palmeira 
CABOCLO procedente do mato 
CATAPORA febre eruptiva, fogo que vem de dentro 
PIPOCA grão de milho que estoura 
 Fonte: http://educacao.uol.com.br/planos-aula/ult3907u160.jhtm 
 
 A política das línguas gerais continuou fortíssima e predominante sobre quaisquer 
outras línguas ou dialetos, inclusive com o apoio e anuência da coroa portuguesa. Somava-
se a isso o trabalho da igreja católica nos territórios brasileiros que catequizava os nativos 
usando versões traduzidas para a língua geral das orações e das pregações bem como da 
bíblia. No entanto, como os integrantes da Companhia de Jesus ganhavam mais e mais 
poder na colônia, a administração viu-se ameaçada em sua posição. Em consequência desta 
situação, o Marquês de Pombal decretou em 1757 que a única língua de ensino no Brasil 
seria a língua portuguesa sem corruptelas ou alterações, mas exatamente aquela falada em 
terras européias. 
 Essa medida teve eficácia até certo ponto questionável. Ilari & Basso (2007: 65-66) 
citam uma carta do ouvidor interino Antônio da Costa Camelo na qual relata os fatos 
ocorridos na vila de São Jorge dos Ilhéus, a 28 de dezembro de 1795. Aparentemente, fora 
destituído um funcionário público que não cumpria suas funções e, em seu lugar, fora 
nomeado outro, que tinha várias qualidades, entre elas, ser natural da própria vila e falar a 
língua dos índios. Mas o fato é que, no começo do século XXI, essas línguas gerais estão 
circunscritas às pequeníssimas comunidades isoladas no norte 
 
amazônico. Além disso, não são detectáveis vestígios dessas línguas no PB, fato que 
corrobora com o descrédito sobre a possibilidade de as línguas indígenas – naturais ou as 
línguas gerais – serem a base do PB. Soma-se a estas evidências o fato de que a população 
indígena tornou-se infimamente pequena conforme se nota no Quadro 2, abaixo. Em 
meados do século XVII, representavam apenas 10% da população os índios integrados, 
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tendo sua presença na população diminuído ao longo dos séculos até ínfimos 2% na 
segunda metade do século XIX. 
 
2.3. África 
 
 Uma segunda possibilidade abordada seria a de que a simplificação/mudança do PB 
seria o resultado de uma pidginização causada pelos escravos trazidos dos países africanos. 
Esta teoria esteve em um limbo entre os anos 1950 até meados de 1990/2000 quando foi 
novamente trazida à tona por Mattos e Silva. Segundo a autora, em Estudos para uma 
sócio-história do português brasileiro (2004: 82), busca “(...) argumentar em favor de um 
ponto de vista segundo o qual teria sido essa significativa parcela de africanos e afro-
brasileiros da população colonial o agente principal de difusão do que (…) [ela designa] de 
português geral brasileiro, antecedente histórico do chamado português popular brasileiro.” 
 Iniciado nos anos que seguiram imediatamente à chegada dos portugueses no 
Brasil, o tráfico de escravos oriundos do continente africano continuou, embora em 
diferentes quantidades, ao longo dos quase quatro séculos durante os quais foi legalizado, e 
por algumas décadas após ser declarado ilegal. Estimativas sobre a quantidade de pessoas 
subtraídas da África variam de três milhões e trezentos mil, de acordo com Roberto 
Simonsen (1944) a 13 milhões, seguindo os estudos do historiador Rocha Pombo (1919). 
 Seja qual for a estimativa adotada, o fato é que as populações não-européias 
sempre foram a maioria avassaladora entre os habitantes do território brasileiro. 
Reproduzindo uma tabela de Alberto Mussa, temos um retrato diacrônico da distribuição 
das etnias, de acordo com com seu estudo de 1991: 
 
 
Quadro 2: Distribuição das etnias no Brasil de 1538 a 1890 
 1538-1600 1601-1700 1701-1800 1801-1850 1851-1890 
Africanos 20% 30% 20% 12% 2% 
Negros brasileiros - 20% 21% 19% 13% 
Mulatos - 10% 19% 34% 42% 
Brancos brasileiros - 5% 10% 17% 24% 
Europeus 30% 25% 22% 14% 17% 
Índios integrados 50% 10% 8% 4% 2% 
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www.utp.br/eletras 
 
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Fonte: Mussa, 1991: 163 
 
 O que se depreende dos dados acima é que a comunidade falante do PE – brancos 
brasileiros e europeus – girou em torno de 30% desde o século XVI, quando os índios 
representavam 50% da população local e africanos, 20%, e manteve-se neste patamar até o 
século XIX, quando falantes do PE ganham espaço em detrimento da entrada de pessoas 
africanas escravizadas e do virtual desaparecimento das populações indígenas, que 
atingiram seu mínimo, até então, histórico. 
 Em contrapartida, a comunidade falante das dezenas de línguas africanas 
registradas no Brasil, representada pela população de africanos e brasileiros descendentes 
de africanos (negros e mulatos), foi a maioria absoluta desde o século XVII, quando 
começaram a ser sequestrados em larga escala do continente negro, ao mesmo tempo em 
que os índios sofriam um massacre sem precedentes para dar espaço para a ocupação 
européia em terras locais. Tal fato resultou numa rápida inversão da distribuição 
populacional brasileira: de um total de 50% de índios integrados durante o século XVI, os 
fatos mencionados levaram a uma queda deste número para 10% no século seguinte, ao 
mesmo tempo que o africanos passaram de 20 para 30% no mesmo período. 
 Somam-se a esses africanos suas primeiras gerações de descendentes, bem como 
aquelesindivíduos resultantes da miscigenação com as populações locais, de tal forma que 
negros brasileiros e mulatos igualaram-se em quantidade aos africanos já no século XVI e 
cresceram desde então, representando 40%, 53% e 55% nos séculos XVIII, e primeira e 
segunda metades do século XIX, respectivamente. No mesmo período, a população 
originalmente africana decresceu, representando 20%, 12% e 2%, refletindo 
 
a mudança das políticas populacionais brasileiras. 
 Um interessante fenômeno apontado por Darcy Ribeiro (1995: 220) é de que os 
africanos seriam, eles próprios, os principais difusores da língua portuguesa que eles 
aprendiam oralmente de seus colonizadores. Submetidos à política de separação étnica e 
linguística, eram forçados a adotar o português como meio de contato tanto com os demais 
escravos quanto com os não-escravos. Segundo o autor, “(...) fazendo-o, se reumanizou… 
conseguindo dominar a nova língua, não só a refez, emprestando singularidade ao 
português do Brasil, mas também possibilitou sua difusão por todo o território.” (Soma-se 
BOTELHO, André; STOLBERG, Daiane. As origens do Português Brasileiro. Eletras, vol. 18, n.18, jul.2009. 
www.utp.br/eletras 
 
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ao fato do grande número de africanos que viviam em terras brasileiras o declínio da mão-
de-obra indígena, sobretudo nas regiões nordestinas e no sudeste, onde o PB já se 
configurava como língua predominante. Nas regiões sulinas ainda com forte presença tupi 
– e das línguas gerais dos jesuítas e dos bandeirantes, as crescentes levas de imigrantes 
europeus, a abertura de novas frentes de exploração agropecuária e a consequente expulsão 
das populações autóctones trouxeram gradativamente, também para esta região, o 
predomínio do português. 
 Houve, no entanto, um momento em que a identidade africana pôde se manifestar 
de forma una: durante o período dos quilombos. Há registros destas comunidades de 
fugitivos dos martírios da escravidão que datam desde meados do século XVII e vem até a 
atualidade, quando as comunidades foram reconhecidas como descendentes diretos dos 
próprios quilombolas. Nestes locais, acredita-se que não eram faladas línguas africanas 
propriamente ditas, mas línguas gerais que mesclariam o português brasileiro em 
formação, o português europeu, línguas africanas variadas, além das línguas indígenas. 
Estas configurações dependeriam dos indivíduos que formassem cada aglomerado 
populacional. 
 Acredita-se que o conhecido Quilombo dos Palmares – que era, na realidade, um 
complexo de doze ou mais quilombos, poderia ter tido até 30 mil indivíduos em 
determinado momento. Levando-se em consideração que estes habitantes falariam uma 
enorme gama de línguas e dialetos africanos como fulfuldé, wolof, serei, temre, mande, 
kwa, ghe, ewen, gen, oj'a, fous, yoruba, nagô-ketu, nupe, igbo, ijó, tchadico, haussá, 
kanuri, somente para citar alguns, é factível acreditar-se na necessidade de uma língua 
comum a todas as comunidades de falantes desta plêiade linguística. 
 
 
 Muitos desses quilombos estavam situados nas regiões periféricas ou próximas dos 
centros urbanos em formação como a cidade do Rio de Janeiro e de Salvador. Mattos e 
Silva (2004: 89) cita as palavras de F. S. Gomes quando este menciona as comunidades 
situadas na Baixada Fluminense e no Recôncavo da Guanabara: “Os quilombos de Iguaçu, 
como hidra de várias cabeças, tornaram-se ameaçadores para os mundos da escravidão. As 
cabeças imortais da hidra de Iguaçu, além dos quilombolas, eram taberneiros, pequenos 
lavradores, escravos remadores, etc.” Na Bahia, havia quilombos 'urbanos' nas imediações 
BOTELHO, André; STOLBERG, Daiane. As origens do Português Brasileiro. Eletras, vol. 18, n.18, jul.2009. 
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de Salvador – mais especificamente, em Cabula, Matatu e Itapoan. Mattos e Silva (2004: 
89) cita anda J. J. Reis quando ele diz que “os quilombolas circulavam com frequência 
entre seus quilombos e os espaços 'legítimos' da escravidão” e também Schwartz que 
afirma que “os quilombos estavam cada vez mais integrados à vida da escravidão urbana.” 
 Pode-se, pois, supor que esses locais eram verdadeiros laboratórios linguísticos 
onde os falantes combinavam e recombinavam suas culturas, hábitos, léxicos, gramáticas, 
portugueses, tupis e demais elementos culturais e de identidade para produzir o que seria o 
nosso PB. A proximidade com os futuros centros urbanos trazia sempre sua influência para 
dentro da comunidade e vice-versa; esses indivíduos exportavam sua produção linguística 
diária para as camadas da população com as quais tinha contato. 
 
3. Conclusão 
 
 A coroa portuguesa nunca se preocupou com a difusão organizada de sua língua 
aqui na colônia brasileira. Ao contrário das políticas romanas já citadas de conjugação das 
dominações militar e cultural, deu-se aqui uma simples ocupação humana culturalmente 
desordenada e consideravelmente aleatória no que diz respeito ao desenvolvimento dos 
sistemas de significação cultural do povo. Em realidade, não houve o suporte ao 
desenvolvimento de uma identidade cultural brasileira, mas simplesmente a reprodução – 
defectiva – do modelo lusitano. 
 Como consequência, o nível do sistema educacional brasileiro foi sempre 
 
sofrível, e piorou ainda mais com a expulsão dos Jesuítas em 1760 pelo Marquês de 
Pombal. Havia um pequeníssimo número de estabelecimentos educacionais que, além de 
atender uma ínfima ponta da pirâmide social, estava setorizado nos centros urbanos. 
Temerosos de que seus filhos fossem influenciados pelo falar dos escravos, índios e 
gentios, os mais ricos começaram a enviá-los para Coimbra, em Portugal, para estudar 
Direito. Isto resultou em uma grande quantidade de falantes do PE pertencentes às classes 
dominantes – o que já era a praxe, uma vez que o PB era somente falado pelas camadas 
trabalhadoras e nos espaços de menor prestígio. De qualquer forma, no sentido de 
resguardar a formação européia, estes brasileiros voltavam para a terra pátria carregados de 
influência lusitana – tanto cultural quanto lingüística, o que retroalimentava este círculo de 
BOTELHO, André; STOLBERG, Daiane. As origens do Português Brasileiro. Eletras, vol. 18, n.18, jul.2009. 
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falantes de alto-prestígio e confirmava ainda mais o PE como a variante de prestígio. 
 Apesar de tudo isso, o PB sempre se caracterizou por uma realização menos 
marcadamente identificável ou menos carregada de estigmas, como que escolhendo um 
caminho próprio (MATTOS E SILVA, 2004: 82). Este fato é, de sobremodo, surpreendente, 
tendo em vista a proporção da população que tinha o português como língua materna e 
aquela que o tinha como segunda língua. Seria de se esperar que a língua falada aqui 
derivasse direta e fortemente das línguas que falavam os escravos e indígenas, que, juntos, 
representaram sempre cerca de 70% da população local. 
 Não obstante, uma série de políticas de isolamento social – como a seleção 
negativa, na qual falantes de uma mesma língua eram obrigatoriamente separados, assim 
como a negação da formação de núcleos familiares, que eram dissolvidos assim que 
começavam a se formar dentro das fazendas – fizeram com que as línguas faladas pelos 
escravos se perdessem no tempo e não se tornassem a interface de contato. Some-se a isso 
o fato de os possíveis pidgin e crioulo brasileiros nunca haverem sido a língua de prestígio, 
o que fazia com que os ricos enviassem seus filhos para a Europa para que estudassem o 
PE. Além disso, a variante européia era a adotada oficialmente pelos órgãos de governoe 
por seus representantes, normalmente nascidos em território português. 
 É importante observar que houve – e ainda há – comunidades isoladas falantes de 
dialetos variados de origem africana e nativa brasileira, como as comunidades 
 
quilombolas de então e aquelas que ainda existem no interior brasileiro, bem como as 
comunidades indígenas isoladas em variadas regiões brasileiras, mas, sobretudo, no norte 
amazônico. Estas comunidades funcionariam como laboratórios linguísticos onde os 
indivíduos dariam sua contribuição através da adição de léxicos e gramáticas variadas, bem 
como, seus hábitos culturais herdados de seus pais ou trazidos de seus locais de origem. 
 
4. BIBLIOGRAFIA 
 
MATTOS E SILVA, Rosa Virgínia (2004). Ensaios para uma sócio-história do português 
brasileiro. São Paulo: Parábola Editorial. 
NARO, Anthony Julius; SCHERRE, Maria Marta Pereira [organização] (2007) Garimpo 
das origens do português brasileiro. São Paulo: Parábola Editorial. 
ILARI, Rodolfo; BASSO, Renato (2007). O português da gente: a língua que estudamos a 
língua que falamos. São Paulo: Contexto. 
BOTELHO, André; STOLBERG, Daiane. As origens do Português Brasileiro. Eletras, vol. 18, n.18, jul.2009. 
www.utp.br/eletras 
 
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Eletras, vol. 18, n.18, jul.2009 
 
SIMONSEN, R. C. (1944). História econômica do Brasil. São Paulo: Nacional. 
RIBEIRO, D. (1995). O povo Brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. São Paulo: Cia 
das Letras. 
ROCHA POMBO, J. F. (1919). História do Brasil. São Paulo: Melhoramentos. 
MUSSA, A. (1991). O papel das línguas africanas na história do português do Brasil. Rio 
de Janeiro: UFRJ (dissertação de mestrado), mimeo. 
SILVA, Ana Rosa. Portuês Vocábulos Indígenas. <http://educacao.uol.com.br/planos-
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