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2000 anos de cristianismo carismático

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Prévia do material em texto

Diretora	Executiva:	Luciana	Avelino
Cunha
Diretor	Editorial:	Renato	Cunha
Tradução:	Rafael	Resende
Revisão:	Eliana	Moura
Copidesque:	Renato	Cunha
Capa	e	diagramação:	Marina	Avila
1ª	edição:	2018
	
Direitos	de	imagens:
Manuscrito:	FJ	Brechtel,	Bamberg	State	Library
Joseph	Badger:	Henry	Augustus	Loop,	Princeton	University	Art
Museum
George	Whitefield:	Harvard	University	Portrait	Collection
Charles	Finney:	Christian	History	vol.	VII,	n.	4,	issue	20
Pandita	Ramabai:	J.	B.	Rodgers	printing
Dwight.	L.	Moody:	Barron	Fredricks,	NYC.
D11791	U.S.	Copyright	Office
John	Wesley:	Whitemay,	Istockphoto
	
Dados	Internacionais	de	Catalogação	na	Publicação	(CIP)
Ficha	Catalográfica	elaborada	pela	bibliotecária	Maria	Jucilene	Silva	dos	Santos	CRB-15/722
H992d
Hyatt,	Eddie	L.
2000	Anos	de	Cristianismo	Carismático	:	um	olhar	do	século	21	na	história	da	igreja	a	partir	de
uma	perspectiva	carismático-pentecostal	/	Eddie	L.	Hyatt	;	tradução	de	Rafael	Resende	;	revisão	de
Eliana	Moura.	–	Natal,	RN	:	Carisma,	2018.
260	p.	;	16x23cm.
ISBN	978-85-92734-08-4
1.	Dons	do	Espírito	Santo	-	História.	2.	Cristianismo	carismático	-	História.	3.
Pentecostalismo.	I	Resende,	Rafael,	trad.	II.	Moura,	Eliana,	rev.	III.	Título.
CDU	234-15(091)
editoracarisma.com.br	|	sac@editoracarisma.com.br
Copyright	©	2018	em	língua	portuguesa	para	Editora	Carisma.	Direito	exclusivo	de	distribuição	em	todo
mundo	(worldwide).	Originalmente	publicado	em	inglês	pela	Charisma	House,	Charisma	Media/Charisma
House	Book	Group,	600	Rinehart	Road,	Lake	Mary,	Florida	32746	sob	o	título	“2000	Years	of
Charismatic	Christianity”	Copyright	©	2002	by	Eddie	L.	Hyatt.	Todos	os	Direitos	Reservados.
Sumário
Reconhecimentos
Prólogo
Prefácio
Introdução
Recuperando	a	história	do	cristianismo	carismático
Qual	é	a	diferença?
Crescimento	fenomenal
O	desafio	da	legitimidade	histórica
O	caminho	para	a	recuperação	histórica
Capítulo	1
A	igreja	apostólica
Cargos	ou	funções?
Obras	maiores	ou	menores?
Capítulo	2
A	igreja	antenicena
Irineu	de	Lyon
Tertuliano
Orígenes
Novaciano
Cipriano
Outros	relatos	da	igreja	primitiva
Conclusão
Capítulo	3
O	declínio	dos	dons	espirituais	e	a	primeira	Renovação	Carismática
O	institucionalismo	e	os	bispos
Montano
Montanismo:	heresia	ou	cristianismo	bíblico?
Os	toques	finais
Capítulo	4
O	Impacto	da	conversão	de	Constantino	no	aspecto	carismático	da	Igreja
Fusão	entre	Estado	e	Igreja
A	religião	exclusiva	do	Estado
Adoção	do	modelo	político	romano
Surgimento	das	batalhas	doutrinais
Capítulo	5
Monasticismo:	o	surgimento	de	outro	Movimento	Carismático
Antão
Pacômio
Atanásio
Hilarião
Ambrósio
Jerônimo
Agostinho
Bento	de	Núrsia
Gregório	Magno
Conclusão
Capítulo	6
Desenvolvimento	interno	do	monasticismo	e	a	igreja	institucional
Extremismos	monásticos	e	misticismo
Os	milagres	e	a	expansão	missionária
Santos	ou	feiticeiros?
O	Misticismo	medieval	era	um	modelo	de	espiritualidade?
Capítulo	7
A	renovação	monástica
Bernardo	de	Claraval
Hildegarda	de	Bingen
Domingos	de	Gusmão
Francisco	de	Assis
Vicente	de	Ferrier
Mais	evidências
Capítulo	8
Os	cátaros
O	consolamentum
Hereges	ou	heróis	da	fé?
Capítulo	9
Os	valdenses
Pedro	Valdo
Rejeição	e	perseguição
Cristianismo	neotestamentário
Cura	divina
Igualdade	no	ministério
Conclusão
Capítulo	10
Martinho	Lutero	e	a	Reforma
Lutero	e	os	milagres
Lutero	e	a	autoridade
Lutero	e	o	dom	profético
Lutero	e	a	cura	divina
Johannes	Brenz
Lutero	e	o	cessacionismo
Bem-vindo,	Espírito	Santo!
Capítulo	11
Os	anabatistas
Os	tais	“reformadores	radicais”
O	batismo	do	crente
A	iluminação	das	Escrituras
A	profecia	como	ministério	de	todos	os	crentes
Exageros	carismáticos	e	proféticos
Pilgram	Marpeck
Menno	Simmons
O	legado	anabatista
Capítulo	12
Os	profetas	franceses
Uma	unção	profética
Falando	em	línguas
Os	camisards
Capítulo	13
George	Fox	e	os	quakers
George	Fox
A	batalha	entre	os	símbolos	externos	e	a	luz	interior
Perseguição
Os	fenômenos	carismáticos
Conclusão
Capítulo	14
O	avivamento	moraviano
Conde	Zinzendorf
Em	fervente	oração
Um	derramamento
Capítulo	15
O	avivamento	metodista
Fenômenos	espirituais	extraordinários
Acusado	de	entusiasmo
Falando	em	línguas
Uma	segunda	obra	da	graça
John	Fletcher
Capítulo	16
O	grande	despertamento	(1726-1750)
Jonathan	Edwards
George	Whitefield
Capítulo	17
O	segundo	Grande	Despertamento	(1800-1840)
O	avivamento	na	Costa	Leste
O	avivamento	em	Kentucky
Barton	Stone	e	o	avivamento	de	Cane	Ridge
Conclusão
Capítulo	18
Edward	Irving	e	a	igreja	católica	apostólica
O	dom	do	Espírito	Santo
Um	surto	carismático	na	Escócia
Eventos	em	Londres
O	sinal	permanente
Conclusão
Capítulo	19
Os	precursores	do	Movimento	Pentecostal/Carismático	no	século	19
Pheobe	Palmer
Charles	Finney
A.	J.	Gordon
Dwight	L.	Moody
Reuben	A.	Torrey
Línguas	e	linguagem	pentecostal
Capítulo	20
Charles	Parham	e	a	Escola	Bíblica	Bethel	(Bethel	Bible	College)
A	busca
Escola	Bíblica	Bethel	em	Topeka,	Kansas
O	derramamento
A	Importância	da	Escola	Bíblica	Bethel
Parham	era	racista?
Capítulo	21
William	Seymour	e	o	Avivamento	da	Rua	Azuza
O	chamado	para	Los	Angeles
Oração
O	Espírito	Santo	e	a	liderança
O	caráter	inter-racial
Um	fenômeno	mundial
Capítulo	22
Parham	e	o	avivamento	de	City	Zion
Os	problemas	em	Zion	City
“Até	que	o	Reino	venha”
A	conexão	da	cura	divina
Segadores	empurrados	à	colheita
Marie	Burgess	Brown
F.	F.	Bosworth
John	G.	Lake
Conclusão
Capítulo	23
A	mensagem	se	espalha	pelo	mundo
Índia
América	do	Sul
Europa
China
Proliferação
Capítulo	24
Desenvolvimentos	posteriores	no	Pentecostalismo
O	pacto	da	última	chuva
A	tendência	ao	denominacionalismo
Capítulo	25
O	Avivamento	de	Cura
Oral	Roberts
A	voz	da	cura
T.	L.	e	Daisy	Osborn
Conclusão
Capítulo	26
A	segunda	chuva	de	avivamento
O	derramamento	na	Faculdade	Bíblica	de	Sharon
A	importância	de	Sharon
Crescimento	e	oposição
Capítulo	27
O	Movimento	Carismático
Dennis	Bennet	e	a	renovação	protestante
O	Movimento	Carismático	Católico
Ecumenismo	e	cismas
O	problema	da	autoridade
Capítulo	28
A	Terceira	Onda
John	Wimber	e	a	vinha
Diferenças	doutrinais
Capítulo	29
A	última	década	do	século	XX
A	bênção	de	Toronto
Divisões	devido	às	manifestações
O	avivamento	de	Pensacola
Divisões	em	Pensacola
O	vaivém	do	avivamento
O	problema	das	manifestações
Tendências	nas	instituições
O	movimento	de	convergência
As	novas	igrejas	apostólicas
A	vanguarda	da	Igreja	hoje
Conclusão:	Batalhando	pela	fé
Na	periferia?
Os	guardiães	da	verdade
Referências
Reconhecimentos
Qualquer	pessoa	que	já	tenha	escrito	um	livro	entende	o	quanto	ele	é	um	esforço
mútuo,	 e	 este	 livro	 não	 é	 exceção.	 Em	 primeiro	 lugar,	 se	 as	 pessoas	 e	 os
movimentos	sobre	os	quais	eu	tenho	escrito	não	tivessem	seguido	corajosamente
a	Deus,	não	haveria	fundamento	nem	motivo	para	escrever.	Em	uma	escala	mais
pessoal,	 se	muitas	 pessoas	 não	 tivessem	 cooperado	 de	 uma	maneira	 ou	 outra,
este	livro	continuaria	a	ser	um	sonho	esquivo.
Quero	 agradecer	 ao	 Dr.	 Benjamim	 Crandall,	 presidente	 do	 Zion	 Bible
Institute	em	Barrington,	Rhode	Island,	que	organizou	minha	agenda	durante	os
anos	escolares	de	1991	a	1992	para	que	me	 fosse	possível	dedicar	quatro	dias
por	semana	à	pesquisa	e	à	escrita.	Eu	também	quero	reconhecer	a	falecida	Esther
Rollins	que,	aos	84	anos,	fez	a	revisão	da	primeira	edição,	que	foi	a	base	desta.
Sou	muito	grato	 à	minha	esposa,	Dr.	Susan	Hyatt,	 que	me	 foi	um	 impulso
constante.	Ela	contribuiu	ao	mesmo	tempo	com	suas	habilidades	editoriais	e	com
sua	perícia	astuta	nas	áreas	histórica	e	teológica.
Prólogo
Eddie	e	Susan	Hyatt	são	dois	dos	melhores	estudantes	que	eu	 já	 tive.	O	apego
que	 tinham	 à	 teologia	 e	 à	 história	 pentecostal	 e	 carismática	 era	 enorme	 ainda
antes	de	começarem	a	frequentar	minhas	aulasna	Universidade	Oral	Roberts,	em
1990.	 Desde	 aquele	 tempo	 eles	 cresceram	 mais	 e	 mais	 na	 maestria	 e	 no
entendimento	do	assunto.
O	livro	2.000	anos	de	cristianismo	carismático	é	o	trabalho	mais	importante
de	Hyatt	até	hoje.	É	uma	excelente	pesquisa	da	história	carismática	e	da	natureza
da	 Igreja.	 Sua	 abordagem	 das	 origens	 e	 do	 destino	 da	 Teoria	 Cessacionista	 é
muito	requisitada	e	apresentada	de	maneira	convincente.	Este	livro	é	realmente,
como	diz	o	título,	“um	olhar	do	século	XXI	à	história	da	Igreja	a	partir	de	uma
perspectiva	 carismático-pentecostal”.	 As	 seções	 sobre	 Charles	 Fox	 Parham,	 o
formulador	da	Teologia	Pentecostal,	e	o	papel	crucial	que	tiveram	os	seguidores
de	Alexander	Dowie,	que	deixou	Zion	City	para	fundar	movimentos	pentecostais
relevantes	por	todo	o	mundo,	são	de	particular	interesse	e	valor.
A	obra	de	Hyatt	é	mais	uma	na	corrente	de	trabalhos	acadêmicos	que	estão
cravando	cada	vez	mais	pregos	no	caixão	da	Teoria	de	B.	B.	Warfield,	segundo	a
qual	 sinais	 miraculosos,	 prodígios	 e	 maravilhas	 cessaram	 após	 o	 fim	 da	 Era
Apostólica.	Este	livro,	ao	mesmo	tempo	em	que	traz	as	pesquisas	mais	recentes
sobre	 o	 assunto,	 apresenta-as	 de	 uma	 maneira	 popular,	 acessível	 a	 qualquer
leitor.
Eu	 recomendo	 este	 livro	 para	 todos	 aqueles	 que	 querem	 se	 aprofundar	 no
entendimento	 dos	 movimentos	 pentecostais	 e	 carismáticos	 que	 eclodiram	 no
século	XX	até	se	tornarem	a	maior	família	de	cristãos	no	mundo.
Vynson	Synan
Deão	da	School	of	Divinity	Regent	University
Virginia	Beach,	Virginia
Prefácio
A	inspiração	para	este	livro	veio	das	minhas	raízes	no	pentecostalismo	clássico	e
do	 meu	 amor	 por	 história.	 Tive	 ainda	 mais	 motivação	 quando	 reconheci	 a
ausência	 de	 informação	 disponível	 sobre	 cristãos	 carismáticos	 na	 história	 da
Igreja.	 Para	 a	minha	 surpresa,	meu	 primeiro	 curso	 de	 história	 da	 Igreja	 numa
escola	 pentecostal	 bíblica	 parecia	 investigar	 a	 história	 das	 igrejas	 católica	 e
reformada.	 Pessoas	 e	 temas	 pentecostais/carismáticos	 não	 são	 abordados	 até	 a
chegada	do	século	XX.	Será	que	o	Espírito	Santo	esteve	mesmo	ausente	durante
18	séculos	na	história	da	Igreja?
Por	 ter	 começado	 uma	 pesquisa	 séria,	 eu	 descobri	 que	 a	 dimensão
carismática	da	atividade	do	Espírito	não	se	ausentara	do	passado	da	Igreja.	Em
vez	disso,	prevalecia	um	viés	contra	os	dons	carismáticos	que	muitas	vezes	era
influenciado	por	historiadores	modernos,	fosse	para	ignorar	os	dons	do	Espírito
Santo	 ou	 para	 falar	 deles	 de	 maneira	 detrativa.	 Depois	 eu	 descobri	 que	 os
pentecostais	 e	 carismáticos,	 pela	 falta	 de	 pesquisas	 acadêmicas,	 muitas	 vezes
aceitavam	as	determinações	de	historiadores	não	carismáticos.
Enquanto	minha	pesquisa	continuava,	encontrei	o	permanente	conflito	entre
a	 espontaneidade	 do	 Espírito	 e	 as	 rígidas	 estruturas	 da	 instituição.	 Isso
geralmente	 resultou	 na	 igreja	 institucional	 acusando	 de	 hereges	 todos	 aqueles
que	defenderam	a	 liberdade	do	Espírito,	suprimindo	e	destruindo	seus	escritos.
Obviamente,	 tal	 atitude	 contribuiu	 para	 a	 ausência	 de	 dados	 sobre	 a	 ação	 do
Espírito	Santo	na	história.
Neste	 livro,	 eu	 preencho	 algumas	 lacunas	 relatando	 pessoas	 e	movimentos
pentecostais/carismáticos.	 Este	 estudo	 não	 é	 nem	 exaustivo	 nem	 crítico.	 Seu
objetivo	 é	mostrar	 que	 pentecostais	 e	 carismáticos	 têm	 realmente	 uma	história
legítima.	Ele	 também	sugere	que,	 em	vez	de	 estar	na	periferia	do	 cristianismo
ortodoxo,	o	cristianismo	pentecostal/carismático	está	no	âmago	do	cristianismo
bíblico	e	histórico.
Introdução
RECUPERANDO	A	HISTÓRIA	DO	CRISTIANISMO
CARISMÁTICO
O	 cristianismo	 carismático	 não	 é	 um	 fenômeno	 que	 pertence	 unicamente	 ao
século	XX.	Ele	tem	sido	uma	constante	desde	que	Jesus	caminhou	pela	terra,	há
2	 mil	 anos.	 Contudo,	 no	 século	 XX	 e	 continuando	 pelo	 XXI,	 houve	 uma
tremenda	explosão	do	cristianismo	carismático.	Começando	com	o	Movimento
Pentecostal	 em	 1901	 e	 revigorado	 pelo	 Movimento	 Carismático	 iniciado	 em
1960,	 com	 sua	 Terceira	Onda	 em	 1980,	 essa	 explosão	 do	Movimento	 ganhou
impulso	e	permeou	todos	os	setores	da	vida	cristã.	Desde	o	primeiro	século	não
havia	tal	ênfase	no	Espírito	Santo	e	seus	dons.
Será	 essa	 expressão	 de	 espiritualidade	 simplesmente	 heresia	 e	 fanatismo,
como	 alguns	 acusam?	 É	 apenas	 uma	 expressão	 marginal	 do	 verdadeiro
cristianismo,	 como	 alguns	 sugerem?	 Ou	 é	 na	 verdade	 uma	 restauração	 do
verdadeiro	cristianismo	bíblico?
Questões	legítimas	têm	sido	levantadas	acerca	da	historicidade	dessa	forma
dinâmica	de	cristianismo.	Será	que	ele	apareceu	subitamente	neste	século,	sem
nenhuma	 ligação	 histórica	 com	 o	 primeiro	 século	 da	 Igreja,	 como	 alguns
afirmam?	 Ou	 ele	 tem	 precedentes	 históricos?	 E	 por	 que	 ele	 é	 chamado	 de
carismático?
A	 palavra	 carismático	 é	 uma	 variação	 da	 palavra	 grega	 charisma,	 termo
neotestamentário	 para	 dom	 espiritual.	 Charisma,	 ou	 sua	 forma	 plural
charismata,	é	a	palavra	que	Paulo	usa	em	1	Coríntios	12.1-11	quando	fala	sobre
os	 dons	 do	 Espírito	 Santo,	 como	 falar	 em	 línguas,	 dons	 de	 cura,	 milagres	 e
profecias.	Por	esse	motivo,	qualquer	grupo,	igreja	ou	movimento	que	adote	essa
dimensão	 dinâmica	 do	 Espírito	 Santo	 e	 seus	 dons	 pode	 ser	 chamado	 de
carismático.	Embora	eles	possam	ser	conhecidos	historicamente	como	quakers,
metodistas	ou	pentecostais,	sua	tendência	para	o	dinamismo	do	Espírito	Santo	e
seus	 dons	 qualifica-os	 como	 carismáticos.	 Pelo	 mesmo	 motivo	 a	 igreja	 do
primeiro	século	também	pode	ser	chamada	de	carismática.
QUAL	É	A	DIFERENÇA?
Essa	pergunta	já	foi	feita	várias	vezes:	Qual	é	a	diferença	entre	os	pentecostais
modernos	 e	 os	 carismáticos?	 Talvez	 a	 principal	 distinção	 seja	 as	 origens
históricas	diferentes	dos	dois	movimentos.	O	Movimento	Pentecostal	 começou
em	 1901,	 na	 Escola	 Bíblica	 Betel,	 em	 Topeka,	 Kansas.	 Lá	 houve	 um
derramamento	do	Espírito	Santo	e	 a	doutrina	pentecostal	 clássica	da	evidência
bíblica	do	batismo	com	o	Espírito	Santo	foi	formulada	e	posta	em	prática.
O	começo	do	Movimento	Carismático	moderno,	por	 sua	vez,	 é	geralmente
identificado	com	o	pronunciamento	de	Dennis	Bennet,	reitor	da	Igreja	Episcopal
de	 São	 Marcos,	 na	 Califórnia;	 em	 1960,	 ele	 disse	 ter	 sido	 batizado	 com	 o
Espírito	Santo	e	falado	em	línguas.
Outra	 importante	 distinção	 é	 o	 fato	 de	 que	 o	 Movimento	 Pentecostal	 foi
rejeitado	pelas	 igrejas	da	época	e,	desde	então,	740	denominações	pentecostais
se	 formaram,	 com	 mais	 de	 65	 milhões	 de	 membros1.	 Por	 outro	 lado,	 o
Movimento	 Carismático	 alcançou	 um	 alto	 grau	 de	 aceitação	 nas	 igrejas
tradicionais,	 onde	 era	 tratado	 como	 um	 renovo	 espiritual.	 Mas,	 apesar	 dessa
aceitação,	que	muitas	vezes	era	morna,	milhares	de	denominações	carismáticas
se	 formaram	 desde	 a	 década	 de	 602.	 A	 Terceira	 Onda3,	 ou	 Movimento
Neocarismático,	 também	 produziu	 milhares	 de	 denominações,	 mostrando	 um
ímpeto	crescente	e	o	poder	de	cada	onda	espiritual.
Apesar	das	diferenças	de	cada	“onda”,	o	estatístico	David	Barret	nota	que	há
uma	 “unidade	 subjacente”	 que	 permeia	 todo	 o	movimento	 do	 século	XX.	 Por
esse	motivo,	ele	cunhou	a	expressão	“pentecostal/carismático”	para	se	referir	à
obra	 do	 Espírito	 Santo	 por	 toda	 a	 terra.	 Ele	 vê	 os	 movimentos	 Pentecostal,
Carismático	e	Terceira	Onda	como	“um	só	movimento	harmônico”	para	o	qual
um	 vasto	 número	 de	 todos	 os	 tipos	 de	 indivíduos	 e	 comunidades	 têm	 sido
atraídos.
CRESCIMENTO	FENOMENAL
Surpreendentemente,	 há	 apenas	 100	 anos,	 nenhuma	 congregação
pentecostal/carismática	–	como	entendemos	a	palavra	atualmente	–	existia.	Hoje,
um	 século	 depois,	 igrejas	 e	 denominações	 carismáticas	 e	 pentecostais	 se
notabilizam	 no	 cenárioreligioso	 e	 constituem	 o	 segmento	 mais	 dinâmico	 e
crescente	da	cristandade.
Esse	crescimento	impressionante	foi	mostrado	por	uma	pesquisa	de	1980	da
Gallup,	publicada	na	Christianity	Today.	A	pesquisa	mostrou	que	19%	de	toda	a
população	 americana,	 cerca	 de	 50	 milhões	 de	 pessoas,	 identificaram-se	 como
pentecostais	 ou	 carismáticos.	 Numa	 pesquisa	 mais	 recente	 da	 Newsweek,	 em
1998,	47%	dos	cristãos	entrevistados	disseram	que	“experimentaram	o	poder	do
Espírito	 Santo”.	 Dentre	 os	 protestantes	 evangélicos,	 este	 número	 sobe	 para
75%4.	Esse	 crescimento	 fenomenal	 é	 um	dos	 principais	motivos	 pelos	 quais	 o
famoso	 teólogo	 Harvey	 Cox,	 de	 Harvard,	 dispôs-se	 a	 dizer	 que	 “o
pentecostalismo	está	reformulando	a	religião	no	século	XXI”5.
O	DESAFIO	DA	LEGITIMIDADE	HISTÓRICA
Uma	crítica	geralmente	dirigida	aos	pentecostais	e	carismáticos	modernos	é	a	de
que	 eles	 não	 têm	 tradição	 nem	 história.	 O	 argumento	 é	 mais	 ou	 menos	 o
seguinte:	 a	 Igreja	 existe	 há	 2	mil	 anos,	mas	 os	 pentecostais	 e	 carismáticos	 só
estão	aí	há	menos	de	100	anos.	Essa	alegada	falta	de	história	parece	indicar	que
o	movimento	é,	na	melhor	das	opções,	periférico	ao	cristianismo	ortodoxo.
Esse	 desafio	 da	 legitimidade	 histórica	 é	 respondido	 habitualmente	 de	 duas
maneiras.	 Pentecostais	 clássicos	 escolheram	 a	 abordagem	 restauracionista,	 em
que	geralmente	veem	a	si	mesmos	como	restauradores	da	pureza	e	do	poder	da
igreja	 apostólica	 do	 primeiro	 século.	 Desde	 essa	 perspectiva,	 os	 18	 séculos
intermediários	 são	 tidos	 como	 anos	 de	 corrupção	 e	 fracasso	 espiritual6.	Mais
recentemente,	alguns	pentecostais	e	carismáticos	não	estão	se	conformando	com
esse	 salto	 de	 18	 séculos	 sobre	 a	 história	 da	 Igreja	 e	 têm	 escolhido	 uma
abordagem	 tradicionalista.	 Eles	 procuram	 preencher	 o	 vácuo	 histórico	 criando
cargos	e	departamentos	eclesiásticos	e	 tradicionais	na	estrutura	de	suas	 igrejas,
instaurando	 liturgias	 tradicionais	 em	 seus	 cultos7.	 Tais	medidas	 são	motivadas
em	parte	por	tentativas	de	estabelecer	uma	continuidade	com	o	passado	por	meio
da	imitação	das	igrejas	mais	tradicionais	e	institucionais.
Nem	 a	 abordagem	 restauracionista	 nem	 a	 tradicionalista	 podem	 responder
adequadamente	à	questão	histórica.	O	fato	é	que	os	pentecostais	e	carismáticos
têm	uma	história	legítima.	É	uma	história	encontrada	nos	vários	movimentos	de
avivamento	 e	 renovo	 que	 sempre	 surgiram	 na	 vida	 da	 Igreja.	 Por	 terem	 sido
frequentemente	 condenados	 e	 marginalizados	 pela	 igreja	 institucional,	 sua
história	tem	sido	ocultada	ou	mal	interpretada.	Essa	é,	portanto,	uma	história	que
precisa	ser	descoberta	e	plenamente	recuperada.
O	CAMINHO	PARA	A	RECUPERAÇÃO	HISTÓRICA
Este	 volume	 traz	 ao	mesmo	 tempo	 vários	 elementos	 recuperados	 por	meio	 de
pesquisas	 acadêmicas	 e	 históricas.	 Ele	 narra	 a	 vida	 de	 movimentos	 e	 pessoas
corajosas	desde	o	Dia	do	Pentecostes	até	o	século	XXI.
Todavia,	 este	 estudo	 de	 nenhuma	 maneira	 é	 exaustivo,	 no	 entanto,	 seus
benefícios	 são	 incontáveis.	 Com	 a	 permissão	 do	 leitor,	 ele	 pode	 informar	 o
pesquisador	mais	sério	sobre	a	atividade	dinâmica	do	Espírito	Santo	por	meio	da
história	da	Igreja.	Além	disso,	pode	instruir	aqueles	que	queiram	aprender	com	o
passado.	Ele	pode	também	inspirar	outras	pesquisas	e	promover	a	consciência	e
o	entendimento	futuro	da	rica	história	que	pertence	legitimamente	a	cada	crente
pentecostal	e	carismático.
Por	fim,	os	dados	deste	 livro	confirmam	que	os	pentecostais	e	carismáticos
realmente	têm	uma	história	legítima	e	emocionante.	Seu	elo	com	o	passado	não	é
apenas	institucional.	Mais	que	isso,	eles	têm	a	mesma	fé	bíblica,	que	continua	a
demonstrar	 o	 poder	 espiritual	 da	 igreja	 apostólica	 do	 primeiro	 século.	 Com
efeito,	 o	 fato	 de	 que	 o	 avivamento	 pentecostal	 e	 carismático	 deste	 século	 seja
cristianismo	ortodoxo	é	confirmado	não	somente	pelo	próprio	Novo	Testamento,
mas	também	pela	existência	de	2	mil	anos	de	cristianismo	carismático.
Capítulo	1
A	IGREJA	APOSTÓLICA
A	igreja	do	primeiro	 século	era	uma	 igreja	carismática.	Lucas,	que	gravou	sua
história	 no	 livro	 de	 Atos,	 incluiu	 nele	 fielmente	 a	 abundância	 de	 fenômenos
sobrenaturais	que	retrataram	sua	vida	e	seu	ministério.	Línguas,	profecias,	curas
e	milagres	–	e	todos	os	outros	carismas	–	eram	comuns	e	até	mesmo	tidos	como
norma	(At	1.8;	10.19;	13.2).	Essa	era	a	atividade	dinâmica	do	Espírito	Santo,	que
agia	mais	na	vida	pessoal	e	individual	dos	crentes	e	na	vida	corporativa	da	igreja
que	 na	 sua	 estrutura	 institucional,	 provendo	 assim	 a	 base	 para	 sua	 vida,	 sua
comunidade	 e	 sua	 missão.	 De	 acordo	 com	 Gordon	 Fee,	 Paulo	 viu	 o	 Espírito
como	“a	chave	para	tudo	na	vida	cristã”8.
Enquanto	os	crentes	levavam	o	evangelho	de	Jerusalém	para	o	mundo	greco-
romano,	essa	característica	carismática	continuava	a	ser	a	norma	para	as	novas
igrejas	 que	 surgiam	 por	meio	 de	 seus	ministérios.	 Isso	 está	 óbvio	 no	 livro	 de
Atos	 tanto	 quanto	 nas	 epístolas	 de	 Paulo,	 nas	 quais	 ele	 fala	 livremente	 de
milagres	 e	 dons	 espirituais.	 Paulo	 declarou	 haver	 “proclamado	 plenamente”	 o
evangelho	aos	gentios	“pelo	poder	dos	sinais	e	prodígios,	na	virtude	do	Espírito
de	Deus”	 (Rm	15.19).	As	cartas	aos	Coríntios	particularmente	mostram	que	as
igrejas	 congregadas	 confiavam	 mais	 na	 espontaneidade	 do	 Espírito	 que	 na
autoridade	oficial	para	guiar	suas	vidas	e	direcionar	seus	encontros.
Esses	fatos	levaram	Hans	von	Campenhausen	a	descrever	que	a	visão	que	a
igreja	 primitiva	 tinha	 da	 comunidade	 cristã	 era	 a	 de	 “uma	 comunidade	 que	 se
desenvolvia	por	meio	da	interação	de	seus	dons	espirituais	e	ministérios,	sem	o
benefício	 de	 uma	 autoridade	 oficial	 ou	 anciãos	 responsáveis”9.	 O	 teólogo
católico	Hans	Kung	concorda,	sugerindo	que	a	igreja	de	Corinto	“não	conhecia
bispos,	nem	presbíteros,	nem	qualquer	tipo	de	ordenação,	mas	somente	os	dons
livres	 e	 espontâneos10.	Então	 ele	 aponta	 que,	 de	 acordo	 com	Paulo,	Deus	 lhes
provia	tudo	que	era	necessário11.	Rudolph	Bultmann	concorda	e	insiste	em	dizer
que,	 na	 igreja	 do	 Novo	 Testamento,	 “as	 pessoas	 com	 mais	 autoridade	 eram
aquelas	investidas	de	dons	espirituais”12.
No	seu	livro	Jesus	e	o	Espírito,	James	D.	G.	Dunn	demonstra	que	as	igrejas
cristãs	 mais	 primitivas	 buscavam	mais	 a	 presença	 imediata	 do	 Espírito	 Santo
para	sua	vida	e	sua	comunidade	que	a	estrutura	organizacional	e	a	formalidade.
Ele	também	aponta	que,	a	não	ser	em	Filipenses	1.1,	Paulo	nunca	se	dirige	a	um
líder	dentro	de	uma	comunidade”13.	A	 implicação	é	clara	para	Dunn:	“Se	uma
liderança	 fosse	 necessária,	 Paulo	 presumia	 que	 o	 Espírito	 carismático	 lhe
indicaria	um	nome”14.
CARGOS	OU	FUNÇÕES?
As	 epístolas	 pastorais,	 que	 são	 do	 período	 final	 da	 vida	 de	 Paulo,	 parecem
revelar	 uma	 estrutura	 mais	 formal	 da	 vida	 da	 igreja.	 O	 termo	 presbuteros
(ancião)	 é	 então	 usado	 pela	 primeira	 vez	 por	 Paulo,	 e	 refere-se	 às	 qualidades
exigidas	 àqueles	 que	 queiram	 servir	 como	 episkopoi	 (bispos)	 ou	 diakonoi
(diáconos).	Adolph	Harnack	sugere	que	aqueles	presbuteros,	ou	anciãos,	possam
significar	mesmo	os	mais	velhos,	em	oposição	aos	jovens.	John	Knox	corrobora,
dizendo	que	“não	estamos	lidando	com	cargos	formais,	mas	com	funções	para	as
quais	as	pessoas	estavam	dotadas	tanto	quanto	estariam	para	as	profecias	ou	as
curas”15.	 Kung	 concorda	 e	 diz	 que	 a	 escolha	 dos	 anciãos	 “não	 pode	 ser	 vista
como	 o	 começo	 de	 um	 sistema	 de	 administração	 clerical”.	 Ele	 mostra	 que	 o
surgimento	 de	 anciãos	 e	 bispos	 deve	 ser	 entendido	 no	 contexto	 da	 “estrutura
visceralmente	carismática	da	igreja”16.
OBRAS	MAIORES	OU	MENORES?
A	ênfase	da	igreja	primitiva	nos	charismata	não	deve	surpreender,	uma	vez	que
Jesus	ensinouseus	discípulos	a	esperar	o	poder	e	o	dinamismo	do	Espírito	em
suas	vidas	e	ministérios.	Em	certa	ocasião,	ele	os	alertou	que,	quando	o	Espírito
viesse,	seria	permitido	que	fizessem	as	mesmas	obras	que	ele	fazia	e	obras	ainda
maiores	 (Jo	 14.12).	 A	 expectativa	 que	 a	 igreja	 tinha	 de	 um	 ministério
sobrenatural	 era,	 portanto,	 proveniente	 da	 vida	 e	 dos	 ensinamentos	 do	 próprio
Jesus.	Dunn	 diz	 que,	 “por	 ser	 ele	 (Jesus)	 um	 carismático,	 assim	 eram	muitos,
senão	todos	os	crentes”17.
Mas	o	que	aconteceu	após	o	primeiro	século	com	a	morte	dos	apóstolos?	Os
dons	 carismáticos/pentecostais	 cessaram	 subitamente?	 Os	 dons	 de	 revelação
foram	 substituídos	 pela	 formação	 do	 cânon	 neotestamentário	 da	 Escritura?	 O
caráter	 sobrenatural	 da	 igreja	 foi	 dissolvido	 após	 o	 fim	 da	 Era	 Apostólica	 do
primeiro	século?
Em	retrospectiva,	pode	ser	constatada	a	diminuição	do	caráter	carismático	da
igreja	 e	 o	 surgimento	 de	 uma	 estrutura	 organizacional.	 Ainda	 assim,	 os	 dons
espirituais	 continuaram	 a	 ser	 parte	 vital	 da	 igreja	 após	 o	 primeiro	 século.
Escritos	pós-apostólicos	não	revelam	nem	o	conhecimento	nem	a	expectativa	de
sua	cessação	em	nenhum	momento.	Aqueles	que	sucederam	os	apóstolos	como
líderes	na	 igreja	deixaram,	em	vez	disso,	um	 testemunho	evidente	da	operação
contínua	dos	dons	espirituais	e	de	seu	poder	durante	esse	tempo.
Capítulo	2
A	IGREJA	ANTENICENA
Justino	Mártir	é	considerado	o	primeiro	e	mais	importante	apologeta	do	segundo
século.	Filho	de	pais	pagãos	que	moravam	perto	da	cidade	bíblica	de	Siquém,	ele
se	 tornou	um	filósofo	 itinerante	conhecido	por	seu	brilhantismo.	Sua	sede	pela
verdade	nunca	foi	satisfeita	até	o	dia	em	que,	andando	por	uma	praia,	encontrou
um	senhor	de	idade	que	o	conduziu	até	as	Escrituras.	Estas,	disse	o	velho,	são	a
verdadeira	 filosofia.	 Justino	 foi	 convencido	 e	 se	 converteu.	 Ele	 foi	 até	 Roma
inaugurar	uma	escola	cristã.
Justino	estava	claramente	familiarizado	com	os	dons	miraculosos	do	Espírito
Santo.	 Em	 seu	 Diálogo	 com	 Trifão,	 escreve	 o	 seguinte:	 “[…]	 pois	 os	 dons
proféticos	permanecem	conosco	 até	o	dia	de	hoje”18.	Em	outro	 trecho	ele	diz:
“Agora	ainda	é	possível	ver	entre	nós	homens	e	mulheres	que	possuem	os	dons
do	Espírito	de	Deus”19.	Em	outra	obra,	intitulada	A	segunda	apologia	de	Justino,
fala	 sobre	 a	 habilidade	 que	 os	 cristãos	 tinham	 em	 seu	 tempo	 de	 expulsar
demônios	e	ministrar	curas:	“Pois	incontáveis	endemoniados	por	todo	o	mundo,
inclusive	 em	 sua	 cidade,	 tem	 sido	 exorcizados	 por	 cristãos	 no	 nome	de	 Jesus,
que	 foi	 crucificado	 sob	Pôncio	Pilatos,	que	curou	e	 ainda	cura,	 tornando	esses
demônios	impotentes	e	expulsando-os	dos	homens”20.
Portanto,	 Justino	 Mártir	 testifica	 claramente	 que	 os	 cristãos	 do	 segundo
século	 continuavam	a	 exercer	 sua	 autoridade	 sobre	 as	 doenças	 e	 os	 demônios.
Ele	também	mostra	que	tanto	homens	quanto	mulheres	estavam	utilizando	outros
dons	 do	Espírito	 também.	Além	disso,	 ele	 nunca	 sugeriu	 a	 expectativa	 de	 que
esses	dons	cessassem	em	algum	momento.
IRINEU	DE	LYON
Irineu	(125-200	d.C.),	bispo	de	Lyon,	é	mais	conhecido	por	seus	escritos	contra
o	 gnosticismo	 e	 outras	 grandes	 heresias	 de	 seu	 tempo.	 Nascido	 na	 cidade	 de
Esmirna,	 ele	 foi	 um	 pupilo	 de	 Policarpo,	 que	 por	 sua	 vez	 foi	 discípulo	 do
apóstolo	 João.	Pelos	 seus	 escritos	 fica	 evidente	 que	os	 dons	do	Espírito	Santo
ainda	eram	comuns	na	vida	da	igreja	de	seu	tempo.
Em	sua	obra	Contra	as	heresias,	Irineu	mostra	a	falácia	de	certos	gnósticos
ao	afirmarem	que	Jesus	era	um	fantasma	sem	corpo	físico	real,	e	que	ele	realizou
suas	obras	“somente	em	aparência”.	 Irineu	 refuta	essa	afirmação	mostrando	as
obras	que	os	seguidores	de	Jesus	continuavam	a	fazer	até	então:
Pois	 verdadeiramente	 e	 seguramente	 alguns	 expulsam	 demônios,	 tanto	 que	 aqueles	 que	 foram
purificados	 desses	 espíritos	maléficos	 passam	 a	 crer	 (em	Cristo)	 e	 se	 unem	 à	 Igreja.	Outros	 têm
visões	 do	 que	 acontecerá	 no	 futuro:	 eles	 as	 veem	 e	 proferem	 expressões	 proféticas.	Outros	mais
ainda	curam	os	doentes	por	imposição	de	mãos,	e	eles	ficam	completamente	curados.
Irineu	também	fala	de	mortos	que	ressuscitaram:
Sim,	 além	disso,	 como	eu	 já	 falei,	 os	mortos	 têm	 sido	até	mesmo	 ressuscitados,	 e	permaneceram
entre	nós	por	muitos	anos.	E	o	que	devo	mais	dizer?	É	impossível	enumerar	os	dons	que	a	Igreja	tem
recebido	em	todo	o	mundo	no	nome	de	Jesus	Cristo21.
Ele	também	testifica	que	os	crentes	ainda	falavam	em	línguas	na	sua	época,
dizendo:
Da	mesma	maneira	nós	também	ouvimos	muitos	irmãos	na	igreja	que	possuem	os	dons	proféticos	e
que	pelo	Espírito	falam	todo	tipo	de	línguas,	e	trazem	à	luz,	para	benefício	geral,	coisas	escondidas
aos	homens,	e	proclamam	os	mistérios	de	Deus”22.
A	vida	e	a	obra	de	Irineu	quase	alcança	o	terceiro	século.	Sua	obra	escrita	é
um	 testemunho	 poderoso	 de	 quanto	 o	 conhecimento	 e	 a	 prática	 dos	 dons
espirituais	 se	 expandiram	na	 igreja	 de	 seu	 tempo.	Assim	 como	 Justino	Mártir,
Irineu	nem	pensava	em	dizer	que	os	charismata	cessaram.
TERTULIANO
Tertuliano	 (160-240	 d.C.),	 nativo	 de	 Cartago,	 converteu-se	 em	 192.	 Já	 nessa
época	 ele	 era	 proficiente	 no	 direito	 e	 nos	 sistemas	 filosóficos	 de	 então.
Conhecedor	de	grego	e	latim,	escreveu	extensivamente	nesta	última	língua.	Com
essa	 experiência,	 tornou-se	 rapidamente	 um	 presbítero	 em	 Cartago,	 um	 líder
influente	na	Igreja	e	o	primeiro	apologeta	da	Igreja	Ocidental.	Nos	seus	escritos
incisivos	 e	 poderosos	 contra	 os	 tiranos	 e	 as	 seitas	 do	 seu	 tempo,	 formulou
conceitos	teológicos	que	lhe	conferiram	o	título	de	“pai	da	teologia	latina”.	Suas
obras	 também	 revelam	 um	 contato	 pessoal	 com	 os	 dons	 sobrenaturais	 do
Espírito	Santo,	inclusive	o	dom	de	línguas.
No	 seu	Tratado	 sobre	a	alma,	 Tertuliano	 diz:	 “Visto	 que	 reconhecemos	 os
charismata,	 ou	 dons,	 nós	 também	 fomos	 dignos	 do	 dom	 profético”	 23.	 Mais
adiante	ele	faz	um	relato	sobre	uma	mulher	em	sua	congregação	“cujo	ministério
tem	sido	favorecido	por	diversos	dons	de	revelação”.	De	acordo	com	Tertuliano,
ela	recebeu	a	visita	de	anjos	várias	vezes	e	até	mesmo	a	do	próprio	Senhor.	Além
disso,	frequentemente	sabia	os	segredos	dos	corações	das	pessoas	e	era	capaz	de
dar	 respostas	 às	 suas	 necessidades	 mais	 íntimas,	 inclusive	 a	 cura	 física.
Tertuliano	 diz:	 “Todas	 as	 suas	 mensagens	 são	 examinadas	 da	 maneira	 mais
escrupulosa	para	que	a	verdade	delas	possa	ser	provada”24.
No	 seu	Para	 Escápula,	 Tertuliano	 relata	 ocasiões	 específicas	 nas	 quais	 há
cura	e	libertação	da	opressão	demoníaca.	Ele	conclui:	“[…]	e	o	céu	sabe	quantos
homens	 distintos,	 para	 não	 falar	 das	 pessoas	 comuns,	 têm	 sido	 curados	 das
doenças	e	libertos	dos	demônios”25.
Em	Contra	 Marcion,	 escrito	 para	 opor-se	 ao	 herege	 Marcion,	 Tertuliano
revela	tanto	seu	contato	com	o	falar	em	línguas	quanto	sua	crença	de	que	os	dons
sobrenaturais	 do	 Espírito	 são	 um	 sinal	 de	 ortodoxia.	 Isso	 é	 patente	 em	 seu
desafio	a	Marcion.
Que	Marcion	exiba,	então,	alguns	profetas	como	esses,	que	não	falam	pelo	juízo	humano,	mas	com
o	Espírito	de	Deus,	prevendo	também	fatos	futuros	e	manifestando	os	segredos	do	coração.	Que	ele
produza	um	salmo,	uma	visão,	uma	oração	–	que	 isso	provenha	somente	do	espírito,	num	êxtase,
abruptamente,	ou	algum	momento	em	que	lhe	tenha	ocorrido	uma	interpretação	de	línguas.	Pois	do
meu	lado	esses	sinais	aparecem	sem	qualquer	dificuldade26.
Em	Sobre	o	batismo,	Tertuliano	defende	que	uma	operação	do	Espírito	num
crente	é	subsequente	à	conversão.	Ele	escreve:	“Não	que	na	água	obtenhamos	o
Espírito;	mas	na	água	somos	purificados	e	preparados	para	o	Espírito	Santo.	Ele
também	 defende	 que	 após	 o	 batismo	 “a	 mão	 está	 sobre	 nós,	 invocando	 e
convidando	 o	 EspíritoSanto	 por	 meio	 das	 bênçãos”27.	 Sem	 dúvidas,	 isso	 se
refere	ao	costume	apostólico	de	impor	as	mãos	sobre	os	novos	convertidos	para
a	recepção	do	Espírito	Santo	(cf.	At	8.14-17;	9.17;	19.5-6).
O	 testemunho	de	Tertuliano	demonstra,	portanto,	que	no	 terceiro	 século	os
dons	espirituais	ainda	eram	comuns	na	igreja.	Seu	ponto	de	vista	sobre	a	obra	do
Espírito	 Santo	 após	 o	 batismo	 é	 especialmente	 interessante	 sob	 a	 ótica	 do
movimento	 pentecostal/carismático	 moderno,	 que	 também	 ensina	 que	 há	 um
aumento	de	poder	que	se	segue	à	conversão.	Como	outros	de	sua	era,	Tertuliano
não	fornece	nenhum	indício	de	que	esses	dons	viessem	a	cessar.
ORÍGENES
Orígenes	 (185-285	 d.C.),	 um	 escritor	 prolífico,	 foi	 o	 primeiro	 teólogo
sistemático	da	Igreja.	Seu	pai,	que	era	um	cristão	devoto,	foi	martirizado	quando
Orígenes	tinha	16	anos.	Aos	18,	foi	escolhido	como	líder	de	uma	notável	escola
cristã	destinada	a	instruir	convertidos	do	paganismo	em	Alexandria,	Egito.
Em	Contra	Celso,	Orígenes	fala	sobre	os	milagres	que	eram	realizados	pelo
poder	 do	 nome	 de	 Jesus	 em	 sua	 época.	 Seu	 testemunho	 indica	 que	 ele	 estava
pessoalmente	envolvido	em	muitos	desses	milagres.
E	 alguns,	 nas	 curas	 que	 realizam,	 demonstram	 ter	 recebido	 por	 sua	 fé	 um	 poder	 maravilhoso,
invocando	somente	o	nome	do	Deus	de	todas	as	coisas	e	de	Jesus	sobre	aqueles	que	necessitavam	de
sua	 ajuda,	 além	de	 algumas	menções	 à	 sua	história.	Pois	por	 esses	meios	nós	 temos	visto	muitas
pessoas	libertas	de	calamidades	terríveis,	da	demência,	da	loucura	e	de	diversas	outras	doenças	que
não	poderiam	ter	sido	curadas	nem	pelo	homem	nem	por	demônios28.
Mais	 adiante,	 Orígenes	 cita	 a	 acusação	 que	 Celso,	 um	 escritor	 pagão,	 fez
contra	 os	 cristãos.	Ele	 critica	 a	 confiança	 dos	 cristãos	 na	 inspiração	 dada	 pelo
dom	 profético	 e	 então	 cita	 cinicamente	 pedaços	 de	 algumas	 profecias	 que	 ele
ouviu.	 Ele	 então	 diz:	 “São	 somadas	 a	 essas	 promessas	 algumas	 palavras
estranhas,	ininteligíveis	e	fanáticas,	cujo	significado	ninguém	conhece”29.
Se	 essa	 frase	 se	 refere	 às	 línguas	 estranhas,	 como	 creem	alguns,	 então	 é	 o
testemunho	de	alguém	exterior	à	igreja	de	que	falar	em	línguas	era	algo	comum
naquele	 tempo.	 O	 contexto	 do	 argumento	 também	 claramente	 indica	 que
profecias	eram	tão	recorrentes	entre	os	cristãos	que	até	mesmo	um	escritor	pagão
estava	consciente	dessa	prática.
Orígenes	obviamente	reconheceu	a	realidade	e	o	valor	de	orar	em	línguas,	e
ele	 dá	mais	 evidências	 disso	 em	 seu	 comentário	 sobre	Romanos	 8.26,	 em	que
liga	 a	 oração	 no	 Espírito	 à	 oração	 em	 línguas.	 Cecil	M.	 Robeck	 escreve	 que
“Orígenes	afirmaria	que	a	oração	em	línguas	existiu	em	seu	tempo	e	pensava-se
que	 o	 benefício	 dela	 era	 ser	 o	 tipo	 de	 oração	 na	 qual	 o	 Espírito	 intercedia
intensamente	diante	de	Deus”30.
Orígenes,	assim	como	Tertuliano,	mostra	sua	fé	numa	obra	do	Espírito	Santo
que	 era	 posterior	 à	 regeneração.	 Em	 seu	 tratado	 De	 principiis	 (Sobre	 os
princípios),	 ele	 fala	 de	 Deus	 soprando	 em	 Adão	 o	 fôlego	 (Espírito)	 da	 vida,
afirmando	 que	 isso	 não	 se	 refere	 a	 todo	 homem,	 mas	 somente	 àqueles	 que
nasceram	de	novo	em	Cristo.	Daí	ele	diz:
Por	esse	motivo	a	graça	e	a	revelação	do	Espírito	Santo	foram	concedidas	pela	imposição	das	mãos
dos	 apóstolos	 após	o	batismo,	 e	 também	Nosso	Senhor,	 depois	 da	 ressurreição,	 quando	 as	 velhas
coisas	haviam	passado	e	tudo	se	renovara	[…].	Seus	apóstolos,	 também	renovados	pela	fé	em	sua
ressurreição,	dizem	“Recebam	o	Espírito	Santo”31.
Orígenes	 foi	 o	 primeiro	 dos	 pais	 da	 Igreja	 a	 assinalar	 que	 esse	ministério
sobrenatural	 estava	 se	 tornando	 menos	 comum.	 Ele	 mostra	 a	 abundância	 de
sinais	 sobrenaturais	 nos	ministérios	 de	Cristo	 e	 na	 igreja	 apostólica.	Então	 ele
destaca:	“Mas	desde	esses	tempos	os	sinais	têm	diminuído”.	Ele	culpa	a	falta	de
santidade	e	pureza	entre	os	cristãos	de	seu	tempo	como	a	causa	disso32.
Orígenes,	 portanto,	 estava	 familiarizado	 com	 o	 ministério	 miraculoso	 do
Espírito	 Santo,	 incluindo	 a	 fala	 em	 línguas	 estranhas.	 Ele	 também	 ensina
nitidamente	a	obra	do	Espírito	como	posterior	à	conversão.	Ademais,	enquanto
ele	indica	uma	diminuição	da	atividade	carismática,	não	é	a	ela	que	atribui	um
decreto	divino,	mas	sim	à	falta	de	santidade	entre	os	cristãos	do	seu	tempo.
NOVACIANO
Novaciano	 (210-280	 d.C.)	 foi	 um	 presbítero	 da	 Igreja	 de	Roma	 e	 um	 teólogo
respeitado.	 Aparentemente,	 ele	 era	 estimado	 por	 sua	 santidade	 e	 compaixão,
pois,	 em	 uma	 polêmica	 escrita	 contra	 ele,	 seu	 oponente	 diz	 que	 Novaciano
“chorou	 pelos	 pecados	 de	 seus	 vizinhos	 como	 se	 fossem	 os	 seus,	 carregou	 os
fardos	de	 seus	 irmãos,	 assim	como	o	apóstolo	exorta,	 e	 fortaleceu	aqueles	que
estavam	 fracos	 em	 sua	 fé	 em	 Deus”33.	 Novaciano	 se	 envolveu	 em	 uma
controvérsia	 com	 Cornélio,	 bispo	 de	 Roma,	 em	 virtude	 da	 leniência	 que	 este
estava	mostrando	em	relação	aos	cristãos	que	“caíram”	durante	a	perseguição.	O
problema	 nunca	 foi	 resolvido	 por	 completo,	 e	 então	 Novaciano	 tornou-se	 um
bispo	rival	de	Roma.
O	 movimento	 que	 Novaciano	 iniciou	 ganhou	 impulso	 e	 se	 espalhou
rapidamente,	sobretudo	na	parte	oriental	do	Mediterrâneo	e	do	Norte	da	África.
Seus	 seguidores	 chamavam-se	 a	 si	 de	 cátaros,	 que	 significa	 “os	 puros”,
distinguindo-se	de	outros	que	se	chamavam	cristãos,	os	quais	eles	consideravam
ser	 carnais	 e	 impuros.	 Há	 outros	 grupos	 na	 história	 da	 Igreja	 com	 a	 mesma
ênfase	que	adotaram	o	mesmo	nome.	Nos	séculos	XVIII	e	XIX	os	movimentos
Holiness	(santidade)	declararam	prioridades	similares.
Aquela	 que	 talvez	 seja	 a	 mais	 importante	 das	 obras	 que	 sobraram	 de
Novaciano	é	seu	tratado	A	trindade.	Nela,	discorre	sobre	sua	familiaridade	com
o	ministério	sobrenatural	do	Espírito	Santo:
É	ele	(o	Espírito	Santo)	que	coloca	os	profetas	na	igreja,	instrui	os	professores,	orienta	as	línguas,
concede	poderes	e	cura,	realiza	maravilhas,	oferece	o	discernimento	dos	espíritos,	confere	poderes
de	 governo,	 sugere	 conselhos	 e	 organiza	 vários	 outros	 dons	 que	 fazem	 parte	 dos	 charismata;
fazendo	 assim	 com	 que	 a	 Igreja	 do	 Senhor	 se	 esmere	 e	 se	 aperfeiçoe	 em	 todo	 lugar,	 com	 seus
membros34.
Para	Novaciano,	o	Espírito	Santo	era,	assim,	a	fonte	da	vida	e	da	ordem	na
Igreja.	 Ele	 claramente	 vê	 como	 experiências	 cristãs	 normais	 as	 curas,	 os
milagres	e	as	línguas.	Sua	crença	nas	carismata	não	era	uma	novidade,	posto	que
a	 igreja	 do	 seu	 tempo	 ainda	 reconhecia	 os	 dons	 como	 uma	 parte	 vital	 do
cristianismo	cotidiano.
A	ênfase	de	Novaciano	na	pureza	moral,	aliada	ao	testemunho	de	Orígenes,
indica	que	o	declínio	moral	entre	os	cristãos	era	uma	tendência	tanto	nos	setores
orientais	 quanto	nos	ocidentais	 da	 Igreja.	Esse	declínio	moral	 produziu	muitas
lutas	e	rixas	na	Igreja,	e	frequentemente	a	instituição	oficial	se	posicionou	contra
aqueles	que	defendiam	a	pureza	moral.
As	gerações	seguintes	interpretariam	essa	postura	sobre	a	moralidade	como	a
principal	causa	da	perda	de	poder	espiritual	da	Igreja.
CIPRIANO
Cipriano	 (195-258	 d.C.)	 foi	 um	 cartaginense	 próspero	 que	 desfrutou	 os
benefícios	de	uma	boa	educação	em	Retórica	e	em	Direito.	Quando	ele	se	tornou
um	cristão,	por	volta	de	246,	destacou-se	 rapidamente.	Em	dois	 anos	 ele	 já	 se
tornara	bispo	de	Cartago,	cargo	que	manteve	até	seu	martírio,	em	258.
Por	 ser	 um	 ávido	 leitor	 de	 Tertuliano,	 evidentemente	 estava	 consciente	 da
existência	 dos	 charismata.	 O	 secretário	 de	 Cipriano	 disse	 a	 Jerônimo	 que
Cipriano	nunca	passou	sequer	um	dia	sem	ler	Tertuliano	e	estava	acostumado	a
pedir	seus	livros	para	ler,	dizendo:	“Dê-me	o	mestre”35.
Cipriano,	 segundo	 seu	 próprio	 testemunho,	 experimentou	 visões
sobrenaturais.Sua	 explicação	 para	 as	 condutas	 que	 sua	 congregação	 teria
durante	os	tempos	de	perseguição	era	a	de	que	“seria	melhor	para	nós	sofrê-las
com	o	auxílio	das	visões	genuínas”36.	Essas	visões	ocorriam,	de	fato,	em	toda	a
comunidade	cristã,
pois	 além	 das	 visões	 noturnas,	 e	 mesmo	 durante	 o	 dia,	 há	 entre	 nós	 garotos	 ainda	 na	 idade	 da
inocência	que	estão	cheios	do	Espírito	Santo,	vendo	com	seus	olhos,	em	êxtase,	e	ouvindo	e	falando
tais	coisas	pelas	quais	o	Senhor,	por	condescendência,	nos	alerta	e	nos	instrui37.
Enquanto	 era	 bispo	 de	 Cartago,	 Cipriano	 envolveu-se	 numa	 controvérsia
com	Estêvão,	bispo	de	Roma.	Estêvão	defendia	que	aqueles	que	 tivessem	sido
batizados	 por	 hereges	 não	 tinham	 a	 necessidade	 de	 ser	 batizados	 novamente
quando	retornassem	à	igreja.
Cipriano	 discordou	 enfaticamente	 e	 insistia	 excessivamente	 na
obrigatoriedade	de	um	novo	batismo.	No	decorrer	do	debate,	 tornou-se	clara	a
posição	 de	 Cipriano,	 segundo	 a	 qual	 o	 Espírito	 Santo	 é	 recebido	 após	 uma
evidente	 obra	 de	 regeneração.	 Para	 ele,	 a	 regeneração	 ocorre	 por	 meio	 do
verdadeiro	 batismo,	 e	 a	 recepção	 do	 Espírito	 Santo	 vem	 logo	 após,	 pela
imposição	de	mãos38.	Ele	diz	ainda:	“pois	aquele	que	 foi	 santificado,	que	 teve
seus	 pecados	 lavados	 no	 batismo	 e	 renasceu	 espiritualmente	 como	 um	 novo
homem,	se	adequou	ao	recebimento	do	Espírito	Santo”39.
Cipriano	compara	os	dois	eventos,	regeneração	e	recepção	do	Espírito,	com
eventos	na	criação	divina	de	Adão.	Adão	primeiro	foi	formado,	e	só	depois	Deus
soprou	nele	o	Espírito	da	vida.	Cipriano	conclui	que	da	mesma	maneira	a	pessoa
é	primeiro	nascida	de	novo	e	depois	enchida	do	Espírito	Santo:	“Ninguém	nasce
pela	imposição	de	mãos	quando	recebe	o	Espírito	Santo,	assim	como	aconteceu
com	 Adão,	 o	 primeiro	 homem.	 Pois	 primeiro	 Deus	 o	 criou	 e	 depois	 soprou
dentro	de	suas	narinas	o	espírito	de	vida”40.
Os	 escritos	 de	 Cipriano	 fornecem	 mais	 evidências	 de	 que	 o	 ministério
sobrenatural	do	Espírito	Santo	ainda	era	considerado	um	componente	normal	da
vida	e	do	ministério	da	 igreja	no	século	III.	Sua	crença	no	batismo	do	Espírito
Santo	 logo	 após	 a	 salvação	 também	 mostra	 a	 aceitação	 ampla	 desse	 fato	 no
século	III.	Como	muitos	outros	autores	da	época,	Cipriano	não	dá	sinais	de	que
saiba	o	que	seja	o	cessacionismo.
OUTROS	RELATOS	DA	IGREJA	PRIMITIVA
Há	 outros	 escritos	 dentre	 os	 cristãos	 pioneiros	 que	 confirmam	 a	 presença	 dos
dons	espirituais	nas	igrejas.	Por	exemplo,	o	Didaquê,	provavelmente	escrito	no
começo	do	 segundo	 século,	 reconhece	a	 legitimidade	do	ministério	profético	e
dá	instruções	sobre	como	distinguir	entre	os	falsos	profetas	e	os	verdadeiros.	O
Pastor	 de	 Hermas,	 escrito	 no	 início	 do	 segundo	 século,	 é	 fundamentado	 nas
revelações	 sobrenaturais	 e	 visões	do	 autor.	 Inácio,	 bispo	de	Antioquia,	 em	 sua
Carta	aos	 filadelfos,	 escrita	 também	no	 início	do	 segundo	 século,	 lembra	 seus
leitores	a	mensagem	profética	que	ele	entregara	no	meio	deles	durante	uma	visita
recente41.
CONCLUSÃO
Esses	testemunhos	demonstram	com	clareza	que	os	dons	espirituais,	inclusive	o
de	falar	em	línguas,	mantiveram-se	comuns	na	igreja	desde	o	Dia	de	Pentecostes
até	 o	 começo	 do	 quarto	 século.	 O	 pesquisador	 Morton	 Kelsey,	 da	 Igreja
Episcopal,	está	correto	ao	dizer:	“Esses	homens	estavam	conscientes	de	cada	um
dos	 itens	da	 lista	de	dons	espirituais	de	Paulo.	Em	nenhum	lugar	eles	sugerem
que	 algum	 deles	 fora	 abolido”42.	 Orígenes	 indica	 seu	 declínio,	 e	 não	 sua
cessação.
Os	 testemunhos	 patrísticos	 também	 indicam	 que	 a	 recepção	 do	 Espírito
Santo	 era	 considerada	 como	 um	 fato	 subsequente	 à	 conversão,	 iniciada	 pela
imposição	 de	 mãos.	 Essa	 era	 obviamente	 uma	 continuação	 do	 costume
apostólico	 gravado	 no	 livro	 de	 Atos.	 Esse	 testemunho	 indica	 que,	 ao	 menos
durante	 os	 três	 primeiros	 séculos,	 a	 Igreja	 acompanhou	 o	 uso	 apostólico	 da
conversão	seguida	pela	recepção	do	Espírito	Santo43.
Capítulo	3
O	DECLÍNIO	DOS	DONS	ESPIRITUAIS	E	A	PRIMEIRA
RENOVAÇÃO	CARISMÁTICA
Os	 dons	 espirituais	 continuaram	 a	 se	 manifestar	 após	 o	 primeiro	 século.	 Sua
prevalência	 e	 influência	 diminuíram	 enquanto	 o	 institucionalismo	 dominava
cada	vez	mais	a	vida	e	o	ministério	da	Igreja.	Institucionalismo	é	uma	ênfase	na
organização	 em	 detrimento	 de	 outros	 fatores.	 Na	 igreja,	 tal	 ênfase	 na
organização,	ou	sua	superestimação,	sempre	vem	à	custa	da	vida	e	da	liberdade
do	Espírito.	O	professor	James	L.	Ash	diz	que	praticamente	todo	historiador	do
cristianismo	 concorda	 que	 a	 institucionalização	 da	 igreja	 primitiva	 foi
acompanhada	pelo	esmorecimento	dos	dons	carismáticos44.
O	INSTITUCIONALISMO	E	OS	BISPOS
O	movimento	em	direção	ao	 institucionalismo	na	 igreja	primitiva	 surgiu	como
um	meio	 de	 defesa	 contra	 a	 perseguição	 do	Estado	 e	 a	 constrição	 do	 erro	 por
parte	 das	 seitas	 heréticas,	 como	o	 gnosticismo	 e	 o	marcionismo.	 Para	 reagir	 a
esses	 erros,	 a	 igreja	 formalizou	 o	 culto	 e	 centralizou	 o	 poder	 no	 bispo.
Infelizmente,	 esse	 movimento	 em	 direção	 à	 estrutura	 organizacional	 trouxe	 à
tona	uma	mudança	até	mesmo	no	significado	da	palavra	“bispo”.
A	palavra	“bispo”	é	derivada	do	grego	episcopos	que,	em	sua	forma	verbal,
significa	 “vigiar”	 e,	 portanto,	 “superintender	 e	 ver	 além”.	 Não	 sendo	 própria
somente	do	Novo	Testamento,	ela	foi	usada	em	todo	o	mundo	greco-romano	do
primeiro	 século	 para	 se	 referir	 a	 indivíduos	 que	 trabalhassem	 como	 tutores,
inspetores,	 patrulheiros,	 vigias	 e	 superintendentes45.	 Na	 igreja	 apostólica,	 a
palavra	foi	usada	para	descrever	a	 função	de	prever	 fatos	 relacionados	à	 igreja
dada	 a	 certos	 indivíduos.	Atos	 20.17,28	 e	Tito	 1.5-7	mostram	que	 os	mesmos
indivíduos	chamados	de	episcopas	eram	também	chamados	de	anciãos,	de	quem
se	esperava	que	guiassem	e	pastoreassem	o	rebanho.
Com	 a	 recente	 ênfase	 na	 estrutura	 organizacional,	 os	 episcopas	 se
transformaram	 numa	 função	 separada	 e	 distinta,	 com	 poder	 e	 prestígio
crescentes.	 Essa	 mudança	 traça	 sua	 origem	 desde	 as	 obras	 de	 Inácio	 de
Antioquia	(morto	por	volta	de	110	d.C),	que	parece	preocupado	em	defender	e
promover	 a	 autoridade	 e	 o	 prestígio	 do	 bispo.	Em	 sua	Carta	aos	Esmirniotas,
por	 exemplo,	 Inácio	 declara	 que	 “a	 Eucaristia	 tem	 validade	 somente	 sob	 a
autoridade	 do	 bispo”.	 Ele	 afirmou	 que,	 sem	 o	 bispo,	 é	 ilegal	 “tanto	 batizar
quanto	 realizar	 uma	 ‘festa	 de	 amor’”46.	 Em	 sua	 Carta	 aos	 Tralianos,	 ele
admoesta	seus	leitores	a	“não	fazer	nada	sem	o	bispo”47.
Ash	 vê	 essa	 tentativa	 de	 obter	 autoridade	 para	 si	 e	 para	 o	 cargo	 de	 bispo
como	uma	novidade48.	Quando	comparado	com	os	escritos	do	Novo	Testamento,
realmente	torna-se	óbvio	que	Inácio	seguiu	um	novo	caminho	na	administração
da	Igreja.	Burnett	Streeter,	em	The	Primitive	Church,	sua	obra	clássica,	diz:	“O
que	 ninguém	 questiona,	 ninguém	 defende;	 uma	 defesa	 exagerada	 implica	 a
existência	de	uma	oposição	ferrenha.	O	princípio	que	Inácio	está	preocupado	em
defender	estava	bem	distante	de	ser	universalmente	reconhecido”49.
A	história	demonstra	que	essa	tendência	institucional	reivindicada	por	Inácio
continuou,	culminando	no	eclesiasticismo	da	Igreja	Católica	Romana	medieval	e
no	 seu	 bispo	 monárquico.	 Isso	 significou	 que	 as	 formas	 rituais	 e	 de	 cargos
valorizaram-se	 mais	 que	 as	 experiências	 pessoais	 e	 espirituais.	 Isso	 também
significou	que	as	manifestações	espontâneas	do	Espírito	Santo	se	tornaram	cada
vez	menos	desejáveis,	ainda	mais	para	quem	tinha	alguma	autoridade.	É	por	esse
motivo	 que	 Ash	 declara,	 em	 resposta	 à	 noção	 popular	 de	 que	 os	 dons
carismáticos	foram	substituídos	pelo	Cânon	do	Novo	Testamento,	que	“foram	os
bispos	que	rejeitaram	asprofecias,	e	não	o	Cânon”50.
Aqueles	 que	 ampararam	 essa	 ênfase	 na	 estrutura	 organizacional	 não	 mais
consideraram	que	a	autoridade	espiritual	pertencesse	à	pessoa	em	quem	o	dom
espiritual	 residisse.	Agora	 essa	 autoridade	 reside	 na	 pessoa	 que	ocupa	o	 cargo
eclesiástico.	 Isso	 gerou	 tensões	 crescentes	 entre	 aqueles	 que	 continuavam	 a
apoiar	 os	 dons	 espirituais	 e	 aqueles	 que	 preferiam	 a	 estrutura	 organizacional
emergente.
Aqueles	que	queriam	a	liberdade	e	a	espontaneidade	do	Espírito	sentiram-se
suprimidos	pela	formalidade	e	o	ritualismo	crescentes.	Por	outro	lado,	os	líderes
eclesiásticos,	que	agora	podiam	ocupar	os	cargos	sem	o	devido	dom	espiritual,
sentiram-se	 incomodados	 com	 a	 alegação	 de	 comunhão	 direta	 com	 Deus.	 O
problema	 chegou	 ao	 cume	 na	 última	 metade	 do	 segundo	 século,	 quando
Montano	 começou	 a	 reafirmar	 a	 importância	 dos	 dons	 espirituais	 na	 igreja,
particularmente	o	dom	de	profecia.
MONTANO
Montano	 nasceu	 na	 Frígia	 durante	 a	 primeira	metade	 do	 segundo	 século	 e	 foi
bispo	 por	 algum	 tempo.	 Embora	 fosse	 um	 convertido	 do	 paganismo,	 como
cristão	 ele	 era	 ortodoxo	 em	 sua	 fé,	 aceitando	 todos	 os	 livros	 do	 Cânon	 e	 as
Regras	da	 fé51.	Ele	“se	destacava	por	operar	 sinais	e	milagres”,	e	mesmo	seus
inimigos	 admitiam	 que	 “tanto	 sua	 vida	 quanto	 sua	 doutrina	 eram	 santas	 e
irrepreensíveis”52.
Montano	 preocupava-se	 com	 o	 formalismo	 crescente	 na	 igreja	 e	 com	 a
progressiva	 lassidão	moral	dos	seus	membros.	Foi	então	que,	por	volta	de	172
d.C.,	 ele	 começou	 a	 destacar	 a	 importância	 do	 ministério	 sobrenatural	 do
espírito,	 insistindo	 que	 os	 cristãos	 conduzissem	 um	 estilo	 de	 vida	moral	mais
estrito.	Ele	enfatizou	a	segunda	vinda	de	Cristo,	provavelmente	crendo	que	este
evento	 ocorresse	 ainda	 durante	 sua	 vida.	 Após	 obter	 um	 grande	 número	 de
seguidores,	o	movimento	se	espalhou	por	toda	a	Ásia	Menor,	Norte	da	África	e
Europa,	alcançando	até	mesmo	Roma.
De	 acordo	 com	 Montano,	 o	 fator	 qualitativo	 para	 o	 exercício	 de	 algum
ministério	 na	 igreja	 era	 a	 posse	 de	 algum	 dom	 espiritual	 em	 lugar	 de	 uma
indicação	para	algum	cargo.	Ele	enfatizou	especialmente	o	dom	de	profecias	e
logo	 se	 juntou	 a	 duas	 profetizas,	 Priscila	 e	 Maximila.	 Falar	 em	 línguas	 era
certamente	 um	 fato	 comum	entre	 os	montanistas53.	 Os	montanistas	 preferiram
ser	chamados	de	A	nova	profecia,	pois	acreditavam	que	Deus	estava	renovando	o
ministério	 profético	 da	 igreja	 por	meio	 deles.	 Seus	 oponentes	 se	 lhes	 referiam
desdenhosamente	como	montanistas,	segundo	o	nome	de	seu	líder,	que	é	o	nome
pelo	qual	se	tornaram	conhecidos.
A	ênfase	nos	dons	espirituais	 levou	Montano	a	entrar	em	um	conflito	feroz
com	muitos	líderes	da	Igreja	que	insistiam	no	recente	predomínio	da	hierarquia
eclesiástica	sobre	qualquer	dom	espiritual54.	Esses	líderes	também	discordaram
da	 maneira	 pela	 qual	 Montano	 e	 seus	 seguidores	 entregavam	 suas	 profecias.
Embora	não	encontrassem	erros	no	conteúdo	das	profecias,	eles	o	acusavam	de
entregá-las	sob	influência	de	um	estado	frenético	de	êxtase55.	Alegando	que	isso
fosse	 a	 prova	 da	 origem	 demoníaca	 das	 mensagens,	 os	 críticos	 acusavam
Montano	e	seus	seguidores	de	estarem	possuídos	pelo	demônio.
Muitos	 concílios	 e	 sínodos	 regionais	 realizados	 na	 segunda	 metade	 do
segundo	século	censuraram	Montano	e	seus	seguidores.	Porém,	essa	convocação
dos	concílios	 somente	evidencia	o	 impacto	que	o	Montanismo	estava	 tendo	na
igreja.	Em	seu	 livro	Christian	 initiation	and	baptism	 in	 the	Holy	Spirit,	 Kilian
McDonald	e	George	Montague	mostram	que	esses	eram	os	primeiros	concílios
na	história	depois	do	concílio	de	Jerusalém	em	Atos	15,	e	que	“nem	a	ameaça	do
gnosticismo	nem	o	marcionismo	obrigaram	a	Igreja	a	convocar	concílios”56.
O	 suporte	 a	Montano	 e	 a	 seus	 seguidores	 era	 amplo.	 Eusébio	 aponta	 que
Irineu	foi	enviado	a	Roma	pelos	cristãos	da	Gália	para	interceder	em	favor	dos
montanistas57.	Sua	intercessão	inicialmente	induziu	o	bispo	de	Roma	a	escrever
cartas	 de	 paz	 para	 as	 igrejas	 montanistas,	 mas	 depois	 ele	 as	 revogou.	 Irineu
deveria	 estar	 se	 referindo	 aos	 inimigos	 do	montanismo	 quando	 expressou	 seu
desânimo	em	relação	àqueles	que	“rejeitam	ao	mesmo	 tempo	o	Evangelho	e	o
Espírito	 profético”.	 Esses	 mesmos	 homens,	 disse	 Irineu,	 também	 não	 podiam
aceitar	o	apóstolo	Paulo,	pois	em	sua	epístola	aos	Coríntios	“ele	fala	claramente
dos	dons	proféticos,	e	reconhece	homens	e	mulheres	profetizando	na	Igreja”58.
Na	África	Setentrional	os	montanistas	foram	defendidos	por	Tertuliano,	que
se	uniu	a	eles	por	volta	do	ano	200	d.C.	Em	Contra	Praxeas,	Tertuliano	diz	que
o	 bispo	 de	 Roma	 inicialmente	 “reconheceu	 os	 dons	 proféticos	 de	 Montano,
Prisca	e	Maximila”	e	“concedeu	sua	paz”	sobre	as	igrejas	montanistas	da	Ásia	e
da	Frígia59.	McDonnell	mostra	que	paz	era	um	sinônimo	de	comunhão	pessoal	e
eclesial,	 e	 o	 envio	 de	 cartas	 de	 paz	 às	 igrejas	 montanistas	 pelo	 bispo	 era	 o
mesmo	 que	 dizer	 “participamos	 da	 mesma	 comunhão;	 celebramos	 a	 mesma
Eucaristia;	temos	uma	só	fé”60.
Porém,	 Praxeas	 gerou	 um	 problema	 ao	 ensinar	 uma	 doutrina	 chamada
monarquianismo,	declarando	que	o	Pai,	o	Filho	e	o	Espírito	Santo	são	somente
um.	Sua	influência	fez	com	que	o	bispo	romano	se	opusesse	aos	novos	profetas,
e	 as	 cartas	 de	 paz	 foram	 revogadas.	 Tertuliano	 afirma	 que	 Praxeas	 fez	 um
serviço	duplo	para	o	diabo	em	Roma.	Ele	suprimiu	a	profecia	e	trouxe	a	heresia;
enfrentou	 o	 Paráclito	 e	 crucificou	 o	 Pai”61.	 Tertuliano	 também	 escreveu	 sete
livros	defendendo	a	profecia	extática,	mas	foram	todos	perdidos	ou	destruídos62.
Após	a	morte	de	Montano,	seus	seguidores	tornaram-se	mais	aguerridos	em
seu	ascetismo,	instaurando	jejuns	e	exigindo	que	seus	membros	seguissem	regras
cada	vez	mais	estritas.	No	princípio	do	terceiro	século	eles	também	começaram	a
se	institucionalizar,	criando	seu	próprio	sistema	eclesial,	com	bispos	e	diáconos,
Por	 volta	 de	 381,	 o	 Concílio	 de	 Constantinopla	 finalmente	 decidiu	 que	 os
montanistas	 deveriam	 ser	 considerados	 pagãos.	 Apesar	 dessa	 oposição,	 o
movimento	 continuou	 pelo	 menos	 até	 o	 final	 do	 século	 V,	 quando	 Agostinho
menciona	sua	existência.
MONTANISMO:	HERESIA	OU	CRISTIANISMO	BÍBLICO?
Um	 dos	 problemas	 que	 os	 estudiosos	 enfrentam	 ao	 avaliar	 o	 montanismo	 é
depender	mais	 dos	 escritos	 dos	 inimigos	 do	montanismo	 que	 dos	 documentos
originais,	 escritos	 pelos	 próprios	montanistas.	 Escritos	 como	 os	 sete	 livros	 de
Tertuliano	sobre	a	profecia	extática,	nos	quais	os	montanistas	se	defendem,	não
sobreviveram.
Apesar	 disso,	 o	 montanismo	 tem	 adquirido	 uma	 atenção	 cada	 vez	 mais
favorável.	Em	1750,	por	exemplo,	John	Wesley	leu	uma	obra	do	início	do	século
XVIII,	chamada	A	desilusão	geral	dos	cristãos	em	relação	à	maneira	pela	qual
Deus	se	revela	aos	profetas	e	por	meio	deles	(The	general	delusion	of	christians
touching	the	ways	of	God	revealing	himself	to	and	by	the	prophets.)	Ele	aborda
o	montanismo	de	maneira	positiva,	refutando	muitas	das	acusações	tradicionais.
Após	ler	esse	livro,	Wesley	fez	esta	resenha	em	seu	diário,	em	15	de	agosto	de
1750:
Eu	 fui	 totalmente	 convencido	 do	 que	 eu	 já	 suspeitava:	 1)	 Que	 os	montanistas,	 no	 segundo	 e	 no
terceiro	 séculos	 eram	 realmente	 cristãos	 bíblicos;	 que	 2)	 O	 principal	 motivo	 pelo	 qual	 os	 dons
desapareceram	 tão	cedo	não	 foi	 somente	a	perda	 rápida	da	 fé	e	da	santidade,	mas	sim	os	homens
excessivamente	 formais,	ortodoxos	e	 secos	que	começaram	a	 ridicularizar	 todos	os	dons	que	eles
mesmos	não	tinham	e	a	censurá-los	por	serem	todos	ou	loucura	ou	impostura63.
Alguns	 detratores	 do	 montanismo	 insistem	 que	 o	 movimento	 representou
uma	intrusão	da	profecia	pagã	no	cristianismo	dosegundo	século64.	Porém,	não
há	no	horizonte	nenhuma	evidência	 concreta	que	possa	 sustentar	 essa	posição.
Tal	 afirmação	 “é	 completamente	 falsa”,	 segundo	 David	 Aune,	 no	 seu	 vasto
estudo	 sobre	 a	 profecia	 antiga:	Prophecy	 in	 early	 christianity	 and	 the	 ancient
mediterranean	 world	 (Profecia	 na	 igreja	 primitiva	 e	 o	 antigo	 mundo
mediterrâneo).	 Ele	 assegura	 que	 as	 principais	 características	 do	 montanismo,
incluindo	a	natureza	extática	das	suas	declarações	proféticas,	“são	derivadas	do
cristianismo	primitivo”65.
Em	 suma,	 é	 provavelmente	 seguro	 dizer	 que	 o	montanismo	 foi	 o	 primeiro
renovo	 carismático	 dentro	 da	 Igreja	 e	 que	 ele	 quis	 trazer	 o	 avivamento	 a	 um
eclesiasticismo	 cada	 vez	 mais	 enrijecido.	 É	 óbvio	 que	 a	 igreja	 institucional
reagiu	desmesuradamente	ao	movimento	e	acelerou	uma	tendência	de	desdém	e
indiferença	ante	os	dons	espirituais.	Como	disse	Philip	Schaff,	isto	também	criou
uma	tendência,	em	que	houve	um	ponto	de	cisão	“entre	a	era	dos	apóstolos,	na
qual	 houve	 revelações	 sobrenaturais,	 e	 a	 era	 seguinte,	 na	 qual	 as	 revelações
desapareceram”66.	McDonnell	fala	que	“a	igreja	jamais	conseguiu	recuperar	esse
balanço	depois	da	rejeição	do	montanismo”67.
OS	TOQUES	FINAIS
A	ameaça	 do	montanismo	 às	 autoridades,	 agora	 investidas	 de	 cargos	 eclesiais,
fez	 com	 que	 a	 Igreja	 concedesse	 ainda	 mais	 autoridade	 ao	 bispo,	 acelerando
assim	o	processo	de	 institucionalização.	As	 igrejas	estavam	agora	 sob	controle
de	um	só	indivíduo,	a	quem	o	título	de	bispo	era	reservado	exclusivamente,	pois
a	administração	dos	problemas	da	igreja	do	primeiro	século	era	feita	por	anciãos,
chamados	de	bispos	ou	supervisores68.	Foi	 também	durante	esse	 tempo	que	os
bispos	começaram	a	ser	vistos	como	os	sucessores	dos	apóstolos.	Por	isso,	eles
passaram	a	ser	considerados	os	donos	e	os	garantidores	da	doutrina	apostólica;
só	eles	possuíam	o	charisma	veritus,	o	dom	divino	do	conhecimento	que	vem	de
Deus,	 o	 que	 lhes	 dava	 o	 direito	 de	 ensinar.	 Ao	 conferir	 toda	 a	 autoridade	 ao
cargo	de	bispo,	pensou-se	que	a	Igreja	estaria	protegida	dos	mestres	hereges.
Essa	tendência	institucional	trouxe	para	a	igreja	uma	divisão	profunda	entre
o	clero	e	os	leigos,	desconhecida	na	igreja	do	Novo	Testamento.	O	critério	para
ensinar	e	liderar	deixou	de	ser	o	chamado	e	a	concessão	de	dons	pelo	Espírito	e
passou	a	ser	a	ordenação	feita	pelos	hierarcas	da	Igreja.	Bultmann	mostra	que	o
dom	espiritual	 de	 ensinar	 e	 liderar	 “que	 era	 originalmente	 concedido	 à	 pessoa
pelo	 Espírito,	 é	 agora	 entendido	 como	 um	 cargo	 –	 carisma	 obtido	 por
ordenação”69.	 O	 clero	 assumiu	 todas	 as	 responsabilidades	 da	 Igreja,	 e	 então
emergiu	um	sacerdócio	diferente,	paralelo	àquele	do	Velho	Testamento70.
A	reação	da	Igreja	ao	montanismo	contribuiu	para	um	desaparecimento	cada
vez	mais	 rápido	 dos	 dons	 espirituais.	 À	 altura	 do	 terceiro	 século,	 Orígenes	 já
diria	explicitamente	que	“esses	sinais	diminuíram”71.	A	liberdade	do	espírito	foi
substituída	 pelos	 rituais	 cerimoniais	 e	 pela	 ordem	 eclesial.	 O	 golpe	 final	 no
aspecto	 carismático	 da	 Igreja	 viria	 com	 a	 conversão	 de	 Constantino	 e	 com	 a
aquisição	de	poder	e	afluência	terrenas	por	parte	da	Igreja.
Capítulo	4
O	IMPACTO	DA	CONVERSÃO	DE	CONSTANTINO	NO
ASPECTO	CARISMÁTICO	DA	IGREJA
A	conversão	de	Constantino	em	312	d.C.	marcou	a	ascensão	da	Igreja	ao	poderio
terreno	e	o	fim	da	participação	dos	charismata	em	sua	vida	e	em	seu	ministério.
Em	 313	 d.C.	 Constantino	 publicou	 o	 Edito	 de	Milão,	 um	 decreto	 que	 não	 só
dava	liberdade	de	culto	a	todos	os	habitantes	do	império,	mas	também	concedia
benefícios	 à	 Igreja.	 Como	 consequência,	 esta	 foi	 penetrada	 por	 pessoas	 que
buscavam	vantagens	políticas	e	 sociais	oferecidas	a	quem	se	 identificasse	com
ela.
FUSÃO	ENTRE	ESTADO	E	IGREJA
Constantino	 começou	 a	 se	 envolver	 diretamente	 com	 os	 assuntos	 da	 Igreja,
lançando	 assim	 o	 fundamento	 para	 o	 amálgama	 dos	 poderes	 eclesial	 e	 estatal.
Em	325	 d.C.,	 por	 exemplo,	 ele	 convocou	 o	 Primeiro	Concílio	Geral	 da	 Igreja
Cristã.
Bispos	 de	 todos	 os	 rincões	 do	 império	 encontraram-se	 em	 Niceia,	 uma
cidade	da	Ásia	Menor,	às	expensas	do	governo.	O	próprio	Constantino	presidiu	a
primeira	 sessão,	 e	 em	 sessões	 seguintes	 ele	 interveio	 em	 pontos	 cruciais	 da
discussão,	embora	sequer	fosse	batizado.	Kung	diz	que	“Constantino	usou	esse
primeiro	 concílio	 primariamente	 para	 adaptar	 a	 organização	 eclesial	 à
organização	estatal.	As	províncias	da	Igreja	deveriam	corresponder	às	províncias
imperiais,	cada	uma	com	um	sínodo	metropolitano	e	um	provincial.	Em	outras
palavras,	o	império	doravante	teria	sua	Igreja	Imperial”72.
Constantino	 também	 começou	 a	 construir	 instalações	 que	 abrigassem	 as
reuniões	 dos	 cristãos.	 Antes	 disso,	 os	 crentes	 tinham	 que	 se	 encontrar
principalmente	em	suas	casas.	Porém,	Constantino	erigiu	edificações	nas	quais	a
igreja	deveria	se	encontrar.	Ele	as	projetou	segundo	a	arquitetura	dos	auditórios
da	 época.	Essa	 arquitetura,	 com	 seu	 assento	 frontal	 em	 forma	 de	 trono	 para	 o
bispo	 e	 as	 fileiras	 reservadas	 à	 congregação,	 tornou	 impraticável	 um
envolvimento	significativo	dos	membros.	Além	disso,	o	estilo	da	adoração	e	da
liturgia,	que	antes	era	simples	e	pessoal,	começou	a	ser	adornado	com	a	pompa	e
a	prática	da	corte	imperial73.
A	RELIGIÃO	EXCLUSIVA	DO	ESTADO
Constantino	morreu	em	337	d.C.,	mas	seus	filhos	continuaram	e	expandiram	sua
política	de	favorecer	a	Igreja	Cristã.	Em	381	d.C.,	Teodósio	I,	o	novo	imperador,
fez	do	cristianismo	a	religião	exclusiva	do	Estado.	Todos	que	ousassem	aderir	a
qualquer	 outra	 forma	 de	 adoração	 se	 arriscavam	 a	 sofrer	 uma	 punição74.
Consequentemente,	hordas	de	pagãos	infiéis	encheram	as	igrejas,	trazendo	com
eles	práticas	e	ideias	gentias.	A	lassidão	moral,	que	já	havia	fraturado	a	natureza
original	 da	 Igreja,	 acabou	 por	 dominar	 boa	 parte	 de	 sua	 vida.	 Um	 dos	 que
lamentaram	esse	estado	terrível	da	situação	foi	João	Crisóstomo	(347-407	d.C.),
o	patriarca	de	Constantinopla.	Ele	se	queixou	do	caráter	da	igreja	dos	seus	dias
dizendo	 que	 ela	 não	 se	 diferenciava	muito	 de	 uma	 feira	 ou	 de	 um	 teatro.	 “Se
alguém	está	tentando	ou	pretendendo	corromper	uma	mulher,	suponho	que	não
haja	lugar	melhor	para	ele	do	que	a	igreja.	E	se	há	algo	que	se	queira	vender	ou
comprar,	 a	 igreja	 será	mais	 conveniente	 que	 o	mercado.	Ou	 se	 alguém	 quiser
saber	 de	 algum	 escândalo,	 você	 perceberá	 que	 aqui	 há	 mais	 disso	 que	 no
fórum”75.
Sendo	assim,	não	é	surpreendente	que	Crisóstomo	expresse	uma	ignorância
dos	charismata	elencados	em	1	Coríntios	12.	Ele	diz:	“As	trevas	são	produzidas
por	nossa	ignorância	dos	fatos	referidos	e	por	sua	cessação”76.	Ao	menos	nessa
região,	parece	que	os	dons	pararam	de	operar.	O	motivo	parece	óbvio.
ADOÇÃO	DO	MODELO	POLÍTICO	ROMANO
A	ascensão	do	cristianismo	ao	status	de	 religião	oficial	do	 império	 trouxe	uma
coesão	 política	 à	 Igreja	 que	 ela	 não	 conheceu	 antes.	Um	 sistema	 universal	 de
governança	eclesial	começou	a	emergir,	e	em	breve	ficaria	claro	que	isso	refletia
o	 padrão	 político	 vigente	 do	 Império	 Romano.	 Ao	mesmo	 tempo,	 o	 bispo	 da
cidade	 de	 Roma	 começou	 a	 ser	 visto	 como	 o	 primeiro	 entre	 iguais.
Reivindicando	 ser	 o	 cabeça	 da	 Igreja	 fundada	 por	 Pedro	 e	 Paulo,	 ele	 adquiriu
uma	 influência	 crescente	 para	 si,	 e	 assim	 pavimentou	 o	 caminho	 para	 que	 o
papado	 fosse	 o	 correspondente	 espiritual	 do	 comandante	 político:	 o	 imperador
romano.	Em	virtude	desses	acontecimentos,	Rudolph	Sohm	afirma	que	“em	sua
maior	parte,	a	constituição	da	Igreja	foi	modelada	na	organização	do	Império”77.
Essas	 tendências	 também	 trouxeram	 a	 solidificação	 da	 doutrina	 do
sacramentalismo.	As	ordenançasdo	batismo	e	da	Santa	Ceia	começaram	a	ser
vistas	 como	 sacramentos	 que	 possuíam	 valor	 salvífico	 inerente	 e	 poder	 de
conceder	 a	 graça	 e	 os	 dons	 de	 Deus78.	 Ademais,	 somente	 o	 bispo	 ou	 seu
encarregado	 tinham	 o	 direito	 de	 administrar	 esses	 sacramentos.	Na	 verdade,	 a
ingerência	 de	 alguma	 pessoa	 que	 não	 tivesse	 sido	 ordenada	 na	 administração
tornava	os	atos	sem	validade.
Essas	mudanças	 ocasionaram	 vários	 efeitos	 devastadores	 para	 o	ministério
do	 Espírito	 Santo	 no	 meio	 do	 povo	 de	 Deus.	 Os	 dons	 que	 antes	 surgiam
espontaneamente	entre	 toda	a	congregação	agora	estavam	restritos	à	hierarquia
eclesial	 e	 eram	 transmitidos	 por	 um	 ato	 sacramental.	 Na	 igreja	 do	 Novo
Testamento,	 as	 pessoas	 participavam	de	 uma	 oração	 espontânea,	mas	 agora	 se
tornaram	 espectadoras	 passivas	 de	 um	 ritual	 altamente	 sofisticado,	 presidido
pelos	hierarcas	da	Igreja.
SURGIMENTO	DAS	BATALHAS	DOUTRINAIS
A	 ascensão	 da	 Igreja	 ao	 poder	 também	 marcou	 o	 início	 de	 muitas	 batalhas
doutrinais.	Depois	 que	 a	 Igreja	 se	 livrou	da	 ameaça	da	perseguição	 e	 usufruiu
dos	favores	do	imperador,	ela	voltou	sua	atenção	às	questões	 teológicas	que	se
tornaram	 o	 teste	 de	 tornassol	 da	 ortodoxia	 aplicado	 a	 qualquer	 um.	 Muitas
batalhas	violentas	se	seguiram,	produzindo	divisões	intensas	na	Igreja.	Basílio	de
Cesareia,	 bispo	 da	 Capadócia	 (371-379	 d.C.),	 comparou	 essa	 situação	 a	 uma
batalha	 naval	 combatida	 por	 homens	 que	 “cultivam	 um	 ódio	 mortal	 uns	 para
com	os	outros”79.
Mas	que	tempestade	no	mar	foi	tão	cruel	quanto	as	tempestades	nas	igrejas?	Nela	todos	os	marcos
dos	Pais	estão	sendo	movidos;	toda	fundação,	todo	baluarte	de	opinião	foi	abalado;	por	se	sustentar
numa	base	deteriorada,	tudo	em	volta	se	desestabiliza	e	desmorona.	Nós	atacamos	uns	aos	outros.	Se
nosso	inimigo	não	nos	atinge	antes,	nós	somos	feridos	em	nosso	lado	pelos	nossos	camaradas80.
Em	uma	situação	como	essa,	não	é	de	surpreender	que	os	dons	espirituais	–
que,	 segundo	 os	 ensinamentos	 de	 Paulo,	 deveriam	 funcionar	 dentro	 de	 um
contexto	 de	 amor	 cristão	 –	 se	 extinguissem	 na	 igreja	 institucional.	 O
envolvimento	da	igreja	com	a	abundância	e	o	poder	mundanos	marcaram	o	fim
dos	 charismata	 como	 uma	 parte	 vital	 da	 sua	 vida	 e	 do	 seu	 ministério.	 A.	 J.
Gordon,	 pastor	 e	 fundador	 batista	 da	 Faculdade	 Gordon,	 em	 Boston,	 estava
correto	quando	disse:	“Não	é	de	todo	estranho	que,	quando	a	Igreja	se	esqueceu
de	 sua	 cidadania	 celeste	 e	 começou	 a	 se	 acomodar	 na	 luxúria	 e	 no	 esplendor
terrenos,	ela	tenha	parado	de	exibir	os	dons	sobrenaturais	do	céu”81.
Porém,	 ainda	que	os	dons	 tenham	desaparecido	da	 igreja	 institucional,	 não
desapareceram	por	completo.	A	partir	de	então,	começaram	a	aparecer	entre	os
crentes	que	se	retiraram	da	sociedade	com	o	intuito	de	viver	uma	vida	de	oração
e	devoção	a	Deus,	num	esforço	de	escapar	da	corrupção	que	se	apoderava	tanto
da	Igreja	quanto	do	mundo.	Conhecidos	como	monásticos,	eles	se	tornaram	uma
força	 vital	 durante	 a	 Idade	Média	 e	 preservaram	 a	 dimensão	miraculosa	 da	 fé
cristã.
Capítulo	5
MONASTICISMO:	O	SURGIMENTO	DE	OUTRO
MOVIMENTO	CARISMÁTICO
Os	 monásticos	 eram	 crentes	 devotos	 que	 se	 dedicavam	 à	 vida	 ascética	 num
esforço	 de	 experimentar	 a	 presença	 e	 o	 poder	 de	Deus	 de	 uma	maneira	muito
íntima.	O	estágio	 inicial	do	movimento	foi	 individualista,	com	ascetas	vivendo
como	 ermitões.	 Por	 volta	 de	 320	 d.C.,	 eles	 começaram	 a	 se	 reunir	 em
comunidades	 onde	 adotavam	 um	 estilo	 de	 vida	 totalmente	 autossuficiente.
Durante	 a	 Idade	Média	 (600-1517	 d.C.)	 essas	 comunidades	 –	 ou	monastérios,
como	 eram	 chamados	 –	 tornaram-se	 centros	 de	 aprendizado,	 e	 os	 monges
serviam	como	curadores	dos	livros	e	manuscritos.	Em	total	devoção	a	Deus,	eles
se	entregavam	aos	estudos,	à	oração	e	à	meditação.	Provaram,	de	fato,	ser	focos
de	luz	durante	um	período	de	decadência	social	 intensa,	conhecida	como	a	Era
das	Trevas	(500-1300	d.C.).
Após	 a	 chegada	 de	 Constantino	 ao	 poder,	 a	 maioria	 dos	 fenômenos
sobrenaturais	 é	 registrada	 pelos	 monásticos	 ou	 por	 aqueles	 que	 veneravam	 o
estilo	de	vida	monástico.	O	Cardeal	Leon	Joseph	Suenens	está	correto	ao	dizer
que	“em	seu	princípio,	o	monasticismo	foi,	de	fato,	um	movimento	carismático”
82.	 Os	 dons	 miraculosos	 do	 Espírito	 Santo	 que	 desapareceram	 da	 igreja
institucional	 apareciam	 agora	 entre	 os	 monásticos.	 Muitos	 monges	 ganharam
notoriedade	 pelo	 poder	 de	 sua	 oração	 e	 por	 sua	 habilidade	 em	 produzir	 cura,
libertação	 da	 opressão	 demoníaca	 e	 outros	 fenômenos	milagrosos.	 Os	 pais	 da
Igreja,	 que	 falavam	 sobre	milagres,	 como	Atanásio,	Agostinho	 e	 Jerônimo,	 ou
praticavam	 a	 vida	 monástica	 ou	 tinham	 uma	 ligação	 estreita	 com	 quem	 a
praticava.
ANTÃO
Antão	(251-356	d.C.)	é	geralmente	considerado	o	pai	do	monasticismo.	Ele	foi
criado	 num	 lar	 cristão	 abastado	 do	 Egito.	 Logo	 após	 a	 morte	 de	 seus	 pais,
quando	tinha	18	anos,	sentiu	que	Deus	o	estava	guiando	para	abandonar	todos	os
seus	bens	e	viver	uma	vida	de	devoção	absoluta.	Após	vender	a	fazenda	de	300
acres	de	seu	pai,	ele	se	mudou	para	uma	caverna	no	deserto,	e	ali	dedicava	seu
tempo	à	oração	e	à	meditação.
A	fama	da	santidade	e	do	poder	de	oração	de	Antão	se	espalhou	por	todo	o
império.	Muitos	outros,	 imitando-o,	adotaram	o	estilo	de	vida	ermitão.	Outros,
ainda,	inspirados	por	sua	devoção,	se	organizaram	em	comunidades	monásticas.
A	 vida	 de	 Antão,	 escrito	 pelo	 Bispo	 Atanásio,	 está	 cheio	 de	 relatos
sobrenaturais.	De	 acordo	 com	Atanásio,	muitas	 pessoas	de	 todo	 tipo	visitaram
Antão	no	deserto	buscando	sua	sabedoria	e	suas	orações.	Dizem	que	ele	possuía
o	 dom	 de	 discernimento	 de	 espíritos	 e	 recebia	 revelações	 sobrenaturais.	 Suas
orações	 traziam	cura	 aos	doentes	 e	 libertação	para	 os	 endemoniados.	Atanásio
fala	de	uma	ocasião	específica	em	que	muitos	se	reuniram	à	entrada	da	caverna
de	 Antão	 atrás	 de	 suas	 orações.	 Antão	 enfim	 saiu	 de	 lá	 e	 “por	 meio	 dele	 o
Senhor	 curou	 as	 enfermidades	 corporais	 de	 muitos	 ali,	 e	 purificou	 outros	 de
espíritos	maus”83.
Antão	viveu	até	os	105	anos.	Segundo	Atanásio,	ele	se	manteve	fisicamente
forte	 até	 o	 fim.	 Seus	 olhos	 mantiveram	 o	 fulgor	 e	 ele	 não	 perdeu	 um	 dente
sequer.	Antes	de	sua	morte,	ele	visitou	outros	monges	no	deserto	e	lhes	informou
que	aquela	 seria	a	última	vez	que	o	veriam.	Eles	 responderam	com	 lágrimas	e
abraços	 e	 ele,	 por	 sua	 vez,	 lhes	 exortou	 alegremente	 a	 permanecer	 em	 sua
devoção	a	Deus.	Pouco	depois,	após	ter	indicado	o	que	fazer	na	distribuição	de
seus	poucos	pertences,	ele	uniu	seus	pés	sob	si	(como	Jacó	em	Gênesis	49.33)	e
morreu	com	uma	expressão	de	alegria	no	rosto.
PACÔMIO
Pacômio	 (292-346	 d.C.)	 era	 um	 soldado	 dispensado	 que	 provavelmente	 se
inspirou	no	 testemunho	de	Antão	para	 viver	 durante	 um	 tempo	 como	 ermitão.
Certo	dia,	quando	estava	sentado	em	sua	cela,	um	anjo	lhe	apareceu	e	disse:	“Vá
e	 traga	a	 ti	 aqueles	que	andam	errantes	e	habita	com	eles,	 e	 entrega-lhes	estas
leis	que	lhe	ditarei”84.	Em	seguida,	Pacômio	organizaria	o	primeiro	monastério,
em	320	d.C.,	a	leste	do	Rio	Nilo,	em	Tabennisi.	Cada	membro	da	comunidade	se
comprometia	a	cumprir	uma	tarefa,	adotar	horários	específicos	para	a	adoração	e
usar	 roupas	 similares	 às	 de	 seus	 colegas	monges.	 Além	 do	 tempo	 dedicado	 à
devoção	privada,	eles	tinham	horários	fixos	para	a	adoração	comum.
Um	escritor	 antigo	descreveu	Pacômio	como	“um	homem	dotado	da	graça
apostólica	 tanto	 no	 ensinamento	 quanto	 na	 operação	 de	milagres”85.	 Em	 certa
ocasião,	ele	recebeu	um	visitante	do	Ocidente	que	falava	latim,	uma	língua	que
Pacômio	 não	 conhecia.	 Porém,	 após	 três	 horas	 de	 oração	 sincera,	 Pacômio
adquiriu	a	habilidadede	conversar	com	o	visitante	em	 latim.	Foi	 relatado	que,
quando	necessário,	 Pacômio	 conseguiu	 se	 comunicar	 em	diversas	 ocasiões	 em
uma	 língua	que	não	aprendera	 antes.	 Isso	 indica	que	provavelmente	o	dom	de
línguas	era	comum	nas	comunidades	monásticas.
ATANÁSIO
Conhecido	 como	 o	 pai	 da	 ortodoxia,	 Atanásio	 (295-373	 d.C.)	 foi	 o	 bispo	 de
Alexandria.	 Sua	 vida	 antecedeu	 e	 sucedeu	 o	 Concílio	 de	Niceia.	 Sua	 fama	 se
deve	mais	aos	seus	escritos	contra	o	arianismo.	Arius	ensinava	que	Cristo	era	um
ser	 criado,	 diferente	 do	 Pai	 e	 menor	 que	 ele.	 Esse	 ensinamento	 conquistou
muitos	seguidores	no	quarto	século.
Atanásio,	 por	 outro	 lado,	 insistiu	 que	 Cristo	 era	 igual,	 coeterno	 e
consubstancial	ao	Pai.	Em	virtude	dessas	posições,	foi	exilado	por	cinco	vezes,
mas	seu	ensinamento	finalmente	foi	aceito	pela	doutrina	oficial	da	Igreja.
Atanásio	 estava	 obviamente	 acostumado	 com	 o	ministério	 sobrenatural	 do
Espírito	Santo.	Ele	escreveu	o	relato	da	vida	de	seu	amigo	Antão,	imortalizando
muitos	de	seus	milagres.	Atanásio	concluiu	seu	relato	da	vida	de	Antão	dizendo:
“Nós	não	podemos	duvidar	de	que	tais	maravilhas	tenham	sido	operadas	por	um
homem.	Pois	na	promessa	do	Salvador	ele	disse:	‘Se	tiverdes	fé	como	um	grão
de	mostarda,	direis	a	este	monte:	Passa	daqui	para	acolá,	e	há	de	passar;	e	nada
vos	será	impossível’”86.
À	 época	 de	 Atanásio,	 o	 cargo	 de	 bispo	 já	 tinha	 se	 cercado	 de	 tantos
ornamentos	políticos	que	muitos	consideravam	a	aceitação	dessa	posição	como
uma	maneira	de	dar	ocasião	ao	pecado.	Porém,	Atanásio	argumentou	contra	essa
postura	em	uma	carta	a	seu	amigo	Dracôncio,	o	qual	deveria	escolher	entre	um
estilo	de	vida	monástico	comprometido	com	Deus	ou	o	de	um	bispo,	cercado	de
facilidades	 e	 tentações.	Atanásio	 diz	 a	Dracôncio	 que	 ele	 pode	 viver	 qualquer
tipo	 de	 vida	 devota	 que	 sua	 alma	 deseja,	 mesmo	 sendo	 bispo.	 Ele	 diz	 a
Dracôncio	que	conhece	bispos	que	jejuam	e	monges	que	não,	e	também	bispos
que	não	se	casaram	e	monges	que	se	casaram	e	tiveram	filhos.	Ele	também	diz
que	 “conhecemos	 bispos	 que	 operam	 maravilhas	 (milagres)	 e	 monges	 que
não”87.
O	 testemunho	de	Atanásio	mostra	 claramente	que	 ele	 estava	 acostumado	e
aberto	aos	dons	miraculosos	do	Espírito.	Seus	escritos	revelam	que	não	se	sabia
nada	sobre	a	teoria	de	que	os	dons	haviam	cessado	nem	que	eles	eram	reservados
a	um	grupo	de	poucos	santos	selecionados.
HILARIÃO
Hilarião	(305-385	d.C.)	nasceu	na	cidade	de	Gaza,	Palestina.	Seus	pais,	pagãos,
deram-lhe	 uma	 boa	 educação.	 Tornou-se	 um	 crente	 em	 Jesus	Cristo	 ainda	 em
tenra	idade	e,	desde	o	início,	mostrava	uma	tendência	à	vida	ascética.
Enquanto	 estava	 ainda	 em	 sua	 adolescência,	 Hilarião	 soube	 da	 fama	 de
Antão	 e	 o	 visitou	 em	 seu	 retiro	 no	 deserto.	 Devido	 a	 essa	 visita,	 Hilarião
dedicou-se	 a	 uma	 vida	 de	 devoção	 no	 deserto	 da	 Palestina.	 Ele,	 assim	 como
Antão,	ganhou	reputação	por	sua	santidade	e	poder	de	oração.	Jerônimo,	que	o
conheceu	pessoalmente,	disse:	“Eu	não	teria	tempo	de	relatar	todos	os	milagres
que	foram	operados	por	ele”88.
Em	outra	ocasião,	Hilarião	encontrou	um	paralítico	deitado	perto	da	entrada
de	 sua	 abadia.	 Ele	 perguntou	 qual	 era	 o	 nome	 do	 homem,	 e	 então:	 “[…]
chorando	muito	e	estendendo	sua	mão	ao	homem	prostrado,	disse:	 ‘Ordeno-te,
em	nome	 do	Senhor	 Jesus	Cristo,	 que	 te	 levantes	 e	 ande’.	As	 palavras	 sequer
haviam	 saído	 de	 sua	 boca	 quando,	 numa	 velocidade	milagrosa,	 seus	membros
foram	fortalecidos	e	o	homem	levantou	e	manteve-se	em	pé”89.
Hilarião	 passou	 os	 últimos	 dias	 de	 sua	 vida	 no	 Chipre,	 e	 ali	 morreu.	 Um
amigo	e	admirador	roubou	seu	corpo	e	o	levou	de	volta	à	Palestina.	De	acordo
com	Jerônimo,	que	escrevia	após	a	morte	de	Hilarião,	os	milagres	continuavam	a
acontecer	 tanto	no	Chipre,	no	local	onde	ele	morreu,	quanto	em	seu	túmulo	na
Palestina.
AMBRÓSIO
Ambrósio	 (340-397	 d.C.)	 tornou-se	 bispo	 de	 Milão	 em	 374	 d.C.;	 para	 sê-lo,
desistiu	de	uma	carreira	bem-sucedida.	Ele	era	um	competente	administrador	e
um	pregador	 talentoso.	Sua	pregação	foi	 fundamental	para	 trazer	Agostinho	ao
conhecimento	da	Verdade;	em	387	d.C.	ele	batizou	Agostinho.
Em	 certa	 ocasião	 em	 Milão,	 relata	 Agostinho,	 uma	 enorme	 multidão	 se
aglomerou	próximo	 a	 um	 túmulo	 de	 dois	mártires.	Num	 sonho,	 foi	 revelada	 a
Ambrósio	 a	 localização	 dos	 corpos	 desses	 mártires.	 Assim	 que	 a	 multidão	 se
aglomerou,	um	cego	recebeu	sua	visão	milagrosamente90.
Embora	ele	tenha	vivido	e	ministrado	numa	época	de	decadência	espiritual,
Ambrósio	 expressa,	 nos	 seus	 escritos,	 uma	 preocupação	 e	 uma	 abertura	 às
manifestações	sobrenaturais	do	espírito.	Essa	perspectiva	é	clara	em	sua	obra	Do
Espírito	Santo,	na	qual	ele	 tenta	demonstrar	a	unidade	da	Trindade,	apontando
que	 aquilo	 que	 se	 poderia	 falar	 do	 Pai	 e	 do	 Filho	 também	 se	 pode	 falar	 do
Espírito	Santo.
Veja	que	o	Pai	e	Cristo	também	escolhem	mestres	para	as	igrejas,	e	assim	como	o	Pai	dá	o	dom	de
cura,	o	Filho	 também	o	dá;	 assim	como	o	Pai	dá	o	dom	de	 línguas,	o	Filho	 também	o	concedeu.
Dessa	maneira,	nós	sabemos	que	o	mesmo	ocorre	com	em	relação	ao	Espírito	Santo;	ele	concede	os
mesmos	 tipos	de	graças.	Portanto,	o	Espírito	dá	os	mesmos	dons	que	o	Pai,	e	o	Filho	 também	os
dá91.
Essa	passagem	exprime	uma	clara	aceitação	do	fenômeno	carismático,	como
as	curas	e	o	dom	de	línguas.	Deveria	ser	 lembrado	também	que	ele	fala	desses
dons	no	tempo	verbal	presente,	mostrando	sua	crença	na	validade	deles	na	época
deles.
JERÔNIMO
Jerônimo	(347-420	d.C.)	converteu-se	em	360	d.C.	e	passou	a	ser	um	estudante
nômade	em	Roma	e	nas	cidades	da	Gália	durante	muitos	anos.	Ele	se	tornou	um
intelectual	 astuto	 e	 um	 amante	 das	 letras	 clássicas.	 Enquanto	 viajava	 pelo
Oriente	 e	 para	 a	 Antioquia,	 adoeceu	 gravemente.	 Durante	 sua	 doença,	 Cristo
apareceu	 e	 lhe	 admoestou	 por	 sua	 devoção	 exagerada	 aos	 estudos	 clássicos.
Arrependido,	 ele	 retornou,	 tornou-se	um	diligente	 estudante	da	Bíblia,	 estudou
hebraico	e	viveu	como	ermitão	numa	região	próxima	à	Antioquia.	Um	estudioso
chamou	Jerônimo	de	“o	intelectual	mais	poderoso	que	a	igreja	ocidental	antiga
pôde	ostentar”92.
Tempos	depois,	Jerônimo	se	mudou	para	a	Palestina,	onde	se	tornou	o	abade
do	 monastério.	 Durante	 esse	 tempo,	 até	 sua	 morte	 em	 420	 d.C.,	 Jerônimo
escreveu	 as	 obras	 pelas	 quais	 é	 lembrado,	 inclusive	 sua	 magnum	 opus,	 a
tradução	 das	 Escrituras	 para	 o	 latim,	 chamada	 Vulgata.	 Desde	 o	 Concílio	 de
Trento	 (1545-1563)	 até	 recentemente,	 essa	 foi	 a	 única	 Bíblia	 oficial	 da	 Igreja
Católica	Romana.
Resta	claro	que	Jerônimo	cria	no	ministério	sobrenatural	do	Espírito	Santo.
Os	milagres	são	sempre	mencionados	por	ele,	especialmente	em	sua	obra	A	vida
de	Santo	Hilarião.	Talvez	o	milagre	mais	extraordinário	 relatado	por	Jerônimo
seja	 o	 de	Hilarião	 aquietando	 o	mar	 que	 tinha	 sido	 agitado	 por	 um	 terremoto
violento.	 Segundo	 Jerônimo,	 uma	 enorme	 parede	 d’água	 que	 estava	 prestes	 a
destruir	 a	 vila	 de	 Epidauro	 se	 acalmou	 e	 se	 desfez	 ante	 a	 palma	 da	 mão	 de
Hilarião:	“Em	verdade,	aquilo	que	foi	dito	aos	apóstolos	–	‘se	tiverdes	fé,	direis
a	esta	montanha:	–	vá	para	o	mar	–	e	ela	irá’	pôde	ser	cumprido	literalmente	se
alguém	tiver	a	fé	que	o	Senhor	exigiu	que	os	apóstolos	tivessem”93.
Jerônimo	viveu	saudável	até	chegar	ao	século	V	e	não	dá	nenhuma	pista	em
seus	 escritos	de	que	 esperasse	o	 fim	dos	milagres.	Como	Atanásio,	 ele	mostra
que	os	milagres	estão	ao	alcance	de	todos	os	que	creem	segundo	as	palavras	de
Jesus.
AGOSTINHO
Após	sua	conversão	em	387	d.C.,	Agostinho	(354-430	d.C.)	tornou-se	o	bispo	de
Hipona,	 na	 África	 Setentrional.	 Ele	 foi	 um	 pensador	 influente	 e	 um	 escritor
prolífico,	geralmente	reconhecido	como	o	maior

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