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Marcadores Genéticos na Biologia Forense

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INTRODUÇÃO
Este trabalho tem por objetivo apresentar qual o papel dos marcadores genéticos na biologia forense, que atualmente tem sido de grande auxílio na identificação de suspeitos e vitimas de crimes, vitimas de catástrofes e testes de paternidade. 
O estudo dos polimorfismos do DNA teve grande avanço cientifico a partir dos anos 90 do século XX, o que contribuiu para que a biologia molecular e a aplicação da biotecnologia fossem aplicadas como principal ferramenta em um crescente e diversificado leque de contextos, como os citados acima.
	Como exemplo de biotecnologia utilizado para conhecimento dos cidadãos podemos citar o método da biometria, que através de características físicas, nomeadamente padrões da retina, impressões digitais, perfis de DNA e reconhecimento da face. (Aas, 2006; Adey, 2004).
Também serão tratadas neste trabalho as técnicas utilizadas para a coleta do material genético a ser utilizado na análise de identificação de DNA. 
IMPORTÂNCIA DA ANÁLISE DO DNA
Por empregar técnicas extremamente sensíveis e também pela estabilidade química e térmica do DNA, que mesmo após um longo período de tempo ainda permite obter padrões genéticos individuo-especifico que podem ser comparados com os da vitima ou suspeito em casos de infração penal, a análise do ácido desoxirribonucleico se tornou indispensável como parte da rotina para estudos de casos forenses. 
Através das condições e disposições das diversas amostras biológicas no local dos fatos é possível reconstruir com bastante precisão a dinâmica do evento criminal derivado da pericia forense, em relação às seguintes áreas:
Identificação de suspeitos em casos de crimes sexuais; investigação de paternidade nos casos de gravidez por estupro;
Identificação de partes e órgãos de cadáveres mutilados, carbonizados e em decomposição já esqueletizados, inclusive para esclarecimento de outros crimes;
Estabelecer relações entre suspeitos e locais de crimes, de um local do crime com outro e entre instrumento lesivo e vitima através da produção de perfis de DNA a partir do material biológico (pele, sangue, pelos, etc.) encontrado na cena do crime ou presente em objeto relacionado ao crime.
A análise do DNA tem sido entendida como uma técnica que pode substituir as tradicionais bases de dados de impressões digitais, utilizadas desde o início do século xx na área da investigação criminal e da identificação civil (Doutremepuich 1998), por se acreditar que constitui uma estrutura biológica que é exclusiva de cada indivíduo (exceto em casos de gêmeos monozigóticos).
Porém para que a técnica de identificação pelo DNA seja corretamente realizada a amostra biológica que será analisada precisa de certos cuidados: deve ser corretamente escolhida, transportada, coletada e armazenada. (Silva & Passos, 2006).
Atualmente, além das amostras sanguíneas uma grande quantidade de materiais biológicos pode ser utilizada na determinação do perfil biológico como: saliva, urina, esperma, pelos, dentes, ossos secreções e outros fluidos relacionados a ocorrências criminais.
Além disso, tendo como exemplo outros países, a criação de um banco de dados com perfis genéticos dos vestígios analisados e de criminosos condenados vem contribuindo com a elucidação de delitos.
VANTAGENS DO EXAME DE DNA SOBRE OS TESTES TRADICIONAIS
Várias são as vantagens do DNA sobre a sorologia tradicional que foram apresentadas por Weedn; Swarnen (1998), sendo a primeira e principal delas a sua aplicabilidade sobre toda e qualquer forma de material biológico, enquanto que um exame sorológico completo pode ser realizado apenas em sangue.
A segunda vantagem do DNA é seu potencial discriminatório, pois em alguns casos, seus estudos podem revelar a identificação positiva, em relação aos exames sanguíneos, que tem a capacidade de identificar um entre três indivíduos da população geral, atingindo valores de um em alguns bilhões ou mais.
A terceira vantagem da análise de DNA é a sensibilidade do exame, pois a tipagem do polimorfismo do DNA através da reação em cadeia da polimerase (PCR) pode ser efetuada com o DNA de poucas células, superando assim a sensibilidade dos exames tradicionais.
Como quarta vantagem o DNA apresenta a resistência aos fatores ambientais. Por ser uma molécula robusta, relativamente resistente a ácidos, álcalis e detergentes e sua informação é encontrada na sequencia nucleotídica. Dessa forma os exames de DNA podem ser realizados em amostras muito antigas e que tenham sido expostas a maiores agressões ambientais.
Por fim, a quinta vantagem desse tipo de exame diz respeito à possibilidade de se poder separar o DNA da célula espermática de qualquer outro DNA celular. Um dos problemas históricos nos estudos de vestígios de violência sexual é a presença de outro liquido corporal junto ao sêmen, o que cria uma dificuldade para os exames sorológicos tradicionais, pois em aproximadamente dois terços dos casos não se consegue identificar o sêmen do doador, pelo fato da mistura de fluidos biológicos gerarem uma mistura de tipos sorológicos (DAVIES, 1982). Porém, através do exame de DNA é possível separar o DNA do sêmen do não espermático por lise diferencial de membranas, assim é possível individualizar a fonte do sêmen sem confundi-lo com os dados do não-semen contidos no vestígio.
ANÁLISES DE DNA COADJUVANTES
Quando um perfil genético vindo de uma cena do crime não encontra combinação com as amostras-referência ou com as contidas em um banco de dados, qualquer informação a ser deduzida deste DNA sobre seu doador é útil, sendo que a informação do sexo do doador é um item básico. 
Grandes variações genéticas têm sido encontradas nas populações humanas. Porém indivíduos de diferentes populações são, em média, um pouco mais diferentes entre si do que indivíduos da mesma população, e assim conjuntos de marcadores genéticos podem ser usados para predizer qual a população de origem e isto pode ser aplicado para analisar as amostras oriundas de locais de crime (BAMSHAD et al., 2004).
Uma forte predição da população de origem pode indicar alguns aspectos fenotípicos, dentre eles a cor da pele. Porém, testes genéticos diretos podem ser mais uteis, pois muitos fenótipos humanos tem um forte componente genético, como estatura, características faciais e pigmentação. Atualmente as investigações sobre a pigmentação têm sido levadas mais a serio, e o gene mais estudado é o MC1R (melanocortin 1 receptor), que está ligado à produção de melanócitos. Outros genes têm sido testados com menos sucesso, como é o caso dos relacionados com a cor dos olhos. Entretanto, a complexidade da herança quantitativa associada a esses genes e o conjunto de variações que ocorre por diferenças ambientais e nutricionais que podem influenciar na expressão gênica faz com que estes testes não sejam determinativos (JOBLING; GILL, 2004).
EVOLUÇÃO DAS TÉCNICAS UTILIZADAS NA IDENTIFICAÇÃO HUMANA
A evolução da genética forense se deu através da analise das variações genéticas, que começaram a ser descritas no inicio do século XX pelo médico e biólogo austríaco Karl Landsteiner sobre grupos de polimorfismos do sistema ABO no sangue humano e pela rápida compreensão de que essas variações poderiam auxiliar na descoberta de crimes. 
No DNA apenas algumas regiões são analisadas, sendo essas aquelas que apresentam maior variação individual e facilidade de estudo. Tais regiões são denominadas de marcadores genéticos ou moleculares, e esses podem ser usados para caracterizar o DNA de um individuo em um padrão ou perfil de fragmentos que lhe é particular. Neste caso são usados marcadores polimórficos, regiões que apresentam mais de um alelo por lócus; em loci forense, o alelo mais comum tem a frequência menor que 0,6 (DUARTE et al., 2001).
Até a década de 1980 quando se desejava amplificar um trecho da molécula de DNA os cientistas lançavam mão de uma tecnologia desenvolvida por Cohen e Boyer que nada mais era do que um recurso de clonagem molecular. Neste método primeiro isolava-seo trecho de DNA em foco a ser amplificado utilizando enzimas de restrição. Estas enzimas também chamadas de endonuclease de restrição têm origem de procariotos e atuam como "tesouras moleculares", reconhecendo sequências de pares de bases específicas em moléculas de DNA e cortando-as nesses pontos.
	Depois de isolar o trecho desejado este era inserido no plasmídeo de uma bactéria que foi cortado e aberto em determinado ponto para que a inserção pudesse ser realizada. Tal plasmídeo modificado ou DNA recombinante era colocado dentro de uma célula bacteriana e esta ao se duplicar replicava o próprio material genético e consequentemente o segmento de DNA inserido. Assim, esperava-se que essas bactérias se multiplicassem o suficiente para obter uma quantidade razoável do trecho desejado. Tal segmento era purificado pela separação da massa total de DNA da população de bactérias formada. Podemos verificar como era realizado esse processo na figura 1.
	Este procedimento era muito trabalhoso e demorado, pois além do inconveniente de ter de lidar com bactérias levavam-se dias para conseguir uma significativa quantidade de DNA amplificado.
Figura 1 – Clonagem molecular, modelo de Cohen e Boyer.
A definição de Genética como a ciência da hereditariedade e da variação foi proposta por Batelson em 1905. Porém, Weissman já havia reconhecido em 1885 a base física da Genética ao diferenciar somatoplasma e germoplasma, classificando assim os diferentes tecidos que compõem o organismo daqueles relacionados com as células germinativas, que são responsáveis por garantir a continuidade genética do indivíduo. (CALABREZ, 1999).
Em 1983 foi inventado, por um bioquímico estadunidense chamado Kary Mullis, uma técnica conhecida como PCR (Polymerase Chain Reaction – Reação em Cadeia de Polimerase) que consiste num método de replicação in vitro de um trecho de DNA de forma extremamente rápida. Utilizando esta técnica quantidades mínimas de material genético podem ser amplificadas milhões de vezes em poucas horas, permitindo a detecção rápida e fiável de marcadores genéticos. 
A PCR funciona de acordo com o princípio natural de replicação do DNA (figura 2), dessa forma um ciclo de PCR consiste de três passos:
Figura 2 – Molécula de DNA
Desnaturação: a cadeia de DNA é separada em dois filamentos através da elevação da temperatura, geralmente > 90°C. Isso ocorre porque as pontes de hidrogênio que ligam os dois filamentos da molécula são ligações relativamente fracas. Podemos observar esse processo na figura abaixo.
Figura 3 – Desnaturação, através da quebra das pontes de hidrogênio.
Hibridização: o objetivo da PCR é replicar a sequência desejada do DNA que é única no organismo, sendo que essa sequência tem suas extremidades marcadas pelos primers, que são curtas sequencias sintéticas de nucleotídeos. Em uma reação de PCR são incluídos dois primers para cada cadeia simples de DNA que foi produzida durante o processo de desnaturação, sendo assim o inicio da sequencia de DNA alvo é marcada pelos primers que se hibridizam com a sequência complementar. A temperatura desse processo varia entre 40°C e 60°C, e é através dela que as sequencias iniciadores se ligam a sequencia alvo de forma extremamente especifica, como vemos na figura 4.
Figura 4 – Processo de hibridização.
Extensão: depois que os primers já se ligaram às sequências complementares de DNA a temperatura se eleva até aproximadamente 72°C e a enzima Taq polimerase replica a cadeia de DNA (figura 5). Esta enzima é uma polimerase de DNA termo-estável recombinante do organismo Thermus aquaticus, uma bactéria encontrada em fontes hidrotermais, que ao contrário de outras polimerases se mantém ativa á temperaturas elevadas. O processo de síntese é iniciado na zona onde estão ligados os primers, incorporando os nucleotídeos complementares à sequência alvo e utilizando as dNTPs em solução. A extensão inicia-se no extremo 3’ do primer, criando uma cadeia dupla a partir de cada uma das cadeias simples. A Taq polimerase, entretanto sintetiza exclusivamente no sentido 5’ – 3’.
Figura 5 – Processo de Extensão realizado pela Taq polimerase.
Ao final do processo de PCR são encontrados duas cadeias de DNA idênticas à cadeia original.
A tipagem molecular de material genético foi utilizada oficialmente pela primeira vez na Inglaterra de 1985 pelo geneticista Alec Jeffreys, que colheu o esperma encontrado em uma vitima de estupro e fez o exame de DNA. Através da comparação dessa amostra de DNA com a análise do sangue colido do suspeito Jeffreys foi capaz de comprovar a culpabilidade do viajante que tinha sido responsável pelo estupro. (Amabis & Martho, 1995).
A partir desse caso que ficou conhecido como Enderby (Queen v. Pitchfork) a Criminalística e a Medicina Forense tem utilizado a técnica de tipagem molecular do DNA como uma arma potente no esclarecimento de diversos delitos e na identificação humana (Moura-Neto, 1998).
Uma fração de DNA repetido é formado por regiões denominadas minissatélites ou repetição em tandem de número variável (VNRT – “variable number of tandem repeats”). Esses VNRTs exibem uma enorme variabilidade e são constituídos de 9 a 100 pares de bases repetidos sequencialmente em loci cromossômico.
As primeiras sequências VNRT descritas tiveram uso na genética forense e também no mapeamento do genoma humano. Foi Alec Jeffreys, em 1985, também o responsável por conceber o termo “DNA fingerprint”, ou perfil de DNA, que demonstra a alta variabilidade destas regiões do genoma, de forma que é improvável a existência de dois indivíduos com o mesmo perfil genético, a não ser no caso de gêmeos monozigóticos. 
Esses marcadores VNRT são analisados através da técnica RFLP (“restriction fragment lenght polymorphism” – polimorfismo de comprimento de fragmentos de restrição), que se baseia em mutações que alteram sequências no DNA de um indivíduo, de modo que enzimas de restrição perdem a capacidade de clivar tal DNA em posições ainda suscetíveis à clivagem nos DNAs de outros indivíduos. Dessa forma indivíduos podem ser identificados pelo comprimento da sequência de VNRT do DNA gerado após a ação de uma enzima de restrição.
A metodologia consiste em extração de DNA genômico e digestão com enzima de restrição. As mais utilizadas são Hae III, Pst I e Hinf I. Em seguida, os produtos da digestão são separados em gel de agarose, desnaturados e transferidos para membrana própria para hibridização, técnica esta denominada Southern-blot. Uma sonda quimioluminescente, ou marcada radioativamente, complementar às sequências VNTR é, então, utilizada para, através de hibridização, detectar as sequências alvo. Os alelos VNTR, identificados pelas sondas, são visualizados após sensibilização de filmes de raios-X. A mesma membrana, com o DNA fixado, pode ser utilizada para hibridizações sequênciais com diferentes sondas, específicas para sequências VNTR em diferentes cromossomos. Observe a sequência dessa técnica na imagem abaixo.
Essa técnica porém é mais utilizada em testes de paternidade, pois requer um DNA integro e em grande quantidade o que dificulta sua utilização em amostras biológicas antigas, degradas ou com pouca quantidade de DNA, sendo assim pouco utilizada em investigações genéticas atualmente.
Figura 6 - Polimorfismo de Comprimento de Fragmentos de Restrição
Atualmente a técnica mais utilizada em investigações genéticas utiliza o método de STR (“short tandem repeats”), que estuda regiões repetitivas de DNA chamadas de microssatélites. Devido ao seu pequeno tamanho alelos STR podem ser analisados após sua amplificação pela técnica de PCR, dessa forma é possível realizar a tipagem do DNA utilizando quantidades mínimas de amostras, ou que apresentem certo grau de degradação. Assim a possibilidade de realizar analise do loci STR superou várias limitações inerentes á manipulação de sequências VNRT.
Locus STR analisado individualmente não apresenta poder de discriminação comparável ao locus VNTR. No entanto, a análise conjunta de regiões STR proporciona resultadosaltamente satisfatórios. Desta forma, na tipagem de regiões STR, através da técnica PCR, são utilizados, usualmente, sistemas multiplexes, onde vários pares de “primers” orientam simultâneas reações de amplificação, gerando produtos de múltiplos loci. Os alelos amplificados são separados em eletroforese em gel de poliacrilamida.
Com o avanço da tecnologia, foram desenvolvidos processos automatizados para análise de loci STR. Acoplou-se a produção de primers marcados com diferentes corantes fluoróforos e sistemas de detecção a laser em aparatos de separação eletroforética. Os produtos de PCR marcados com fluorocromos podem ser detectados em tempo real mediante eletroforese capilar ou pode-se realizar a detecção pós-eletroforética em escâner de fluorescência.
BANCO DE DADOS CRIMINAL
É utilizado para fazer comparação de perfis genéticos obtidos de suspeitos com os cadastrados no banco e identificação de criminosos a partir de outros crimes. A tecnologia em questão pode ser usada para provar tanto inocência como culpabilidade, identificar restos mortais e amostras biológicas. 
Atualmente usa-se o Sistema CODIS (Combined DNA Index System) do FBI/EUA, que preconiza no mínimo 13 regiões de STR (SILVA & PASSOS, 2006).
CONCLUSÃO
Com o avanço da ciência e o estudo cada vez maior da área de biologia molecular, as técnicas de identificação genética tem se aprimorado cada vez mais se tornando uma ferramenta de grande importância para as investigações criminais.
Em comparação as técnicas usadas anteriormente a tipagem molecular do DNA ganha destaque por sua facilidade em relação aos tipos de amostras biológicas que podem ser analisadas, e também na precisão do resultado.
BIBLIOGRAFIA
http://www.roche.pt/ - Visitado em 11 de junho de 2015.
 http://www.crbm1.gov.br/ - Visitado em 11 de junho de 2015.
Saúde e Ambiente em revista – DNA forense, artigo de revisão. Luciana Cresta Dolinsky e Lissiane Miranda Campelo Veras Pereira. Ciências Biológicas – IBC, Universidade do Grande Rio-Unigranrio. 2007.
Bio - Volume Único - 3ª Ed. 2013 – Lopes, Sônia.
Confiança, voluntariedade e supressão dos riscos: expectativas, incertezas e governação das aplicações forenses de informação genética. Helena Machado e Susana Silva.
Aplicação do exame de DNA na elucidação de crimes. Norma Sueli Bonaccorso. Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. 2005.
 
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