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3 Conflitos afriCanos “A liberdade de um homem é o jugo de outro.” Provérbio africano, Benim Uma breve história da África pré-colonial: aspectos físicos, povos e cultura A ideia de que o continente africano evoluiu isolado dos grandes fluxos internacionais é enganosa. Desde o início dos tempos históricos, a metade norte e leste do continente mantiveram contatos regulares com a Ásia e a Europa. Por essa razão, qualquer estudo que deseje colocar o continente numa perspectiva global deve iniciar pelo conhe- cimento e pela análise da dimensão pré-colonial e faz estruturas profundas da história do continente. Da mesma forma, conhecer sua configuração geográfica é indispensável, especialmente a partir da formação de um sistema mundial calcado nos fluxos comerciais dos grandes espaços oceânicos a partir do século XV. É errônea a percepção de uma África cristalizada em dezenas de povos e centenas de “tribos”, com suas estruturas específicas consolidadas. O quadro é mais o de um intenso deslocamento, interação, fusões e o sur- gimento de novas entidades. Da ocupação de espaços e seus conflitos, do desenvolvimento de novas formas de produzir e das conexões com outros povos africanos e extracontinentais foi emergindo uma espécie de sistemas de “relações internacionais” que terá uma dinâmica apenas parcialmente determinada pelos estrangeiros e que não desaparecerá por completo, mesmo com a ocupação europeia. O continente africano está separado da Europa pelo mar Mediterrâneo e da Ásia pelo mar Vermelho, mas liga-se a ela por meio de sua extremidade nordeste, o Istmo de Suez. A principal subdivisão da África refere-se às duas regiões que ficam ao norte e ao sul do Deserto do Saara – África Subsaariana ou África Negra, e ao norte da África, ou Magreb (ocidente, em árabe). Sendo o terceiro maior continente da Terra, a África ocupa, juntamente com as ilhas adjacentes, uma superfície de 30 milhões de Km2, mais de 20% do total das massas terrestres, formando um espaço compacto. Com exceção dos montes Atlas, no norte, do maciço etíope e do Drakensberg sul-africano, o território africano é um planalto vasto e ondulado, marcado por quatro grandes bacias hidrográficas: a do Nilo, do Níger, do Congo e a do Zambeze. 4 A África pode ser dividida geograficamente em três regiões distintas: o planalto setentrional, os planaltos central e meridional e as montanhas do leste. Em geral, a altitude do continente aumenta de noroeste para sudes- te. A característica peculiar do planalto setentrional é o Deserto do Saara, que se estende por mais de um quarto do território africano. As faixas litorâneas baixas, com exceção da costa mediterrânea e da costa da Guiné, são estreitas e elevam-se bruscamente em direção ao planalto. O litoral se caracteriza por dimensões contínuas, quase sem reentrâncias e portos de águas profundas e com plataforma continental muito exígua, o que limita as possi- bilidades de pesca e jazidas de petróleo off-shore. Por fim, os rios, em sua maioria, não são navegáveis a grandes embarcações, devido a um grande número de corredeiras, dificultando o acesso ao interior do continente. Outra característica peculiar é que boa parte dos rios africanos tem drenagem endorreica, ou seja, correm para o interior do continente, não atingindo o mar. A África é riquíssima em recursos minerais, possuindo em seu subsolo, a maioria dos minerais conhecidos, sobretudo os mais raros e valiosos, muitos deles em quantidade e qualidade notáveis. Sua principal atividade econômica é a mineração, principalmente nas grandes jazidas de carvão, reservas de petróleo e gás natural, bem como as maiores reservas de ouro do mundo, diamantes, bauxita, cobre, manganês, níquel, germânio, lítio, fosfato, rádio e titânio. Os principais países produtores desses minérios são República Democrática do Congo, África do Sul 5 e Namíbia, que juntos representam aproximadamente 98% da produção mundial de diamantes. A profunda contradição do continente africano fica explícita numa comparação referente à energia, pois há aproximadamente 66 bilhões de barris de pe- tróleo apenas ao sul do Saara e inúmeras jazidas de gás natural, entretanto, a maior parte da energia consumida na África provém da lenha (90%). A segunda atividade econômica mais importante no continente é a agricul- tura, praticada de três formas específicas: a de subsis- tência, em sistemas de rotação de terras, desenvolvida por nativos nas áreas de floresta e savana; a permanen- te, realizada por povos berberes no Marrocos, felás no Egito e alguns povos negros da África Ocidental e da Meridional; e a plantation, cultivo de produtos tropicais em grande escala, direcionada para exportação. Dentre esses produtos agrícolas exportados encontram-se o café, o cacau, a borracha, a cana-de-açúcar, o algodão, o amendoim e o azeite de dendê. A pecuária é pouco praticada nas áreas equa- toriais e tropicais, mas, na zona norte africana (Egito, Líbia, Marrocos, Argélia e Tunísia), há grandes criações de camelos, ovinos e caprinos. O nível de industrializa- ção africana é baixo, existindo, no entanto, no norte do continente, indústrias relativamente bem desenvolvidas, especialmente no Egito (alimentícia, petrolífera, têxtil e siderúrgica) e na Argélia (óleos vegetais e máquinas agrícolas). No sul africano, também há industrialização média no Zimbábue (alimentícia e de energia) e na Áfri- ca do Sul (têxtil, alimentícia, química, siderúrgica, meta- lúrgica e de equipamentos de transporte). Atualmente vive no continente africano quase um bilhão de pessoas, com densidade demográfica de 30 habitantes por Km2. A população urbana é de, apro- ximadamente, 40%, ao passo que a rural é de 60%. O continente está dividido em cerca de oitocentos grupos étnicos, cada qual com sua própria língua e cultura. A distribuição populacional da África é muito irregular. As regiões desérticas são quase desabitadas. Em compen- sação, nas regiões às margens do rio Nilo, nos vales do Marrocos, na Tunísia, na Nigéria, na área urbano-indus- trial da África do Sul e na região dos grandes lagos a densidade é bastante elevada. Ruanda e Burundi, por exemplo, destacam-se por estarem entre as mais altas densidades demográficas do mundo. Obá Ovonramwen de Benin e sua família Na África são faladas mais de mil línguas diferentes, que são divididas em quatro famílias: as afro-asiáticas, as Khoisan, as nígero-congolesas e as nilo-saarianas. Além do árabe, as mais faladas são o suaíle e o hau- çá. Há também várias línguas que pertencem a famílias de línguas não africanas, como a malgaxe, que é uma língua austronésia (malaia), e o afrikaaner (derivado do holandês), pertencente à família das línguas indo- -europeias, assim como a maioria das línguas crioulas da África. Além disso, a maior parte dos países africanos adotou, pelo menos como uma de suas línguas oficiais, uma língua europeia (português, francês e inglês nas respectivas ex-colônias), sendo que essas línguas são, geralmente faladas pela população urbana desses pa- íses e, particularmente, por todas as pessoas com uma escolaridade significativa. As línguas alemã, italiana e espanhola são ainda faladas por minorias na Namíbia, Camarões, Eritréia, Líbia, Somália, Marrocos e Guiné Equatorial. Muitas foram as tentativas de classificar os gru- pos étnicos na África, seja pela cor da pele, pela identi- dade linguística ou pelas características culturais. Uma das primeiras tentativas nessa direção foi a de definir os habitantes do norte da África como caucasoides e os habitantes ao sul do Saara de negroides. Entre esses dois grupos podem-se encontrar variações e, além disso, entre todos esses povos houve cruzamentos, de forma que múltiplos graus de mestiçagem ocorreram e ainda são esperados. Originalmente, também as fronteiras ge- ográficas não eram tão rigorosas como atualmente. A África pré-colonial era dividida em grandesrei- nos ou impérios que funcionavam com uma organiza- ção política e socioeconômica assentada em estruturas 6 específicas, cujo núcleo de base é a família estendida. A sociedade africana tradicional era dividida em várias categorias sociais ou castas, que exerciam de forma exclusiva uma função ou uma atividade socioeconômi- ca específica. Essa organização sócia, apesar de suas características complexas, tanto do ponto de vista po- lítico e cultural, quanto do ponto de vista econômico, teve um papel fundamental nas relações internacionais da época. Outro ponto importante refere-se à questão da posse de terra. Na Idade Média, o sistema feudal derivava da posse da terra, frustrando os habitantes, teoricamente protegidos pelo Estado, e resultando na formação de uma nobreza na Europa e em outras partes do mundo. Já na África Negra nem o rei, ou qualquer outro senhor, tinha o sentimento pela da posse da terra, ou seja, a consciência do poder político derivava, prin- cipalmente de concepções religiosas e morais. O rei, um pequeno senhor local, possuía escravos e reinava sobre toda região, cujos limites conhecia perfeitamente. A fon- te de recursos do Estado tradicional africano sempre foi baseada em um sistema de taxas, extração e dos bens provindos da guerra. Do ponto de vista religioso, o continente africa- no apresenta uma rica variedade que reflete o impor- tante papel das crenças nas organizações políticas e socioeconômicas. Isso mostra a importância da religião, da divindade ou do sagrado na vida dos africanos, bem antes da chegada das chamadas religiões reveladas (cristianismo e islamismo). Nesse sentido, a África tem sido uma grande precursora dos valores humanos in- corporados pelas religiões reveladas, apesar do discurso que anunciava a tarefa de “civilizar” os povos africanos a partir de seus valores. Da mesma maneira, a diversi- dade dos grupos linguísticos, bem como a organização sociopolítica da África pré-colonial, continua pouco co- nhecida ou simplesmente desvalorizada. A religião tra- dicional africana teve um papel importante na formação política, social, econômica e cultural do continente, da mesma maneira que outras religiões e crenças em ou- tras partes do mundo. O continente africano é conhecido pela diversi- dade e pela riqueza de suas culturas e religiões, mas sobre o período pré-colonial a maioria dos filmes e do- cumentários mostra uma imagem essencialmente pri- mitiva e “bárbara”. No entanto, essa visão não passa de um olhar racista e ideológico que busca descaracte- rizar o continente para poder controlá-lo com facilidade. Apesar disso, nenhuma das classificações pode apagar a história da mais antiga região do mundo, que é, cul- turalmente, um conjunto plural, um mosaico de nações étnicas correspondentes a identidades distintas. O legado colonial No final do século XIX, o capitalismo caminhava em passos largos para a monopolização da economia a que assistimos atualmente; os trustes nascidos no continen- te europeu atingiram uma força tão grande, que os mes- mos Estados aos quais estavam associados lançaram-se sobre novas bases territoriais, procurando garantir o acesso facilitado às fontes de matérias-primas existen- tes na África e na Ásia. Assim, na busca por novas áreas que garantissem a expansão capitalista, em 1885 deu-se a Conferência de Berlim, que instituiu uma divisão do continente em territórios coloniais, submetidos ao poder e aos interes- ses das potências europias. Essa “partilha da África” não respeitou os limites culturais dos povos africanos, fazendo com que populações milenarmente ligadas fos- sem separadas, enquanto outras, muitas vezes inimigas, fossem submetidas a um mesmo poder central. Iniciava- -se então, o neocolonialismo e um intenso processo de expropriação das riquezas africanas. A África foi retalhada de acordo com as possibili- dades de exploração e submetida ao sistema capitalista na sua mais cruel forma de espoliação. Assim, os solos mais férteis foram destinados à agricultura do tipo plan- tation, e dedicados à produção de café, cana, cacau e algodão, produtos que não abasteciam as populações locais, mas sim, eram exportados para a Europa, onde eram industrializados. As imensas riquezas minerais estimularam a corrida imperialista que, além de prioritária aquisição das fontes de matéria-prima, também visava converter aqueles habitantes em mão-de-obra capaz de dar vazão à produção. Os africanos foram introduzidos em rela- ções de trabalho destoante dos padrões culturais até então vigentes, e a novas formas de organização social e política que lhes eram estranhas: o Estado-nação, o modo de produzir, o salário. 7 A Conferencia de Berlim A intensificação da corrida por esferas de influência no território africano, originada pela disputa entre ca- pitalistas europeus e Estados africanos como Ashanti, Benim e N’Gola, que controlavam ferreamente as expor- tações de novos produtos (óleo de palma, amendoim, ouro e marfim), foi potencializada pela crise econômi- ca que eclodiu na década de 1870. Para os europeus, era necessário abrir o comércio direto para os produtos africanos e manufaturados europeus. Nesse quadro, tor- nou-se necessária uma ruptura do controle do acesso ao interior, que era mantido pelos Estados do litoral. Tais Estados vinham, ao longo do século XIX, estabelecendo impérios tributários com a subjugação dos vizinhos me- nos poderosos e, assim, compensando a repressão ao tráfico internacional de escravos. Reinos africanos Possessões europeias (1875) Africânder Britânica Espanhola Francesa Portuguesa Estados sob domínio otomano Outro aspecto decorrente do processo foi a in- ternacionalização, no continente, da escravidão moder- na, para atender a demanda do comércio legítimo dos novos produtos. A utilização de escravos na produção africana provocava o aumento da intervenção filantró- pica (via missionários) e da pressão sobre os Estados europeus para intervir, com o estabelecimento de con- sulados e agentes para firmar acordos de proibição do tráfico de escravos e da liberalização de mercados, além de estabelecimentos de esferas de interesse. Frente aos tradicionais parceiros nas relações da Europa com o continente africano – Inglaterra, França e Portugal –, que deslocaram os outros da época mer- cantilista, surgiram novos competidores: o rei Leopoldo II, da Bélgica, e empresários alemães. Se o primeiro pre- tendia construir um império colonial privado na África Central, os segundos desejavam estabelecer esferas de influência no litoral dos territórios com projeção para o interior, nas áreas não controladas por potências tradi- cionais. Métodos privados, através de empresas que re- cebiam apoio estatal e de entidades filantrópicas, foram empregados. Associações aparentemente internacio- nais de exploração, além de companhias com carta de direitos emitidos por potências europeias, mesclaram-se nessa corrida gerando desconfiança recíproca e insta- bilidade. Exploradores e viajantes, agindo por represen- tação ou autonomamente, estabeleciam por onde pas- savam, tratados e acordos pessoais em benefício de Estados europeus, sob a forma de cessão de soberania ou de estabelecimento de esferas monopólicas de pro- teção. Portugal tentou fortalecer, com reconhecimento internacional, seu controle sob a foz do rio do Congo, sendo barrado pelo governo britânico. Essa situação, numa área de intensa disputa, proporcionou condições para a convocação de uma conferência internacional na cidade de Berlim, de novembro de 1884 a fevereiro de 1885. Na conferência, foram estabelecidas regras para a liberdade de comércio e igualdade de condições para os capitais concorrentes. O mundo liberal vencia o pro- tecionismo. Paralelamente aos tratados de navegação, foi reconhecida a esfera de influência da Alemanha sobre os territórios litorâneos conquistados ou ocupados por suas Chartered Companies e oEstado Livre do Congo, propriedade pessoal do rei da Bélgica. Definiam-se, também, a legitimidade e inviolabilidade das esferas dos antigos ocupantes do litoral da África – Inglaterra, França e Portugal. A conferência estabeleceu ainda as regras para a legitimidade da dominação: a prova de ocupação definitiva e a declaração de tais normas para possível contestação por outras potências europeias e assinaturas de acordos. Após a conferência, os beneficiários trataram de impor sua dominação no interior e de remodelar geo- política, social e economicamente o continente trans- formado em objeto pelo imperialismo de novo tipo que surgia na Europa. Para isso, usavam os mesmos argu- mentos de sua instalação no litoral: fim da escravidão, civilização, cristianismo e abertura do território para o comércio internacional. Iniciaram-se as guerras de con- quista e a dependência econômica do continente às economias industriais das potências europeias. 8 Tendo o Congresso de Berlim estabelecido as regras para a partilha da África e reconhecido a supre- macia das potências europeias, cabia realizar ajustes das fronteiras litorâneas e a incorporação do interior do continente. Diplomacia e armas modernas seriam utilizadas. A primeira, para as relações entre os euro- peus; as segundas, para as relações com os africanos. A dominação efetiva do continente gerou guerras de conquista territorial e para a submissão dos africanos até as vésperas da Primeira Guerra Mundial. Os natu- rais do continente resistiam à perda de uma soberania e às transformações econômicas, fiscais e políticas que, junto com a exploração predatória de recursos naturais e demográficos, impunham a transformação da África. Os defensores do imperialismo visavam explorar economicamente o continente e adaptá-lo à nova divi- são internacional do trabalho como região periférica e subordinada. A riqueza produzida com o atendimento da demanda de minerais, matérias-primas e gêneros tropicais da nova sociedade fabril, monopolista e urba- nizada deveria ser acumulada na metrópole para ga- rantir lucro e custo de produção, além de reservas que possibilitassem a liberdade de ação e produção das po- tências imperialistas. Para isso, era necessário submeter territórios e populações, reorganizar a produção, o sis- tema de propriedade e obrigar a população ao trabalho orientado pelos novos objetos e volumes de produtos. Esse imenso processo de expropriação da economia, do tempo, da cultura e das condições de vida originou rebeliões e resistências, principalmente nas sociedades sem organização estatal. A anulação da soberania e a subordinação das sociedades organizadas sob formas estatais foram efetivadas através de guerras de conquis- ta. A superioridade em armamentos e meios de locomo- ção proporcionada pela nova tecnologia foi a garantia da vitória na repressão às resistências e nas guerras. Enquanto a violência física e simbólica marcou as relações de conquista, as diferenças entre as potên- cias eram resolvidas entre os diplomatas por meio de mapas incompletos e falhos. Isso resultou no estabele- cimento de fronteiras em linhas retas que reuniam, em uma unidade administrativa, povos diferentes e até ini- migos e dividiam conjuntos étnico-linguísticos com uma longa história de unidade. O processo de descolonização A expansão colonial europeia na África havia dividido o continente entre quatro potências – Grã-Bretanha, Fran- ça, Bélgica e Portugal. Essas potências coloniais diferiam em níveis de desenvolvimento, riquezas e necessidades. Tal situação determinou diferenças secundárias, porque as colônias eram predominantemente de exploração e não de povoamento. Determinou também uma reor- ganização na geografia política africana, voltada para o comércio metropolitano, unindo e separando áreas e economias, sociedades e povos. Tal reorientação geoeco- nômica manifestou-se pelas criações de novas “regiões” na África, regiões que entravam em contradição com a tradicional ordenação continental, externalizando sua economia e criando novas realidades sociais e políticas. O domínio colonial clássico na África durou apro- ximadamente 75 anos, tempo suficiente para o amadure- cimento de sua incorporação na economia mundial, das economias capitalistas monopolistas e para a emergência de um movimento emancipacionista bastante problemá- tico. Nesse período, os impérios coloniais submeteram ou cooptaram tanto as resistências tradicionais como as “modernizantes”, ordenaram o continente e mudaram seu perfil. O auge da dominação e reordenação deu-se no período entre guerras, com marcada participação da crise econômica de 1929 e a posterior recessão. Ao final da Segunda Guerra Mundial, a situa- ção crítica das metrópoles europeias e sua necessidade de riquezas entraram em contradição com os ideais dos social-democratas que chegaram ao poder em 1945. Isso levantou o problema da evolução dos impérios. Por ou- tro lado, certos grupos empresariais já haviam alcançado um nível de desenvolvimento que podia prescindir da subordinação direta à metrópole. A solução era apresen- tada por um longo e quase secular processo evolutivo de emancipação. Frente a tal projeto, classificaram-se vários elementos de oposição: a ascensão dos Estados Unidos e da URSS como potências mundiais e anticolonialistas, o sistema das Nações Unidas com seu comitê de desco- lonização, as reivindicações africanas de emancipação e os interesses econômicos das emergentes multinacionais estadunidenses – obstaculizados pelas políticas dos im- périos coloniais. Tais fatores são determinantes nos pro- cessos de descolonização. Na África, onde os colonizados e suas reivindicações são protagonistas preponderantes, deve-se agregar o papel das decisões da Conferência de 9 Bandung e das guerras anticoloniais da Ásia como ele- mentos-chave da descolonização. Embora o auge da descolonização da África tenha acontecido na passagem da década de 1950 para a de 1960, a reivindicação pacífica ou violenta pela indepen- dência iniciou-se no imediato pós-guerra. Ela se aprofun- dou e se radicalizou com as tentativas metropolitanas que buscaram criar mecanismos de autonomização lenta e controlada. Isso favorecia as forças internas arcaicas e a permanência das colônias subordinadas à metrópole. A regionalização geopolítica da África contemporânea e seus principais conflitos A África adentrou o século XXI apresentando um me- lancólico estado econômico, social e também geopolí- tico. Esquecido pela globalização, o continente assiste impotente à degradação humana e a proliferação da pobreza. Guerras, fome e AIDS figuram entre os com- ponentes da realidade de boa parte do continente. Para onde quer que se olhe, vêem, conflitos de ordem étni- ca, religiosa ou política. Na porção centro meridional, a trágica situação social da África Subsaariana faz dessa região a mais pobre do planeta. Eis o legado colonial. Sudão e o conflito norte-sul O cenário geopolítico do maior país africano é marcado por uma guerra civil que perdurou por mais de 20 anos e tem conduzido ao genocídio da população. A guerra tem razões religiosas e envolve de um lado, a maioria muçulmana ao norte do país, e de outro, uma forte mi- noria cristã e animista do sul. Essa situação de instabilidade vem desde a inde- pendência do Sudão em 1956, mais se agravou a partir de 1983. Naquele ano, o governo muçulmano impôs a sharia (lei corânica) a todo o conjunto da sociedade fo- mentando a imediata reação das populações cristã e ani- mista do sul. Começava então uma sangrenta guerra civil. O Sudão é ex-domínio egípcio e ex-colônia britâ- nica: para além da questão religiosa, o fator étnico é dos mais complicados, uma vez que se contabilizam no país, aproximadamente 570 grupos distintos e mais de cem idiomas. Árabes e núbios concentrados no norte somam aproximadamente 50% da população. A outra metade está divididaem inúmeros grupos minoritários. Após a radicalização islâmica do governo de Car- tum (capital sudanesa), surgiu nos anos 1980, no sul do país, um movimento denominado MPLS (Movimento Po- pular de Libertação do Sudão). Com um viés ideológico e empunhando a bandeira do socialismo, o MPLS propu- nha um novo governo de unidade nacional, com respeito à diversidade religiosa que caracteriza o Sudão, opondo- -se ao modelo teocrático de imposição do islã como re- ligião oficial. Para fazer frente à repressão do governo central, derivou do MPLS uma facção armada, o SPLA (Exército Popular de Libertação do Sudão). A guerra civil se agravaria a partir de então. O que motivava a guerrilha do sul a insistir na ação armada era o desprezo com que o governo muçulmano do país tratava as áreas cristãs e animistas. Alternando golpes militares intrínsecos ao gover- no sudanês e frágeis eleições, o país seguiu praticamente dividido entre o norte e o sul, prolongando a guerra. Algumas publicações internacionais relataram que os EUA passaram a apoiar e armar os guerrilheiros do sul. Especula-se que, em represália, o governo suda- nês tenha passado a dar abrigo a militantes da Al-Qaeda. No meio desse emaranhado encontra-se a popu- lação sudanesa que sofreu as mais duras consequências. A maioria muçulmana do norte foi atacada constante- mente por guerrilhas cristãs, enquanto o governo central de Cartum isolava as aldeias e tribos simpatizantes dos guerrilheiros cristãos, levando-as à miséria. Com uma ge- ografia natural não muito favorável em grandes trechos do país, o Sudão teve uma seca longa e intensa, o que agravou as condições da agricultura, principal atividade nacional. O resultado de tantas situações críticas foi uma gravíssima crise humanitária: de 1983 até 2005, a guerra provocou dois milhões de mortes e mais de seis milhões de refugiados. Isso é aproximadamente o total da popu- 10 lação do país. É isso o que está por trás das cenas de crianças africanas abandonadas e da degradação huma- na no Sudão, que por vezes a mídia veicula. Aproximando-se sobremaneira da opção fun- damentalista, o governo sudanês se envolveria ainda em duas contendas internacionais. A primeira foi uma disputa territorial na zona da fronteira com o Egito: os sudaneses requerem o direito sobre a região de Halaíb (rica em minérios, particularmente o fosfato). O Egito, por sua vez, acusou o Sudão de apoiar grupos funda- mentalistas egípcios. A segunda se deu após ataques terroristas à embaixada norte-americana em Nairó- be (Quênia) e Dar Asslaan (Tanzânia), quando os EUA acusaram o Sudão de ter dado abrigo e proteção aos terroristas que realizaram os atentados, atribuídos à Al- -Qaeda. Em represália a essa hipótese, os EUA bom- bardearam uma fábrica em Cartum, a qual, segundo os americanos, produzia armas químicas. O governo do Sudão afirmou tratar-se apenas de uma fábrica de remédios. Depois de vinte anos sem guerra, foi assinado me 2005, um acordo de paz entre o governo de Car- tum e os rebeldes do sul liderados por John Garang (do MPLS). O que parecia impossível há alguns anos, enfim aconteceu: o Sudão seria dividido em duas porções geo- políticas, uma ao norte, outra ao sul. Cada uma teria leis e exércitos próprios, mas continuariam fazendo parte de uma só nação, ao menos até 2011, quando foi realizado um plebiscito pelo status final do país. O que realmente permitiu o acordo foi um fator econômico e não geopo- lítico: o petróleo. Norte e sul ainda precisariam chegar a um acordo com relação ao traçado da nova fronteira e como ela será controlada, como dividir a dívida do Sudão e os royalties do petróleo do novo país e que moeda será adotada pelo novo país. A questão de Darfur Localizada no oeste do Sudão, a região de Darfur tem o tamanho da França e apresenta acelerado crescimento demográfico. Os violentos conflitos – a que um obser- vador da ONU, Mukesh Kapila, caracterizou como “a maior crise humanitária do mundo” – iniciaram-se em 2003. Trata-se novamente de uma questão territorial separatista. Representantes da população local acusam o governo central de desprezar Darfur, entregando-a à própria sorte. Nesse contexto, enquanto o governo su- danês empregava todas as suas forças no sul, organi- zou-se em Darfur um movimento contestatório denomi- nado Frente de Libertação de Darfur (FLD) e igualmente um braço armado, o Exército de Libertação de Darfur (ELD ou SLAN, das iniciais em inglês Sudan Liberation Moviment Army). Esse movimento realizou uma ofensiva para o leste, conquistando partes do território do país. O go- verno, ocupado com os combates no sul confiou então a grupos de mercenários e saqueadores tribais armados a função de combater a nova insurgência. Ou seja, o governo de Cartum delegou uma responsabilidade de Estado a grupos paramilitares, localmente denominados janjawid. Segundo analistas, esses grupos de extermínio existem a muito tempo e antes da explosão da crise separatista, já saqueavam as aldeias de Darfur, promo- vendo uma verdadeira limpeza étnica, com a conivência de Cartum. O governo, obviamente, nega. A ONU, os Estados Unidos e a comunidade in- ternacional passaram a pressionar o governo sudanês para intervir mais energicamente e suspender o genocí- dio que já se verificava em Darfur. A descoberta de petróleo nessa região fez com que os países olhassem com mais atenção para essa região. Durante encontros internacionais em Nairóbe, os Estados Unidos manifestaram a intenção de uma inter- 11 venção “humanitária” em Darfur – ideia imediatamente frustrada pela China que anunciou que vetaria qualquer iniciativa nessa direção no âmbito do Conselho de Se- gurança da ONU. Atualmente, o Sudão é um importante fornecedor de petróleo à China, país que tem investido em oleodutos sudaneses. O conflito já causou 70 mil mortes, mais de 2 mi- lhões de refugiados (principalmente no vizinho a oeste, o Chade) e aproximadamente 3,2 milhões de depen- dentes diretos de assistência humanitária dentro e fora de Darfur. Uma acordo foi assinado em abril de 2004, mas não trouxe segurança. Ainda há milhões de pesso- as desabrigadas por conta desse conflito. Somália: um país de guerra e fome Situada numa estratégica posição no Golfo de Áden, a Somália dividi com Dijibuti o controle do estreito de Bab el Mandeb, em sua vertente ocidental. Encontra-se em estado técnico de guerra civil desde 1991. Diferen- temente dos casos anteriores, o país apresenta certa homogeneidade étnica. Fala-se predominantemente a língua somali; o árabe é uma forte minoria, mas é o mesmo grupo étnico falando uma língua diferente, he- rança que remonta ao período de arabização promovida pela expansão do islã. Apesar da uniformidade, o país se encontra fragmentado em diversos clãs rivais – os protagonistas deste estado de guerra. Colonizada por italianos e britânicos, a Somália alcançou a independência em 1960, quando se firmou como uma república. Nove anos mais tarde um regime comunistas alinha com Moscou chegaria ao poder por meio de um golpe militar. Em 1977, travou uma guerra contra a Etiópia pela disputa de Ogaden (Guerra do chifre africano), re- gião que os britânicos concederam à Etiópia, o que os somalis nunca aceitaram. A Somália saiu derrotada e ainda perdeu a ajuda de Moscou, que optou por apoiar o inimigo. Soldados cubanos que davam suporte à Etió- pia ajudaram a derrotar a Somália. Em 1991, o regime militar somali foi derruba- do por um emaranhado de tribos que combatiam ana- quicamente o governo. O único fator de convergência entre essas tribos era o ódio que todas nutriam contra o regime centralizado do governo somali. Diante do caos, o presidente se exilou e o país ficou literalmente desgovernado. Os vários clãs – aproximadamente vinte milícias tribais – não se entenderam e mergulharam em intensa guerracivil, todos contra todos. Com o caos instalado, a fome se alastrou pelo país, já prejudicado pela natural aridez. Diante da situ- ação, grupos de ajuda humanitária limitavam-se a so- brevoar e despejar pacotes de alimentos junto às áreas castigadas. Mas os donativos eram confiscados pelas milícias, que assim impediam aos rivais o acesso à co- mida. As plantações também eram atacadas por grupos inimigos. Em 1992, houve uma fracassada intervenção estadunidense, que permitiu duas leituras: os Estados Unidos tentavam conter o quadro generalizado de guer- ra e a degradação humana na Somália; os Estados Uni- dos estavam se aproveitando do cenário caótico para posicionar-se estrategicamente no estreito de Bab el Mandeb, controlando assim a rota do petróleo, uma vez que já haviam saído vitoriosos da Guerra do Golfo, no mesmo ano. Uma mistura de duas hipóteses talvez seja o mais provável. Mas a Somália se converteu numa espécie de “breve Vietnã” aos Estados Unidos que, derrotados, após três anos, se retiraram. 12 No transcorrer dos conflitos, varias regiões so- malis anunciaram suas respectivas “independências”: a república da Somalilância, Puntland, Somália do Su- doeste, entre outras. Diante da obscuridade da guerra, nenhuma das pseudo-repúblicas foi reconhecida por regime algum e muito menos pela ONU. O cenário beligerante e a prolongada seca de 1997 levaram a uma nova crise humanitária. Os anos de guerra em que todos perderam e a triste realidade do país fizeram com que as principais lideranças dos inúmeros meros grupos sentassem em uma mesa de negociação em 2000, no Dijibuti. Mas líderes tribais não contemplados na conferência continuaram a luta armada. Uma conferência maior em 2004, contando com quase todos os chefes tribais, levou a um acordo mais consistente. Criou-se um parlamento transitório cuja composição obedeceria à proporcionalidade demográ- fica das tribos, mas que, por motivos de segurança, per- maneceria instalado provisoriamente no Quênia, país que patrocinou o mais bem sucedido acordo de paz até então. O caso da Nigéria Potência regional africana, a Nigéria é o país mais po- puloso do continente, muito rico em petróleo e membro da Opep. Contudo, também vive há longos anos sob ins- tabilidade política. A causa maior é a dificuldade de convivência harmônica entre muçulmanos do norte e os cristãos ao sul, diferenças que já puseram o país em guerra civil. A Nigéria abriga mais de 200 etnias, que abra- çam três religiões; islamismo, cristianismo e animismo. Dentre os diversos grupos, destacam-se os hauçás, fula- nis e iorubas. Os ibos, uma forte minoria, tentaram sem sucesso em 1996, construir um Estado independente na região de Biafra, o que levou, diante da negativa do go- verno central, a uma violenta guerra civil. As duas reli- giões dominantes são o cristianismo (sul) e o islamismo (norte), que aproximadamente se equivalem em número de seguidores: cerca de 45% da população para cada. O restante pratica ritos tribais do animismo. Há minorias religiosas cristãs no sul e no norte. A formação política e cultural nigeriana foi in- fluenciada por essas três fontes distintas: a cultura islâ- mica, levada à Nigéria com a expansão muçulmana; a influência cristã, trazida pelo colonizador britânico; ritos tradicionais do milenar animismo africano. Apesar da relativa liberdade política e de culto, essa convivência não foi pacífica. Alguns estados nigerianos (de um total de 36) adotam a sharia (lei islâmica), e isto é fator de tensão, pois os cristãos não a aceitam. Desde sua independência, em 1960, a Nigéria é uma República Federativa, apresentando três regiões princi- pais e autônomas. Também com um passado de golpes militares, o país tem, desde 1999, um presidente (cris- tão) democraticamente eleito e que tentou, com muita dificuldade, minimizar a instabilidade política decorren- te dos conflitos religiosos. Os conflitos são mais intensos no norte do país, onde a maioria islâmica persiste na aplicação da sharia e pretende fazer valer a sua jurisdição sobre as minorias não-muçulmanas. Apesar de os políticos muçulmanos afirmarem que a sharia não atingiria os cristãos, na prá- tica foi o contrário que aconteceu. Discriminados, mui- tos fugiram para outras áreas. A séria crise em 2002 deu-se porque, ignorando a fragilidade da convivência entre cristãos e muçulma- nos, organizou-se no país o concurso de “miss univer- so”. O presidente, um cristão anglicano, deu apoio à re- alização do evento. Os muçulmanos consideraram uma profanação ao Islã aquela exposição de mulheres semi- -nuas em pleno mês do Ramadã, período sagrado para eles. A situação se agravou com uma frase divulgada no jornal mais importante do país: “até Maomé se renderia àquelas beldades”. Isso bastou para que muçulmanos e cristãos se armassem com o que podiam rumo a uma batalha campal que deixou mais de cem mortos. O epi- sódio pôs à mostra a instabilidade do país. Assim, em linha gerais, o cenário geopolítico que caracteriza o mais populoso país africano pode ser sin- tetizado da seguinte leitura religiosa: muçulmanos de 13 um lado, cristãos e animistas do outro. Essa divisão gera um constante quadro de tensão, levantes separatistas e frequentes distúrbios. Boko Haram O Boko Haram é um grupo terrorista surgido na Nigéria que, muitas vezes, é denominado como “grupo radical islâmico”, pois as suas ações correspondem ao funda- mentalismo religioso de combate à influência ociden- tal e de implantação radical da lei islâmica, a sharia. O nome Boko Haram significa “a educação não islâmica é pecado” ou “a educação ocidental é pecado” na língua Hausa, um idioma bastante falado no norte do território nigeriano. Logomarca do grupo terrorista Boko Haram O surgimento do Boko Haram ocorreu em 2002 como uma seita religiosa, fundada por Mohammed Yu- suf na cidade de Maiduguri, capital do estado de Borno, na Nigéria. Para Yusuf e os seus seguidores, a cultura ocidental reproduzida na sociedade seria a principal razão para os males do país, sendo necessária a sua erradicação para combater a corrupção e o descaso das autoridades para com o povo. O líder atual do Boko Ha- ram é Abubakar Shekau. Com o passar do tempo, o Boko Haram foi se tornando um grupo militar cada vez mais bem armado, recebendo vários treinamentos e ações de formação por parte da Al-Qaeda do Magrebe de alguns outros gru- pos militares radicais existentes na região setentrional da África. Em 2009, com a morte de Mohammed Yusuf durante um confronto armado, o Boko Haram tornou-se uma organização militar totalmente radical. No entanto, somente em 2013 os Estados Unidos passaram a consi- derar, oficialmente, o Boko Haram como grupo terroris- ta, que é hoje um dos maiores da atualidade. O principal objetivo do Boko Haram atualmente, além de combater os princípios e legados ocidentais dei- xados pela colonização britânica no país, é a construção de uma república islâmica. Para conseguir esse objetivo, o grupo terrorista utiliza muitos métodos radicais, in- cluindo a realização de atentados e o sequestro para realizar avanços territoriais. O Boko Haram também age por meio do sequestro de mulheres, utilizando-as para a obtenção de resgates e, principalmente, negociando-as como escravas sexuais. A ação mais notória do grupo até hoje ocorreu em abril de 2014, quando o Boko Haram sequestrou cerca de 276 mulheres entre 16 e 18 anos. Segundo relatos de algumas das que conseguiram escapar, os militantes utilizavam-nas como escravas sexuais e vendiam-nas para membros da organização a um preço médio de 12 dólares. Indícios posteriores também afirmaram que boa parte das mulheres foi utilizada em diversos combates. Grupo de nigerianos protestam contra o Boko Haram na cidade de Alicante, Espanha. Não há números concretos sobre a ação do Boko Haram, mas estima-se que o grupo terrorista já tenha executadomais de três mil pessoas, número que se ele- va continuamente a cada conflito ocorrido. O grupo já tomou boa parte do território da Nigéria, sobretudo as suas áreas ao norte e a nordeste, em um mapa difícil de ser representado, pois, a cada mês ou semana, um nova cidade é tomada ou perdida para as tropas do governo nigeriano, realinhando as fronteiras da república radical islâmica. 14 Os milhares de combatentes e militantes do Boko Haram vêm lutando não tão somente contra as tropas governamentais da Nigéria, mas também contra o apoio de outros países. Chade e Níger, que formam uma coalização africana, vêm atuando no território nigeriano para combater as ações da milícia terrorista, que eventu- almente realiza atividades fora da Nigéria e ameaça, com uma possível expansão, os países circunvizinhos, princi- palmente Camarões, que já sofreu alguns atentados. As ações do Boko Haram são uma demonstra- ção da expansão da atividade de grupos terroristas pelo mundo, algo que se intensificou nos períodos posterio- res à Guerra Fria. O líder Abubakar Shekau jurou, in- clusive, uma lealdade a outro grupo terrorista radical, o Estado Islâmico. Essa postura não se trata, ao menos por enquanto, de uma aliança entre os dois grupos, mas pode indicar um paralelo sem igual para o crescimento da ação de grupos radicais pelo mundo.
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