Buscar

MÃES DE SUJEITOS COM DEFICIÊNCIA

Prévia do material em texto

1 
 
HISTÓRIAS DE VIDA DE MÃES DE SUJEITOS COM DEFICIÊNCIA: VIDAS QUE 
COMPÕEM HISTÓRIAS 
 
 
Valdirene de Almeida Cardoso Silva
1
 
Andrea de Augusto Silva
2
 
Jéssica Heloisa Lima da Silva
3
 
Michell Pedruzzi Mendes Araújo
 4
 
 
 
RESUMO: 
 
Este trabalho objetiva compreender uma parte das histórias de vida de mães de sujeitos com 
deficiência. Para que esse objetivo fosse atingido, recorremos à metodologia história de vida, imersa 
numa perspectiva sócio-histórica, pois assim acreditamos que podemos, através dela, entender 
melhor a constituição subjetiva dos indivíduos. Para coleta dos dados, fizemos o uso da entrevista 
semiestruturada do tipo biográfica. A escolha por esses sujeitos foi feita com base na intersecção 
entre suas narrativas de vida: apresentam filhos com deficiência, um com síndrome de Down e outro 
com deficiência física e intelectual, e cursam pedagogia numa universidade. Uma consideração a ser 
tecida a partir desse estudo é que SER mãe de um sujeito com deficiência só é possível SENDO, 
uma vez que as relações dialógicas MÃE-FILHO que ocorrem no processo são determinantes para a 
constituição identitária do „eu‟- mãe e do „outro‟- filho. Além disso, entendemos que as práticas 
pedagógicas na escola comum devem ser (re)pensadas a partir do olhar dessas mães. 
 
 
PALAVRAS-CHAVE: MÃES. HISTÓRIA DE VIDA. PERSPECTIVA SÓCIO-
HISTÓRICA. 
 
 
INTRODUÇÃO 
 
Acreditamos que a maternidade, planejada ou não, é um momento cheio de 
significados para a mulher, pois envolve vários fatores como físico, psicológico e 
financeiro. Isso porque, durante a gravidez a mãe idealiza o filho perfeito, belo e 
saudável, imagina a profissão que o filho deverá seguir o tipo de esporte que gostará 
de fazer, enfim, passa a viver a vida de um ser que ainda não conhece, mas que o 
ama incondicionalmente. 
Dessa forma, quando uma criança nasce com alguma deficiência, na 
juventude desenvolve algum tipo de doença ou sofre um grave acidente que 
compromete seu desenvolvimento motor e/ou cognitivo, a mãe passa por conflitos 
emocionais, dificuldades em aceitar a situação e mudanças significativas em sua 
 
1
 Graduada em Pedagogia/UFES. 
2
 Graduada em Pedagogia/UFES. 
3
 Graduada em Pedagogia/UFES. 
4
 Mestre em Educação pela Universidade Federal do Espírito Santo, na linha de Diversidade e 
Práticas Educacionais Inclusivas. É especialista em Educação Inclusiva e em Gestão Escolar pela 
Faculdade Afonso Cláudio. É biólogo pela Universidade Federal do Espírito Santo. Professor 
orientador desse trabalho. 
2 
 
rotina. Nesse contexto, certamente, novas interações subjetivas serão estabelecidas. 
São essas mudanças, essas dúvidas, temores e renúncias feitas em função do outro 
que serão destacadas no nosso estudo. 
Nesse mesmo caminho, ao pensar nas histórias de vida das mães de sujeitos 
com deficiência, nos afloram algumas indagações: O que essas genitoras sentiam 
quando constatavam que seu filho era deficiente? Quais caminhos percorriam até 
chegarem às escolas de seus filhos? O que sentiam quando seus filhos eram 
discriminados? Existe algum projeto do Estado para dar atendimento psicológico 
e/ou psiquiátrico para elas? Essas indagações motivaram a realização dessa 
pesquisa. 
Souza5 (2003, p. 84-85), ao afirmar que a nossa consciência é fruto de como 
compartilhamos o nosso olhar com o olhar do outro, nos motivou a realizar a 
presente pesquisa, que consiste em duas narrativas de vida. Na primeira, está uma 
mãe que possui um filho de 13 anos com síndrome de Down, e na segunda, uma 
mãe que, após o filho de 20 anos ser vítima de acidente de trânsito, mudou toda a 
sua vida para cuidar desse jovem que passou a ter necessidades especiais físicas e 
cognitivas. 
Nesse contexto, cabe dizer que a presente pesquisa visa discutir, entender, 
compreender e refletir o que sentem, pensam e como agem as genitoras de sujeitos 
com deficiência. Nesse sentido, entendemos que a deficiência de um filho interfere 
de maneira direta sobre a constituição do „ser‟ mãe „sendo‟. Certamente, as relações 
dialógicas „mãe-filho‟ interferem na constituição identitária da mãe. 
Para que os objetivos expostos anteriormente fossem atingidos, utilizamos 
como metodologia a história de vida, uma vez que esse método permite penetrar 
nas entranhas e nas entrelinhas das vozes dos sujeitos, captar sentimentos 
implícitos e sensações escondidas que se tornam visíveis e ganham destaque no 
processo de narrar, tanto para o pesquisador quanto para o próprio entrevistado 
(DRAGO; SANTOS, 2013)6. 
 
 
 
5
 SOUZA, S. J. e. Dialogismos e alteridade na utilização da imagem técnica em pesquisa acadêmica: 
questões éticas e metodológicas. In: FREITAS, M. T. F.; SOUZA, S. J. e; KRAMER, S. Ciências 
Humanas e Pesquisa. 1. ed. São Paulo: Cortez, 2003. 
6 DRAGO, R. SANTOS, C. R. dos. História de vida na pesquisa com adultos com deficiência: algumas 
reflexões. Educação: Teoria e Prática. Rio Claro. Vol. 23, n.44. p. 81-94/ Set-Dez. 2013. 
3 
 
REFERENCIAL TEÓRICO 
Tudo o que me diz respeito, a começar pelo meu nome, chega do 
mundo exterior à minha consciência pela boca dos outros (da minha 
mãe, etc.), com a sua entonação, em sua tonalidade valorativo-
emocional. A princípio eu tomo consciência de mim através dos 
outros: deles eu recebo as palavras, as formas e a tonalidade para a 
formação da primeira noção de mim mesmo (BAKHTIN
7
, 2003, p.373-
374). 
Para embasar nossos estudos, escolhemos os pressupostos da perspectiva 
histórico-cultural de Vigotski, Bakhtin e de seus colaboradores e para dar início aos 
nossos estudos acerca da construção identitária e subjetiva de mães de sujeitos 
com deficiência analisaremos a subjetividade dentro da teoria sócio-histórica de 
Vigotski (20018, 20039), pois acreditamos “que o comportamento do homem é 
formado pelas peculiaridades e condições biológicas e sociais do seu crescimento” 
(VIGOTSKI10, 2001, p. 63). 
Os dados obtidos a campo foram analisados a partir da perspectiva sócio-
histórica do desenvolvimento humano, tendo Vigotski como principal interlocutor. O 
interesse por Vigotski se dá principalmente pelo fato de que ele via o ser humano 
como possuidor de história, cultura e ferramentas culturais e sociais de 
transformação da realidade, possuidor de materiais que possibilitam a 
concreticidade das coisas vivas e inanimadas. Nessa perspectiva, destacamos a 
possibilidade de se enxergar uma nova forma de ver o homem, as relações entre 
natureza e homem e as deficiências. Isso porque essa base teórica ajuda a explicar 
os processos de aprendizagem e desenvolvimento do ser humano e utiliza conceitos 
que fundamentam a prática pedagógica de muitos professores e a compreensão dos 
processos que ocorrem na escola ou no cotidiano dos sujeitos com ou sem 
deficiência (VIGOTSKI11, 2003). 
Tendo como paradigma de fundamentação as bases teóricas do pensamento 
sócio-histórico, percebemos que o eixo analítico do estudo, adequa-se aos objetivos 
da pesquisa, pois essa teoria tem subjacente a busca constante por “[...] refletir o 
indivíduo em sua totalidade, articulando dialeticamente os aspectos externos com os 
 
7
 BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 2003. 
8
 VIGOTSKI, L. S. Psicologia Pedagógica. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo: Martins Fontes, 2001. 
9
 VIGOTSKI, L. S. A formação Social da mente: O desenvolvimento dos processos psicológicos; 6° 
edição. São Paulo: Martins Fontes, 2003. 
10
 VIGOTSKI, L. S. Psicologia Pedagógica. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo: Martins Fontes,2001. 
11 VIGOTSKI, L. S. A formação Social da mente: O desenvolvimento dos processos psicológicos; 6° 
edição. São Paulo: Martins Fontes, 2003. 
 
4 
 
internos, considerando a relação do sujeito com a sociedade à qual pertence” 
(FREITAS12, 2002, p. 22). 
Nesse sentido, entendemos que a perspectiva defendida por autores como 
Vigotski ancora a nossa pesquisa porque possibilita reconhecer o ser humano como 
ser social e cultural, ou seja, um indivíduo que apresenta uma subjetividade que é 
tecida nas e pelas relações dialógicas. 
Para Molon13 (2011), a subjetividade e o sujeito são compreendidos na 
realidade social e na vida social, sendo assim é nas relações com os outros e por 
meio dessas relações que se constitui sujeito. 
Assim, percebemos que as mães já citadas anteriormente, passam a viver o 
seu “eu” no “outro” e assim passam a ser a voz, a força, e a necessidade de um 
individuo. Para essa ligação entre sujeito e subjetividade Molon14 (2011, p. 59) nos 
alerta que: 
Neste processo de significação, o eu, ao se constituir sujeito, torna-se 
para o sujeito o significante da própria subjetividade. A consciência da 
própria subjetividade aparece na relação eu-outro, tal como 
compreendida e demonstrada acima; neste sentido, a consciência da 
subjetividade e a penetração do universo da significação somente 
acontece no campo da intersubjetividade, configurado como o lugar 
do encontro e do confronto e como o palco de negociações dos 
mundos de significação privados e públicos. 
 
Sob este mesmo prisma, Gonzalez Rey15 (2003, p. 108) afirma que a 
subjetividade pode ser definida, "como a organização dos processos de sentido e 
significação que aparecem e se organizam de diferentes formas e em diferentes 
níveis do sujeito e na personalidade, assim como nos diferentes espaços sociais em 
que o sujeito atua". 
 
OBJETIVO GERAL 
Compreender uma parte das trajetórias de vida de mães de sujeitos com 
deficiência. 
 
OBJETIVOS ESPECÍFICOS 
- Entender as relações que são estabelecidas entre filhos com deficiência e as 
 
12
 FREITAS, M. T. A. A abordagem sócio-histórica como orientadora da pesquisa qualitativa. 
Cadernos de Pesquisa, Fundação Carlos Chagas, n. 116, jul.2002. 
13 MOLON, S. I. Subjetividade e constituição do sujeito em Vygotsky. Petrópolis, RJ: Vozes, 
2011. 
14
 MOLON, S. I. Subjetividade e constituição do sujeito em Vygotsky. Petrópolis, RJ: Vozes, 
2011. 
15
 GONZALEZ REY, F. L. Sujeito e subjetividade. São Paulo: Thomson, 2003. 
 
 
5 
 
suas mães; 
- Compreender como a deficiência de um filho pode afetar na constituição 
subjetiva de uma mãe; 
- Compreender como as relações interpessoais podem contribuir para a 
formação e o reconhecimento da subjetividade de uma mãe de um sujeito com 
deficiência; 
- Entender como se deu a participação da mãe do sujeito com deficiência no 
processo inclusivo social, familiar e escolar. 
 
METODOLOGIA 
Para que os objetivos elencados anteriormente fossem atingidos, recorremos 
à metodologia história de vida. A partir das histórias de vida, podemos entender 
melhor a formação subjetiva dos indivíduos, considerando o contexto histórico e 
cultural no qual o sujeito está inserido. 
Utilizamos os fundamentos teórico-filosóficos da psicologia sócio-histórica, 
tendo Vigotski como principal interlocutor e as bases teóricas da perspectiva sócio-
histórica para análises do estudo. Isso porque essa perspectiva nos dá 
fundamentação para alcançar nossos objetivos, entendendo que devemos “[...] 
refletir o indivíduo em sua totalidade, articulando dialeticamente os aspectos 
externos com os internos, considerando a relação do sujeito com a sociedade à qual 
pertence” (FREITAS16, 2002, p. 22). 
Sob este mesmo prisma, entendemos que olhar as histórias de vida de 
adultos com deficiência, a partir de uma perspectiva sócio-histórica, pode ser capaz 
de trazer à tona sentimentos, significações, construções e desconstruções desses 
sujeitos, que, uma vez internalizados, podem contribuir para o processo de 
aprendizagem e desenvolvimento humano, como demonstraram estudos de Araújo17 
(2014) e Drago18 (2012). 
Não houve questionário ou roteiro fixo para a entrevista. A entrevista utilizada 
foi a semiestruturada porque permitiu certa liberdade aos nossos sujeitos da 
 
16 FREITAS, M. T. A. A abordagem sócio-histórica como orientadora da pesquisa 
qualitativa. Cadernos de Pesquisa, Fundação Carlos Chagas, n. 116, jul. 2002. 
17 ARAÚJO, M. P. M. Para além do biológico, o sujeito com a Síndrome de Klinefelter. 2014. 
Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-graduação em Educação, Universidade 
Federal do Espírito Santo, Vitória, 2014. 
18 DRAGO, R. Síndromes: conhecer, planejar e incluir. Rio de Janeiro: Wak Editora, 2012. 
6 
 
pesquisa. 
Para o alcance dos objetivos já elencados anteriormente, utilizamos a 
metodologia história de vida, pois se baseia em fatos do cotidiano e no 
conhecimento humano acumulado sobre as vivências de mães que por motivos que 
as coloca em posições de cuidar do outro. 
Nesse mesmo caminho, concordamos com Silva19 et al. (2007, p. 34), quando 
dissertam que 
o método de História de Vida é um método científico com toda força, 
validade e credibilidade de qualquer outro método, sobretudo porque 
revela que por mais individual que seja uma história, ela é sempre, 
ainda, coletiva, mostrando também o quão genérica é a trajetória do 
ser humano. 
 
Recuperamos memórias, para que fosse possível analisar uma parte da 
história de vida de cada uma dessas genitoras, que ao relatar suas experiências e 
sentimentos, nos faz entender desde a primeira relação com o seu bebê, seja ela de 
raiva, rejeição, revolta ou até mesmo de culpa, suas dificuldades e desafios ao 
decorrer de suas vidas. Neste sentido, para realizarmos este estudo, tínhamos em 
mente que “[...] na pesquisa qualitativa com enfoque sócio-histórico não se investiga 
em razão de resultados, mas o que se quer obter é a compreensão dos 
comportamentos a partir da perspectiva dos sujeitos da investigação” (FREITAS20, 
2002, p. 21). 
 
SUJEITOS DA PESQUISA 
 
Os sujeitos da presente pesquisa são duas mães de indivíduos com 
deficiência e transtornos globais do desenvolvimento. Ambas cursam o ensino 
superior. Uma residente no município de Cariacica e a outra no município de Serra. 
A escolha foi feita devido a essas mães terem algo em comum: possuem 
filhos com deficiência e cursam o ensino superior numa Universidade Federal. 
A mãe do filho com Síndrome de Down possui 36 anos de idade e dois filhos. 
Atualmente está desempregada. Ela conta que começou a trabalhar com 13 anos e 
que se interessou pelo curso de pedagogia após acompanhar o processo de 
 
19
 SILVA, A. P.; BARROS, C. R.; NOGUEIRA, M. L. M.; BARROS, V. A. “Conte-me sua história”: 
reflexões sobre o método de História de Vida. Revista do Centro Acadêmico de Psicologia da 
FAFICH/UFMG, Belo Horizonte, v. 1, n. 1, p. 25-35, 2007. 
20 FREITAS, M. T. A. A abordagem sócio-histórica como orientadora da pesquisa 
qualitativa. Cadernos de Pesquisa, Fundação Carlos Chagas, n. 116, jul. 2002. 
7 
 
aprendizado do seu filho, hoje com 13 anos, que nasceu com Síndrome de Down, o 
qual ela cria sozinha. Nunca teve ideia de fazer uma faculdade, achava que não 
tinha capacidade. Ela nos conta que o principal incentivo para voltar a estudar veio 
de membros da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE) da Serra. 
Ultimamente, tem se dedicado à vida acadêmica e à educação de seus filhos. 
A outramãe, com 40 anos, também estudante do curso de pedagogia, relata a 
sua vida após o acidente que seu filho de vinte anos sofreu, ficando com sequelas 
físicas e intelectuais. A mãe relatou que seu filho parece que „virou criança‟ após o 
acidente, tendo mudanças repentinas de humor e picos de agressividade. A partir 
desse acidente, a mãe nos conta que passa a viver mais para/ pelo outro (o seu filho 
deficiente físico). 
 
AS TRAJETÓRIAS DE VIDA DAS MÃES DE SUJEITOS COM DEFICIÊNCIA: 
QUANDO SER REALMENTE É PARA O OUTRO! 
Iniciamos a nossa conversa com os sujeitos da nossa pesquisa, citando uma 
frase da escritora Clarice Lispector: 
 “Para escrever tenho que me colocar no vazio” (LISPECTOR21, 1992, p. 33). 
E o que seria esse vazio? Perguntamos à Angelina, mãe de Allann com treze anos e 
com Síndrome de Down. Ela nos disse: 
Seria voltar lá no início da gravidez, com vinte e dois anos, sem um 
companheiro para me apoiar e só descobrir após o nascimento do 
meu filho que ele tinha síndrome de Down. 
Fizemos também a pergunta anterior para Valquíria, mãe do Rodrigo com 22 anos, 
vítima de acidente de trânsito. Ela nos respondeu: 
Colocar-me no vazio seria não seguir em frente após o diagnóstico do 
meu filho. Pensava que não conseguiria concluir um curso superior e 
cuidar dele ao mesmo tempo. Tive medo de ser dependente das 
pessoas para me ajudar nos cuidados quando precisasse sair e 
deixá-lo em casa. 
 
Ou seja, “se colocar” no vazio para a Angelina e Valquíria é voltar no tempo e 
sofrer as mesmas dores e (re) sentimentos do passado. 
Para Padilha22 (2007, p. 33), “as coisas não se dão de maneira linear, 
seguindo uma sequência harmoniosa e acumulativa. Há involuções, conflitos, idas e 
 
21 LISPECTOR, C. A hora da estrela. 20. ed. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1992. 
22 PADILHA, A. M. L. Práticas pedagógicas na educação especial: a capacidade de significar o 
mundo e a inserção cultural do deficiente mental. 4. ed. Campinas, SP: Autores Associados, 
2007. 
8 
 
voltas, ou seja, um emaranhado de fios que tecem a história das ideias”. 
Nesse sentido, a mãe encontra-se diante de si mesma, em um processo entre 
o filho bonito, inteligente e saudável idealizado durante a maternidade e o filho real 
com limitações e com uma deficiência ou transtorno global do desenvolvimento. 
A sociedade estabelece um padrão do que é normal. E a família, em especial 
as genitoras, tem dificuldades em aceitar no primeiro momento, que seus filhos não 
se enquadram nesse padrão de normalidade. 
Nesse mesmo caminho, concordamos com Padilha23 (2007, p.35) quando a 
autora afirma que “o que revela a anormalidade, a patologia, a deficiência ou o 
distúrbio, é o “não fazer”, o “não saber”, o “não conseguir” e o que “falta”, em um 
padrão hegemônico estabelecido pela sociedade”. 
Assim, nesse artigo, trazemos as narrativas de vida de duas mães de sujeitos 
com deficiência, que mesmo após um difícil período de aceitação/ adaptação do seu 
filho com deficiência, passam a lutar pela vida de seus filhos com uma força que 
advêm de seus filhos que, ao invés de limitadores por suas condições orgânicas, são 
molas propulsoras. 
NARRATIVA DE VIDA DE VALQUÍRIA24: MÃE DE UM ADULTO COM 
DEFICIÊNCIA FÍSICA 
Iniciamos a tecitura de uma parte da narrativa de vida de Valquíria com o 
relato/denúncia dessa mãe acerca do despreparo dos profissionais de saúde para 
dar a notícia sobre a deficiência dos pacientes aos parentes. Valquíria nos 
reproduziu a fala da médica após o acidente do seu filho: “Se sobreviver, será um 
bebê para sempre”. A mãe nos contou que esse “bebê” de 20 anos sobreviveu e 
hoje está em casa com a família. Após quase três meses de internação, ele estava 
de alta do hospital. 
Valquíria nos contou que a sensação de desamparo relatada por algumas 
mães poderia ser minimizada caso houvesse um cuidado maior ao transmitir o 
diagnóstico sobre a deficiência de seus filhos. Se as genitoras fossem após o 
diagnóstico, encaminhadas a psicólogos, psiquiatras e neurologistas para ouvirem, 
aconselharem e falarem mais a respeito da deficiência do seu filho. 
 
23 PADILHA, A. M. L. Práticas pedagógicas na educação especial: a capacidade de significar o 
mundo e a inserção cultural do deficiente mental. 4. ed. Campinas, SP: Autores Associados, 
2007. 
24
 Nome fictício. 
9 
 
Parafraseando Pino25 (2005), entendemos que para Valquíria no primeiro 
momento acontece um processo de participação fusional do “eu” no “outro,” no qual 
o “eu” perde-se no “outro”. Onde a mãe sabe que também precisa de atendimento 
médico, mas segue em frente assim mesmo para ajudar o seu filho. 
Valquíria se tornou sujeito da nossa pesquisa após o acidente de moto 
envolvendo o seu filho na época, com 20 anos. Embora diga que não consegue falar 
sobre o acidente, acaba relatando como vivia antes do dia 31 de agosto de 2012, 
onde estudava pela manhã, trabalhava à tarde e fazia curso de inglês aos sábados. 
Sobre o acidente, Valquíria nos contou: 
[...] Acho que a minha vida se dividiu... Sei lá... Porque depois do 
acidente eu passei a ficar no hospital acompanhando o meu filho 
durante dois meses e quinze dias. Parei tudo o que fazia. Eu lembro 
de que no dia do acidente a médica que o recebeu no hospital o 
diagnosticou com traumatismo crânio-encefálico grave, múltiplas 
fraturas dos membros superiores, afundamento de ace e duas 
paradas cardíacas. Uma frase que me marcou foi quando perguntei 
se meu filho ia ficar bom [...] A médica disse assim: “se sobreviver, 
ficará as sequelas e você terá um bebê para o resto da vida” 
(VALQUÍRIA). 
Concordamos, nesse sentido, com Padilha26 (2007), quando afirma que tudo 
é dado como pronto: assim é, porque assim é. Nenhum questionamento do modelo 
médico; nenhuma indagação sobre a vida das pessoas, sobre a história dos grupos 
sociais afetados pelos chamados distúrbios. 
Mesmo muito afetada pelas palavras dos médicos, Valquíria ressalta: 
Graças a Deus, fiquei com o bebê. Atualmente, com 22 anos, devido 
ao acidente, perdeu os movimentos dos membros inferiores e 
superiores do lado direito, o lado direito da face devido ao 
afundamento, ficou diferente do lado esquerdo, até o tom de voz 
mudou. Tenho a preocupação de fazer as matrículas das disciplinas 
pensando nos dias e horários de psicólogos, psiquiatras, 
fisioterapeutas, fonoaudiólogos e dentistas do Rodrigo (VALQUÍRIA). 
Assim, para Molon27 (2011), o homem não só se adapta à natureza, mas a 
transforma, e ao transformá-la transforma a si mesmo: ele sente, pensa, age, 
imagina, deseja. De forma análoga e entendendo seu filho Rodrigo como um ser 
humano com potencialidades, a mãe salientou: 
Tenho a preocupação de sempre avisar para ao Rodrigo o que vamos 
fazer durante o dia e recapitulo o que fizemos no dia anterior. 
Também aviso quem o acompanhará nos momentos em que estarei 
 
25 PINO, A. As marcas do humano. São Paulo: Cortez Editora, 2005. 
26 PADILHA, A. M. L. Práticas pedagógicas na educação especial: a capacidade de significar o 
mundo e a inserção cultural do deficiente mental. 4. ed. Campinas, SP: Autores Associados, 
2007. 
27 MOLON, S. I. Subjetividade e constituição do sujeito em Vygotsky. Petrópolis, RJ: Vozes, 
2011. 
10 
 
fora de casa e se ele está de acordo. Às vezes, ele não me responde 
e apenas faz gestos com a cabeça, ou caras e bocas. O Rodrigo 
muda muito de opinião. Às vezes acorda e não quer ver e nem falar 
com ninguém, apenas comigo (VALQUÍRIA). 
Nesse contexto, Bakhtin28 (1992) afirma que é insuficiente o discurso verbal 
para exprimirtudo aquilo que na verdade estamos querendo ou deixamos escapar 
ao nos comunicarmos com o nosso interlocutor. Sendo assim, mãe e filho passaram 
a fazer uso dos signos para se comunicarem de uma maneira em que só eles 
entendem. 
Ainda segundo Bakhtin29 (1992), é na dimensão extraverbal que estão 
contidos os elementos ideológicos da fala e os julgamentos de valor, que são, além 
de emoções individuais atos sociais regulares e essenciais. 
A mãe Valquíria nos conta sobre algumas adversidades no convívio social: 
Vimos umas camisas na vitrine de uma rede de lojas do Estado que 
estava em liquidação. Entramos e todos os olhares se voltaram para 
o meu filho, escolhemos umas camisas para ele quando fui levá-lo no 
provador masculino para vestir as camisas, o atendente da loja me 
falou que o provador era “masculino” então nos dirigimos para o 
provador feminino e o atendente me disse que meu filho não poderia 
entrar devido o provador ser “feminino”. Fiquei sem saber o que fazer! 
(VALQUÍRIA). 
Nesse contexto, Molon30 (2011) ressalta que a subjetividade e o sujeito são 
compreendidos na realidade social e na vida social, vista esta como primordialmente 
histórica. Nesse sentido, mãe e filho são cúmplices em meio a uma sociedade que 
ainda é separada por gêneros, onde até o espaço usado para provar roupas em uma 
loja precisa ser separado e nomeado. 
Após o ocorrido, perguntei ao Rodrigo se ele poderia tirar a camisa ali 
mesmo onde estávamos no meio da loja e próximo ao caixa. Ele 
sorriu e aceitou na hora. Foi o que fizemos e ele vestiu varias 
camisas, de todas as cores e modelos... (VALQUÍRIA). 
Quando Valquíria sugeriu ao filho que trocasse de camisa na frente de todos 
sem usar o provador “masculino” ou “feminino”, não foi por falta de conhecer seus 
direitos como mãe de um rapaz com deficiência ou mesmo como cidadã. Ela quis 
mostrar para o seu filho que ele faz parte das práticas sociais, independente de 
gênero, cor, raça ou religião. 
 
28 BAKHTIN, M. Marxismo e Filosofia da Linguagem. São Paulo: Hucitec, 1992. 
29 BAKHTIN, M. Marxismo e Filosofia da Linguagem. São Paulo: Hucitec,1992. 
30 MOLON, S. I. Subjetividade e constituição do sujeito em Vygotsky. Petrópolis, RJ: Vozes, 
2011. 
11 
 
Ainda segundo Molon31 (2011), não se trata de inserir o sujeito na realidade 
social, pois este é o seu lugar, ele é o sujeito da atividade, mas de operar com 
processos psicológicos constituídos no social, que ao mesmo tempo se diferenciam 
dele. 
Araújo32 (2014, p. 69), nesse contexto, enfatiza que os caminhos para a 
aprendizagem e o desenvolvimento percorridos pelos sujeitos com deficiência não 
são os mesmos que aqueles sem deficiência traçam. Quando Valquíria cita a 
dificuldade que encontrou ao sair com o seu filho para comprar camisas para ele, 
lembramo-nos dessa citação anteriormente exposta, uma vez que o caminho 
percorrido pelo indivíduo com deficiência parece sempre ser o mais tortuoso... Mas 
ele deve ser trilhado! Nesse processo a família e, mais especificamente na nossa 
pesquisa, as mães dos sujeitos com deficiência são exímias protagonistas. 
Ao falar sobre os estudos e a vida „corrida‟ que leva, Valquíria destaca: “Fico 
com a consciência pesada... Mas sei que preciso concluir o curso e trabalhar para 
dar melhor condição de vida para os meus filhos”. A fala anterior vai ao encontro dos 
pressupostos defendidos por Vigotski33 (2003, p. 42). O autor afirma que “temos 
consciência de nós mesmos porque a temos dos demais, nesse sentido, a mãe 
sente a necessidade de mudar a sua condição social em benefício dos filhos”. 
A partir do relato de Valquíria nos sensibilizamos quanto ao despreparo de 
alguns profissionais para lidar com a deficiência dos pacientes, principalmente no 
que tange à forma de explicar para a família sobre as sequelas advindas de um 
acidente. Além disso, ressaltamos a importância de um atendimento psicossocial 
mais exitoso e eficaz no atendimento às mães de sujeitos que se tornaram 
deficientes (por acidentes). 
“Sinto-me sem amparo! Parece que os profissionais da saúde acham que é 
frescura... Sei lá... Não entendem que temos dúvidas... Que nunca tive um filho 
assim! Que faço muitas outras coisas também!” (VALQUÍRIA). 
Valquíria nos contou que o curso de pedagogia nunca foi um limitante no 
processo de cuidar e estar com seu filho deficiente. Ela nos disse que tem restrições 
 
31 MOLON, S. I. Subjetividade e constituição do sujeito em Vygotsky. Petrópolis, RJ: Vozes, 
2011. 
32 ARAÚJO, M. P. M. Para além do biológico, o sujeito com a Síndrome de Klinefelter. 2014. 
Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-graduação em Educação, Universidade 
Federal do Espírito Santo, Vitória, 2014. 
33 VIGOTSKI, L. S. A formação Social da mente: O desenvolvimento dos processos psicológicos; 6° 
edição. São Paulo: Martins Fontes, 2003. 
12 
 
de horários, mas que as disciplinas, as leituras dos textos e a vivência com a 
diversidade no campo educacional têm potencializado ações junto ao seu filho. Ela 
ressaltou que nunca pensa no filho como um inválido, mas pensa nas suas 
potencialidades. 
 
NARRATIVA DE VIDA DE ANGELINA34: MÃE DE UMA CRIANÇA COM A 
SÍNDROME DE DOWN 
 
Angelina, hoje com 36 anos, é universitária (graduanda em pedagogia do 8º 
período) e possui dois filhos. É mãe de uma menina com três anos e de um menino 
de treze anos com síndrome de Down. 
Angelina estava com vinte e dois anos quando engravidou de seu primeiro 
filho. 
A mãe Angelina nos contou: 
 
 Na primeira ultrassonografia o Doutor me fez um monte de pergunta. 
Fiquei preocupada, por fim, disse que era um menino, então eu 
insisti: perguntei se tinha algum problema, entretanto, ele tornou 
afirmar que se tivesse algum problema meu médico iria me falar. 
Analisando melhor essa fala, destacamos o despreparo dos profissionais da 
área da saúde, em orientar essa mãe. Ao decorrer de sua fala, foi possível perceber 
que houve uma ausência de explicações para ela, e lhe foi negado o direito de saber 
que seu filho nasceria com Síndrome de Down. 
Quando nasceu, em dezenove de janeiro do ano de dois mil e um, na 
maternidade, no momento de seu nascimento de parto normal, eu 
estava lúcida. Assim, pude perceber a expressão do médico de 
susto/espanto. Todos viraram de costas pra mim, assim, sabia que 
algo estava errado. Foram feitos os procedimentos comigo e ele 
nada, a enfermeira colocou ele para que eu pudesse vê-lo e me 
perguntou como iria se chamar, então fui pro quarto, mas não pude 
vê-lo ou ficar com ele junto de mim. A enfermeira disse que ele tinha 
que ficar em observação porque tinha um probleminha e que deveria 
esperar a médica passar. Foi muito ruim aquele momento! Outras 
mães tinham seus filhos em seus braços e estavam amamentando e 
eu, não! estava sozinha. No outro dia, na hora da visita, quando o 
meu marido chegou, nos deram a notícia e eu pude tê-lo em meus 
braços (ANGELINA). 
 
Ao considerar que outras mães vivenciam uma experiência semelhante, ou 
talvez pior, e ao comparar-se com elas, a mãe lança-se num viver e fazer por e para 
 
34
 Nome fictício. 
13 
 
o filho deficiente, relatando que ao invés de ficar se lamentando, buscou se erguer e 
encarar o desafio. 
Por amor e desejo de dar ao Allan a oportunidade de desenvolver 
suas possibilidades, reabilitação, educação, entre outros recursos, na 
certeza de estar fazendo o que deve ser feito, mesmo que isso traga 
a ela desgaste físico e emocional (ANGELINA). 
Houve a necessidade de deixar o trabalho paraatender às necessidades de 
cuidado do filho com deficiência, e também devido à dificuldade inicial em lidar com 
os sentimentos, anseios e conflitos vividos. Sentiu-se incapaz de levar uma vida 
como levava antes da chegada do filho e, assim, abre mão de seu emprego e fica só 
por conta de cuidar do seu filho. 
Nesse sentido, concordamos com Molon35 (2011), quando enfatizamos que o 
sujeito adquire singularidade na relação com o outro e em relação ao outro. 
A mãe compreende que a situação emocional gerada pela deficiência do Allan 
atinge também os familiares mais próximos e que tal experiência colabora para a 
união da família, que se mobiliza no sentido de ajudar a cuidar. Ao conviver com a 
criança com deficiência, a família descobre que não há receitas ou maneiras 
específicas para o relacionamento com ele, a não ser que é preciso ter um pouco 
mais de paciência, força, persistência e carinho. 
Matriculei-o numa escolinha infantil. Foi complicado... A dona da 
creche o aceitou, mas deixou claro que a escola não estava 
preparada pra lidar com ele. Durante os dois anos que ele ficou lá, a 
diretora me dizia que o Allann deveria estar em uma escola especial e 
nesses dois anos, eu passei dizendo sim, eles estavam certos. 
Entretanto, as escolas funcionam, mas que no caso dele como era 
muito pequeno só ia lá pra fazer tratamento específico como fono, 
fisioterapia e estimulação, três vezes na semana, no horário da tarde 
quando não está na escola (FALA DE ANGELINA). 
Angelina relata que se interessou pelo curso de pedagogia após acompanhar 
o processo de aprendizagem e desenvolvimento de seu filho, na APAE36 do 
município de Serra. Relata também que recebeu muitos incentivos dos profissionais 
dessa instituição para voltar a estudar. 
É importante dizer que, a partir de nossas observações a campo e de nossas 
entrevistas, o filho de Angelina se tornou a mola propulsora para o desenvolvimento 
dela como professora e pesquisadora e, assim, abriram-se novos outros possíveis 
em sua vida. Mesmo que logo após o nascimento de seu filho, a mãe, no primeiro 
 
35 MOLON, S. I. Subjetividade e constituição do sujeito em Vygotsky. Petrópolis, RJ: Vozes, 
2011. 
36
 Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais. 
14 
 
momento, se viu perdida em um emaranhado de dúvidas e receios, conseguiu 
buscar forças com apenas vinte e dois anos e com um filho com síndrome de Down. 
Concordamos com Araújo37 (2014), nesse mesmo caminho, quando afirma 
que a elaboração cognitiva é formada na relação com o outro, portanto, a 
aprendizagem da cultura através da interação eu-outro é o divisor de águas no que 
tange ao desenvolvimento pleno do ser humano. 
 
ALGUMAS TECITURAS 
 
Por meio desse trabalho foi possível compreender os sentimentos, as dúvidas 
e temores dessas mães ao constatar que seus filhos possuem algum tipo de 
deficiência. Mas o que nos motivou a escrever cada linha desse texto foi a 
determinação dessas mães ao enxergarem seus filhos para além da condição 
orgânica. Nas falas delas observamos muitos pensamentos que convergem para um 
olhar sócio-histórico... Essas mães trabalham as possibilidades e não se limitam às 
deficiências de seus filhos. 
A partir da pesquisa realizada e da escrita desse trabalho, pensamos com 
Vigotski e outros colaboradores da perspectiva sócio-histórica sobre a importância 
das mães dos sujeitos com deficiência para a constituição identitária de seus filhos e 
a troca mútua de saberes que ocorre. Entendemos que o „eu‟ só se manifesta na 
relação dialógica eu-outro que ocorre nessa dimensão social e culural, nesse 
caminho, ser mãe de um sujeito com deficiência só é possível „sendo‟, uma vez que 
a limitação, as barreiras que se tornaram transponíveis representam molas 
propulsoras para a aprendizagem e desenvolvimento dos filhos e, certamente, das 
mães. 
Além de superar o trauma do diagnóstico com a deficiência dos filhos, essas 
mães buscam meios sejam nas clínicas médicas, ministérios públicos, escolas e a 
comunidade em geral para que esses indivíduos não sejam rotulados por palavras, 
mas que sejam reconhecidos como sujeito de direitos. 
Assim, fica exposto o diferencial neste trabalho: dar voz e vez a estas mães 
que se dedicam integralmente aos seus filhos sem abrir mão de se tornarem 
profissionais, estudando em uma universidade. Entendemos que a escola comum 
 
37 ARAÚJO, M. P. M. Para além do biológico, o sujeito com a Síndrome de Klinefelter. 2014. 
Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-graduação em Educação, Universidade 
Federal do Espírito Santo, Vitória, 2014. 
15 
 
deve ouvir a voz dessas mães de sujeitos com deficiência para (re) pensar as suas 
práticas pedagógicas. 
Nesse momento, gostaríamos de remeter a nossa discussão ao título do 
presente estudo. Parafraseamos Bakhtin38 (2003) e Souza39 (2003), porque 
entendemos que ser mãe de um sujeito com deficiência (sendo!) realmente é ser 
para o outro. Nesse processo de relações interpessoais, ao ser para o outro, a mãe 
é para si (mesma), assim, assume uma identidade que é, ao mesmo tempo, 
individual e social. 
Finalizamos nossas tecituras e não o debate da constituição subjetiva das 
mães dos sujeitos com deficiência, parafraseando Freitas40 (2013). Desenvolver uma 
atitude “inclusiva” não significa apenas conduzir sujeitos para dentro de disciplinas e 
fronteiras acadêmicas, até porque ele é um ser ativo em vários outros espaços... é, 
portanto, um ser social e cultural! “O que está em questão é enxergar o outro sem 
reduzi-lo às marcas de seu corpo; às mutilações que sofreu ou as ineficiências que 
seu organismo expõe quando comparado a outro” (FREITAS41, 2013, p.17). Assim 
fazem as mães dos sujeitos com deficiência de nossa pesquisa: Tentam enxergar 
seus filhos para além das marcas fenotípicas deixadas por um acidente ou pela 
própria constituição genética... 
 
 
ABSTRACT 
This work aims to understand a part of the life stories of mothers of individuals with disabilities. For this 
goal to be achieved, we used the methodology of living history, immersed in a socio-historical 
perspective, as well we believe we can, through it, to better understand the subjective constitution of 
individuals. For data collection, we use the semi-structured interview biographical type. The choice of 
these subjects was based on the intersection of their life narratives: they have disabled children, one 
with Down syndrome and another with physical and intellectual disabilities, a university and studying 
Pedagogy. One consideration to be woven from this study is that SER mother of a disabled person is 
only possible BEING, since the dialogical relations MOTHER-SON occurring in the process are crucial 
to the identity construction of 'I'- mother and 'other'- son. Furthermore, we understand that the 
pedagogical practices in the common school should be (re) designed from the look of these mothers. 
 
 
38 BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 2003. 
39 SOUZA, S. J. e. Dialogismos e alteridade na utilização da imagem técnica em pesquisa acadêmica: 
questões éticas e metodológicas. In: FREITAS, M. T. F.; SOUZA, S. J. e; KRAMER, S. Ciências 
Humanas e Pesquisa. 1. ed. São Paulo: Cortez, 2003. 
40 FREITAS, M. C. de. O aluno incluído na educação básica: avaliação e permanência. São 
Paulo: Cortez, 2013. 
41 FREITAS, M. C. de. O aluno incluído na educação básica: avaliação e permanência. São 
Paulo: Cortez, 2013. 
 
16 
 
 
KEYWORDS: MOTHERS. LIFE STORY. PERSPECTIVE SOCIO-HISTORICAL.REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 
 
ARAÚJO, M. P. M. Para além do biológico, o sujeito com a Síndrome de Klinefelter. 2014. 
Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-graduação em Educação, Universidade 
Federal do Espírito Santo, Vitória, 2014. 
 
BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 2003. 
 
BAKHTIN, M. Marxismo e Filosofia da Linguagem. São Paulo: Hucitec,1992. 
 
DRAGO, R. SANTOS, C. R. dos. História de vida na pesquisa com adultos com deficiência: algumas 
reflexões. Educação: Teoria e Prática. Rio Claro. Vol. 23, n.44. p. 81-94/ Set-Dez. 2013. 
 
DRAGO, R. Síndromes: conhecer, planejar e incluir. Rio de Janeiro: Wak Editora, 2012. 
 
FREITAS, M. C. de. O aluno incluído na educação básica: avaliação e permanência. São Paulo: 
Cortez, 2013. 
 
FREITAS, M. T. A. A abordagem sócio-histórica como orientadora da pesquisa qualitativa. Cadernos 
de Pesquisa, Fundação Carlos Chagas, n. 116, jul. 2002. 
 
GONZALEZ REY, F. L. Sujeito e subjetividade. São Paulo: Thomson, 2003. 
 
LISPECTOR, C. A hora da estrela. 20. ed. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1992. 
 
MOLON, S. I. Subjetividade e constituição do sujeito em Vygotsky. Petrópolis, RJ: Vozes, 2011. 
 
PADILHA, A. M. L. Práticas pedagógicas na educação especial: a capacidade de significar o 
mundo e a inserção cultural do deficiente mental. 4. ed. Campinas, SP: Autores Associados, 
2007. 
 
PINO, A. As marcas do humano. São Paulo: Cortez Editora, 2005. 
 
SILVA, A. P.; BARROS, C. R.; NOGUEIRA, M. L. M.; BARROS, V. A. “Conte-me sua história”: 
reflexões sobre o método de História de Vida. Revista do Centro Acadêmico de Psicologia da 
FAFICH/UFMG, Belo Horizonte, v. 1, n. 1, p. 25-35, 2007. 
 
SOUZA, S. J. e. Dialogismos e alteridade na utilização da imagem técnica em pesquisa acadêmica: 
questões éticas e metodológicas. In: FREITAS, M. T. F.; SOUZA, S. J. e; KRAMER, S. Ciências 
Humanas e Pesquisa. 1. ed. São Paulo: Cortez, 2003. 
 
VIGOTSKI, L. S. A formação Social da mente: O desenvolvimento dos processos psicológicos; 6° 
edição. São Paulo: Martins Fontes, 2003. 
 
VIGOTSKI, L. S. Psicologia Pedagógica. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
17

Continue navegando