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1. Resumo do Texto As marcas publicitárias ocupam hoje um local privilegiado na simbologia dos países capitalistas. Elas representam a realidade nacional, criando, para isso, símbolos específicos. Nos Estados Unidos, por exemplo, a propaganda do cigarro Marlboro retratava um cowboy durão, um típico personagem sulista. Mas o processo que acontece atualmente é justamente o inverso. Os próprios americanos começam a se identificar com a marca, no caso, com o homem Marlboro. Acontece, aí, um processo de transmutação onde, num primeiro momento “a marca usa elementos da realidade social para constituir sua imagem; em outro, é essa própria realidade social que se refere à marca para definir a si mesma”. Assim, a marca ganha existência própria. Nesse contexto, encaixa-se um conceito criado por Marx, o de fetichismo da mercadoria. Esse termo é uma apropriação feita pelo autor da noção inicial de fetiche como ideia da aparência, aplicada à sociedade capitalista. Nesse caso, os produtos fabricados pela indústria capitalista perdem seu valor de uso, sua utilidade prática, e passam a ser desejados pelo seu valor de troca, pelo seu valor simbólico. Os homens, então, deixam de se reconhecer como produtores daqueles objetos, deixam de ser sujeitos para serem objetos, meros consumidores acríticos. Marx toma a mercadoria como exemplo para explicar o processo, ocorrido em meados do século XIX, onde a sociedade começa a valorizar os produtos lançados pelas fábricas. A mercadoria é “o objeto histórico através do qual se poderia dizer algo sobre a sociedade industrial e os seus valores sociais mais amplos”. Ela é o ponto chave a ser analisado para que possamos perceber uma distorção desses valores sociais, que são agora, mediados pela troca mercantil. E é exatamente essa a análise a ser empreendida a seguir. Durante a Revolução Industrial, Marx apreende o processo de transmutação sofrido pela mercadoria, que constrói sua linguagem a partir do contexto em que foi criada para, depois, servir de “espelho” às pessoas que buscam nelas sua imagem refletida. Para atingir esse feito, a indústria produtora opera através do estímulo amoroso, as mercadorias retiram sua estética da relação amorosa entre seres humanos. Porém, essa relação é invertida e as pessoas, então, “retiram a sua expressão estética das mercadorias”. A partir daí, Marx separa claramente o objeto (produto) da sua forma dotada de significado. Não é o produto em si, suas qualidades positivas, que definem o seu valor de uso, mas um conceito mais amplo, o da “forma-mercadoria”. Portanto, a relação fetichista não acontece no nível das coisas e sim no nível das palavras. Isso quer dizer que ela é produto da história cultural da época que assim o formatou. Assim, para que possamos melhor entender essa relação é preciso buscar a história cultural que transforma o objeto em questão em fetiche e que se relaciona com o que é valorizado socialmente em determinada época. “No caso específico da marca publicitária, apreender as mudanças que ocorrem para que a sociedade contemporânea passasse a usar esse tipo de símbolo para falar de si mesma”. Dentro dessa perspectiva, consideramos decisiva a importância da marca publicitária, pois ela exemplifica muito bem toda a teoria demonstrada acima. Além disso, ela está inserida também na discussão contemporânea de “fetichismo das imagens”, um desdobramento do “fetichismo da mercadoria”. A diferenciação fundamental entre os dois conceitos é a seguinte: enquanto no último ocorre uma transformação das relações sociais, que passam a ocorrer mediadas pela relação entre as “coisas”; no segundo, processo que ocorre atualmente, são as próprias coisas (os produtos) que se referem às marcas para ganhar identidade própria. “Ou seja, não basta tomar refrigerante, tem de ser Coca-Cola”. O consumo é então, orientado pelas marcas. As pessoas deixam de se referir às coisas em si e passam a se referir às imagens sobre as quais essas próprias coisas se constroem. Ocorre aí um deslocamento do mundo das coisas para o mundo das imagens. E a imagem, como definiu Guy Debord, se torna forma final da “reificação” (“coisificação”) da mercadoria. Nesse novo estágio do fetichismo da mercadoria, as imagens adquirem novo papel. A marca publicitária é agora um sintoma de uma cultura que se tornou, ao longo do século XX, cada vez mais voltada para a produção de imagens. Essa noção se encaixa numa das grandes polêmicas contemporâneas sobre o lugar da arte e da cultura, fomentada principalmente com o surgimento dos meios eletrônicos de comunicação: cinema e TV. A produção dessas imagens é voltada basicamente para o consumo, vinculadas ao propósito da distração, do entretenimento. Por esse motivo, não são imagens com conteúdo de grande complexidade, mas imagens simples, capazes de captar a atenção do espectador, que é mantida sem esforço, “de maneira descontínua, superficial e difusa”. Elas imagens de recepção “tátil” são apreendidas através dos sentidos, contrapondo-se à imagens de recepção ótica, que exigem uma postura mais contemplativa, atenta, reflexiva. E são justamente essas as imagens táteis que encontramos todos os dias na mídia. Nesse nível, podemos retomar o paradoxo da marca como tendo de veicular imagens que, em um curto período de tempo, se tornam ultrapassadas em função da concorrência e das mudanças de gostos e estilo, ao mesmo tempo em que deve insistir em um padrão de consumo. O estilo das mercadorias está, portanto, em constante readaptação. A única coisa que se fixa é o nome da marca. Devido a sua importância histórico-social, o uso da imagem para fins abertamente comerciais fomentou inúmeras pesquisas. Uma das principais análises desse contexto é empreendida por Adorno E Horkheimer, que critica a utilização do termo “cultura de massa”, convencionado anteriormente para se referir a essas imagens de cunho lucrativo. Eles propõem, no seu lugar, o conceito de “indústria cultural” para se pensar a “fetichização da cultura”. Da mesma forma, a Escola de Frankfurt, da qual os autores citados acima fazem parte, empreendeu uma crítica à mercantilização da cultura. Como previu Adorno, tudo tornou-se cultura. Com isso, podemos pensar em “cultura da imagem” como uma resposta à emergência de uma sociedade de capitalismo de massa e à evolução técnica, que possibilitou a reprodução interminável das imagens. Nesse sentido, elas passam a circular desligadas do mundo material da produção, mas conectadas ao círculo mercantil. A partir daí, fica clara a simbiose entre publicidade e cultura: as imagens podem ser tomadas como sintoma de uma cultura que se tornou descartável, ao mesmo tempo em que, são a própria condição para a reprodução acelerada do capitalismo. O cenário formado, então, é o da marca publicitária como sintoma da nova forma de fetichismo. O capitalismo avançou até a medida que a cultura tornou-se um bem de consumo e foi além, pois agora a cultura torna-se peça fundamental na reprodução do sistema, a sua própria “mola propulsora”. Por esse motivo, não consumimos mais produtos em sim, e sim conceitos. A imaterialização tomou conta do social. Diante de todo o apresentado, podemos dizer que “a marca publicitária reflete o espírito de nossa época”. Para que ela seja criada e permaneça no mercado, deve estar relacionada a uma certa realidade social. E a partir dessa realidade, ela retira seus elementos constitutivos, seu significado, alterando, assim, a própria realidade em si. A força de uma marca está, portanto, na sua capacidade de forjar esse sentido refletido. Chegamos, dessa maneira, a ponto em que o capitalismo está subvertendo qualquer representação estável. A marca publicitária é agora uma ilusão de forma num mundo em que as coisas estão perdendo a forma em função da aceleração capitalista e no qual a dimensão simbólica da cultura está sendo ocultada pela própria dinâmica veloz do capitalismo. 2. Análise-Comentário O texto resumido acima é de difícil leitura, exigindo uma grande concentração, pois não é muito objetivo. Não há uma preocupação em explicitar a tese defendida logo inicialmente. O caminho optado é do desenvolvimento das ideias e dos exemplos, contrapondo algumas vezes com conceitos de outros autores, para no fim – nos últimos parágrafos – estabelecer a tese. Além disso, o uso demasiado de citações diretas, que muitas vezes não se adequam perfeitamente à frase construída pela autora, é um dos principais problemas. Podemos destacar também a presença de forte interdisciplinaridade. Conhecimentos básicos de Teoria da Comunicação e Filosofia são essenciais para total compreensão do texto, já que são feitas constantes referências a outros autores como Marx, Adorno, Horkheimer, Jean Baudrillard, entre outros. Já sobre a temática abordada pelo texto, podemos dizer que é muito atual. Vivenciamos atualmente essa era em que a publicidade e a cultura se misturam. Nessa medida, a publicidade passa a vender conceitos, símbolos, e não mais meros produtos materiais. As propagandas vendem agora padrões de vida. Por exemplo, a Coca-Cola deixou de vender refrigerantes e passou a vender felicidade (com o slogan “Abra a felicidade”). A Peugeot não vende mais carros (meios de transporte) e sim status, sucesso. Dessa forma, podemos afirmar que a produção dos bens de consumo não só é determinada pelo modo de vida da população, como também a determina. A lógica da produção penetra na vida dos homens, alterando definitivamente suas relações sociais, que passam agora a ser mediadas pelas marcas publicitárias. Possuir um produto de determinada marca significa pertencer a determinado grupo social. Esse processo de subversão das relações humanas, ou o fetichismo da mercadoria, é, segundo Marx, a manifestação concreta da alienação da sociedade burguesa. A esse respeito, também escreve Guy Debord, ao classificar essa sociedade em “sociedade do espetáculo”. Dentro da lógica dessa nova sociedade, a marca passa a ser um produto artístico, estético, com um nome que lhe garante identidade única. E a produção cultural é voltada para a criação de novos hábitos de vida e consumo. O termo indústria cultural, como chamará Adorno, é justamente a explicitação de que essa produção cultural não é feita pela massa, mas sim para a massa. É imposta verticalmente pelas elites. A heterogeneidade, a diferença, a qualidade, é então substituída pela quantificação. Na indústria cultural, entretenimento não é mais do que uma novo forma de dominação da sociedade.
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