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APOSTILA DE MÉTODOS E TÉCNICAS DE PESQUISA EM HISTÓRIA

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APOSTILA DE 
MÉTODOS E TÉCNICAS DE PESQUISA EM HISTÓRIA
CURSO DE HISTÓRIA
ESR/SFC
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
Prof. Leonardo Soares dos Santos 
CAMPOS DOS GOYTACAZES
2014
Sumário 
Parte I – Definições ........................................................................................................5
Texto 1 – Verbete “método”..............................................................................................6
Texto 2: verbete “metodologia” .......................................................................................8
Texto 3 - O diálogo entre o estrangeiro e Teeteto: a definição do sofista .......................9
Texto 4 - Texto 4: Método em Galileu.............................................................................15
Parte II - Os Clássicos ................................................................................................16
Texto 5: Os quatro preceitos fundamentais do Método de 
 Descartes ........................................................................................................... 17
Texto 6: Marx e a metáfora da Estrutura e superestrutura............................................ 19
Texto 7: o ponto de partida da produção material da existência humana.................... 21
Texto 8: uma noção ampliada do modo de produção................................................... 22
Texto 9: a análise das conexões entre representação e estrutura social........................ 23
Texto 10: a filosofia e os conceitos não são a-históricos, muito menos entidades extra-corpóreas que habitem o plano divino. São expressões de determinada época, fruto de um contexto bem determinado de relações sociais e históricas................................................................................................................ 24
Texto 11: o conceito de fetiche. Um dos nexos entre representação e realidade................................................................................................................ 25 
Texto 12: o cerne de um sistema de domínio não está no arbítrio de quem detêm o poder e sim nas relações de poder que possibilitam tal dominação............................................................................................................. 26
Texto 13: a definição de tipo ideal.................................................................................. 27
Texto 14: as noções de ação social e causalidade.......................................................... 28
Texto 15: a centralidade do indivíduo na análise weberiana........................................ 29
Texto 16: a historicidade dos conceitos e das idéias..................................................... 30 
Texto 17: método e fato social...................................................................................... 31
Texto 18: Cliford Geertz e seu conceito de cultura........................................................ 33
Texto 19: a relação entre idéias e estruturas de poder.................................................. 34
Texto 20: o mundo social como texto........................................................................... 35
Texto 21: e a cultura um conjunto de textos ................................................................. 36
Texto 22: pressuposto do “geertzismo” segundo Giovanni Levi: a recusa do objetivismo........................................................................................................... 37
Texto 23: o primado da interpretação em Paul Ricoeur e Geertz.................................................................................................................... 38
Texto 24: Geertz, Darnton e Gadamer e a estetização do mundo social..................................................................................................................... 39
Texto 25: os perigos do geertzismo. O maior deles: a história se confundir com a literatura................................................................................................................ 40
Texto 26: a História não é Ciência, e sim um desdobramento da Arte Retórica................................................................................................................. 42
Texto 27: para Lacapra, a retórica é mais eficaz do que a ciência na busca por “vozes do passado”... ...................................................................................................... 43
Texto 28: o Documento como Monumento ................................................................. 44
Texto 29: novamente a História como discurso..............................................................45
Texto 30: uma alternativa possível ao subjetivismo:
 o conceito de habitus de Pierre Bourdieu........................................................ 46
Texto 31: comentários de Thompson acerca da clássica oposição 
 entre ser e consciência sociais........................................................................ 47
Texto 32: o status do fato e da evidência histórica na análise 
 de Thompson ................................................................................................. 49
Texto 33: sobre o tratamento dos fatos ......................................................................... 50
Texto 34: Thompson e a noção de lógica histórica ....................................................... 51
Texto 35: a crítica de Thompson ao conceito de classe social 
 do Estruturalismo ........................................................................................... 52
Texto 36: a crítica de Ginzburg ao postulado pós-moderno do “tudo é discurso”............................................................................................................... 53
Texto 37: o rigor metodológico da micro-história italiana ............................................54
Texto 38: o historiador e suas fontes ............................................................................. 55
Texto 39: a busca pelo conhecimento histórico já é em si mesma parte da história que deve ser contada .................................................................................................. 56
Parte III O Trabalho com fontes ..............................................................................57
Texto 40: Fotografia ...................................................................................................... 58
Texto 41: Pinturas ...........................................................................................................59
Texto 42: Jornais .............................................................................................................60
Texto 43: Literatura ........................................................................................................61
Texto 44: Fonte Orais.....................................................................................................62
Bibliografia ..................................................................................................................65
	
Parte I
Definições
Texto 1 – Verbete “método”:
“sm (lat methodu). 1 Conjunto dos meios dispostos convenientemente para alcançar um fim e especialmente para chegar a um conhecimento científico ou comunicá-lo aos outros. 2 Ordem ou sistema que se segue no estudo ou no ensino de qualquer disciplina. 3 Maneira sistemática de dispor as matérias de um livro. 4 Maneira de fazer as coisas; modo de proceder. 5 Circunspecção, prudência. 6 Mat Conjunto de regras para resolver problemas análogos. 7 Mat Processo pelo qual, depois de tomados os valores de certos resultados por acréscimos sucessivos da variável, se procura averiguar em que é que eles se convertem no limite ou quando esses acréscimos se tornam sucessivamente menores.8 Classificação ou distribuição sistemática dos diversos seres, segundo os caracteres ou semelhanças que apresentam. M. analítico: método em que se emprega a análise. M. a posteriori: método experimental que procede dos fatos para os princípios ou leis. M. a priori: método experimental que procede de uma hipótese anterior ou dos princípios ou leis para os fatos. M. botânico: ordem ou sistema que se segue no arranjo dos vegetais em uma classificação. M. comparativo: método de investigação ou pesquisa baseado na comparação. M. de acesso por fila, Inform: método de programação que minimiza os atrasos de entrada/saída, assegurando que os dados transferidos entre o programa e um dispositivo de E/S sejam sincronizados com o dispositivo de E/S. M. de acesso sequencial por chaves, Inform: estrutura de arquivo que permite o acesso aos dados usando campos-chaves ou o conteúdo do campo-chave. M. de Cooper: sistema de exercícios de intenção eugênica e atlética. M. de Golgi, Med: método de preparar tecidos para o estudo de nervos, pelo uso de bicromato de potássio e nitrato de prata. M. de Gramm, Biol: método para o tingimento diferencial de bactérias, pelo qual são tratadas com a solução de Gramm após serem tingidas com violeta de genciana; posteriormente são tratadas com álcool e lavadas em água, constatando-se que certas espécies retêm o corante enquanto outras se descolaram. M. de observação: conjunto dos processos próprios das ciências positivas, que se limitam a contemplar a natureza, sem atuar sobre ela. M. didático: o que se aplica ao ensino: expositivo ou discursivo, dialogado, experimental, de centros de interesse, de projetos etc. M. estatístico: método de estudo dos caracteres flutuantes, que consiste em efetuar a medida deles, grupando e analisando os números obtidos. M. exegético: processo de investigação e análise que se emprega para esclarecer ou interpretar um texto obscuro ou duvidoso. M. expectante: norma de proceder que consiste em esperar pelos acontecimentos, antes de tomar uma resolução qualquer. M. sincrônico: o que consiste em descrever ou narrar os fatos pela coincidência destes no mesmo tempo em diferentes lugares ou países. M. sintético: método em que se emprega a síntese. M. subjetivo: método em que o ponto de partida é uma concepção do espírito, que supõe a priori um certo princípio metafísico de onde tira as deduções, ou que chega às deduções pelas concepções do espírito. M. zetético: o mesmo que zetética.”
Fonte: Dicionário Michaelis.
Texto 2: verbete “metodologia”:
“sf (método2+logo2+ia1) 1 Estudo científico dos métodos. 2 Arte de guiar o espírito na investigação da verdade. 3 Filos Parte da Lógica que se ocupa dos métodos do raciocínio, em oposição à Lógica Formal. M. didática: teoria dos procedimentos de ensino, geral ou particular para cada disciplina; didática teórica.”
Fonte: Dicionário Michaelis.
Texto 3 – O Método segundo Platão: O diálogo entre o estrangeiro e Teeteto: a definição do sofista 
“ESTRANGEIRO 
— Disseste bem. Aliás, a decisão importará a ti e poderás tomá-la durante a discussão. Entretanto cabe a mim e a ti, ao empreender esta análise, iniciá-la desde logo pelo estudo do sofista, ao que me parece, procurando saber e definir claramente o que ele é. Até aqui só concordamos, tu e eu, quanto ao seu nome, mas a função que, por esse nome lhe cabe, poderia ser, para cada um de nós, uma noção toda pessoal. Todavia, em qualquer análise, é sempre indispensável, antes de tudo, estar de acordo sobre o seu próprio objeto, servindo-nos de razões que o definam, e não apenas sobre o seu nome, sem preocupar-nos com a sua definição: Não é nada fácil saber o que são as pessoas, objeto de nossa análise, e dizer o que é o sofista. Mas, o método aceito por todos, e em todo lugar, para levar a bom termo as grandes obras é o de que se deve procurar, primeiramente, ensaiar em exemplos pequenos e mais fáceis antes de chegar propriamente aos temas grandiosos. No caso presente, Teeteto, também me parece ser esse o método que aconselho a nós: antes desta procura difícil e penosa a que, bem sabemos, nos obrigará o gênero sofistico, deve-se, primeiramente, ensaiar em algum assunto mais fácil o método aplicável a esta pesquisa; a menos que tenhas outro caminho mais fácil a propor-nos. 
TEETETO 
— Não, não tenho nenhum outro. 
ESTRANGEIRO 
— Concordas, pois, que investiguemos um assunto simples qualquer, procurando nele encontrar um modelo para o nosso tema grandioso? 
TEETETO 
— Sim. 
ESTRANGEIRO 
— O que, então, de mínimo poderíamos propor-nos, que fosse fácil de conhecer, comportando, entretanto, uma definição tão trabalhosa quanto a de qualquer outro assunto mais importante? O pescador com anzol, por exemplo, não te parece um assunto conhecido de todos e que não exige atenção demasiada? 
TEETETO 
— Sim. 
ESTRANGEIRO 
— Apesar do que, creio, o método que comporta em sua definição será, certamente, de algum proveito ao fim que perseguirmos. 
TEETETO 
— Seria excelente. 
ESTRANGEIRO 
— Pois bem: vê por onde começaremos. Dize-me: devemos reconhecer-lhe uma arte, ou se não uma arte, qualquer outra faculdade? 
TEETETO 
— Negar-lhe uma arte seria inadmissível. 
ESTRANGEIRO 
— Mas tudo o que é realmente arte, se reduz, afinal, a duas formas. TEETETO 
— Quais? 
ESTRANGEIRO 
— A agricultura e todos os cuidados relativos à manutenção dos corpos mortais; todo o trabalho relacionado ao que, composto e fabricado, se compreende pelo nome de mobiliário, e, enfim, a imitação, não podem, como um todo, merecer um único nome? 
TEETETO 
— Como assim, e que nome? 
ESTRANGEIRO 
— Das coisas que do não-ser anterior foram posteriormente tornadas ser, não se dirá que foram produzidas, pois que, produzir é tornar ser, e ser tornada é ser produzida? 
TEETETO 
— É certo. 
ESTRANGEIRO 
— Ora, este poder é próprio a todas as artes que há pouco enumeramos. 
TEETETO 
— Tens razão. 
ESTRANGEIRO 
— Produção é, pois, o nome em que todas, elas necessariamente se incluem. 
TEETETO 
— Seja. 
ESTRANGEIRO 
— Consideremos depois as atividades que têm a forma de disciplina e de conhecimento, e ainda, de ganho pecuniário, de luta e de caça. Na realidade, nenhuma delas nada fabrica; trata-se sempre do preexistente, ou do já produzido que ou bem é apoderado pela palavra ou pela ação, ou bem é defendido contra quem pretenda dele apossar-se. Seria melhor, então, reunir de uma vez todas estas partes num só todo sob o nome de arte de aquisição. 
TEETETO 
— Sim, na realidade, é o que seria melhor. 
ESTRANGEIRO 
— Se a aquisição e a produção assim compreendem o conjunto das artes, sob que título devemos nós, Teeteto, colocar a arte do pescador com anzol? 
TEETETO 
— Em algum lugar da aquisição, evidentemente. ESTRANGEIRO 
— Mas não há duas formas de aquisição? De um lado a troca voluntária, por presentes, locação e compra, ao passo que o resto, onde tudo o que se faz é apoderar-se pela ação ou palavra, seria a arte da captura? 
TEETETO 
— E o que se segue do que dissemos. 
ESTRANGEIRO 
— E também a arte da captura não deve dividir-se em duas? 
TEETETO 
— De que maneira? ESTRANGEIRO 
— Tudo o que nela se faz às claras seria dito pertencer à luta e tudo o que nela se faz por armadilha, à caça. 
TEETETO 
— Sim. 
ESTRANGEIRO 
— Mas a própria arte da caça deve ela mesma ser dividida em duas, se quisermos evitar um absurdo. 
TEETETO 
— Em quais? — dize-me. 
ESTRANGEIRO 
— A primeira relativa ao gênero inanimado, e outra ao animado. 
TEETETO 
— Na verdade, é inegável que elas se distinguem. 
ESTRANGEIRO 
— E como se distinguem? Aliás, desde que para a caça ao gênero inanimado não há nomes próprios senão para algumas partes do ofício do mergulhador e outras artes muito limitadas, teremos que abstrair-nos completamente delas. De outro lado há a caça ao que possui alma e vida: nós a chamaremos de caça aos seres vivos. 
TEETETO 
— Seja. 
ESTRANGEIRO 
— Mas, nesta caça aos seres vivos não poderemos distinguir duas formas, uma para o gênero dos seres que andamsobre a terra e que se distribui numa pluralidade de formas e de nomes, a caça aos terrestres; outra, compreendendo todos os seres vivos nadadores, a caça aos aquáticos? 
TEETETO 
— Certamente. 
ESTRANGEIRO 
— E ainda, no gênero nadador, há o grupo dos animais voadores e o dos que só vivem na água. 
TEETETO 
— Evidentemente. 
ESTRANGEIRO 
— A toda caça ao gênero voador creio que poderemos chamar de caça às aves. 
TEETETO 
— É esse, na realidade, o seu nome. 
ESTRANGEIRO 
— Ao contrário, a caça aos aquáticos é, creio, em sua quase totalidade, a pesca. 
TEETETO 
— Sim. 
ESTRANGEIRO 
— E, nesta espécie de caça aquática, não podemos, atendendo às suas partes mais importantes, distinguir ainda duas divisões? 
TEETETO 
— Atendendo a que partes? 
ESTRANGEIRO 
— A que, numa delas, a caça se faz por meio de redes que por si mesmas prendem a presa; e noutra, fere-se a presa. 
TEETETO 
— Que pretendes dizer e como distingues uma da outra? 
ESTRANGEIRO 
— De um lado, tudo que serve para envolver e cercar o que se quer prender, pode chamar-se de cerca. 
TEETETO 
— Certamente. 
ESTRANGEIRO 
— Às redes, aos laços, às enseadas, às armadilhas de junco e aos engenhos semelhantes caberá outro nome que não o de cerca? 
TEETETO 
— Certamente não. 
ESTRANGEIRO 
— Esta parte da caça designaremos, pois, pelo nome de caça por cerco, ou por algum outro nome análogo. 
TEETETO 
— Sim. 
ESTRANGEIRO 
— Mas aquela que se faz por anzol ou arpões é diferente da primeira e o nome que, agora, devemos dar a toda ela é o de caça vulnerante. E de que outra forma poderíamos melhor denominá-la, Teeteto? 
TEETETO 
— Não nos preocupemos com o nome; e, aliás, esse está bem. 
ESTRANGEIRO 
— Para esta caça vulnerante, quando ela se realiza durante a noite e à luz do fogo, os seus próprios profissionais deram o nome, creio, de caça ao fogo. 
TEETETO 
— Perfeitamente. 
ESTRANGEIRO 
— E quando se realiza à luz do dia, armando-se de fisga a própria ponta do arpão, cabe-lhe o nome comum de caça por fisga. 
TEETETO 
— Ê esse, na realidade, o nome que se lhe dá. 
ESTRANGEIRO 
— Mas esta caça vulnerante, servindo-se da fisga, se ferir do alto para baixo, terá empregado o arpão, na maioria das vezes, e daí o seu nome de caça por arpão, creio. 
TEETETO 
— Pelo menos é como alguns a chamam. 
ESTRANGEIRO 
— Todas as demais constituem, pode-se dizer, uma forma única. 
TEETETO 
— Qual? 
ESTRANGEIRO 
— A que ferindo em sentido inverso ao da primeira, e por meio do anzol, não fere o peixe em qualquer parte do corpo, como faz o arpão, mas segura a presa, sempre, nalgum lugar da cabeça ou da boca, tirando-a do fundo até a superfície por meio de varas e paus. Por que nome, Teeteto, teríamos de chamá-la? 
TEETETO 
— Ao que me parece, encontramos o objeto a que há pouco nos havíamos proposto procurar. 
ESTRANGEIRO 
— Chegamos, pois, a um acordo, tu e eu, a respeito de pesca por anzol; e não apenas a respeito do seu nome mas, sobretudo,. relativamente a uma definição que nos propusemos sobre o seu próprio objeto. Na realidade, consideradas as artes em seu todo, uma metade inteira era a aquisição; na aquisição havia a arte de captura, e, nesta, a caça. Na caça, a caça aos seres vivos, e nesta a caça aos aquáticos. Da caça aos aquáticos, toda a última divisão constitui-se da pesca, e na pesca, há a pesca vulnerante e nela a pesca por fisga. Nesta última, a que golpeia de baixo para cima, por tração ascendente do anzol, recebeu seu nome de sua própria maneira de proceder: chama-se aspaliêutica, ou pesca por anzol — e essa era a própria forma que procurávamos. 
TEETETO 
— Aí está, pelo menos, uma demonstração plenamente evidente. 
ESTRANGEIRO 
— Tomando-a por modelo, procuremos determinar de igual modo, para o caso do sofista, o que ele poderá ser. 
TEETETO 
— Perfeitamente. 
Texto 4: Método em Galileu.
“Em seu sentido mais geral, método é a ordem que se deve impor aos diferentes processos necessários para atingir um certo fim ou um resultado desejado. Nas ciências, entende-se por método o conjunto de processos empregados na investigação e na demonstração da verdade.
[...]
O florentino Galileu Galilei (1564-1642) foi o primeiro teórico do método experimental. O método empírico defendido por Galileu constitui uma ruptura com o método aristotélico mais abstrato, que busca a essência íntima das substâncias individuais, devido a isso, Galileu é considerado o "pai da ciência moderna".
Para Galileu o objetivo das investigações deve ser o conhecimento da lei que preside os fenômenos, e não a essência íntima dos mesmos. Além disso, o foco principal da ciência não deve ser a qualidade, mas sim as relações quantitativas.
O método de Galileu é conhecido como indução experimental e consiste nos seguintes passos: observação dos fenômenos, análise dos elementos constitutivos do fenômeno, indução de certo número de hipóteses, verificação das hipóteses, generalização dos resultados, e confirmação das hipóteses. 
Diz Eva Maria Lakatos: 
Da mesma forma que o conhecimento se desenvolveu, o método, sistematização das atividades, também sofreu transformações. O pioneiro a tratar do assunto, no âmbito do conhecimento científico, foi Galileu, primeiro teórico do método experimental.”
Fonte: BANDEIRA, Rodrigo. O método científico em Galileu, Bacon, Descartes e Newton. Disponível em: http://geolibertaria2.blogspot.com.br/2010/07/o-metodo-em-galileu-bacon-descartes-e.html. Acesso em: 21/08/2014.
	
Parte II
Os
clássicos
René Descartes, 1596-1650
Texto 5: Os quatro preceitos fundamentais do Método de Descartes:
“1º) Jamais acolher alguma coisa como verdadeira que eu não conhecesse evidentemente como tal; isto é, de evitar cuidadosamente a precipitação e a prevenção, e de nada incluir em meus juízos que não se apresentasse tão clara e tão distintamente a meu espírito, que eu não tivesse nenhuma ocasião de pô-lo em dúvida.
2º) Dividir cada uma das dificuldades que eu examinasse em tantas parcelas quanto possíveis e quantas necessárias fossem para melhor resolvê-las.
3º) Conduzir por ordem meus pensamentos, começando pelos objetos mais simples e mais fáceis de conhecer, para subir, pouco a pouco, como por degraus, até o conhecimento dos mais compostos, e supondo mesmo uma ordem entre os que não se precedem naturalmente uns aos outros.
4º) Fazer em toda parte enumerações tão completas e revisões tão gerais, que eu tivesse a certeza de nada omitir.”
Fonte: DESCARTES, Renés. Discurso do método. São Paulo: Martins Fontes: 2001. p. 23-4.
Karl Marx, 1818-1883
Texto 6: Marx e a metáfora da Estrutura e superestrutura.
“O resultado geral que se me ofereceu e, uma vez ganho, serviu de fio condutor aos meus estudos, pode ser formulado assim sucintamente: na produção social da sua vida os homens entram em determinadas relações, necessárias, independentes da sua vontade, relações de produção que correspondem a uma determinada etapa de desenvolvimento das suas forças produtivas materiais. A totalidade destas relações de produção forma a estrutura econômica da sociedade, a base real sobre a qual se ergue uma superestrutura jurídica e política, e à qual correspondem determinadas formas da consciência social. O modo de produção da vida material é que condiciona o processo da vida social, política e espiritual. Não é a consciência dos homens que determina o seu ser, mas, inversamente, o seu ser social que determina a sua consciência. Numa certa etapa do seu desenvolvimento, as forças produtivas materiais da sociedade entram em contradição com as relações de produção existentes ou, o que é apenas uma expressão jurídica delas, com as relações de propriedade no seio das quais se tinham até aí movido. De formas de desenvolvimento das forças produtivas, estas relações transformam-se em grilhões das mesmas. Ocorre então uma época de revolução social. Com a transformação do fundamento econômico revoluciona-se, mais devagar ou mais depressa, toda a imensa superestrutura. Na consideraçãode tais revolucionamentos tem de se distinguir sempre entre o revolucionamento material nas condições económicas da produção, o qual é constatável rigorosamente como nas ciências naturais, e as formas jurídicas, políticas, religiosas, artísticas ou filosóficas, em suma, ideológicas, em que os homens ganham consciência deste conflito e o resolvem. Do mesmo modo que não se julga o que um indivíduo é pelo que ele imagina de si próprio, tão-pouco se pode julgar uma tal época de revolucionamento a partir da sua consciência, mas se tem, isso sim, de explicar esta consciência a partir das contradições da vida material, do conflito existente entre forças produtivas e relações de produção sociais. Uma formação social nunca decai antes de estarem desenvolvidas todas as forças produtivas para as quais é suficientemente ampla, e nunca surgem relações de produção novas e superiores antes de as condições materiais de existência das mesmas terem sido chocadas no seio da própria sociedade velha. Por isso a humanidade coloca sempre a si mesma apenas as tarefas que pode resolver, pois que, a uma consideração mais rigorosa, se achará sempre que a própria tarefa só aparece onde já existem, ou pelo menos estão no processo de se formar, as condições materiais da sua resolução. Nas suas grandes linhas, os modos de produção asiático, antigo, feudal e, modernamente, o burguês podem ser designados como épocas progressivas da formação económica e social. As relações de produção burguesas são a última forma antagónica do processo social da produção, antagónica não no sentido de antagonismo individual, mas de um antagonismo que decorre das condições sociais da vida dos indivíduos; mas as forças produtivas que se desenvolvem no seio da sociedade burguesa criam, ao mesmo tempo, as condições materiais para a resolução deste antagonismo. Com esta formação social encerra-se, por isso, a pré-história da sociedade humana.
Fonte: MARX, Karl. Para a crítica da economia política. Disponível em: http://www.marxists.org/portugues/marx/1859/01/prefacio.htm. Acesso em: 20/09/2013.
 Friedrich Engels, 1820-1895.
Texto 7: o ponto de partida da produção material da existência humana.
“A primeira premissa de toda a história humana é, naturalmente, a existência de indivíduos humanos vivos primeiro fato a constatar é, portanto, a organização física destes indivíduos e a relação que por isso existe com o resto da natureza. Não podemos entrar aqui, naturalmente, nem na constituição física dos próprios homens, nem nas condições naturais que os homens encontraram — as condições geológicas, hidrográficas, climáticas e outras. Toda a historiografia tem de partir destas bases naturais e da sua modificação ao longo da história pela ação dos homens.
O modo como os homens produzem os seus meios de vida depende, em primeiro lugar, da natureza dos próprios meios de vida encontrados e a reproduzir.”
Fonte: MARX, Karl & ENGELS, Friedrich. A Ideologia alemã. Disponível em: https://www.marxists.org/portugues/marx/1845/ideologia-alema-oe/cap1.htm#i1. Acesso em: 20/09/2013.
Texto 8: uma noção ampliada do modo de produção.
“Este modo da produção não deve ser considerado no seu mero aspecto de reprodução da existência física dos indivíduos. Trata-se já, isso sim, de uma forma determinada da atividade destes indivíduos, de uma forma determinada de exprimirem a sua vida, de um determinado modo de vida dos mesmos. Como exprimem a sua vida, assim os indivíduos são. Aquilo que eles são coincide, portanto, com a sua produção, com o que produzem e também com o como produzem. Aquilo que os indivíduos são depende, portanto, das condições materiais da sua produção.
Esta produção só surge com o aumento da população. Ela própria pressupõe, por seu turno, um intercâmbio [Verkehr] dos indivíduos entre si. A forma deste intercâmbio é, por sua vez, condicionada pela produção.”
Fonte: MARX, Karl & ENGELS, Friedrich. A Ideologia alemã. Disponível em: https://www.marxists.org/portugues/marx/1845/ideologia-alema-oe/cap1.htm#i1. Acesso em: 20/09/2013.
Texto 9: a análise das conexões entre representação e estrutura social
“O fato é, portanto, este: o de determinados indivíduos, que trabalham produtivamente de determinado modo, entrarem em determinadas relações sociais e políticas. A observação empírica tem de mostrar, em cada um dos casos, empiricamente e sem qualquer mistificação e especulação, a conexão da estrutura social e política com a produção. A estrutura social e o Estado decorrem constantemente do processo de vida de determinados indivíduos; mas destes indivíduos não como eles poderão parecer na sua própria representação ou na de outros, mas como eles são realmente, ou seja, como agem, como produzem materialmente, como trabalham, portanto, em determinados limites, premissas e condições materiais que não dependem da sua vontade.
A produção das ideias, representações, da consciência está a princípio diretamente entrelaçada com a atividade material e o intercâmbio material dos homens, linguagem da vida real. O representar, o pensar, o intercâmbio espiritual dos homens aparecem aqui ainda como refluxo direto do seu comportamento material. O mesmo se aplica à produção espiritual como ela se apresenta na linguagem da política, das leis, da moral, da religião, da metafísica, etc., de um povo. Os homens são os produtores das suas representações, ideias, etc., mas os homens reais, os homens que realizam [die wirklichen, wirkenden Menschen], tal como se encontram condicionados por um determinado desenvolvimento das suas forças produtivas e do intercâmbio que a estas corresponde até às suas formações mais avançadas. A consciência [das Bewusstsein], nunca pode ser outra coisa senão o ser consciente [das bewusste Sein], e o ser dos homens é o seu processo real de vida. Se em toda a ideologia os homens e as suas relações aparecem de cabeça para baixo como numa Camera obscura, é porque este fenômeno deriva do seu processo histórico de vida da mesma maneira que a inversão dos objetos na retina deriva do seu processo diretamente físico de vida.”
Fonte: MARX, Karl & ENGELS, Friedrich. A Ideologia alemã. Disponível em: https://www.marxists.org/portugues/marx/1845/ideologia-alema-oe/cap1.htm#i1. Acesso em: 20/09/2013.
Texto 10: a filosofia e os conceitos não são a-históricos, muito menos entidades extra-corpóreas que habitem o plano divino. São expressões de determinada época, fruto de um contexto bem determinado de relações sociais e históricas.
“Lá onde a especulação cessa, na vida real, começa, portanto, a ciência real, positiva, a representação da atividade prática, do processo de desenvolvimento prático dos homens. Cessam as frases sobre a consciência, o saber real tem de as substituir. Com a representação da realidade, a filosofia autônoma perde o seu meio de existência. Em seu lugar pode, quando muito, surgir uma súmula dos resultados mais gerais que é possível abstrair da consideração do desenvolvimento histórico. Estas abstrações não têm, separadas da história real, o menor valor. Só podem servir para facilitar a ordenação do material histórico, para indicar a sequência de cada um dos seus estratos. Mas não dão, de modo nenhum, como a filosofia, uma receita ou um esquema segundo o qual as épocas históricas possam ser ajeitadas ou ajustadas. A dificuldade começa pelo contrário, precisamente quando nos damos à consideração e ordenação do material, seja de uma época passada seja do presente, à representação real. A eliminação destas dificuldades está condicionada por premissas que de modo nenhum podem ser aqui dadas, e que só resultarão claras do estudo do processo real da vida e da ação dos indivíduos de cada época. Vamos escolher aqui algumas destas abstrações, que utilizamos em contraposição à ideologia, e vamos explicá-las com exemplos históricos.”
Fonte: MARX, Karl & ENGELS, Friedrich. A Ideologia alemã. Disponível em: https://www.marxists.org/portugues/marx/1845/ideologia-alema-oe/cap1.htm#i1.Acesso em: 20/09/2013.
Texto 11: o conceito de fetiche. Um dos nexos entre representação e realidade.
 “VIMOS como o capital produz, como ele mesmo é produzido, e como, na qualidade de relação transmutada na essência, resulta do processo de produção, nele se desenvolve. De um lado, transforma o modo de produção; do outro, essa forma transmutada do modo de produção e estádio particular do desenvolvimento das forças produtivas materiais são o fundamento e condição - o pressuposto da própria formação do capital.
Uma vez que o trabalho vivo - com a troca entre capital e trabalhador - se incorpora ao capital e aparece como atividade a este pertencente desde o início do processo de trabalho, todas as forças produtivas do trabalho social passam a desempenhar o papel de forças produtivas do capital, do mesmo modo que a forma social geral do trabalho aparece no dinheiro como propriedade de uma coisa. Assim, a força produtiva do trabalho social e suas formas particulares se apresentam então na qualidade de forças produtivas e formas do capital, do trabalho materializado, das condições materiais (objetivas) do trabalho - as quais, nessa forma independente, em face do trabalho vivo, se personificam no capitalista. Eis aí, mais uma vez, a relação pervertida, que, ao tratar do dinheiro, chamamos de fetichismo.”
Fonte: MARX, Karl. Produtividade do Capital, Trabalho Produtivo e Improdutivo. Disponível em: http://www.marxists.org/portugues/marx/1863/mes/prodcapital.htm. Acesso em: 20/09/2013.
Texto 12: o cerne de um sistema de domínio não está no arbítrio de quem detêm o poder e sim nas relações de poder que possibilitam tal dominação.
“Por que a vontade do capitalista norte-americano difere da do capitalista inglês? E para responder a esta questão, não teriam outro remédio senão ir além dos domínios da vontade. É possível que venha um padre dizer-me que Deus quer na França uma coisa e na Inglaterra outra. E se o convido a explicar esta dualidade de vontade, ele poderá ter a impudência de responder que está nos desígnios de Deus ter uma vontade em França e outra na Inglaterra. Mas nosso amigo Weston será, com certeza,a última pessoa a converter em argumento esta negação completa de todo raciocínio.
Sem sombra de dúvida, a vontade do capitalista consiste em encher os bolsos o mais que possa. E o que temos a fazer não é divagar acerca da sua vontade, mas investigar o seu poder, os limites desse poder e o caráter desses limites.”
Fonte: MARX, Karl. Salário, Preço e lucro. Disponível em: http://www.marxists.org/portugues/marx/1863/mes/prodcapital.htm. Acesso em: 20/09/2013.
Max Weber, 1864-1920.
Texto 13: a definição de tipo ideal.
“Um conceito ideal é normalmente uma simplificação e generalização da realidade. Partindo desse modelo, é possível analisar diversos fatos reais como desvios do ideal: Tais construções (...) permitem-nos ver se, em traços particulares ou em seu caráter total, os fenômenos se aproximam de uma de nossas construções, determinar o grau de aproximação do fenômeno histórico e o tipo construído teoricamente. Sob esse aspecto, a construção é simplesmente um recurso técnico que facilita uma disposição e terminologia mais lúcidas.”
Fonte: Weber, Max. A “objetividade” do conhecimento das ciências sociais; tradução de Gabriel Cohn. São Paulo: Ática, 2006.
Texto 14: as noções de ação social e causalidade.
“Para a consideração científica que se ocupa com a construção de tipos, todas as conexões de sentido irracionais do comportamento afetivamente condicionadas e que influem sobre a ação são investigadas e expostas, de mais clara, como “desvios” de um curso construído dessa ação, no qual ela é orientada de maneira puramente racional pelo seu fim (...) [para aquela consideração] é conveniente verificar primeiro como se teria desenrolado a ação caso se tivesse conhecimento de todas as circunstâncias e de todas as intenções dos protagonistas e a escolha dos meios ocorresse de maneira estritamente racional orientada pelo seu fim, conforme a experiência que consideramos válida. Somente esse procedimento possibilitará a imputação causal dos desvios às irracionalidades que os condicionam.” 
Fonte: Weber, Max. Economia e Sociedade: fundamentos de sociologia compreensiva. Volume 1; tradução de Regis Barbosa e Karen Elsabe Barbosa; revisão técnica de Gabriel Cohn. Brasília, DF: Editora Universidade de Brasília: São Paulo, 2000.
Texto 15: a centralidade do indivíduo na análise weberiana.
"não são, naturalmente, mesmo quando apresentam uma 'evidência' muito grande, mais do que meras hipóteses para uma imputação causal. Faz-se necessário, portanto, uma verificação na qual se emprega os mesmos meios como em qualquer outra hipótese. Elas valem para nós como hipóteses utilizáveis enquanto vemos uma 'possibilidade', que é muito diferente de caso para caso, de poder supor que existam cadeias de motivações 'providas de sentido.
[...] exatamente por esta razão, nesta maneira de ver, o indivíduo constitui o limite e o único portador de um comportamento provido de sentido".
Fonte: WEBER, Max. A Ciência como vocação. In: WRIGHT MILLS, C. E GERTH, H.H. Org. Ensaios de Sociologia. 5ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara, 1982.
Émile Durkhem, 1856-1917
Texto 16: a historicidade dos conceitos e das idéias 
“Ora, os costumes e as idéias que determinaram esse tipo, não fomos nós, individualmente, que os fizemos. São produto da vida em comum e exprimem suas necessidades. São mesmo, na sua maior parte, obra das gerações passadas. Todo o passado da humanidade contribuiu para estabelecer esse conjunto de princípios que dirigem a educação de hoje; toda nossa história aí deixou traços, como também o deixou a história dos povos que nos precederam. Da mesma forma, os organismos superiores trazem em si como que um eco de toda a evolução biológica de que são o resultado. Quando se estuda historicamente a maneira pela qual se formaram e se desenvolveram os sistemas de educação, percebe-se que eles dependem da religião, da organização política, do grau de desenvolvimento das ciências, do estado das indústrias, etc. Separados de todas essas causas históricas, tornam-se incompreensíveis. Como, então poderá um indivíduo pretender reconstruir, pelo esforço único de sua reflexão, aquilo que não do pensamento individual? Ele não se encontra em face de uma tabula rasa, sobre a qual poderia edificar o que quisesse, mas diante de realidades que não podem ser criadas, destruídas ou transformadas à vontade. Não podemos agir sobre elas senão na medida em que aprendemos a conhecê-las, se não nos metermos a estudá-las, pela observação, como o físico estuda a matéria inanimada, e o biologista, os corpos vivos”.
Fonte: DURKHEIM, Émile. Educação como processo socializador: função homogeneizadora e função diferenciadora. Disponível em: http://www.gutierrez.pro.br/cdpead/pead/textos/durkheim.pdf. Acesso em: 21 de outubro de 2013.
Texto 17: método e fato social.
“Em face das doutrinas práticas, nosso método permite e requer a mesma independência. A sociologia, assim entendida, não será nem individualista, nem comunista, nem socialista, no sentido que se dá vulgarmente a essas palavras. Por princípio, irá ignorar essas teorias, às quais não poderia reconhecer valor científico, já que elas tendem diretamente, não a exprimir os fatos, mas a reformá-los. Pelo menos, se se interessa por elas, é somente na medida em que as vê como fatos sociais capazes de ajudá-la a compreender a realidade social, ao manifestarem as necessidades que movem a sociedade. Isso não quer dizer, porém, que a sociologia deva se desinteressar das questões práticas. Pôde-se ver, ao contrário, que nossa preocupação constante era orientá-la de maneira que pudesse alcançar resultados práticos. Ela depara necessariamente com esses problemas ao término de suas pesquisas. Mas, exatamente por só se apresentarem a ela nesse momento e por decorrerem portanto dos fatos e não das paixões,pode-se prever que tais problemas devam se colocar para o sociólogo em termos muito diferentes do que para a multidão, e que as soluções, aliás parciais, que ele é capaz de propor.não poderiam coincidir exatamente com nenhuma daquelas nas quais se detêm os partidos. O papel da sociologia, desse ponto de vista, deve justamente consistir em nos libertar de todos os partidos, não tanto por opor uma doutrina às doutrinas, e sim por fazer os espíritos assumirem, diante de tais questões, uma atitude especial que somente a ciência pode proporcionar pelo contato direto com as coisas: Com efeito, somente ela pode ensinar a tratar com respeito, mas sem fetichismo, as instituições históricas sejam elas quais forem, fazendo-nos perceber o que elas, têm ao mesmo tempo de necessário e de provisório, sua força de resistência ê sua infinita variabilidade.
Em segundo lugar, nosso método é objetivo. Ele é inteiramente dominado pela idéia de que os fatos sociais são coisas e como tais devem ser tratados. Certamente, esse princípio se encontra, sob forma um pouco diferente, na base das doutrinas de Comte e de Spencer. Mas esses grandes pensadores deram muito mais sua fórmula teórica do que o puseram em prática. Para que ela não permanecesse letra morta, não bastava promulgá-la; era preciso torná-la a base de toda uma disciplina que se apoderasse do cientista no momento em que ele abordasse o objeto de suas pesquisas e que o acompanhasse em todos os seus passos. Foi a instituir essa disciplina que nos dedicamos. Mostramos como o sociólogo deveria afastar as noções antecipadas que possuía dos fatos, a fim de colocar-se diante dos fatos mesmos; como deveria atingi-los por seus caracteres mais objetivos; como deveria requerer deles próprios o meio de classificá-los em saudáveis e em mórbidos; como, enfim, deveria seguir o mesmo princípio tanto nas explicações que tentava quanto na maneira pela qual provava essas explicações. Pois, quando se tem o sentimento de estar em presença de coisas, nem sequer se pensa mais em explicá-las por cálculos utilitários ou por raciocínios de qualquer espécie. Compreende-se muito bem a distância que há entre tais causas e tais efeitos. Uma coisa é uma força que não pode ser engendrada senão por outra força. Buscam-se então, para explicar os fatos sociais, energias capazes de produzi-los. As explicações não apenas são outras, como são demonstradas de outro modo, ou melhor, é somente então que se sente a necessidade de demonstrá-las. Se os fenômenos sociológicos forem apenas sistemas de idéias objetivas, explicá-los é repensá-los em sua ordem lógica e essa explicação é sua própria prova; quando muito será o caso de confirmá-la por alguns exemplos. Ao contrário, somente experiências metódicas são capazes de arrancar das coisas seu segredo.” 
Fonte: DURKHEIM, Émile. As regras do método sociológico. Disponível em: 
http://www.galileu.radiocb.com/ebooks/durkheim_as_regras_do_metodo_sociologico.pdf. Acesso em: 21 de outubro de 2013.
Clifford Geertz, 1926-2006.
Texto 18: Cliford Geertz e seu conceito de cultura:
“O conceito de cultura que eu defendo [...] é essencialmente semiótico. Acreditando, como Max Weber, que o homem é um animal amarrado a teias de significados que ele mesmo teceu, assumo a cultura como sendo uma ciência interpretativa, à procura do significado. É justamente uma explicação que eu procuro, ao construir expressões sociais enigmáticas na sua superfície”. 
Fonte: GEETZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: LTC, 2008. p. 4.
Texto 19: a relação entre idéias e estruturas de poder.
“As ideias — religiosa, moral, prática, estética — como Max Weber, entre outros, nunca se cansou de insistir, devem ser apresentadas por grupos sociais poderosos para poderem ter efeitos sociais poderosos: alguém deve reverenciá-las, celebrá-las, impô-las. Elas têm que ser institucionalizadas para poderem ter não apenas uma existência intelectual na sociedade, mas também, por assim dizer, uma existência material. As guerras ideológicas que devastaram a Indonésia nos últimos vinte e cinco anos não devem ser vistas, como tantas vezes acontece, como embates de mentalidades opostas — "misticismo" javanês versus "pragmatismo" sumatrano, "sincretismo" Índico versus "dogmatismo" islâmico — mas como a substância de uma luta para criar uma estrutura institucional para o país que um número suficiente de seus cidadãos ache conveniente o bastante para permitir-lhe funcionar”.
Fonte: GEETZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: LTC, 2008. p. 137.
Texto 20: o mundo social como texto literário.
“Na briga de galos, portanto, o balinês forma e descobre seu temperamento e o temperamento de sua sociedade ao mesmo tempo. Ou, mais exatamente, ele forma e descobre uma faceta particular deles. Não só existem ainda muitos outros textos culturais que fornecem comentários sobre a hierarquia do status e a auto-apreciação em Bali, como existem muitos outros setores críticos da vida balinesa além do estratificador e do agonístico que recebem tais comentários. A cerimónia que consagra um sacerdote Brahmana, o tema do controle respiratório, da imobilidade de postura e da concentração vazia na profundidade do ser mostram uma propriedade radicalmente diferente, mas igualmente real para os balineses, da hierarquia social — seu alcance da transcendência numinosa. Estabelecida não na matriz da emocionalidade cinética dos animais, mas na desapaixonada estática da mentalidade divina, ela expressa a tranquilidade e não a inquietação. Os festivais de massa nos templos das aldeias, que mobilizam toda a população local em recepções elaboradas aos deuses visitantes — canções, danças, cumprimentos, presentes — afirmam a unidade espiritual dos companheiros de aldeia em relação à sua desigualdade de status e projeta uma disposição de amabilidade e confiança.
 A briga de galos não é a chave principal para a vida balinesa, da mesma forma que não o é a tourada para os espanhóis. O que ela diz a respeito dessa vida não deixa de ser qualificado ou até desafiado pelo que outras afirmativas culturais igualmente eloquentes também dizem sobre ela. Mas nada existe de mais surpreendente nisso do que no fato de Racine e Molière terem sido contemporâneos ou de que as mesmas pessoas que fazem arranjos de crisântemos cruzem espadas.” 
Fonte: GEETZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: LTC, 2008. p. 212.
Texto 21: e a cultura um conjunto de textos ....
“A cultura de um povo é um conjunto de textos, eles mesmos conjuntos, que o antropólogo tenta ler por sobre os ombros daqueles a quem eles pertencem. Existem enormes dificuldades em tal empreendimento, abismos metodológicos que abalariam um freudiano, além de algumas perplexidades morais. Esta não é a única maneira de se ligar sociologicamente com as formas simbólicas. O funcionalismo ainda vive, e o mesmo acontece com o psicologismo. Mas olhar essas formas como "dizer alguma coisa sobre algo", e dizer
isso a alguém, é pelo menos entrever a possibilidade de uma análise que atenda à sua substância, em vez de fórmulas redutivas que professam dar conta dela.”
Fonte: GEETZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: LTC, 2008. p. 212-3.
 Giovanni Levi, 1939
Texto 22: pressuposto do “geertzismo” segundo Giovanni Levi: a recusa do objetivismo.
“O conhecimento histórico não pode ser descrito segundo o modelo de um conhecimento objetivo, já que ele próprio é um processo que tem todas as características de um evento histórico. A compreensão deve ser entendida no sentido de um ato da existência, e é então um ‘projeto lançado’. O objetivismo é uma ilusão.”
H.G. Gadamer, Verità e metodo (1960). Milão: Fabbri, 1972. Apud: LEVI, Giovanni. OS PERIGOS DO GEERTZISMO, p. 139.
Texto 23: o primado da interpretação em Paul Ricoeur e Geertz.
“A posição de Ricoeur (ressaltada por Geertz, que sobrepõecompreensão histórica e compreensão antropológica) implica também considerar irrelevantes as diferenças entre pesquisa de campo e pesquisa de arquivo. Para Ricoeur, é o discurso que tem como aspecto intrínseco a imediata situação de comunicação: o texto não é a mesma coisa que a sua leitura. Para entender o discurso, é preciso estar na presença do sujeito que fala; mas, para que o discurso se torne texto, é preciso que tenha se tornado autônomo com relação à situação imediata: a interpretação é diferente da interlocução. O texto pode ser transportado, e a etnografia se produz longe do campo. A experiência de pesquisa, central para o antropólogo dos anos 30-60, é transformada em um conjunto textual, separado da ocasião discursiva em que se produz”.
LEVI, Giovanni. Os perigos do geertzismo. p. 142. Disponível em: http://www.ifch.unicamp.br/ojs/index.php/rhs/article/view/182.
Texto 24: Geertz, Darnton e Gadamer e a estetização do mundo social.
“Não sei dizer se um dos principais limites práticos a que essa perspectiva induz a pesquisa etnológica e histórica pode ser absolutamente ineliminável: entretanto, é pelo menos muito freqüente em Geertz e em Darnton que esse contexto de referência seja erigido como um fundo imóvel. E, por outro lado, Gadamer nos adverte que “a verdadeira intenção do conhecimento histórico não é explicar um fenômeno concreto como caso particular de uma regra geral (...). O seu verdadeiro fim – mesmo quando usa conhecimentos gerais – é, antes de mais nada, compreender um fenômeno histórico na sua singularidade, na sua unicidade”. É um pouco como um círculo vicioso, no qual o texto nos torna capazes de tomar consciência dos nossos preconceitos e de descobrir um mundo “outro” significativo, mas no qual o contexto global é dado de saída e não muda até o fim: a unicidade de um texto talvez possa fornecer uma capacidade de compreensão maior do contexto, mas não mudar-lhe substancialmente os elementos. É, em suma, um processo circular no qual os critérios de verdade e de relevância, todos fechados na atividade hermenêutica constitutiva, parecem – ao menos para a minha obsoleta mentalidade materialista – arbitrários demais.
Como se vê, aqui estão refletidos os limites, no fundo irracionalistas e
estetizantes, de Gadamer: a falta de um sentido global da história que não seja o seu crescimento hermenêutico sobre si própria, porque todo evento histórico é por sua natureza uma mediação entre passado (o “outro”), presente e futuro; cada interpretação de textos é uma aplicação de alguma preferência ou situação presente. Não há, em suma, nenhum critério para escolher entre interpretações válidas ou não, senão o seu potencial de dar lugar a novos processos hermenêuticos, de ativar um contínuo diálogo com o passado e com o
“outro”, que todavia não reduza os textos a objetos separados do sujeito”.
LEVI, Giovanni. Os perigos do geertzismo. p. 143. Disponível em: http://www.ifch.unicamp.br/ojs/index.php/rhs/article/view/182.
Texto 25: os perigos do geertzismo. O maior deles: a história se confundir com a literatura. 
“Clifford Geertz [...], em um artigo de extraordinária inteligência como “Centers, kings and charisma: reflections on the symbolics of power” nos fornece ainda descrições para formular os caracteres culturais (eis os atores-autores generalizados dos quais falava James Clifford) da Inglaterra elisabetana, da Java de Hayam Wuruk, do Marrocos de Hassan: contextos imóveis nos quais é inserido o estudo do carisma e do poder simbólico. Mas Geertz é Geertz: o perigo é o geertzismo. Um outro aspecto é a perda do sentido das relevâncias: pequenos episódios podem ser reveladores de atitudes culturais importantes, mas na hermenêutica com fim em si mesma que parecemos ver em Gadamer, e que reencontramos muitas vezes em Darnton, a falta de um critério geral de validade e de relevância nasce de um deslocamento das perspectivas. Pequenos episódios tornam-se aparentemente importantes, porque já conhecemos o esquema global no qual inseri-los e lê-los: a pesquisa não acrescenta nada ao já conhecido, e o confirma debilmente e de modo supérfluo. É exatamente o caso do ensaio que dá título ao volume, “Workers revolt: the great cat massacre of the Rue Saint Severin”. O assassinato dos gatos da mulher do mestre por parte dos trabalhadores tipográficos exprime a revolta de um grupo social ainda corporativamente subordinado aos bourgeois: “Seria absurdo considerar o massacre dos gatos como um ensaio geral para os massacres de setembro da Revolução Francesa, mas a irrupção anterior de violência realmente sugeria uma rebelião popular, embora permanecesse restrita ao nível do simbolismo” (p. 131). As relações entre mestres e trabalhadores, o simbolismo dos gatos, a visão de mundo do povo e da burguesia estão dados, contexto imóvel que não é modificado; o que o artigo explica é, então, a morte violenta de um gato qualquer, em um quadro já conhecido de cultura carnavalesca e de revolta operária, estabelecido através de estudos bem mais importantes e inovadores.
Em resumo: contexto e relevância são assumidos a priori nos capítulos desse livro. O resto é muitas vezes o garboso caligrafismo de uma filosofia da história fechada em um círculo vicioso. Interpretei esses ensaios como um “texto”: mas, com um procedimento diferente do da hermenêutica de Darnton, deixei de lado – talvez em demasia – a singularidade da obra, para colocar em evidência a exemplaridade de um modo irremediavelmente “outro” de ler a história social em relação ao meu próprio e àquele, espero, de muitos leitores de Quaderni Storici.” 
LEVI, Giovanni. Os perigos do geertzismo. p. 145-6. Disponível em: http://www.ifch.unicamp.br/ojs/index.php/rhs/article/view/182.
 Dominick LaCapra, 1939	
Texto 26: a História não é Ciência, e sim um desdobramento da Arte Retórica.
“Historians have shown relatively litle interest in this problem, in good part because they continue to confide in a ’documentary’ or ’objectivist’ model of knowledge that is typically blind to its own rhetoric. Indeed this model has been effective in placating or neutralizing concerns that motivate the work of the new rhetoricians”.
Fonte: LACAPRA, Dominick. History & criticism. Ithaca: 1985. pp. 17-18.
Texto 27: para Lacapra, a retórica é mais eficaz do que a ciência na busca por “vozes do passado”...
“Instead of licensing free variations on the past, variations hose only justification is their furtherance of a present policy, the rhetorical dimension of historiography may rather serve to test current views by requiring the historian to listen attentively to possibly disconcerting voices of the past and not simply project narcissistic or self-interested demands upon them”. 
Fonte: LACAPRA, Dominick. History & criticism. Ithaca: 1985. pp. 36-37.
 Jacques Le Goff, 1924
Texto 28: o Documento como Monumento.
“O documento não é inócuo. É antes de mais nada, o resultado de uma montagem, consciente ou inconsciente, da história, da época, da sociedade que o produziram, mas também das épocas sucessivas durante as quais continuou a viver, talvez esquecido, durante as quais continuou a ser manipulado, ainda que pelo silêncio. O documento é uma coisa que fica, que dura, e o testemunho, o ensinamento que ele traz devem ser em primeiro lugar analisados, desmitificando-lhe seu significado aparente. O documento é monumento. Resulta do esforço das sociedades históricas para impor ao futuro – voluntária ou involuntariamente- determinada imagem de si próprias. No limite, não existe um documento-verdade. Todo documento é mentira.”
Fonte: LE GOFF, Jacques. História e memória. Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 2003. p. 538.
 Hayden White, 1928
Texto 29: novamente a História como discurso....
“(...) “história’ é o tema desse aprendizado que só é acessível por meio da linguagem; nossa experiência da história é indissociável denosso discurso sobre ela; esse discurso tem que ser escrito antes de poder ser digerido como “história”; e essa experiência, por conseguinte, pode ser tão vária quanto os diferentes tipos de discurso com que nos deparamos na própria história da escrita.” 
Fonte: WHITE, Hayden. Meta-historia: a imaginação historica do seculo XIX. São Paulo: EDUSP, 1992. p. 31.
 
Pierre Bourdieu, 1930-2000
Texto 30: uma alternativa possível ao subjetivismo: o conceito de habitus de Pierre Bourdieu.
“Por sua própria etimologia – habitus é o que foi adquirido, do verbo habeo -, devia significar muito concretamente que o princípio das ações ou das representações e das operações da construção da realidade social, pressupos tas por elas, não é um sujeito transcendental (...) É o habitus, como estrutura es truturada e estruturante, que engaja, nas práticas e nas idéias, esquemas práticos de cons trução oriundos da incorporação de es truturas sociais oriundas, elas próprias , do trabalho his tórico de gerações sucessivas.” 
Fonte: BOURDIEU, Pierre. Razões práticas. Campinas: Papirus, 1996.
 Edward Thompson, 1924-1993.
Texto 31: comentários de Thompson acerca da clássica oposição entre ser e consciência sociais. 
“Mas a questão que temos imediatamente à nossa frente não é a dos limites da experiência, mas a maneira de alcançá-la, ou produzi-la. A experiência surge espontaneamente no ser social, mas não surge sem pensamento. Surge porque homens e mulheres (e não apenas filósofos) são racionais, e refletem sobre o que acontece a eles e ao seu mundo. Se tivermos de empregar a (difícil) noção de que o ser social determina a consciência social, como iremos supor que isto se dá? Certamente não iremos supor que o “ser” está aqui, como uma materialidade grosseira da qual toda idealidade foi abstraída, e que a “consciência” (como idealidade abstrata) está ali. Pois não podemos conceber nenhuma forma de ser social independentemente de seus conceitos e expectativas organizadores, nem poderia o ser social reproduzir-se por um único dia sem o pensamento. O que queremos dizer é que ocorrem mudanças no ser social que dão origem a experiencia modificada; e essa experiência é determinante, no sentido de que exerce pressões sobre a consciência social existente, propõe novas questões e proporciona grande parte do material sobre o qual se desenvolvem os exercícios intelectuais mais elaborados. A experiência, ao que se supõe, constitui uma parte da matéria-prima oferecida aos processos do discurso científico da demonstração. E mesmo alguns intelectuais atuantes sofreram, eles próprios, experiências.”
Fonte: THOMPSON, Edward Palmer. A miséria da teoria. Rio de Janeiro: Zahar, 1979. p. 16.
Texto 32: o status do fato e da evidência histórica na análise de Thompson.
“A evidência histórica existe, em sua forma primária, não para revelar seu próprio significado, mas para ser interrogada por mentes treinadas numa disciplina de desconfiança atenta. Os fatos isolados podem ser interrogados pelo menos de seis maneiras diferentes: (1) antes que qualquer outra interrogação possa ter início, suas credenciais como fatos históricos devem ser examinadas: como foram registradas? Com que finalidade? Podem ser confirmados por evidências adjacentes? E assim por diante. [...]; (2) ao nível de sua própria aparência, ou auto-revelação aparente, mas nos termos de uma investigação histórica disciplinada [...]; (3) como evidências isentas de valor, mais ou menos inertes, “neutras” (índices de mortalidade, escalas de salários, etc.) que são então submetidas a indagação, à luz das questões particulares (demográficas, econômicas, agrárias) propostas: tendo essas indagaçãoes seus procedimentos próprios e adequados (por exemplo, estatísticos) destinados a limitar (embora nem sempre tenham êxito) a intromissão de atribuições ideológicas; (4) como elos numa série linear de ocorrências, ou fatos contingentes – isto é, a história ‘tal como realmente aconteceu’ (mas como nunca poderá ser plenamente conhecida) – na construção de uma exposição narrativa [...]; como elos numa série lateral de relações sociais/ideológicas/econômicas/políticas (por exemplo – este contrato é um caso especial da forma geral de contratos daquela época: tais contratos eram governados por essas formas de lei, impunham tais formas de obrigação e subordinação) [...]; (6) segue-se disto, se levarmos a questão um pouco mais adiante, que mesmo fatos isolados podem ser interrogados em busca de evidências que sustentam a estrutura.
Fonte: THOMPSON, Edward Palmer. A miséria da teoria. Rio de Janeiro: Zahar, 1979. p. 38-39.
Texto 33: sobre o tratamento dos fatos.
“[Há] certas maneiras de interrogar os fatos, e sem dúvida outros meios disciplinados e adequados podem ser propostos. Estes têm dois atributos comuns: (1) supõem que o historiador está empenhado em algum tipo de encontro com uma evidência que não é infinitamente maleável ou sujeita à manipulação arbitrária, que há um sentido real e significante no qual os fatos “existem”, e que são determinantes, embora as questões que possam ser propostas sejam várias e elucidem várias indagações; (2) envolvem uma aplicação disciplinada e ponderada, e uma disciplina desenvolvida precisamente para detectar qualquer tentativa de manipulação arbitrária: os fatos não revelarão nada por si mesmos, o historiador terá que trabalhar arduamente para permitir que eles encontrem ‘suas próprias vozes’. Mas atenção: não a voz do historiador, e sim a sua (dos fatos) própria voz, mesmo que aquilo que podem ‘dizer’ e parte de seu vocabulário seja determinado pelas perguntas feitas pelo historiador. Os fatos não podem ‘falar’ enquanto não tiverem sido interrogados”.
	
Fonte: THOMPSON, Edward Palmer. A miséria da teoria. Rio de Janeiro: Zahar, 1979. p. 40.
Texto 34: Thompson e a noção de lógica histórica.
“Por lógica histórica entendo um método lógico de investigação adequado a materiais históricos, destinado, na medida do possível, a testar hipóteses quanto à estrutura, causação etc., e a eliminar procedimentos autoconfirmadores (“instâncias”, “ilustrações”). O discurso histórico disciplinado da prova consiste num diálogo entre conceito e evidência, um diálogo conduzido por hipóteses sucessivas, de um lado, e a pesquisa empírica, do outro. O interrogador é a lógica histórica; o conteúdo da interrogação é uma hipótese (por exemplo, quanto à maneira pela qual os diferentes fenômenos agiram uns sobre os outros); o interrogado é a evidência, com suas propriedades determinadas. Mencionar essa lógica não é, decerto, proclamar que ela esteja sempre evidente na prática de todo historiador, ou na prática de qualquer historiador durante todo o tempo. (A história não é, penso eu, a única a quebrar seus próprios juramentos). É, porém, dizer que essa lógica não se revela involuntariamente; que a disciplina exige um preparo árduo; e que três mil anos de prática nos ensinaram alguma coisa. É dizer que é essa lógica que constitui o tribunal de recursos final da disciplina: não – por favor, notem – a ‘evidência’ por si mesma, mas a evidência interrogada dessa maneira.”
Fonte: THOMPSON, Edward Palmer. A miséria da teoria. Rio de Janeiro: Zahar, 1979. p. 49.
Texto 35: a crítica de Thompson ao conceito de classe social do Estruturalismo.
 “A desgraça dos historiadores marxistas (que é sem dúvida nossa própria desgraça, hoje) é que alguns de nossos conceitos são moeda corrente num universo intelectual mais amplo, são adotados em outras disciplinas, que lhes impõem sua própria lógica e os reduzem a categorias estáticas, não-históricas. Nenhuma categoria histórica foi mais incompreendida, atormentada, transfixada e des-historizada do que a categoria de classe social; uma formação histórica autodefinidora, que homens e mulheres elaboram a partir de sua própria experiência de luta, foi reduzida a uma categoria estática, ou a um efeito de uma estrutura ulterior, das quais oshomens não são os autores mas os vetores. Althusser e Poulantzas não só fizeram à história marxista esse mal, como também queixaram-se ainda de que a história (de cujos braços arrancaram esse conceito) não tem uma teoria acabada de classe! O que eles, e muitos outros, de todos os matizes ideológicos, não compreendem é que não é, e nunca foi tarefa da história elaborar esse tipo de teoria inelástica. E se o próprio Marx teve uma prioridade metodológica suprema, esta foi, precisamente, a de destruir a fabricação de teorias não-históricas desse tipo.”
Fonte: THOMPSON, Edward Palmer. A miséria da teoria. Rio de Janeiro: Zahar, 1979. p. 57.
 Carlo Ginzburg, 1939
Texto 36: a crítica de Ginzburg ao postulado pós-moderno do “tudo é discurso”.
“Parece-me que o estranhamento é um antídoto eficaz contra um risco a que todos nós estamos expostos: o de banalizar a realidade (inclusive nós mesmos). As implicações antipositivistas dessa observação são óbvias. Mas, ao salientar as implicações cognitivas do estranhamento, eu gostaria também de me opor com a máxima clareza possível às teorias da moda que tendem a esfumar, até torná-los indistintos, os limites entre história e ficção”.
Fonte: GINZBURG, Carlo. O fio e os rastros. São Paulo: Companhia das Letras, 2007, p. 7.
Texto 37: o rigor metodológico da micro-história italiana.
“A atitude experimental que aglutinou, no fim dos anos 70, o grupo de estudiosos italianos de micro-história (...) baseava-se na aguda consciência de que todas as fases que marcam a pesquisa são construídas, e não dadas. Todas: a identificação do objeto e da sua relevância; a elaboração das categorias pelas quais ele é analisado; os critérios de evidência; os modelos estilísticos e narrativos por meio dos quais os resultados são transmitidos ao leitor. Mas essa acentuação do momento construtivo inerente à pesquisa se unia a uma rejeição explícita das implicações céticas (pós-modernas, se quiserem) tão largamente presentes na historiografia européia e americana dos anos 80 e início dos 90. A meu ver, a especificidade da micro-história italiana deve ser buscada nessa aposta cognoscitiva”.
Fonte: GINZBURG, Carlo. O fio e os rastros. São Paulo: Companhia das Letras, 2007, p. 80.
 Marc Bloch, 1886-1944
Texto 38: o historiador e suas fontes.
“A partir do momento em que não nos resignamos mais a registrar [pura e] simplesmente as palavras de nossas testemunhas, a partir do momento em que tencionamos fazê-las falar [, mesmo a contragosto], mais do que nunca impõe-se um questionário. Esta é, com efeito, a primeira necessidade de qualquer pesquisa histórica bem conduzida.
Muitas pessoas e mesmo, parece, certos autores de manuais fazem uma imagem surpreendentemente cândida da marcha de nosso trabalho. No princípio, diriam de bom grado, eram os documentos. O historiador os reúne, lê, empenha-se em avaliar sua autenticidade e veracidade. Depois do que, e somente depois, os põe para funcionar... Uma infelicidade apenas: nenhum historiador, jamais, procedeu assim. Mesmo quando, eventualmente, imagina fazê-lo.
Pois os textos ou os documentos arqueológicos, mesmo os aparentemente mais claros e mais complacentes, não falam senão quando sabemos interrogá-los. [...] Em outros termos, toda investigação histórica supõe, desde seus primeiros passos, que a busca tenha uma direção. No princípio, é o espírito. Nunca [em nenhuma ciência,] a observação passiva gerou algo de fecundo. Supondo, aliás, que ela seja possível”.
Fonte: BLOCH, Marc. Apologia da História ou o ofício de historiador. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, p. 78-79.
Texto 39: a busca pelo conhecimento histórico já é em si mesma parte da história que deve ser contada.
“A despeito do que às vezes parecem imaginar os iniciantes, os documentos não surgem, aqui ou ali, por efeito [de não se sabe] qual misterioso decreto dos deuses. Sua presença ou ausência em tais arquivos, em tal biblioteca, em tal solo deriva de causas humanas que não escapam de modo algum à análise, e os problemas que sua transmissão coloca, longe de terem apenas o alcance de exercícios de técnicos, tocam eles mesmos no mais íntimo da vida do passado, pois o que se encontram assim posto em jogo é nada menos do que a passagem da lembrança através das gerações. À frente das obras históricas do gênero sério, o autor em geral coloca uma lista das cotas de arquivos que vasculhou, das coletâneas de que fez uso. Isso é muito bom. Mas não basta. Todo livro de história digno desse nome deveria comportar um capítulo ou [, caso se prefira], inserida nos pontos de inflexão da exposição, uma série de parágrafos que se intitulariam algo como: ‘Como posso saber o que vou lhes dizer?’ Estou convencido de que, ao tomar conhecimento dessas confissões, inclusive os leitores que não são do ofício experimentariam um verdadeiro prazer intelectual. O espetáculo da busca, com seus sucessos e reveses, raramente entedia. É o tudo pronto que espalha o gelo e o tédio”.
Fonte: BLOCH, Marc. Apologia da História ou o ofício de historiador. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, p. 83.
	
Parte III
O
Trabalho
com fontes
Texto 40: Fotografia.
“A fotografia (...) traz em si uma relação material e causal com seu sujeito, assim, ela é o meio visual no qual os acontecimentos passados são tornados mais acessíveis pela resposta emocional do momento. Para Gaskell os fotógrafos estão sujeitos a muitas formas de manipulação dessas imagens, e muitas vezes um significado legível é gerado pela combinação com uma legenda, sendo que diferentes legendas numa mesma fotografia podem produzir significados distintos ou, até mesmo, contraditórios. 
A informação correta que a fotografia fornece pode ser de uso relevante para a análise de um acontecimento passado, mas também podem ser reveladas novas linhas de curiosidade sobre esse passado.
(...) todo o material do passado é potencialmente admissível como evidência para o historiador, assim ele não deve apoiar-se somente na imagem enquanto fonte, mas aliar o seu e studo à análise de outros documentos que sejam relevantes para a pesquisa.” 
Fonte: MUCELIN, Patrícia Carla. Imagem como fonte histórica: A análise da fotografia presente na obra Docas do Mucuripe. Disponível em: http://ufpi.br/subsiteFiles/patrimoniocultural/arquivos/files/4_texto%281%29.pdf). Acesso em: 18 de agosto de 2014.
Texto 41: Pinturas. 
“Como todas as pessoas, os pintores, escultores, enfi m os artistas (incluso os escritores) possuem um ponto de vista sobre determinado assunto sobre o qual estão trabalhando, e o historiador, muitas vezes, sem ter consciência dessas influências das idéias do artista sobre seu trabalho, acabam criando um equívoco histórico com a sua análise. 
No seu livro História & Imagem, Eduardo França Paiva aponta para os problemas de trabalhar com fontes visuais originadas por autores que possuem inspirações e anseios, assim como condutas e ideologias, as imagens herdam de seus criadores sentidos e significados. A iconografi a é certamente uma das fontes mais ricas, que traz embutida as escolhas do produtor e todo o contexto qual foi concebida, idealizada, forjada ou inventada. Nesse aspecto, ela é uma fonte [...] e, assim como as demais, tem de ser explorada com muito cuidado.”
Fontes: COELHO, Thiago da Silva. “A imagem como fonte histórica: enigmas e abordagens”. In: Cad. Pesq. Cdhis, Uberlândia, v.25, n.2, jul./dez. 2012, p. 443.
Texto 42: Jornais.
“Para o trabalho com a imprensa de um ponto de vista da historia politica é necessário, segundo Wlamir Silva, pensar o político em sua dinâmica própria, e as relações de mediação entre a sociedade e o Estado.
Trata-se de romper com as determinações absolutas de estruturas, materiais ou mentais, do economicismo às formas mais enrijecidas das mentalidades, sobre o político. Devemos destacar, assim, a relativa autonomia do político e o papel dos agentes sociais, sejam indivíduosou grupos, na construção do Estado. 
Na medida em que valorizamos as mediações entre sociedade e Estado e entendermos os conceitos, como formas de consciência, que compõem a vida política, estimaremos também a imprensa. Nesse contexto, a imprensa, sobretudo a periódica, é um importante meio de construção de culturas políticas especificas, ou seja, empiricamente verificáveis e de interesse historiográfico. A imprensa periódica é segundo Silva, meio de criação de uma cultura política, da difusão de um “sistema de referencias” que alcança estratos mais amplos da sociedade, transformando a filosofia política num conjunto de conceitos compreensíveis por um contingente mais significativo da sociedade. Dessa forma, “a cultura política aparece, em suas diversas manifestações, como a linguagem comum simplificada”.
(...) o fascínio suscitado pela revista como documento tornou-a irresistível, conjunto lúdico que numa só publicação reúne texto, imagem, técnica, visões de mundo e imaginários coletivos. Todos os seus elementos, aparentemente corriqueiros; formato, papel, letra, ilustração, tiragem, sugerem indagações que prenunciam a carga de historicidade presente nos periódicos. Tem-se ali registro múltiplo, do textual ao iconográfico, do extratexto, reclame ou propaganda, à segmentação, do perfil de seus proprietários àquele dos consumidores. O que exige análise mais substanciada.”
Fonte: VIEIRA, Lucas Schuab. “Imprensa como Fonte para a Pesquisa em Historia: Teoria e Método”. Disponível em: http://www.bocc.ubi.pt/pag/vieira-lucas-2013-imprensa-fonte-pesquisa.pdf. Acesso em: 17 de agosto de 2014. 
Texto 43: Literatura.
“Todas as obras, bem como toda produção literária, guardam em seu bojo aspectos, características e relações sócio-culturais do universo em que é produzida. 
Neste sentido, torna-se importante destacar o fato de que a produção da obra literária está associada ao seu tempo, refletindo em suas narrativas angústias e sonhos de agentes sociais contemporâneos à sua criação e mesclando elementos de ficção e das possíveis realidades existentes no momento da criação literária. Dessa forma, a obra de ficção lida com ações sonhadas, com sentimentos compartilhados, com intermediação entre o real e as aspirações coletivas. A obra literária constitui-se parte do mundo, das criações humanas, e transforma-se em relato de um determinado contexto histórico-social. Por isso, “qualquer obra literária é evidência histórica objetivamente determinada – isto é, situada no processo histórico”, cabendo ao historiador se debruçar sobre estas obras como uma “nova” fonte de percepção para a produção historiográfica, indagando, questionando, trazendo a tona a sua visão sobre determinado tempo. 
A literatura passa então a fornecer uma versão da “história real” pelos olhos de um observador privilegiado – o escritor, que mesmo quando não possui o objetivo explícito de “fazer história” com sua obra, acaba por fornecer uma junção de elementos e características capaz de “dizer a história” em que se insere. Desta forma (...) a literatura portanto fala ao historiador sobre a história que não ocorreu, sobre as possibilidades que não vingaram, sobre os planos que não se concretizaram. Ela é o testemunho triste, porém sublime, dos homens que foram vencidos pelos fatos. 
Para Nicolau Sevcenko, o estudo da literatura traz consigo nova possibilidade de análise do passado, por meio da fala dos não ajustados socialmente. A narrativa literária cria a possibilidade do vir a acontecer, dos sonhos que revelam outro cotidiano que não apenas o dos vencedores, fazendo alusão a sujeitos que reelaboram sua prática social e os transforma em realizadores de 
sua própria história, permitindo, finalmente, o conhecimento de uma realidade que não apenas a sacralizada pela história dos vencedores.”
Fonte: SENA JÚNIOR, Gilberto Ferreira. “Realidade versus ficção: a literatura como fonte para a escrita da história”. Disponível em: http://www.historia.uff.br/estadoepoder/6snepc/GT13/GT13-GILBERTO.pdf. Acesso em: 19 de agosto de 2014.
Texto 44: Fontes Orais.
“Outro aspecto a ser considerado nessa problemática da credibilidade das fontes orais é o fato das limitações que tanto a fonte oral como a escrita apresentam. É neste contexto que Garrido insiste na necessidade de se trabalhar com os dois registros, pois há coisas que nunca poderemos saber a partir dos documentos escritos, como também há outras tantas que a pesquisa com fontes orais não permite ser colocada'. O mais importante para o historiador que pretende trabalhar com fontes orais é ter claro que qualquer tipo de fonte pode suscitar dúvidas e que é justamente o seu trabalho de reflexão crítica sobre as fontes de que dispõe é que possibilitarão o encontro de evidências com as quais poderá produzir o seu trabalho historiográfico.
No sentido de operacionar metodologicamente o trabalho com a produção das fontes orais, uma vez que o pesquisador a partir do momento em que grava a entrevista com seu depoente está produzindo uma fonte, é importante que o pesquisador tenha claro o grupo de pessoas que irá entrevistar, ou seja, o grupo que compõe a amostra de sua pesquisa. Depois de selecionado os entrevistados é o momento de proceder a escolha do tipo de entrevista a ser aplicada. E comum encontrarmos três tipos mais utilizados: o questionário dirigido e fechado, o semi-dirigido e o aberto. Particularmente, entendo que o questionário semi-dirigido, aplicado com flexibilidade permite uma maior interação com o entrevistado e explorar melhor as informações que estão sendo transmitidas pelo mesmo, pois a partir das respostas de uma base de questões comuns ao todo que integra a amostra,se pode aplicar outras, ampliando as possibilidades de conhecimentos da problemática estudada. O pesquisador deve pensar também no local onde a entrevista pode ser realizada, sendo importante escolher um local em comum acordo com o entrevistado e de preferência que este local seja onde o entrevistado sinta-se mais a vontade, podendo a princípio, contribuir de forma mais produtiva para a pesquisa. A atitude do pesquisador frente ao entrevistado também é importante para o bom andamento da entrevista. A entrevista é uni momento em que se abre a oportunidade para que uma determinada pessoa possa contar a sua experiência de vida e sua participação em determinados acontecimentos públicos ou mesmo privados, e é com base neste relato, onde estão contidas as representações que este informante fez sobre seu próprio passado que o historiador vai realizar sua análise, ou seja, o trabalho histórico por excelência. Portanto, a postura do pesquisador no momento da entrevista não deve ser o de quem está realizando um interrogatório sobre o que foi certo ou errado, mas ouvir atentamente o relato do entrevistado, elaborando perguntas que possibilitem alcançar o maior volume de informações possíveis. É oportuno que antes de realizar a entrevista o pesquisador procure se instrumentalizar com o máximo de informações possíveis sobre o tema da entrevista para poder aproveitar a oportunidade e questionar aspectos ainda pouco explorados.
Após concluída a etapa da realização das entrevistas, faz-se necessário o processo de transcrição das mesmas. É uma atividade demorada e as vezes desgastante, mas fundamental para o exercício de análise das informações. A transcrição deve comportar a versão integral da entrevista, com escrita inteligível, de modo que preserve o tipo de linguagem, particularidades de dialeto ou mesmo a terminologia utilizada pelo informante. É aconselhável (e desejável) que se informatize em seguida estas informações, facilitando acesso. O mais importante a ser frisado é que o texto da transcrição é matéria-prima e não informação elaborada. Por ter este status seria conveniente que estas fontes ficassem disponíveis para ser utilizadas por mais de um pesquisador.
O depósito das fitas com entrevistas e suas respectivas transcrições em arquivos públicos atenderia esta demanda e também a dos críticos

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