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Aula 3 2003

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Engenharia de Bioprocessos Recombinantes
Escola Piloto 2003 - Programa de Engenharia Química – COPPE – UFRJ
Tradução
Na aula anterior estudamos como a informação genética está contida no DNA e começamos a estudar como esta informação é decodificada para proteínas. A primeira parte deste processo, onde a informação do DNA é transcrita para moléculas de RNA, como já foi visto, envolve uma porção de etapas de processos enzimáticos complexos.
Nesta aula veremos como o mRNA é levado a proteínas.
Como já mencionado anteriormente, os aminoácidos, constituintes fundamentais das proteínas, são em número de vinte, já os nucleotídeos são em número de quatro. O que imediatamente descarta a hipótese de que um nucleotídeo poderia codificar para um aminoácido. Embora um par de nucleotídeos pudessem codificar para um número maior de aminoácidos (4x4=16 aminoácidos), este número ainda não seria suficiente. Somente um número de três nucleotídeos daria um número de combinações suficientemente grande para codificar os vinte aminoácidos, uma vez que 4x4x4 geraria 64 combinações possíveis.
Foram os experimentos de Francis Crick e Sydney Brenner que comprovaram a idéia dos tripletos de DNA, os códons.
Primeiro eles observaram que através de uma mutação que causava uma deleção de um nucleotídeo, era possível extinguir a função daquele gene. E que com uma outra mutação a qual era inserido um nucleotídeo diferente daquele deletado e também em uma posição diferente, mas próxima a primeira mutação o gene era reabilitado, como mostra a figura 34. 
Figura 34. Deleção e inserção de nucleotídeos, extinguindo e reabilitando um gene.
Já com duas deleções ou com duas inserções, mesmo que elas sejam próximas não ocorreu a reabilitação do gene mutado.
Figura 35. Efeito de duas inserções ou deleções na seqüência de um gene.
Mas com três inserções ou deleções próximas, o gene era reabilitado, somente após a terceira inserção ou deleção, como mostra a figura 36.
Figura 36. Efeito de três inserções na seqüência de um gene
	Com estes experimentos ficou claro que além de haver uma ordem na leitura da informação genética, esta ordem era estabelecida a cada três nucleotídeos.
	Mas através da combinação de três nucleotídeos, como visto, 64 combinações tornam-se possíveis que é um número maior que 20, que é a quantidade de aminoácidos, o que sugere que existem mais de um conjunto de três nucleotídeos para cada aminoácido, o que foi comprovado posteriormente dando origem a conhecida tabela do código genético que pode ser visualizada na figura 37.
Figura 37. Tabela do código genético
 
Outros experimentos importantes foram os que comprovaram a existência de uma pauta de leitura. Nestes experimentos verificou-se que uma seqüência como UUU UUU UUU UUU, gerava um polipeptídeo Phe-Phe-Phe-Phe, já que o códon UUU é responsável pela incorporação da fenilalanina na cadeia protéica. Já uma seqüência como UAC UAC UAC UAC gerava três tipos de polipeptídeos dependendo da pauta de leitura em que a tradução foi iniciada, como pode ser melhor visualizado na figura 38.
Figura 38. Três pautas de leitura de um mRNA
Observando a tabela do código genético, podemos notar que ele é altamente degenerado, ou seja, existem muito mais que um códon para cada aminoácido, como por exemplo para Arginina, Leucina e Serina, que possuem seis códons cada. Somente Metionina e Triptofano possuem um único códon que os codificam. Códons diferentes que servem para a codificação de um mesmo aminoácido são chamados sinônimos.
Os códons UAG, UAA e UGA são os códons de terminação. Estes códons não codificam nenhum aminoácido, ao contrário sinalizam nos ribossomos o término da síntese protéica.
Os códons AUG e GTG além de codificarem Metionina e Valina respectivamente, determinam o ponto de início da tradução.
Embora muitas vezes nos referimos ao código genético exposto na figura 37, como sendo universal, ou seja, o mesmo para todos os organismos, é preciso salientar que foi descoberto na década de 80 que determinadas mitocôndrias, como a das células animais, possuem um código genético alternativo. Por exemplo, AUA, bem como o padrão AUG, codificam Metionina e a iniciação; UGA determina Triptofano em vez de terminação; AGA e AGG são terminações em vez de Arginina. Isto sugere que as mitocôndrias, que possuem seus próprios genes e sistema de síntese de proteínas, não estão sujeitas às mesmas pressões evolutivas que os genomas nucleares.
Com isto, embora o código genético padrão seja amplamente utilizado, não podemos dizer que o mesmo é universal.
Na aula anterior vimos de forma geral os experimentos que levaram a proposição do dogma central da biologia molecular, ou seja, que o DNA quando transcrito gerava RNA e este quando traduzido gerava proteína. Verificamos também que a síntese das proteínas é feita nos ribossomos (“fabrica das proteínas”) com o “trabalho duro” dos tRNAs que utilizavam como “ordem” o mRNA. Alias esta seria uma boa analogia: Ribossomo ( Fábrica; tRNA ( operários; mRNA ( ordem de serviço.
Figura 39. Comparação entre as atividades dos ribossomos, tRNAs e mRNAs com as atividades fabris.
	
Para entendermos melhor este processo necessitamos estudar um pouco a estrutura dos tRNAs e dos ribossomos.
Estrutura e reações dos tRNAS
Os tRNAs são as moléculas, que recebendo as “ordens de serviço” (mRNA) que descrevem quais aminoácidos devem ser incorporados ao polipeptídeo nascente, fazem a ligação entre os mundos do DNA-RNA e proteína.
As estruturas dos tRNAs embora com algumas variações que dependem principalmente do tipo de aminoácido que eles transferem à proteína, possuem estruturas semelhantes. As estruturas secundárias dos tRNAs são conhecidas como estruturas folha de trevo, por sua semelhança a planta, como visto na figura 40. Esta estrutura é mantida através de pareamentos entre seqüências complementares da molécula de tRNA, e possui como numa folha de trevo, quatro braços contendo regiões pareadas (hastes) e regiões de fita simples (alças), caracterizadas como segue:
- um grupo fosfato na extremidade 5’;
- uma haste de 7pb que inclui o nucleotídeo 5’ terminal e que pode conter pares de bases diferentes de Watson-Crick, como por exemplo G.U. Esta haste é conhecida como haste aceptora, pois o aminoácido carregado pelo tRNA é ligado ao grupo OH da extremidade 3’;
- uma haste de 3 a 4 pb que termina em uma alça de 5 a 7 nt que contém a base modificada diidrouridina (D). Esta haste e alça são denominadas conjuntamente de braço D;
- uma haste de 5pb que termina em uma alça que contém o anti-códon. Este conjunto é conhecido como braço do anti-códon;
- o braço variável é a porção da molécula que apresenta maior variação entre os tRNAs, podendo ter entre 3 e 5 até 13 e 21 pares de bases;
- uma haste que termina em um laço que normalmente contém a seqüência T(C (onde ( é o símbolo para a pseudo-uridina). Este conjunto recebe o nome de braço T;
- uma seqüência CCA 3’ com o grupo 3´-OH livre onde ocorre a ligação dos aminoácidos.
Figura 40. Estrutura secundária dos tRNAs e sua analogia com uma folha de trevo. R e Y são purinas e pirimidinas respectivamente
Como é possível notar a estrutura dos tRNAs possuem bases não usuais, ou seja diferentes das comuns A, U, G e C. Estas bases são geradas através de modificações a qualquer uma das bases já incorporadas ao tRNA, e são responsáveis pro conferir uma maior versatilidade às moléculas que pode estar relacionada as suas funções. As estruturas das principais bases não usuais são mostradas na figura 41.
Figura 41. Bases comuns do RNA e suas modificações usualmente presentes no tRNA.
Os tRNAs apresentam uma estrutura terciária em forma de L como pode ser visualizado na figura 42. Onde em uma extremidade situa-se a haste aceptora e na outra a alça do anti-códon, a distância entre estas extremidades gira em torno de 76
. Os tRNAs possuem uma largura relativamente pequena, de 20 a 25o que é essencial para a sua atividade biológica, pois na síntese protéica duas moléculas de tRNA devem simultaneamente, ligar-se próximas uma da outra em códons adjacentes do mRNA.
Figura 42. Estrutura terciária do tRNAphe.
O processo de tradução envolve duas etapas: a primeira onde o aminoácido correto deve ser selecionado para ligação covalente ao tRNA por meio de uma enzima chamada aminoacil tRNA sintetase; e a segunda onde o aminoacil tRNA correto de fazer par com um códon do mRNA no ribossomo.
A aminoacil tRNA sintetase (aaRS), uma enzima aminoácido específica, adiciona um aminoácido na ribose da extremidade 3’ do tRNA correspondente, como é mostrado na figura 43.
Figura 43. Um aminoacil tRNA. Em vermelho é mostrado um resíduo de aminoácido esterificado à hidroxila 3’
	Esta reação ocorre em duas etapas e é catalisada por uma mesma aminoacil tRNA sintetase. Primeiro o aminoácido é ativado pela reação com ATP para formar um aminoacil adenilato, após o aminoacil adenilato reage com o tRNA para formar o aminoacil tRNA liberando AMP.
	Como existem 20 aminoácidos, devem haver pelo menos 20 aminoacil tRNA sintetases, cada uma reconhecendo um aminoácido e seu tRNA correspondente.
	Um fato importante é a capacidade de correção de erro das aaRSs que evitam a incorporação de aminoácidos errados à estrutura protéica. Embora estas enzimas tenham seletividade variável, ou seja, umas ativam somente um tipo de aminoácido enquanto outras podem ativar também aminoácidos relacionados, elas com a atividade de correção de erro não transferem o aminoácido ativado para o tRNA. Um exemplo é a isoleucil-tRNA-sintetase que é capaz de ativar isoleucina e valina, mas na presença de do tRNA de isoleucina (tRNAile), ocorre somente a formação de ile -tRNAile, enquanto que val-AMP é hidrolisada a val mais AMP, como mostra a figura 44.
Figura 44. Atividade de correção da isoleucil tRNA sintetase
Estrutura dos ribossomos
Chegamos, em fim, a nossa “fábrica de proteínas” e como em geral toda fábrica possui uma estrutura complexa, de forma que pretendemos apenas abordar os aspectos necessários a compreensão da tradução e da aulas futuras.
Os ribossomos apresentam uma estrutura compacta dividida em duas subunidades, uma maior e oura menor, os quais são formadas de proteínas associadas a moléculas de rRNA, como pode ser observado na tabela 2.
Tabela 2. Organização dos ribossomos bacterianos e de células animais
	Ribossomos
	Subunidades
	rRNAs
	Proteínas
	
70S
massa: 2,5x106D
66% RNA
	
	23S = 2904 bases
5S = 120 bases
	31
	
	
	
16S = 1542 bases
	
21
	
80S
massa: 4,2x106D
60% RNA
	
	28S = 4718 bases
5,8S = 160 bases
5S = 120 bases
	
49
	
	
	
18S = 1874 bases
	
33
	Como pode ser observado, embora a organização estrutural dos ribossomos eucarióticos seja semelhante a dos procarióticos, os primeiros são maiores e mais complexos que os últimos.
	O ribossomo completo de E. coli, cujas principais características estão descritas na tabela 3, possui uma velocidade de sedimentação 70S e contém 66% de sua constituição mássica de RNA. Além disso ele é composto por duas regiões: uma de base e outra denominada cabeça ou protuberância, como pode ser visto na figura 45.
Tabela 3. Componentes do ribossomo de E. coli.
	
	ribossomo
	Subunidade menor
	Subunidade maior
	Coeficiente de sedimentação
	70S
	30S
	50S
	Massa (kDa)
	2520
	930
	1590
	RNA
	
	16S, 1542 nt
	23S, 2904 nt
	
	
	
	5S, 120 nt
	Massa do RNA
	1664
	560
	1104
	Proporção da massa
	66%
	60%
	70%
	Proteínas
	
	21 polipeptídeos
	31 polipeptídeos
	Massa de proteína (kDa)
	857
	370
	487
	Proporção da massa
	34%
	40%
	30%
	A estrutura do ribossomo com suas duas subunidades é mantida através de associações discretas entre determinadas regiões das duas subunidades.
Cada subunidade dos ribossomos possuem vários sitos ativos sendo os principais os sítios A, P e E.
O sítio A liga-se preferencialmente a aminoacil-tRNAs, e localiza-se na subunidade 50S, enquanto que o sítio P, liga tanto fMet-tRNA (o tRNA iniciador) como peptidil-tRNA e está localizado na subunidade 30S. O sítio E é o sítio de saída do tRNA que liberou o grupo peptídico. Além destes sítios existem outros responsáveis pela ligação com o mRNA, com fatores envolvidos na síntese das proteínas e com a peptidil transferase, como veremos no próximo item.
Figura 45. Estrutura do ribossomo de E. coli
Síntese protéica
Antes de enfatizarmos os mecanismos da síntese propriamente dita alguns fatos devem ser considerados:
-a síntese de polipeptídeos ocorre da região amino para a carbóxi terminal da proteína;
	- o alongamento da cadeia ocorre pela ligação do polipeptídeo crescente ao resíduo de aminoácido do tRNA ingressante;
	- os ribossomos lêem o mRNA na direção 5’ ( 3’;
	- a tradução ocorre nos polissomos, que são diversos ribossomos na ação de tradução de uma única fita de mRNA. Isto ocorre porque uma vez o ribossomo ativo tenha liberado seu sítio de iniciação no mRNA, outro ribossomo pode iniciar a tradução naquele sítio.
Iniciação
Um dos primeiros indícios de como os ribossomos começam a síntese protéica veio da observação que grande parte das proteínas de E. coli começam com uma Metionina (Met).
De fato o tRNA que começa a síntese protéica é uma forma especial de Met-tRNA, na qual a Metionina é N-formilada. Como mostra a figura 46 o resíduo de N-formilmetionina (fMet) possui uma ligação amida e por isso ele somente pode ser o resíduo N-terminal de um polipeptídeo.
Figura 46. N-formilmetionina
As proteínas de E. coli são modificadas após a tradução sendo desformiladas e algumas vezes sofrem inclusive a remoção da metionina. Isto está de acordo com as observações de que as proteínas maduras de E. coli não possuem fMet. 
O tRNA que reconhece o códon de iniciação, difere do tRNA que carrega os resíduos internos de Met, embora ambos reconheçam o mesmo códon AUG. É provável que as conformações destes dois tRNAs (tRNAMetm e tRNAfMetf) difiram o suficiente para permitir que eles sejam distinguidos no início e no alongamento da cadeia.
Mas além do códon AUG de iniciação, outra seqüência de 3 a 10 nucleotídeos situada antes do códon de iniciação e que pareia com a extremidade 3’ do 16S rRNA, ajuda na definição do início da síntese. A seqüência consenso desta região que é conhecida como seqüência Shine-Dalgarno e a respectiva região 3’ do 16S rRNA são mostradas na figura 47.
Figura 47. Seqüências de Shine-Dalgarno e sua região complementar no 16SrRNA de E.coli
A seqüência 3’ dos rRNAs de procariotos e eucariotos são bastante conservadas, no entanto parece não haver nenhuma evidência de ligação do mRNA ao 18S rRNA nos eucariotos. Nestes, parece que a síntese protéica é orientada pelo reconhecimento das seqüências CAP, pela subunidade 40S do ribossomo.
A iniciação da tradução em E. coli, propriamente dita, como mostra a figura 48, depende de fatores de iniciação que são proteínas que ajudam o processo como veremos.
Inicialmente o ribossomo 70S em sua forma inativa, permanece com as suas subunidades associadas.
Figura 48. Rota de iniciação da tradução em E. coli
Então os fatores de iniciação 1 e 3 (IF-1 e 3 “initiation factor”) ligam-se a subunidade 30S dissociando o ribossomo. Após o mRNA e o IF-2, em um complexo ternário com GTP e fMet-tRNAfmetf ligam-se a subunidade 30S. O IF-3 participa da formação do complexo de iniciação 30S ajudando esta subunidade ribossomal a ligar-se ao mRNA. Posteriormente ocorre a liberação de IF-3 e a reassociação da subunidade 50S, que estimula IF-2 a hidrolisar seu GTP em GDP mais Pi, o que rearranja conformacionalmente a subunidade 30S que acaba liberando IF-1 e IF-2.
Desta forma a iniciação resulta em um complexo entre fMet-tRNAfmetf , mRNA e o ribossomo, sendo que fMet-tRNAfmetf ocupa o sítio P do ribossomo, enquanto que o sítio A é forçadoa aceitar um aminoacil-tRNA ingressante.
Alongamento da cadeia
O alongamento da cadeia, como pode ser visto na figura 49, ocorre num ciclo que pode ser dividido em três etapas: iniciação, transpeptidação e translocação.
A iniciação do alongamento, ou seja, a incorporação do segundo, depois do terceiro aminoácidos à cadeia polipeptídica, depende de um fator denominado EF-Tu que possui afinidade por todos tRNAs ativados, exceto o fMet-tRNA. A ligação do EF-Tu aos aminoacil-tRNAs depende de energia fornecida pela hidrólise do GTP. Após a ligação do aminoacil-tRNA no sitio A do ribossomo com a formação do pareamento códon anti-códon, o EF-Tu é liberado com gasto de GTP (EF-Tu-GDP). EF-Tu-GDP não é capaz de ligar-se aos tRNAs e necessita, então ser regenerado para sua forma ativa. Para que ocorra esta regeneração um outro fator EF-Ts liga-se a EF-Tu-GDP originando a forma ativa. Como pode ser visto na reação abaixo:
EF-Tu-GDP (inativa) + EF-Ts ( EF-Tu-EF-Ts + GDP
EF-Tu-EF-Ts + GTP ( EF-Tu-GTP (ativa) + EF-Ts
Em eucariotos existe apenas um fator de alongamento o eEF-1 que possui funções análogas a EF-Tu e EF-Ts.
Figura 49. Ciclo de alongamento em ribossomos de E. coli
 	
	Na transpeptidação o peptidil-tRNA parado no sítio P do ribossomo, transfere a cadeia polipeptídica para o aminoacil-tRNA parado no sito A, através da atividade peptidil transferase, que está localizada na subunidade maior 50 ou 60S dos ribossomos.
	Após a transpeptidação, o ribossomo sofre um movimento de translocação, transferindo o novo peptidil-tRNA (que estava no sítio A) para o sítio P e deslocando o tRNA do sítio P, para o sítio E de saída. Este deslocamento do ribossomo deixa livre um novo códon para que um novo aminoácido seja incorporado.
	A translocação necessita de um fator, chamado EF-G, que utiliza a hidrólise de GTP para auxiliar o movimento do ribossomo. Em eucariotos, existe o fator eEF-2 que parece exercer uma função similar a EF-G.
	Deve ser ressaltado que os fatores EF-Tu e EF-G não podem se ligar ao ribossomo ao mesmo tempo, originando um ciclo na síntese protéica onde os dois fatores se ligam alternadamente.
Terminação da cadeia
A terminação da tradução ocorre pelo surgimento, no sítio A do ribossomo, de códons específicos de terminação (UAG, UAA e UGA). Estes códons ao invés de serem reconhecidos por aminoacil-tRNAs são reconhecidos por fatores de terminação que em E. coli são denominados RF-1 e RF-2. Estes fatores ligam-se ao códon de terminação sendo que RF-1 reconhece UAA e UAG, ao passo que RF-2 reconhece UGA e UAA. Um terceiro fator de terminação, RF-3, uma proteína que ao ligar-se a GTP, estimula tanto RF-1 como RF-2 a ligarem-se ao ribossomo. Quando isto ocorre a atividade de peptidil transferase ribossômica é obrigada a fazer a transferência da proteína para uma molécula de água. 
 
Figura 50. Rota de terminação da tradução em E. coli
Os resultados desta transferência são uma cadeia protéica e um tRNA livres, após ocorre a liberação do mRNA e a dissociação da subunidades 50 e 30S. 
Regulação da expressão gênica em procariotos 
Como foi visto na aula anterior, os genes de organismos procariontes são organizados em estruturas policistrônicas denominadas operons, que são formadas por várias ORFs (genes estruturais) dispostas seqüencialmente e submetidas a uma única seqüência reguladora. As ORFs são transcritas em um único mRNA, codificando enzimas que atuam em conjunto em determinadas etapas do metabolismo destes organismos. Muitas destas proteínas e enzimas somente são produzidas nas células procariontes quando as substâncias que elas metabolizam estão presentes no meio em que a célula se encontra, permitindo que ela se adapte a este meio, sem que ocorram gastos desnecessários para sintetizar proteínas que não são continuamente utilizadas. Estes metabólitos capazes de ativar/desativar a sínteses de proteínas codificadas em operons são chamadas de indutores/repressores, que regulam a expressão gênica dos mRNA policistrônicos dos operons, de acordo com a composição do meio externo. É também essencial para o funcionamento dos operons a correta interação de proteínas com o DNA, de forma controlar de forma eficiente sua ativação ou desativação. No caso de Escherichia coli, os operons lac, ara e trp são usados como base para a tecnologia de DNA recombinante, como veremos mais adiante. Daí a importância de conhecer o seu funcionamento. 
Operon lac
A bactéria Escherichia coli é capaz de utilizar lactose como substrato devido à presença do operon lac, que contém os genes estruturais para a codificação de três proteínas relacionadas ao metabolismo da lactose (lacZ, lacY e lacA). Estes três genes estruturais estão submetidos ao controle dos elementos promotor (Plac) e operador (O). Além destes, o operon apresenta um gene lacI, submetido ao promotor PI, que codifica a proteína que atua como repressor do operon lac.
A natureza do operon lac foi determinada por Jacob e Monod em 1961, através de estudos de mutações constitutivas. Na ausência da lactose, que atua como indutor, o repressor lac liga-se na seqüência operadora O sob a forma de tetrâmero, bloqueando fisicamente a transcrição dos genes estruturais do operon lac (Z, Y e A) para o metabolismo da lactose. Na presença de um indutor do operon (que pode ser lactose, alolactose, IPTG), esta molécula interage com a proteína repressora, de forma que o complexo formado indutor-repressor impede sua ligação na seqüência do operador, permitindo a transcrição de lacZ, lacY e lacA. Este mecanismo é mostrado na figura 51. 
As três enzimas codificadas quando o operador lac está ativo são a (-galactosidase (lacZ), que catalisa a hidrólise da lactose nos seus dois componentes monossacarídicos (galactose e glicose), a galactosídeo ou lactose permease (lacY), responsável pelo transporte da lactose para dentro da célula e a enzima tiogalactosídeo transacetilase (lacA), capaz de transferir um grupo acetil de acetil-CoA para um grupo C6-OH de um composto do tipo (-tiogalactosideo, como IPTG (isopropil-tiogalactosídeo), que é também um forte indutor do operon lac. O papel fisiológico desta última enzima é ainda desconhecido, uma vez o metabolismo da lactose acontece mesmo na sua ausência. 
Figura 51. Expressão do operon lac na ausência e na presença de indutor.
O operon lac também apresenta um sítio de ligação para o complexo cAMP/CAP na sua região reguladora. Quando os níveis de glicose na célula estão baixos, a célula produz uma molécula chamada AMP cíclico, que liga-se a uma proteína de ativação catabólita (CAP), estimulando a interação do complexo com o operon lac e ativando sua transcrição, pelo aumento da afinidade da RNA polimerase. Este fenômeno é denominado repressão catabólita, pois a presença de glicose no meio reprime o metabolismo de outros açúcares pelas enzimas codificadas nos operons. 
Operon ara
O operon relacionado ao metabolismo da arabinose consiste em três genes estruturais, araB, araA e araD, que codificam três enzimas que catalisam a conversão da arabinose a xilulose-5-fosfato, que é um intermediário para geração de energia pelo ciclo das pentoses. Os genes estruturais são transcritos mediante o funcionamento do promotor PBAD, pela ligação da proteína CAP e controlados pelas regiões operadoras araO1 e araO2 e pelo sítio araI, que consiste em duas subunidades idênticas de 17pb (I1 e I2). O controle do promotor PBAD é feito pela seqüência araO2, localizada 250 bases acima deste promotor. O gene araC codifica a proteína que atua como repressora do operon, cujo mRNA é transcrito sob controle do promotor PC e do operador araO1. Os promotores do operon são transcritos, desta forma, em sentidos contrários, como mostra a figura 52. 
Na ausência de arabinose ocorre a transcrição do gene araC, cuja proteína codificada, sob a forma de dímeros, liga-se aos sítios I1 e O2, através da formação de uma alça no DNA. Nesta configuração, a transcrição dos genes regulados pelo promotorPBAD não acontece. O repressor araC é auto-regulado, ou seja, quanto maior for a quantidade de araC presente no meio, menor é a produção do mRNA correspondente. Esta regulação é feita pela ligação de um dímero de araC ao sítio O1, fazendo com que a transcrição de PC seja evitada. 
Quando a arabinose está presente no meio, ela age como indutor, interagindo com a proteína repressora araC e provocando mudança de conformação, de modo que os dímeros somente possam ligar-se aos sítios I1 e I2. Nesta conformação ocorre a transcrição do mRNA dos três genes estruturais submetidos a PBAD. Nestas condições também liga-se ao promotor PC uma proteína CAP (catabolite activator protein), que liga-se também ao nucleotídeo AMP cíclico (cAMP), que aumenta a taxa de transcrição dos genes PBAD. Assim, este operon, além de ser induzido na presença de arabinose, tem a taxa de transcrição controlada de acordo com o nível deste açúcar, através do nível de cAMP na célula. As três enzimas codificadas pela indução do operon araBAD empregado na conversão da arabinose em xilulose-5-P são a arabinose isomerase (araA), que converte o açúcar presente na célula em ribulose, que é, por sua vez, convertido a ribulose-5-P mediante a ação da ribuloquinase (araB), com gasto de ATP, e a epimerase (araD), que atua na última etapa da obtenção de xilulose-5-P. O sistema permease, para transportar arabinose para dentro da célula é codificado pelos genes araE e araF, presentes em operons independentes. Os mecanismos de repressão e indução do operon araBAD são mostrados na figura 52.
Figura 52. Estrutura a mecanismo de repressão/indução do operon araBAD. Na ausência de arabinose ocorre a transcrição da proteína repressora araC, enquanto na presença de arabinose o sistema araBAD é transcrito.
Operon trp
O operon trp funciona de forma diferente dos operons lac a ara, uma vez que enquanto estes últimos são ativados para permitir que a célula utilize uma fonte particular de carbono e energia do meio, este operon é responsável pelo suprimento do aminoácido triptofano, de acordo com as necessidades celulares. Desta forma, o operon é ativado quando não há ou há baixa concentração de triptofano na célula e desativado quando não há necessidade celular deste aminoácido. Além disto, o operon trp apresenta dois tipos de controle pela concentração de triptofano no meio: repressão, de forma similar aos operons lac e ara, e o mecanismo de atenuação. 
Este operon apresenta cinco genes estruturais, trpE, trpD, trpC, trpB e trpA, que são expressos sob a forma de um mRNA policistrônico, que é traduzido em cinco enzimas envolvidas na síntese de triptofano a partir de corismato/ácido corísmico. Na região reguladora do operon encontram-se o promotor Ptrp, o sítio trpR, que codifica uma proteína que atua como monômero aporepressor e que formará um dímero repressor quando o operon estiver desativado, além dos das regiões operadora (trpO) e atenuadora (trpL). 
Na ausência ou em baixas concentrações de triptofano, o dímero aporepressor não é capaz de ligar-se ao triptofano, não havendo, desta forma, a formação do dímero repressor. Nesta situação, o promotor do operon encontra-se ativado e as proteínas trpE a A são transcritas e, portanto, traduzidas no meio, permitindo a produção do aminoácido. Quando, por outro lado, há concentrações suficientes de triptofano, devido à síntese ou ao meio em que está presente a célula, o aminoácido é capaz de ligar-se ao dímero aporepressor, mudando sua conformação e formando o dímero repressor, tornando-o capaz de interagir com o operador (sítio trpO) e impedir a transcrição das enzimas trpE a trpA. Por isso, o triptofano atua como co-repressor, de forma diversa da lactose e da arabinose, que são indutores dos operons lac e ara, respectivamente. O mecanismo de repressão do operador trp é mostrado na figura 53. 
 
Figura 53. Mecanismo de repressão/ativação do operon trp pela formação do dímero repressor, dependente de triptofano.
Como este mecanismo repressor é relativamente fraco, o operon trp apresenta outro nível de controle, chamado de atenuação, para reduzir a transcrição de seus genes estruturais. O sítio responsável pela atenuação, trpL, contém uma ORF que codifica uma pequena proteína de 14 aminoácidos com dois códons para triptofano, chamada peptídeo líder, e apresenta um códon de terminação da transcrição pela RNA polimerase, localizado antes dos genes estruturais trpE a A. A seqüência do peptídeo líder apresenta quatro regiões específicas, identificadas na figura 54, capazes de formar alças internas que interferem no processo de transcrição do operon. Quando triptofano está presente em baixas concentrações na célula não há suficientes tRNAs para triptofano disponíveis para que o ribossomo traduza os dois códons trp presentes na região 1 do peptídeo líder. Desta forma, o ribossomo fica parado na região 1 de trpL, determinando a ocorrência de uma alça entre as regiões 2 e 3, permitindo que a RNA polimerase transcreva os genes estruturais do operon trp. Quando, por outro lado, a tradução do peptídeo líder acontece em alta disponibilidade de triptofano, o ribossomo não fica parado nos códons trp da região 1, que fica livre para parear com a região 2, permitindo a formação de uma alça entre 3 e 4. Esta alça atua como um terminador independente da transcrição, impedindo a RNA polimerase de continuar a transcrição de trpEDCBA. As estruturas do sítio trpL e das alças formadas são apresentadas na figura 54.
	
	
(a)
	
	
(b)
Figura 54. Mecanismo de atenuação do operon trp. (a) Estrutura da região trpL e (b) alças formadas nas situações de não repressão e repressão da transcrição do operon.
Processamento pós-traducional
Após a ocorrência da tradução, em que são produzidas as proteínas necessárias à célula, algumas destas precisam sofrer processamentos pós-tradução para que tenham atividade biológica. A atividade biológica está intrinsecamente relacionada com a conformação estrutural, que por sua vez está relacionada com estes processamentos (modificações amino e carboxi-terminais, perda de seqüências sinalizadoras, fosforilações, carboxilações, metilações, glicosilações e formação de pontes de enxofre). O conteúdo destes processamentos é determinado pela seqüência de aminoácidos da proteína traduzida. 
- Modificações amino e carboxi-terminais: todos os polipeptídeos começam com N-formilmetionina em procariotos e metionina em eucariotos. Contudo, o grupamento formil, o resíduo metionina e freqüentemente um ou mais resíduos sucessores são removidos pela ação de enzimas específicas e assim não fazem parte da proteína processada. 
- Perda de seqüências sinalizadoras: algumas proteínas possuem seqüências de 15 a 30 resíduos na região N-terminal, que direcionam o seu transporte para locais específicos da célula. Estas seqüências são removidas por peptidases específicas. 
 
- Fosforilação: os grupamentos hidroxilas de certas serina, treonina e tirosina de algumas proteínas são enzimaticamente fosforiladas pelo ATP, para a geração de fosfo-serina, fosfo-treonina e fosfo-tirosina, respectivamente. Este processamento é necessário para promover a ativação ou desativação de certas enzimas, o que, em última análise, está relacionado com a regulação das vias metabólica que ocorrem nas células. 
 
- Carboxilação e metilação: grupamentos carboxila podem ser adicionados aos resíduos aspártico e glutâmico de algumas proteínas, como é o caso, por exemplo, da protrombina, que atua na coagulação do sangue. Em algumas proteínas, certos resíduos de lisina são metilados enzimaticamente. Resíduos de mono e dimetil lisinas são encontrados em algumas proteínas do músculo e no citocromo c.
- Glicosilação: as cadeias de carboidratos de glicoproteínas são adicionadas covalentemente durante ou após a tradução. Em algumas destas proteínas, as cadeias laterais de carboidratos são enzimaticamente anexadas a resíduos de asparagina, serina ou treonina. Muitas destas glicoproteínasapresentam funções ligadas a membranas.
- Formação de pontes de dissulfeto: muitas proteínas, para serem exportadas das células eucarióticas, após o enovelamento espontâneo que define conformação nativa, devem sofrer ligações covalentes entre resíduos de cisteínas de uma ou duas cadeias polipeptídicas, através da formação enzimática de pontes de dissulfeto. Estas pontes ajudam a proteger a conformação nativa das proteínas de desnaturações.
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Literatura utilizada
LEHNINGER, A. L.; NELSON, L. D.; COX, M. M. – Principles of Biochemistry – Worth Publishers,2ed, New York, 1993.
LEWIN, B. – Genes VI – Oxford University Press, New York, 1997.
STRYER, L. – Biochemistry – W H Freeman and Co, 4ed, 1995. 
VOET, D.; VOET, G. V.; PRATT C. W. – Fundamentos de Bioquímica – ArtMed Editora, Porto Alegre, 2000.
ZAHA, A. et al. - Biologia Molecular Básica – Mercado Aberto, Porto Alegre, 1996.
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