Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Do Campus para o Campo Tecnologia para a produção de leite Neiva & Neiva 2006 LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 1LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 1 31/10/2006 11:29:1531/10/2006 11:29:15 LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 2LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 2 31/10/2006 11:29:1631/10/2006 11:29:16 Apresentação Adifusão de tecnologia é uma preocupação cada vez mais presente em todos os seg- mentos envolvidos nesta temática. Uma rápida revisão na literatura existente remete-nos a uma intensificação nas ações pertinentes, nos últimos 50 anos, como a criação da ACAR, em Minas Gerais, em 1948, do Sistema Brasileiro de Extensão Rural, em 1956, da EMBRAPA, em 1973 e da EMBRATER, em 1975, pelo Governo Federal. Também é facilmente perceptível na literatura especializada, que grande parte das tecnologias existentes encontra-se em prateleiras, longe do alcance do produtor rural. Por outro lado, parte dos produtores, mesmo tendo acesso às tecnologias, não estão dispostos a utilizá-las, por diversas razões, inclusive culturais, o que leva a concluir que não basta aos órgãos extensionistas, ter recursos financeiros suficientes para promover a utilização, pelos produtores, de tecnologias capazes de aumentar a produção, diminuir a utilização de insumos, reduzir o uso de água, de área plantada, gerar mais emprego e renda, em especial para a agricultura familiar; é necessário que ações complementares bem elaboradas sejam levadas ao produtor, convencendo-o da importância e dos resultados na sua utilização. Neste sentido, o CNPq associado a diferentes parceiros (Ministérios e Fundos Setoriais, principalmente) investiu fortemente nos últimos anos, tanto com a publicação de Editais Temáticos, como com a criação de novas ferramentas de apoio com destaque para a criação das bolsas voltadas a extensão. Dessa forma, foi possível apoiar o projeto “Do campus para o campo: difusão de tecnologia para o aproveitamento de resíduos agroindustriais na alimen- tação de gado leiteiro”, coordenado pelo Prof. José Neuman Miranda Neiva e em execução na Universidade Federal de Tocantins, onde uma equipe composta por diversos profissionais cujo perfil certamente permitirá o alcance dos objetivos propostos, nos leva a acreditar que se houver uma conscientização crescente da academia da importância do seu papel não só na criação de novas tecnologias mas principalmente na difusão daquelas já existentes, o Brasil poderá experimentar, nos próximos anos, um crescimento no segmento agropecuário, capaz de promover a inclusão do país em patamares mais elevados, propiciando melhor qualidade de vida, em especial ao pequeno produtor. Somando às ações mais substanciais das Instituições de ensino e pesquisa, nos últimos tempos, é necessário reconhecer o papel das agências de fomento, como o Conselho Nacio- nal de Desenvolvimento Cientifico e Tecnológico – CNPq, que tem lançado editais voltados exclusivamente à extensão rural, oferecendo novos mecanismos, como bolsas de extensão rural, de Desenvolvimento Tecnológico e outras ações que tem como cunho principal, o for- talecimento da área de extensão no país. LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 3LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 3 31/10/2006 11:29:1631/10/2006 11:29:16 Assim, é importante reconhecer o esforço governamental na disponibilização de recursos financeiros para solucionar esta lacuna, que se sabe existir, entretanto, é indispensável que professores/pesquisadores, apoiados por estas iniciativas, se preocupem na busca de soluções para que a ciência e a tecnologia cheguem ao produtor rural, sendo bem utilizada e gerando os frutos desejados. Tão importante quanto fazer C&T é difundí-las, de forma adequada e consciente, respei- tando-se, em especial, ao meio ambiente. Dessa forma, a publicação do livro “DO CAMPUS PARA O CAMPO: Tecnologias para pro- dução de leite” mostra que a equipe de professores envolvidos se mostra em sintonia com as políticas atuais do CNPq e demais agências de fomento. Temos certeza que o grupo dará uma enorme contribuição para a cadeia produtiva do leite no Brasil e muito mais que isso; e como o próprio nome já diz, o “CAMPUS” universitário está se envolvendo com o “CAMPO” de produção pecuária. Dra. Maria Auxiliadora da Silveira e Pereira Neves Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 4LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 4 31/10/2006 11:29:1631/10/2006 11:29:16 AUTORES Ana Claudia Gomes Rodrigues Neiva Engenheira Agrônoma, M.Sc. em Economia Rural Universidade Federal do Tocantins, Escola de Medicina Veterinária e Zootecnia, BR- 153 Km 112 Zona Rural 77800-000 - Araguaina, TO - Brasil - Caixa-Postal: 132 Telefone: (63) 4141802 Fax: (63) 34141597 e-mail: claudianeiva@yahoo.com.br Ana Flávia Santos Coelho Engenheira Agrônoma, MsC. em Ciência dos alimentos e doutoranda em Engenharia Agrícola. Universidade Federal do Tocantins. Avenida NS 15 ALC NO 14, Campo Experimental, Lab. de Microbiologia de Alimentos Centro 77020-210 - Palmas, TO – Brasil Telefone: (63) 2188143 Fax: (63) 2188020 e-mail: anaflavia@uft.edu.br Antonio Clementino dos Santos Engenheiro Agrônomo, doutor em Tecn. Energeticas Nucleares-Fertilidade do Solo Universidade Federal do Tocantins, Escola de Medicina Veterinária e Zootecnia, BR- 153 Km 112 Zona Rural 77800-000 - Araguaina, TO - Brasil - Caixa-Postal: 132 Telefone: (63) 4141802 Fax: (63) 34141597. e-mail: clementino@uft.edu.br Antônio Último de Carvalho Médico Veterinário D.Sc. em Zootecnia Universidade Federal de Minas Gerais, Escola de Veterinária, Departamento de Clínica e Cirur- gia Veterinária Av. Presidente Antônio Carlos, 6.627 Campus Pampulha CEP: 31270901 - Belo Horizonte, MG - Brasil - Caixa-Postal: 567Telefone: (31) 4992229 Ramal: 2234 Fax: (31) 4992230 Breno Mourão de Sousa Médico Veterinário, MsC em Zootecnia e Doutorando em Ciência Animal Universidade Federal de Minas Gerais, Escola de Veterinária, Departamento de Zootecnia. Ave- nida Antônio Carlos, 6627 São Francisco 30123-970 - Belo Horizonte, MG - Brasil - Caixa- Postal: 567 Telefone: (31) 34492183 e-mail: brenoms@hotmail.com Carlos Augusto de Miranda Gomide Engenheiro Agrônomo, D.Sc. em Zootecnia Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, Centro Nacional de Pesquisa de Gado de Lei- te, Núcleo Regional Nordeste. Avenida Beira Mar 3250 Sementeira 49025040 - Aracaju, SE – Brasil Telefone: (79) 2261300 Ramal: 1366 Fax: (79) 2261369 e-mail: cagomide@cpatc.embrapa.br LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 5LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 5 31/10/2006 11:29:1631/10/2006 11:29:16 Elcivan Bento da Nóbrega Engenheiro Agrônomo, M.Sc. em Zootecnia Universidade Federal do Tocantins, Escola de Medicina Veterinária e Zootecnia, BR- 153 Km 112 Zona Rural 77800-000 - Araguaina, TO - Brasil - Caixa-Postal: 132 Telefone: (63) 4141802 Fax: (63) 34141597 e-mail: elcivan@uft.edu.br Fabiano Alvim Barbosa Médico Veterinário, MsC em Zootecnia e Doutorando em Ciência Animal Universidade Federal de Minas Gerais, Escola de Veterinária, Departamento de Zootecnia. Ave- nida Antônio Carlos, 6627 São Francisco 30123-970 - Belo Horizonte, MG - Brasil - Caixa- Postal: 567 Telefone: (31) 34492183 Helcileia Dias Santos Medica Veterinária, M.Sc. em Ciências Veterinárias, doutorando em Ciências Veterinárias. Universidade Federal do Tocantins, Escola de Medicina Veterinária e Zootecnia, BR- 153 Km 112 Zona Rural 77800-000 - Araguaina, TO - Brasil - Caixa-Postal: 132 Telefone: (63) 4141802 Fax: (63) 34141597 e-mail: hdsantos@uft.edu.br Heleno Guimarães Carvalho Médico Veterinário e-mail: helenogc@agricuiltura.gov.br José Neuman Miranda Neiva Zootecnista, D.Sc. em Zootecnia Universidade Federal do Tocantins, Escola de Medicina Veterinária e Zootecnia, BR- 153 Km 112 Zona Rural 77800-000 - Araguaina, TO - Brasil - Caixa-Postal: 132 Telefone:(63) 4141802 Fax: (63) 34141597 e-mail: araguaia2007@gmail.com Josefa Moreira do Nascimento Rocha Médica Veterinária, M.Sc. em Ciência Animal Universidade Federal do Tocantins, Escola de Medicina Veterinária e Zootecnia, BR- 153 Km 112 Zona Rural 77800-000 - Araguaina, TO - Brasil - Caixa-Postal: 132 Telefone: (63) 4141802 Fax: (63) 34141597 e-mail: nascimentojmn@hotmail.com Leonardo Andrade Leite Médico Veterinário, MsC em Zootecnia e Doutorando em Ciência Animal Universidade Federal de Minas Gerais, Escola de Veterinária, Departamento de Zootecnia. Ave- nida Antônio Carlos, 6627 São Francisco 30123-970 - Belo Horizonte, MG - Brasil - Caixa- Postal: 567 Telefone: (31) 34492183 e-mail: leonardoleite@superig.com.br LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 6LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 6 31/10/2006 11:29:1631/10/2006 11:29:16 Magno José Duarte Cândido Engenheiro Agrônomo, D.Sc. em Zootecnia Universidade Federal do Ceará Centro de Ciências Agrárias, Departamento de Zootecnia. Av. Mister Hull, 2977 Pici 60970-355 - Fortaleza, CE – Brasil Telefone: (85) 40089711 Fax: (85) 40089701 e-mail: mjdcandido@gmail.com Norberto Mario Rodriguez Bioquímico, PhD em Nutrição Animal Universidade Federal de Minas Gerais, Escola de Veterinária, Departamento de Zootecnia. Av. Antônio Carlos, 6627 São Francisco 31270-901 - Belo Horizonte, MG - Brasil - Caixa-Postal: 560 Telefone: (31) 34992195 Fax: (31) 34992168 e-mail: norberto.bhe@terra.com.br Ricarda Maria dos Santos Medica Veterinária, D.Sc. em Medicina Veterinária Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia de Botucatu, Unesp, Fmvz. Fazenda Lageado 18618000 - Botucatu, SP - Brasil - Caixa-Postal: 516 Telefone: (14) 38117185 Ramal: 209 Fax: (14) 38117180 e-mail: ricasantos@yahoo.com Rubens Fausto da Silva Zootecnista, M.Sc. em Extensão Rural Universidade Federal do Tocantins, Escola de Medicina Veterinária e Zootecnia, BR- 153 Km 112 Zona Rural 77800-000 - Araguaina, TO - Brasil - Caixa-Postal: 132 Telefone: (63) 4141802 Fax: (63) 34141597 e-mail: rubensfausto@hotmail.com Sandra Gesteira Coelho Médica Veterinária, D. Sc. em Zootecnia Universidade Federal de Minas Gerais, Escola de Veterinária, Departamento de Zootecnia. Rua Matipo 220 apt 701 Santo Antonio 30161-970 - BELO HORIZONTE, MG - Brasil - Caixa-Pos- tal: 567 Telefone: (31) 33422288 e-mail: sandra@vet.ufmg.br Severino Delmar Junqueira Villela Zootecnista, D.Sc. em zootecnia Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, Departamento de Zootecnia. Rua da Glória , 187Centro 39100-000 - Diamantina, MG – Brasil Telefone: (38) 35313818 e-mail: smvillela@jknet.com.br Silvia Minharro Barbosa Médica Veterinária, M.Sc. em Ciência Animal, doutoranda em Ciência Animal. Universidade Federal do Tocantins, Escola de Medicina Veterinária e Zootecnia, BR- 153 Km 112 Zona Rural 77800-000 - Araguaina, TO - Brasil - Caixa-Postal: 132 Telefone: (63) 4141802 Fax: (63) 34141597 LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 7LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 7 31/10/2006 11:29:1731/10/2006 11:29:17 Tânia Vasconcelos Cavalcante Medica Veterinária, D.Sc. em Medicina Veterinária Universidade Federal do Tocantins, Escola de Medicina Veterinária e Zootecnia, BR- 153 Km 112 Zona Rural 77800-000 - Araguaina, TO - Brasil - Caixa-Postal: 132 Telefone: (63) 4141802 Fax: (63) 34141597 e-mail: taniavc@gmail.com Warley Efrem Campos Médico Veterinário, D.Sc. em Ciência Animal Universidade Federal de Minas Gerais, Escola de Veterinária, Departamento de Zootecnia. Av. Antônio Carlos, 6627 São Francisco 31270-901 - Belo Horizonte, MG - Brasil - Caixa-Postal: 560 Telefone: Fax: (31) 34992168 e-mail: wecampos2@yahoo.com.br LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 8LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 8 31/10/2006 11:29:1731/10/2006 11:29:17 Sumário A Cadeia Produtiva do Leite .................................................... 001 Formação e Recuperação de Pastagens ..................................... 100 Manejo de pastagens para produção intensiva ........................... 200 Produção e Conservação de Volumosos para Reserva Estratégica . 300 Controle zootécnico e econômico na pecuária leiteira ................. 350 Criação de Animais Jovens ...................................................... 400 Manejo alimentar de vacas leiteiras .......................................... 450 Formulação de dietas para bovinos leiteiros ............................... 500 Manejo Reprodutivo de Vacas Leiteiras ..................................... 550 Manejo sanitário de bovinos leiteiros ........................................ 600 Obtenção Higiênica do Leite .................................................... 650 Associativismo Rural .............................................................. 700 LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 9LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 9 31/10/2006 11:29:1731/10/2006 11:29:17 LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 10LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 10 31/10/2006 11:29:1731/10/2006 11:29:17 A Cadeia Produtiva do Leite Ana Cláudia Gomes Rodrigues Neiva Heleno Guimarães Carvalho 1. O Agronegócio Para entender o conceito de agronegócio, são necessários alguns comentários acerca das mudanças ocorridas nas atividades agropecuárias nas últimas décadas. Tradicionalmente, o termo agricultura era utilizado para designar todas as atividades agro- pecuárias, desde o fornecimento de insumos utilizados na produção, passando pela industria- lização, até a distribuição do produto final ao consumidor. As fazendas eram quase auto-su- ficientes; produziam, além de diversas culturas e criações, os meios de produção necessários ao seu funcionamento. Produziam, por exemplo, arroz, feijão, mandioca, milho, algodão, café, cana-de-açúcar entre outras culturas, além de criações de bovinos, suínos, aves e eqüinos. Nes- sas propriedades, o leite era transformado em queijo e manteiga; a partir da cana-de-açúcar, produzia-se rapadura, cachaça, melado (ou mel de engenho); a mandioca era beneficiada de modo a se obter farinha, polvilho, entre outros produtos. Neste modelo de produção, tinha-se uma atividade comercial (como açúcar, algodão, café) que gerava receita para compra de mercadorias que não eram produzidas internamente, como o sal, querosene, entre outros. No entanto, a transformação sofrida pela sociedade, aliada ao avanço tecnológico, espe- cialmente nas últimas décadas do século passado, modificou o perfil das propriedades rurais. Segundo dados do IBGE (2006), o número de pessoas residentes no meio rural no Brasil passou de 44% em 1970 para 19% em 2000. Os investimentos em tecnologia e pesquisa provoca- ram mudanças significativas nos índices de produtividade das atividades agropecuárias. Araújo (2005) ressalta que esses fatos fazem com que um número cada vez menor de pessoas trabalhe para produzir alimentos para uma população crescente. As propriedades rurais passam, então, a apresentar as seguintes características: • redução da auto-suficiência; • maior dependência de insumos e serviços de outras empresas • especialização em determinadas atividades; • geração de excedentes de consumo e abastecimento de mercados, às vezes, muito dis- tantes; • recebimento de informações externas; • necessidade de infra-estrutura, como estradas, armazéns, portos, aeroportos, além de pesquisas, softwares, fertilizantes, ou seja, insumos fora da propriedade; • conquista cada vez maior de novos mercados; • desafio à globalização e à internacionalização da economia. Assim, a tradicional classificação da economia em setor primário, secundário e terciário deixou de ter sentido. A agropecuária, que antes era vista como setor primário, passou a ter LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 11LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 11 31/10/2006 11:29:1731/10/2006 11:29:17 Ana Cláudia Gomes Rodrigues Neiva / Heleno Guimarães Carvalho 12 intensarelação com outros setores, por sua dependência de insumos e serviços oferecidos por outras empresas. Essa dependência ocorre também para situações posteriores à produção, verificando-se a necessidade de infra-estruturas, como armazéns, estradas, portos, aeroportos, agroindústrias, entre outras. De acordo com Batalha (2001), foi a partir da análise dessas relações que, em 1957, John Davis e Ray Goldberg, professores da Universidade de Harvard nos Estados Unidos, defi- niram agribusiness da seguinte forma: “a soma das operações de produção e distribuição de suprimentos agrícolas, das opera- ções de produção nas unidades agrícolas, do armazenamento, do processamento e da distribui- ção dos produtos agropecuários e itens produzidos a partir deles”. Verifica-se, portanto, que a agropecuária está inserida em uma rede de agentes econômi- cos, que incluem desde a produção de insumos, a produção agropecuária e a transformação industrial até o armazenamento e a distribuição dos produtos agropecuários e seus derivados para o consumidor final (Figura 1). Dando suporte a todos os segmentos da produção agrope- cuária, encontram-se a pesquisa e a assistência técnica, os serviços portuários, os governos, os bancos, entre outros. Ambiente Institucional: Cultura, Tradições, Educação, Costumes INSUMOS AGROPECUÁRIA PROCESSAMENTO DISTRIBIÇÃO CONSUMIDOR FINAL Ambiente Organizacional: Informação, Finanças, Cooperativas Fonte: Zylbersztajn (225) Figura 1 – Sistema de Agribusiness É importante para todos os segmentos envolvidos, inclusive para as autoridades governa- mentais, essa visão sistêmica do agronegócio, ou seja, o entendimento das inter-relações entre os setores “antes da porteira”, “dentro da porteira” e “depois da porteira”. O segmento “antes da porteira”, ou a “montante da produção agropecuária”, é composto por fornecedores de insumos e serviços, como sementes, rações, fertilizantes, defensivos agrí- colas, produtos veterinários, máquinas e equipamentos. O segmento “dentro da porteira”, por sua vez, ou produção agropecuária propriamente dita, envolve todas as atividades de produção dentro da propriedade, enquanto o segmento “depois a porteira” ou “a jusante da produção agropecuária”, refere-se a todas as atividades de armazenamento, processamento, transforma- ção, distribuição e consumo do produto final. Noções de Cadeia (Filière) de Produção Agroindustrial O conceito de filière (cadeia) surgiu na França na década de 1960, como um produto da escola de economia industrial francesa, e diz respeito à seqüência de atividades que transfor- mam uma commodity em um produto final pronto para ser consumido. Morvan (apud Zylber- sztajn, 2005, p.9) define cadeia da seguinte forma: LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 12LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 12 31/10/2006 11:29:1731/10/2006 11:29:17 A Cadeia Produtiva do Leite 13 “é uma seqüência de operações que conduzem à produção de bens. Sua articulação é amplamente influenciada pela fronteira de pos- sibilidades ditadas pela tecnologia e é definida pelas estratégias dos agentes que buscam a maximização dos seus lucros. As relações entre os agentes são de interdependência ou complementariedade e são de- terminadas por forças hierárquicas”. Embora o conceito de filière não tenha sido desenvolvido para análise da cadeia agroin- dustrial, foi entre os estudiosos do setor que se expandiu. A palavra filière pode ser traduzida para o português como cadeia de produção e, no caso do setor agroindustrial, cadeia de produ- ção agroindustrial ou apenas cadeia agroindustrial. Batalha (2001) demonstrou que, de modo geral, uma cadeia de produção agroindustrial pode ser dividida em três macrossegmentos, de jusante a montante, da seguinte forma: 1. Comercialização: engloba as empresas que estão em contato com o cliente final da cadeia de produção e que viabilizam o consumo e comércio dos produtos finais, como super- mercados, mercearias e restaurantes; 2. Industrialização: abrange as firmas responsáveis pela transformação das matérias-pri- mas em produtos destinados ao consumidor (pode ser uma unidade familiar ou outra agroin- dústria); 3. Produção de matérias-primas: inclui as firmas que fornecem as matérias-primas ini- ciais para que outras empresas trabalhem na produção do produto final (agricultura, pecuária, piscicultura, entre outras). Uma cadeia produtiva apresenta as seguintes características: 1. “Refere-se a um conjunto de etapas consecutivas pelas quais passam e vão sendo transformados e transferidos os diversos insumos, em ciclos de produção, distribuição e co- mercialização de bens e serviços; 2. implica divisão de trabalho, na qual cada agente ou conjunto de agentes realiza eta- pas distintas do processo produtivo; 3. não se restringe, necessariamente, a uma mesma região ou localidade; 4. não contempla necessariamente outros atores, além das empresas, tais como institui- ções de ensino, pesquisa e desenvolvimento, apoio técnico, financiamento, promoção, entre outros” (Albagli et al., apud Araújo, 2005). A análise da cadeia de produção de determinado produto agropecuário possibilita maior entendimento das relações entre todos os agentes, facilitando: 1. a descrição de toda a cadeia de produção; 2. o reconhecimento da importância da tecnologia na estruturação da cadeia produtiva; 3. a organização de estudos de integração; 4. a análise das políticas direcionadas ao agronegócio; 5. a melhor compreensão da matriz insumo-produto para cada produto agropecuário; 6. a análise das estratégias das firmas e associações. LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 13LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 13 31/10/2006 11:29:1731/10/2006 11:29:17 Ana Cláudia Gomes Rodrigues Neiva / Heleno Guimarães Carvalho 14 1.1 - Importância do Agronegócio no Brasil O agronegócio, como um todo, destaca-se na economia nacional. Os bons resultados do setor, sobretudo no período 2002-2004, são decorrentes de vários fatores: pelo lado da oferta, destacam-se os investimentos em pesquisas e as tecnologias desenvolvidas por universidades e centros de pesquisas. Assim, o Brasil, terceiro maior exportador de produtos do agronegócio no mundo, apresenta hoje os melhores índices de produtividade em várias commodities agrícolas. Analisando o lado da demanda, verifica-se que o aumento do consumo e das importações dos países em desenvolvimento, e, sobretudo do leste da Ásia, da Rússia, da Europa ocidental e do Oriente Médio, tem contribuído para o desempenho do agronegócio. Segundo Jank (2006), as causas dessa situação seriam: o crescimento da renda per capita e a diminuição da pobre- za absoluta em várias regiões do mundo; a rápida urbanização, de modo que agricultores de subsistência passaram a ser consumidores urbanos de alimentos comprados; e o “efeito gradu- ação”, ou seja, à medida que a renda dos consumidores aumenta, substitui-se o consumo de proteínas de origem vegetal (grãos, por exemplo) por proteínas de origem animal (como carnes e lácteos). A relevância do agronegócio na economia brasileira pode ser mensurada por meio de al- guns indicadores, como participação no PIB e geração de emprego. Segundo dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada da Universidade de São Paulo - CEPEA, o PIB do agronegócio representa aproximadamente 28% do PIB nacional (Figura 2) e emprega em torno de 35% da população economicamente ativa. Figura 2 – Participação do agronegócio no PIB do Brasil, 1994 a 2005. Nos últimos anos, o agronegócio tem sido o setor da economia que mais contribui para a formação do saldo da balança comercial do País. Entre 1989 e 2004, as exportações do setor passaram de US$ 13,9 para US$ 39,0 bilhões. Em 2005, a balança comercial do agronegócio registrou saldo de US$ 29 bilhões, com exportações de U$ 32 bilhões e importações de U$ 3 bilhões. O agronegócio como um todo gera riqueza e alimenta aeconomia brasileira, melhorando a qualidade de vida da população, especialmente nas pequenas e médias cidades cuja economia se baseia na agropecuária. No entanto, em 2005, apresentou retração de 4,66% (Figura 3), de modo que o PIB global do agronegócio, desde a produção agropecuária até a indústria de processamento, de insumos e de serviços, atingiu R$ 537,63 bilhões, o que representa redução de R$ 26,26 bilhões em relação a 2004 (CEPEA, 2006). LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 14LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 14 31/10/2006 11:29:1731/10/2006 11:29:17 A Cadeia Produtiva do Leite 15 Figura 3 – Crescimento do PIB do agronegócio, 1995 a 2005 Analisando isoladamente o PIB do agronegócio da pecuária, observa-se que, no período de janeiro a dezembro de 2005, os índices decresceram 1,90%. No mesmo período em 2004, houve crescimento de 1,72%. O PIB do agronegócio da agricultura apresentou, no mesmo período de 2005 retração de 5,78%, enquanto, no mesmo período de 2004, verificou-se cres- cimento de 2,90%. Segundo informações do CEPEA (2006), as dificuldades enfrentadas no agronegócio são conseqüentes de uma série de fatores: valorização da moeda, afetando a competitividade do Brasil no mercado exportador; aumento dos custos de produção no Brasil, decorrente dos au- mentos sucessivos do preço dos combustíveis, dos fertilizantes e de outros insumos e dos juros altos; falta de investimentos em infra-estrutura física, logística; e problemas de defesa agrope- cuária. Jank (2006) comprovou, por exemplo, que uma das regiões mais favoráveis do mundo para o desenvolvimento do complexo grãos-carnes-fibras-lácteos é o cerrado brasileiro. No en- tanto, seus custos de frete superam 40% do valor FOB do produto. Os problemas de infra-estru- tura, como estradas intransitáveis, ferrovias e hidrovias estagnadas, desfazem toda a eficiência obtida no segmento da produção, o que significa que a logística é hoje um dos principais entra- ves ao desenvolvimento do agronegócio. 2 - O Agronegócio do Leite A cadeia produtiva do leite é uma das mais importantes no agronegócio brasileiro, tanto do aspecto social como do econômico. As atividades relacionadas à produção, à industrialização e à comercialização do leite e seus derivados geram emprego e renda nos meios rural e urbano em todo o País, além de fornecer alimentos de alto valor nutritivo para a população. Segundo estimativas do IBGE, no Brasil existem 1,2 milhões de propriedades rurais produzindo leite, empregando direta ou indiretamente aproximadamente 3 milhões de pessoas. LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 15LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 15 31/10/2006 11:29:1731/10/2006 11:29:17 Ana Cláudia Gomes Rodrigues Neiva / Heleno Guimarães Carvalho 16 De acordo com alguns estudos, para cada R$ 1 milhão investido na indústria de laticínios, pode-se gerar 197 novos empregos permanentes, valor superior ao de outros setores conhecidos como tradicionais geradores de emprego, como a indústria de calçados (191), as empresas de transporte (169), construção civil (128) e a indústria automotriz (102). Em 2005, o leite gerou receitas em torno de R$ 12,5 bilhões, o que representou 7,5% do Valor Bruto da Produção (VBP) Agropecuária Brasileira (R$ 168,5 bilhões) e 18% do VBP da pecuária (R$ 69,9 bilhões), destacando-se como um dos cinco produtos primários de maior valor econômico do País, ao lado da carne bovina, soja, cana-de-açúcar e frango (EMBRAPA, 2006). 2.1 - A Produção de Leite no Mundo No período de 1995 a 2004, a produção mundial de leite cresceu 0,65% ao ano. A União Européia foi responsável por 28,6%, a América do Norte 23,7%, a Ásia 16,7% e a América do Sul por 8,6% do total de leite produzido no mundo no ano de 2004. Em 2004, a produção dos Estados Unidos correspondeu a 19,3% da produção mundial de leite, sendo seguida pelas produções da Índia, Rússia, Alemanha e França, que totalizaram 30% de todo o volume produzido. O Brasil é o sexto maior produtor mundial de leite, com 5,7% da produção total (Tabela 1). Tabela 1 - Principais países produtores de leite em 2004 País Produção (mil toneladas) Participação na Produção Mundial (%) Taxa de Crescimento 1995-2004 Estados Unidos 77.760 19,27 1,10 Índia 37.500 9,29 1,60 Rússia 32.700 8,10 -2,02 Alemanha 27.332 6,77 -0,51 França 23.825 5,90 -0,71 Brasil 23.163 5,74 2,61 China 18.505 4,59 13,84 Nova Zelândia 14.705 3,64 4,75 Reino Unido 13.936 3,45 -0,57 Ucrânia 12.786 3,17 -3,23 Demais países 121.275 30,06 0,23 Total 403.487 100,00 0,65 Fonte: ANUALPEC (2004). Entre os seis maiores produtores de leite do mundo, no período de 1995 a 2004, o Brasil foi o país com a maior taxa anual de crescimento da produção (Tabela 1). Nesse período, a produção dos Estados Unidos cresceu a uma taxa de 1,1% ao ano. Para o Brasil, essa taxa foi de 2,6%, enquanto, para Rússia, Alemanha e França, as taxas foram negativas. De acordo com FAEMG (2006), se essa tendência se mantiver, a produção brasileira na próxima década será a segunda maior do mundo, sendo superada apenas pela dos Estados Unidos. Quanto ao número de vacas leiteiras, todos os maiores produtores do mundo, exceto Índia, apresentaram de 1995 a 2004 taxas negativas de crescimento. O aumento na produtividade LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 16LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 16 31/10/2006 11:29:1731/10/2006 11:29:17 A Cadeia Produtiva do Leite 17 média dos rebanhos pode ser atribuído à maior produção e à diminuição do número de vacas leiteiras. Em 2004, o Brasil possuía um rebanho de vacas leiteiras 69% superior ao dos Estados Unidos. No entanto, a produção desse país foi 235% maior que a brasileira, provavelmente porque, nos Estados Unidos, predominam sistemas intensivos de produção em confinamento com alimentação à base de silagem e ração concentrada. Os sistemas de produção no Brasil são extensivos – os animais são mantidos, basicamente, em pastagem e recebem suplementação alimentar no inverno. A produção e a produtividade apresentam grande oscilação entre os países. Observa-se que, em países como os Estados Unidos e Rússia, esses dois indicadores são elevados. Entre- tanto, existem países (como a Índia) que, apesar de ser um grande produtor, possui baixa pro- dutividade. Em 2004, o Brasil apresentou produtividade de 1.534 litros/vaca/ano, enquanto, nos Estados Unidos, essa produtividade foi 8.703 litros/vaca/ano. Quando comparada à produ- tividade dos dez maiores produtores mundiais de leite, a produtividade brasileira nesse ano só supera a da Índia (1.014 litros/vaca/ano), cujo rebanho não possui qualificações comerciais. Deve-se atentar, no entanto, para os seguintes fatos: no Brasil, existe um número muito grande de unidades com produção de até 50 l de leite/dia, o que contribui para diminuir a mé- dia da produtividade. Esta baixa produtividade média do rebanho brasileiro pode ser melhorada, o que, conseqüentemente, aumenta a produção nacional. Como pode ser observado na Figura 4, entre 1995 e 2004, a taxa anual de crescimento da produtividade brasileira foi em torno de 4,3%, ou seja, a produção de leite no País tem grande potencial de aumento, que pode ser obtido por meio do aumento nos índices de produtividade. Figura 4 – Taxas anuais de crescimento da produção por vaca nos principais países produtores do mundo no período de 1995 a 2004. Em termos de custo de produção, o Brasil, a Argentina, a Índia, a China e a Polônia, são bastante competitivos (Tabela 2). Em diversos países da União Européia, no entanto, os custos de produção são bem mais altos, todavia, sua competitividade é garantida por subsídios e outras formas de proteção de mercado. Estas práticas desequilibram o mercado, reduzem os preços internacionais e acabam excluindo do mercado eficientes produtores que não são subsidiados. LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 17LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 17 31/10/200611:29:1831/10/2006 11:29:18 Ana Cláudia Gomes Rodrigues Neiva / Heleno Guimarães Carvalho 18 Tabela 2 – Custos de produção de leite no mundo. Custo de produção (US$/litro) Países/Regiões < 0,18 Polônia, Argentina, Paquistão, Vietnã, Oeste Australiano, Centro-Oeste Brasileiro, Chile, Grandes fazendas da Índia, Norte da China 0,18 -0,23 Ucrânia, Bangladesh, Fazenda moderna da República Tcheca, Fazenda de custo ele- vado no Brasil, Fazenda de custo elevado no Chile, Fazenda de custo elevado na Índia, Fazenda de custo elevado na Nova Zelândia 0,23 - 0,30 Fazenda antiga na República Tcheca, Grandes fazendas dos Estados Unidos, Peru, Sul da China, Tailândia, Austrália 0,30 – 0,37 Reino Unido, Irlanda , Hungria, Israel, Fazendas pequenas nos Estados Unidos, Grandes fazendas da Alemanha, Espanha, Dinamarca > 0,37 Suíça, Áustria, Holanda, Luxemburgo, França, Itália, Suécia, Finlândia, Noruega, Canadá, Pequenas fazendas na Alemanha. Fonte: International Farm Comparison Network – 2005 (apud Carvalho, 2006) 2.2 - Cenário Nacional da Produção de leite A Produção de Leite no Brasil De acordo com os dados do IBGE, o Brasil produziu em 2004 em torno de 23,5 bilhões de litros de leite. Entre as regiões produtoras, destacam-se a Sudeste e Sul, com aproximadamente 66% da produção nacional. A Região Sudeste é a maior produtora do País (39,4% da produção nacional), sendo se- guida das regiões Sul (26,6%), Centro-Oeste (15,4%), Nordeste (11,5%) e Norte (7,1%). Entre os estados de maior produção, Minas Gerais destaca-se (28,2% da produção total), seguido dos estados de Goiás (10,8%), Paraná (10,2%), Rio Grande do Sul (10,1%), São Paulo (7,4%) e Santa Catarina (6,3%) (Tabela 3). LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 18LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 18 31/10/2006 11:29:1831/10/2006 11:29:18 A Cadeia Produtiva do Leite 19 Tabela 3 - Produção brasileira de leite em 1994 e 2004 1994 2004 Taxa anual de crescimento (%)Volume (milhões de litros) % Volume (milhões de litros) % Norte 651,981 4,13 1.662,888 7,08 9,82 Rondônia 169,031 1,07 646,437 2,75 14,36 Acre 30,299 0,19 109,154 0,46 13,67 Amazonas 45,139 0,29 42,912 0,18 -0,50 Roraima 11,675 0,07 7,290 0,03 -4,60 Pará 297,450 1,88 639,102 2,72 7,95 Amapá 2,545 0,02 3,274 0,01 2,55 Tocantins 95,840 0,61 214,720 0,91 8,40 Nordeste 1.772,817 11,23 2.704,988 11,52 4,32 Maranhão 140,461 0,89 286,857 1,22 7,40 Piauí 51,745 0,33 75,757 0,32 3,89 Ceará 267,555 1,70 363,272 1,55 3,11 Rio Grande do Norte 92,406 0,59 201,266 0,86 8,10 Paraíba 124,420 0,79 137,322 0,58 0,99 Pernambuco 209,686 1,33 397,551 1,69 6,61 Alagoas 189,662 1,20 243,430 1,04 2,53 Sergipe 66,896 0,42 156,989 0,67 8,90 Bahia 629,982 3,99 842,544 3,59 2,95 Sudeste 7.351,888 46,58 9.240,957 39,37 2,31 Minas Gerais 4.577,619 29,00 6.628,917 28,24 3,77 Espírito Santo 365,181 2,31 405,717 1,73 1,06 Rio de Janeiro 403,897 2,56 466,927 1,99 1,46 São Paulo 2.005,188 12,70 1.739,397 7,41 -1,41 Sul 3.830,620 24,27 6.246,135 26,61 5,01 Paraná 1.424,283 9,02 2.394,537 10,20 5,33 Santa Catarina 780,121 4,94 1.486,662 6,33 6,66 Rio Grande do Sul 1.626,215 10,30 2.364,936 10,07 3,82 Centro-Oeste 2.176,249 13,79 3.619,725 15,42 5,22 Mato Grosso do Sul 454,673 2,88 491,098 2,09 0,77 Mato Grosso 286,430 1,81 551,370 2,35 6,77 Goiás 1.409,350 8,93 2.538,368 10,81 6,06 Distrito Federal 25,794 0,16 38,888 0,17 4,19 BRASIL 15.783,557 100,0 23.474,694 100,0 4,05 Fonte: IBGE (2006) No período de 1994 a 2004, a Região Norte apresentou a maior taxa de crescimento (9,8% ao ano), sendo acompanhada das regiões Centro-Oeste (5,2%), Sul (5%), Nordeste (4,3%) e Sudeste (2,3%). O expressivo crescimento da Região Norte foi impulsionado pela produção dos estados de LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 19LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 19 31/10/2006 11:29:1831/10/2006 11:29:18 Ana Cláudia Gomes Rodrigues Neiva / Heleno Guimarães Carvalho 20 Rondônia e Pará, que, em 2004, correspondeu 77% do total produzido na região, com taxas anuais de crescimento de 14,3 e 7,9%, respectivamente, bem superiores à média nacional. No Centro-Oeste, a produção do estado de Goiás, correspondente a 70% do total produzido na região, apresentou taxa de crescimento no período de 1994 a 2004 de 6% ao ano. Verifica-se, portanto, incremento da produção em regiões sem tradição na produção de leite. Em alguns estados como Rondônia, Pará e Goiás, o aumento da produção foi superior à média nacional. Segundo Gomes (2006), o desempenho nessas regiões é favorecido pelo baixo preço dos alimentos concentrados, pela abundância de grãos e pelo baixo custo de oportunida- de da terra. Nesse período, Minas Gerais, maior produtor de leite do País, apresentou taxa de cresci- mento de 3,77% ao ano, enquanto o estado de São Paulo teve taxa de crescimento negativa (-1,4% ao ano), provavelmente em virtude do alto custo de oportunidade da terra. Por outro lado, a participação da produção de Minas Gerais no mercado nacional de leite aumentou com a utilização de modelos com menor custo de produção, mantendo os animais a base de pasto. Como citado anteriormente, deve-se atentar para o fato de que, apesar do rápido cresci- mento da produção de leite, a produtividade das propriedades leiteiras no País, em média, ain- da é baixa quando comparada a de outros países. Em 2005, o Brasil ocupou a 16a posição no âmbito mundial, sendo superado por países como Chile, Argentina e México. Este fato pode ser, na maioria dos casos, resultado de combinações inadequadas de uso dos fatores de produção, elevando os custos e, conseqüentemente, reduzindo a competitividade no tocante ao custo de oportunidade em relação a outras atividades. Além disso, torna o produto lácteo nacional menos competitivo no mercado internacional. O crescimento da população brasileira, do PIB per capita e do PIB não acompanharam o crescimento da produção de leite no País, gerando excesso de produto no mercado. Entre 1994 e 2004, o crescimento da produção brasileira de leite foi de 4,05% ao ano, superior ao da população brasileira (em torno de 1,32% ao ano), resultando em aumento da produção per capita (SEBRAE, 2004). A Produção de Leite em Áreas de Fronteira Agrícola A partir da década 90, a produção de leite no Brasil passou a migrar para as regiões Norte e Centro-Oeste. Alguns fatores foram determinantes para o aumento da produção de leite nestas regiões: 1. a grande extensão territorial; 2. os menores custos de produção, decorrentes do menor preço de alguns insumos im- portantes e do emprego de sistemas de produção em pastagem; 3. o baixo custo de oportunidade da terra; 4. a fertilidade do solo, visto que, inicialmente, as pastagens foram implantadas em áreas de desmatamento; 5. a regularidade de chuvas em algumas regiões, com alto índice pluviométrico; 6. o aparecimento de variedades de forrageiras de fácil adaptação, tanto no cerrado como na região amazônica; 7. a mão-de-obra barata, tendo em vista a pequena oferta de oportunidades de emprego. Em 2004, os maiores produtores de leite na Região Norte foram Rondônia, Pará e Tocan- LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 20LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 20 31/10/2006 11:29:1831/10/2006 11:29:18 A Cadeia Produtiva do Leite 21 tins (Figura 5). No entanto, quando analisada a produção desses estados entre 1994 e 2004, verifica-se a seguinte situação: a produção no estado de Rondônia aumentou de 25,9 para 38,97%, enquanto, no Pará, passou de 45,62 para 38,43% e, em Tocantins, de 14,7 para 12,91%. Figura 5 – Participação dos estados na produção de leite na Região Norte Na Figura 6, observa-se a evolução da produção de leite no Tocantins; em 2004, foi de 214,7 milhões de litros, o que representou 0,9% da produção nacional e 12,9% da produçãoda Região Norte. Em 1994, esses valores eram de 95,8 milhões de litros e representavam 0,6% da produção nacional e 14,7% do volume de leite da Região Norte. Fonte: IBGE Figura 6 – Evolução da produção de leite no Tocantins: 1994 a 2004 Consta na Figura 7 a participação das mesorregiões na produção total do estado. A região de Araguaína é a maior produtora (30,5%), seguida por Miracema do Tocantins (18,7%); e Bico do Papagaio (15,9%). As mesorregiões de Rio Formoso, Dianópolis, Porto Nacional, Gurupi e Jalapão participam, respectivamente, com 9,3; 8,7; 6,2; 5,4 e 5,3% da produção. LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 21LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 21 31/10/2006 11:29:1831/10/2006 11:29:18 Ana Cláudia Gomes Rodrigues Neiva / Heleno Guimarães Carvalho 22 Figura 7 – Distribuição espacial, por Mesorregião, da produção de leite no Tocantins – 2004 3 - A Cadeia Produtiva do Leite 3.1 - Histórico Durante décadas, a produção de leite no Brasil ficou centrada na produção voltada para a subsistência. A produção de leite e derivados lácteos não era vista pelas autoridades governa- mentais e pela sociedade uma cadeia produtiva geradora de riqueza para o País, mas sim como um importante fator de políticas sociais, tanto pela forma coma gerava emprego no campo como pela importância do leite como alimento básico na nutrição infantil. Em 1945, o governo passou a regulamentar o preço do leite no Brasil, decretando o seu tabelamento, cujos objetivos iniciais eram: estimular a produção; reduzir a sazonalidade; e in- centivar o consumo na forma fluida. Até a década 50, em virtude da maior concentração da população no campo, a comer- cialização de produtos lácteos não possuía qualquer tipo de controle sanitário por parte das entidades governamentais. A comercialização era feita de forma arcaica, de porta em porta, em veículos de tração animal com pequenos tanques ou latões. Esta realidade começou a ser alterada com a edição do RIISPOA (Regulamento de Inspe- ção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal), que criou padrões de comercialização e industrialização para todos os produtos de origem animal comercializados no País. Como tudo que é novo provoca grandes mudanças e grande resistência, na época, por desconhecimento, acreditava-se que a pasteurização alterava a qualidade e “enfraquecia o leite”. Esta medida se tornou necessária e eficiente com a necessidade de abastecimento dos grandes centros urbanos com produtos de maior vida de prateleira e que não colocasse em risco a saúde da população. Desse modo, o leite fluido que, sem tratamento térmico, não poderia ser comercializado, com a pasteurização, passou a ter durabilidade de três dias nas geladeiras, o que viabilizou sua comercialização. O leite começou, então, a ser tratado como um produto de interesse comercial. Com o aumento das populações urbanas, decorrente da industrialização, o consumo de leite nos grandes centros aumentou consideravelmente e grandes cooperativas de produtores de leite foram criadas, sobretudo nas regiões Sul e Sudeste, onde se concentram os maiores LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 22LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 22 31/10/2006 11:29:1931/10/2006 11:29:19 A Cadeia Produtiva do Leite 23 centros urbanos. Passou a existir, então, a necessidade de aumento de produtividade, pois a produção precisava ser próxima a grandes cidades visando seu abastecimento de leite fluido pasteurizado. Houve nessas regiões grande importação de tecnologia americana e européia e desenvolvimento de grandes propriedades de criação de bovinos da raça Holandesa como úni- ca raça conhecida de grande aptidão leiteira, visto que zebuínos de origem indiana, apesar de rústicos e adaptados, eram pouco produtivos. Embora se desenvolvesse de modo considerável, a produção de leite ainda apresentava grande sazonalidade. Durante o período de seca, os produtores de baixa tecnologia diminuíam muito sua produção e, ao mesmo tempo em que o tabelamento do produto pelo governo não estimulava a competitividade, inibia o aumento do preço do produto durante a entressafra. A produção de leite no Brasil caminhou assim, sem grandes alterações em sua estrutura, até 1991, quando ocorreu o fim do tabelamento do leite. A cadeia produtiva sempre protegida pelo tabelamento foi abruptamente lançada no mercado competitivo, sem aptidão para compe- tir e sem condições financeiras e tecnológicas, gerando profundas transformações estruturais, geográficas e nos paradigmas de produção com a entrada de grandes corporações multinacio- nais no mercado. De 1993 em diante, outro fato de relevante importância alterou a conturbada cadeia pro- dutiva do leite no Brasil. Mudanças no perfil do consumidor levaram o leite longa vida a tomar conta do mercado, alterando o perfil dos produtores de leite e a geografia das bacias leiteiras no País. Regiões esquecidas passaram a participar de forma significativa na produção de leite e estados sem tradição, como Goiás, Pará, Rondônia e Tocantins, passaram a fazer parte do mapa da produção de leite no Brasil. Alguns se desenvolveram mais que outros, por motivos variados, que serão discutidos adiante, fazendo com que a produção nacional dobrasse nos últimos 25 anos, apesar de todas as turbulências. 3.2 - O Segmento da Produção O segmento da produção de leite sofreu profundas alte- rações no Brasil, sendo mais gritante nos últimos 20 anos. Estas mudanças decorreram de exigências de mercado, aliadas às transformações da indústria, e de questões de or- dem estrutural. Segundo dados do Insti- tuto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a produção de leite cresceu 48,4% entre 1994 e 2004 (Figura 8), en- quanto o número de vacas ordenhadas diminuiu 2,7%. Assim, o incremento na produção de leite esteve relacionado à utilização de técnicas mais avançadas de melhoramento genético, à melhor qualidade da ali- mentação e ao manejo mais adequado dos animais. Fonte: IBGE (2006) Figura 8 – Produção de leite e número de vacas ordenhadas no Brasil: 1990 a 2004 LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 23LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 23 31/10/2006 11:29:1931/10/2006 11:29:19 Ana Cláudia Gomes Rodrigues Neiva / Heleno Guimarães Carvalho 24 Outro fator determinante do aumento da produção leiteira foi a formação de pastagens, principal fonte de alimentação do rebanho leiteiro nacional. Conforme demonstrado na Figura 9, houve aumento significativo de pastagens artificiais no País e, portanto, a melhoria da qualida- de possibilitou o aumento da produtividade. Figura 9 - Evolução de pastagens cultivadas no Brasil O aumento da produção nacional de leite foi acompanhado de maior produção por pro- priedade, que chama a atenção, pois, durante este período, verificou-se também diminuição acentuada do preço pago ao produtor. Ou seja, mesmo com a diminuição do preço, a produção aumentou. Esta aparente contradição só foi possível com a expressiva redução do custo médio de produção do leite, que teve como causas principais: o crescimento da produtividade do reba- nho; a redução dos preços de alguns insumos; e o aumento do volume de produção de leite por produtor. Mesmo com a redução do preço do leite maior que a queda do preço dos insumos, o aumento do volume de produção garantiu o lucro total (Gomes, 2003). Como conseqüências desses fatos, ocorreram importantes mudanças na estrutura de pro- dução do País: o número de produtores foi reduzido e houve maior concentração da produção, sendo mantidos no mercado apenas os produtores mais competitivos; o que teoricamente seria um inibidor de produção foi uma alavanca redefinindo a cadeia da pecuária de leite no Brasil. Com o início do Plano Real, a estabilidade dos preços e o fim do processo inflacionário, houve grande crescimento no consumo de leite no Brasil, que passou de 110 litros/habitante/ ano em 1994 para 133 em 1996. Nesseperíodo, a renda real das famílias teve significativo aumento, principalmente nas classes mais baixas. Entretanto, a redução do nível da atividade econômica nos anos seguintes agravou o desemprego, não permitindo elevação expressiva da renda real e fazendo com que o consumo aparente de lácteos permanecesse, no ano de 2004, estagnado em 130 litros/habitante/ano. Outro fator importante que contribuiu para esta estag- nação foi o lançamento de diversos produtos substitutos ou concorrentes dos lácteos, como os LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 24LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 24 31/10/2006 11:29:1931/10/2006 11:29:19 A Cadeia Produtiva do Leite 25 sucos prontos e as bebidas à base de soja, que cada dia fazem mais parte da alimentação do brasileiro. Oliveira (2006) demonstrou que as elasticidades-renda para o agregado de leite e deriva- dos no Brasil têm se mostrado inelásticas, significando que, para um crescimento mais acen- tuado da demanda interna de leite, é necessário aumento expressivo na renda, como ocorreu no pós Plano Real. No entanto, mesmo que a renda seja imprescindível para o crescimento do consumo de leite, são necessárias ações de longa duração, que comprovem a importância nutricional e funcional do leite e seus derivados e incrementem a presença destes produtos no hábito de consumo do brasileiro. Quanto a rentabilidade do setor, a Figura 10 mostra a evolução dos preços médios nacio- nais pagos aos produtores de leite em reais corrigidos pelo Índice Geral de Preços-Disposição Interna (IGP-DI) e em reais nominais por litro de leite. Fonte: Scot Consutoria Figura 10 – Evolução dos preços médios nacionais pagos aos produtores de leite em reais corrigidos pelo IGP-DI e em reais nominais por litro de leite, 1998 a 2005. Entre 2000 e 2005, o índice de preço nominal do leite pago ao produtor elevou em torno de 63,5%, enquanto o índice de preços de alguns insumos aumentou 91,3%. Os aumentos mais significativos foram em relação à alimentação animal, aos serviços e ao combustível (97; 104,8 e 150,7% respectivamente). Verifica-se, portanto, que os preços do leite ao produtor têm aumentado menos que alguns de seus insumos (Carvalho 2006). É comum produtores e até mesmo consumidores bem informados da situação do Brasil Rural se queixarem que, quando o preço do leite reduz para o produtor, os produtos lácteos não tem o preço diminuído nas gôndolas dos supermercados na mesma proporção. A variação do preço do leite in natura não atinge na mesma proporção os mais variados produtos lácteos, pois, em alguns produtos altamente sofisticados e de grande valor agregado, a matéria-prima “leite in natura” tem pequena participação no preço do produto final. Em outros produtos como leite longa vida e queijos mais simples, a participação é maior. Assim, quando a matéria-prima “leite in natura” tem seus preços diminuídos, observa-se maior reflexo nas gôn- dolas dos supermercados nos produtos de menor valor agregado. Esta idéia de indexação de preço pago pelo consumidor ao preço pago ao produtor está intimamente associada aos tempos de tabelamento do leite quando o governo fixava as margens de cada segmento da cadeia produtiva. Assim, fica claro que a influência do preço pago ao pro- LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 25LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 25 31/10/2006 11:29:1931/10/2006 11:29:19 Ana Cláudia Gomes Rodrigues Neiva / Heleno Guimarães Carvalho 26 dutor no preço do produto final varia de acordo com a participação do preço da matéria-prima na formação do preço do produto final. No 9º Congresso Pan-Americano do Leite, realizado em Porto Alegre em 2006, o Conselho de Produtores e Indústrias de Leite do Estado do Paraná - Conseleite apresentou uma metodolo- gia inovadora na relação indústria-produtores que comprova o acima descrito. O conselho, for- mado paritariamente por representantes das indústrias e dos produtores, divulga mensalmente o valor de referência do leite a ser pago ao produtor. Esse valor se baseia em: 1. informações levantadas pela Universidade Federal do Paraná sobre os preços de comer- cialização dos diversos produtos lácteos produzidos pelas empresas do estado; 2. no custo de produção dos produtos lácteos pelas empresas; 3. no custo de produção do leite pelo produtor; 4. na qualidade do leite; 5. na participação em percentual da matéria-prima no produto final. Este mecanismo gera transparência, ajuda o produtor entender o real valor de seu produto e as oscilações do mercado e ainda acaba com os conflitos entre os segmentos da cadeia pro- dutiva, sobretudo nos momentos de crise. O exemplo do Conseleite-Paraná deveria ser difundido nos demais estados ou regiões brasileiras. Alguns Aspectos da Produção de Leite no Brasil Até 1991, a cadeia láctea no Brasil não sofreu grandes sobressaltos; sua produção se manteve centrada nas regiões Sudeste e Sul e a principal forma de comercialização foi o leite pasteurizado, embalado em sacos plásticos. Com a maior participação da mulher no mercado de trabalho, foram observadas profundas mudanças nos hábitos alimentares da família e, conseqüentemente, no perfil do consumidor de leite. A busca por maior praticidade com a ausência da mulher no lar levou à predominância do consumo de leite longa vida sobre o leite pasteurizado (Figura 11) e ainda possibilitou uma mudança na geografia da produção de leite e nos paradigmas da produção. 4500 4000 3500 3000 2500 2000 1500 1000 500 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 Milhões de litros anos Consumo de leite pasteurizado Consumo de leite loga vida Fonte: ABLV Associação dos produtores de Leite Longa Vida Figura 11 – Consumo de leite longa vida versus consumo de leite pasteurizado O perfil da produção de leite foi alterado, observando-se aumento na participação de esta- LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 26LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 26 31/10/2006 11:29:1931/10/2006 11:29:19 A Cadeia Produtiva do Leite 27 dos sem expressão na produção nacional e até diminuição da produção de São Paulo, tradicio- nal produtor de leite. Esta mudança pode ser atribuída à possibilidade do transporte de leite em embalagens longa vida, favorecendo a instalação de indústrias em estados distantes dos gran- des centros consumidores. Com a entrada das novas fronteiras no cenário da produção nacional de leite, decorrentes do leite longa vida, não havia mais a necessidade de se produzir próximo aos grandes centros produtores de leite pasteurizado. Assim, houve redução dos preços pagos aos produtores da Região Sudeste e maior padronização dos preços pagos em todo o País. O crescimento da produção em regiões pouco conhecidas na produção leiteira foi gritante. Esse incremento, viabilizado pelo aumento do consumo de leite longa vida, foi superior à média nacional em alguns estados, como Rondônia, Pará, Goiás, Mato Grosso e Tocantins, com a en- trada da Região Norte como pólo produtor de leite. O acesso a terra é outro fator fortemente relacionado à produção de leite e ao seu desen- volvimento. A produção está concentrada nos pequenos e médios produtores, portanto, estados com maior distribuição de terras tiveram maior crescimento em sua produção. Quando compa- radas as informações de produção de leite à concentração de propriedades com até 200 ha nos três maiores produtores da Região Norte, observa-se maior produção nos estados com maior concentração destas propriedades, comprovando que a concentração fundiária constitui fator limitante ao aumento da produção de leite. No Tocantins, verifica-se que a maior produção de leite está concentrada em áreas com melhores programas de distribuição de terras e áreas de invasão por pequenos posseiros. En- tretanto, quando comparado aos outros dois estados, até 1996 (último censo), era pequena a porcentagem de propriedades de até 200 ha no Tocantins (13,23% versus 57,16%em Rondô- nia e 52,80% no Pará). Do mesmo modo, o Tocantins teve produção de aproximadamente 215 milhões de litros em 2004, Rondônia 646 milhões e o Pará 639 milhões (Figura 12). Fonte: IBGE – Censo Agropecuário 1995/96 - elaboração: Secretaria de Política Agrícola / MAPA. Figura 12 – Relação entre produção de leite e distribuição fundiária – Região Norte A produção leiteira obtida por pequenos produtores está relacionada aos seguintes fatores: 1. baixa capacidade de investimento do produtor; 2. exploração da fertilidade do solo com a formação de pastagens; 3. pouca capacidade de investimento em máquinas e equipamentos; LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 27LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 27 31/10/2006 11:29:2031/10/2006 11:29:20 Ana Cláudia Gomes Rodrigues Neiva / Heleno Guimarães Carvalho 28 4. pouco capital de giro para sustentar atividades de retorno a médio e longo prazo; 5. oportunidade de aproveitamento da mão-de-obra familiar Considerando os problemas estruturais, como falta de energia elétrica, estradas, assis- tência técnica, crédito e má formação de mão-de-obra, a matéria-prima obtida pelas indústrias captadoras de leite da maioria destas regiões é de péssima qualidade, o que inviabiliza a pro- dução de produtos lácteos de maior valor agregado. Desta forma, os produtores acabam rece- bendo menor remuneração pelo produto (não por culpa das indústrias), formando-se um círculo vicioso, em que o produtor recebe pouco porque seu produto não tem qualidade e a indústria não pode pagar mais porque recebe matéria-prima de baixa qualidade. 3.3 - O Segmento Agroindustrial e Comercial O fim do tabelamento do leite em 1991 e o fim das barreiras comerciais possibilitaram a entrada das grandes multinacionais no mercado de leite do Brasil. As cooperativas e indústrias nacionais antes com mercado cativo foram obrigadas a disputar fornecedores e clientes com grandes grupos capitalizados e com estrutura melhor, o que, aliado à falta de gestão profissio- nal, levou muitas dessas cooperativas à penúria e à falência. Com essas alterações, todos os segmentos da cadeia sofreram transformações. No setor agroindustrial, profundas mudanças ainda estão em curso. Uma concentração, tanto na indus- trialização como na comercialização, foi observada nos últimos 20 anos, com uma concentra- ção da captação e da distribuição, de modo que grandes grupos agregam pequenos laticínios e cooperativas. Essa concentração decorreu, sobretudo, da mudança no consumo, em que o leite longa vida passou a dominar o mercado, inviabilizando a participação das pequenas indústrias. Em decorrência do alto custo de investimento e da necessidade de grande volume de benefi- ciamento para viabilizar sua produção, as pequenas indústrias foram praticamente exiladas do mercado de leite fluido. Verifica-se também uma concentração na comercialização dos derivados lácteos, visto que a formação de grandes grupos multinacionais no comércio varejista fez com que as padarias e pequenos comércios deixassem de ser os principais focos na comercialização de derivados lácteos no Brasil. Outro fator de extrema importância e transformação foi a edição Instrução Normativa Nº 51, em 2002, que, além de regular a coleta de leite a granel, criou padrões de qualidade que vão possibilitar a exportação de produtos lácteos, colocando os produtos nacionais em igualda- de de condições sanitárias aos produtos internacionais. Essa Instrução Normativa, no entanto, vem encontrando resistências e críticas, exata- mente como ocorreu com a obrigatoriedade da pasteurização do leite há 50 anos. A principal crítica refere-se aos rígidos padrões microbiológicos exigidos. Contudo, enquanto uma parte dos produtores, formada principalmente pelos pequenos produtores, critica e resiste (por questões financeiras e culturais) às mudanças, a maior parte do leite produzido nos estados onde estas normas estão em vigor atende plenamente às exigências, comprovando a sua exeqüibilidade. No entanto, ao mesmo tempo em que possibilita a entrada do leite nacional no mercado internacional, a Instrução Normativa exclui pequenos produtores que não conseguem se orga- nizar em tanques comunitários e que não têm acesso à infra-estrutura básica, como energia LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 28LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 28 31/10/2006 11:29:2031/10/2006 11:29:20 A Cadeia Produtiva do Leite 29 elétrica, criando, como em outras cadeias produtivas, dois países: um de primeiro mundo, preparado para enfrentar o mercado mundial, e outro de terceiro mundo, arcaico e voltado para mercados locais. 4 - Considerações Finais Analisando os números da bovinocultura de leite no Brasil e o comportamento da cadeia em outros países, verifica-se que as transformações ocorridas continuarão a acontecer progres- sivamente, como em um caminho sem volta. A produção brasileira de leite nos últimos anos apresentou crescimento significativo. Este incremento, no entanto, representa risco de redução dos preços ao produtor, pois o consumo interno está praticamente estagnado e sofre grande concorrência com outros produtos, como os sucos prontos e as bebidas à base de soja. Incentivar o consumo do leite e seus derivados ressaltando seus aspectos funcionais e nutricionais pode ser um dos caminhos para a expansão do setor no Brasil. Outra possibilidade é a exportação, porém, para alcançar novos mercados, é preciso vencer barreiras altamente protegidas pelos seus detentores e, nesta batalha comercial, dois fatores são determinantes: preço e qualidade. Contudo, vários fatores podem interferir de forma injusta nesta competição gerada pelo mundo globalizado e o monitoramento constante por autoridades brasileiras nas bancas de ne- gociações internacionais se torna extremamente necessário para evitar que subsídios pagos aos produtores dos países ricos prejudiquem o produtor nacional. A competitividade dos produtos lácteos brasileiros no mercado internacional depende mui- to da variação cambial; quando a moeda local se torna sobrevalorizada, a entrada do produto nacional no mercado internacional se torna mais difícil e, conseqüentemente, facilita a im- portação de produtos lácteos. Quando se refere à competitividade e à produtividade, torna-se inevitável a discussão acerca da melhor tecnologia de produção, o que exige do produtor bom conhecimento sobre a melhor forma de sustentação da sua produção. Analisando o cenário nacional de 1991 até os dias atuais, nota-se uma continuação do processo de seleção do mercado, em que apenas os mais competitivos e mais produtivos sobre- viverão. Mesmo com todos os avanços obtidos nos últimos anos, há vários desafios a serem ven- cidos na cadeia produtiva do leite. A produtividade do rebanho leiteiro nacional, apesar do crescimento apresentado nos últimos anos, ainda está muito aquém da média dos rebanhos especializados. Em determinadas regiões do País, os microprodutores sem qualquer forma de organização estão fora do mercado e praticamente não têm opções de comércio de sua produ- ção, pela inexistência de linhas de leite com latões. Neste sentido, são necessários trabalhos que incentivem a organização e a especialização, ou seja, a inserção do pequeno produtor no mercado formal de leite. LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 29LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 29 31/10/2006 11:29:2031/10/2006 11:29:20 LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 30LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 30 31/10/2006 11:29:2031/10/2006 11:29:20 A Cadeia Produtiva do Leite 31 5 - Referências Bibliográficas ANUALPEC. Anuário estatístico da pecuária brasileira. São Paulo: FNP CONSULTORIA & AGROINFORMATIVOS. 2004: 376p. ARAÚJO, M. J. Fundamentos de agronegócios. São Paulo: Atlas. 2005. 160p Associação Brasileira dos Produtores de Leite – Leite Brasil. Disponível em: http://www.leite- brasil.org.br/estatisticas.htm. Acesso em 10 mar 2006. BARROS, G.S. de C; GALAN, V. B. GUIMARÃES, V. D. A.; BACCHI. Estrutura e organização do sistema agroindustrial do leite no Brasil. Piracicaba: CEPEA/ESALQ/USP. 2000. Disponível em: http://www.cepea.esalq.usp.br. Acesso em 20 jan 2006. BATALHA, M. O. (coord). Gestão agroindustrial: GEPAI: Grupo de Estudos e Pesquisas Agroin- dustriais. São Paulo: Atlas. 2001. 690p. CALLADO, A. A. C. (Org). Agronegócio. São Paulo: Atlas. 2005. 142p. CARVALHO M. P. de. O mercado internacional de leite e o preço que o produtor recebe. 2005. Disponível em http://www..milkpoint.com.br. Acesso em 11 mar. 2006. CARVALHO, G.R.; OLIVEIRA, A. F. de O setor lácteo em perspectiva. Boletim de conjuntura agropecuária. Campinas: Embrapa Monitoramento por Satélite. 2006. 23 p. Disponível em http://www.cnpm.embrapa.br/conjuntura/0609_Leitederivados.pdf. Acesso em 29 set 2006. Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada. Indicadores de Preços – Leite. disponí- vel em: <http://www.cepea.esalq.usp.br/>. Acesso em 19 mar 2006. EMBRAPA GADO DE LEITE. Estatísticas do leite. 2006. Disponível em: <http://www.cnpgl. embrapa.br/>. Acesso em 20 abr 2006. EMBRAPA GADO DE LEITE. III Plano diretor da Embrapa gado de leite. 2006 Disponível em: <http://www.cnpgl.embrapa.br/>. Acesso em 20 abr 2006. FAEMG. Diagnóstico da pecuária leiteira do estado de Minas Gerais em 2005: relatório de pesquisa. Belo Horizonte: FAEMG, 2006.156 p. GOMES, S. T. O agronegócio do leite. Belo horizonte: SEBRAE/FAEMG. 2003. 99p. IBGE -Banco de Dados Agregados - Pecuária. Disponível em: http://www.sidra.ibge.gov.br. Acesso em 04 abr 2006. JANK, M. S, ; NASSAR, A. M. ; TACHINARDI, M. H. . Agronegócio e comércio exterior brasilei- ro. São Paulo: Revista da USP. n.64, p.14-27, 2004. JANK, M. S. A ciclotimia do agronegócio. São Paulo: O Estado de São Paulo. 19.04.06. p. A-2. Martins, P. do C.; Araújo, P. F. C. de. Competitividade e eficiência na cadeia produtiva do leite em pó. Revista de Economia e Sociologia Rural, vol.42, n.3, p.431-449. 2004. LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 31LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 31 31/10/2006 11:29:2031/10/2006 11:29:20 Ana Cláudia Gomes Rodrigues Neiva / Heleno Guimarães Carvalho 32 MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO – Assessoria de Gestão Estra- tégica. Projeções do agronegócio: Brasil. Brasília: 2006. 73p. MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO. Estatísticas. Disponível em: <http://www.agricultura.gov.br/. Acesso em 02 mai 2006. MONTOYA, M. A.; FINAMORE, E. B. Delimitação e encadeamentos de sistemas agroindustriais: o caso do complexo lácteo do Rio Grande do Sul. Economia Aplicada, vol.9, n..4, p.663-682. 2005. PONCHIO L. A.; ALMEIDA A. N. de; GIMENES R. M. Fatores sócio-econômicos que inferem na produção de leite nos cinco maiores estados produtores do Brasil. 2004. Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada CEPEA/ESALQ/USP. Disponível em: http://www.cepea.esalq. usp.br. SBRISSIA, G. F. NOVA ZELÂNDIA - Berço da Eficiência e da produção integrada. Boletim do Leite. Piracicaba: Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada CEPEA/ESALQ/USP. Ano 10, n110. 2003 SEBRAE. Diagnóstico da cadeia produtiva do leite e derivados: desenvolvimento da bacia lei- teira da região Tocantina e Médio Mearim. São Luis: SEBRAE. 2003. 12p. SEBRAE. Diagnóstico do arranjo produtivo do leite da região central do Estado do Tocantins. Palmas: SEBRAE. 2004. 184p. VILELA, D.; LEITE, J. L. B.; RESENDE, J. C. de. Políticas para o leite no Brasil: passado, presente e futuro. In: SIMPÓSIO SOBRE SUSTENTABILIDADE DA PECUÁRIA LEITEIRA NA REGIÃO SUL DO BRASIL, 2002, Maringá. Anais... Maringá: UEM/CCA/DZO, 2002. p.1 – 26. YAMAGUCHI, L. C. T. ; MARTINS, P. C. . O agronegócio do leite no Brasil: período 1970-1999. Revista Eletrônica de Economia. Juiz de Fora: Instituto Vianna Júnior. n.2. set. 2003. Disponí- vel em: http://www.viannajr.edu.br/revista/eco/art002.asp. Acesso em 15 mar 2006. ZUIN, L. F. S.; QUEIROZ, T. R. (org). Agronegócios: gestão e inovação. São Paulo: Saraiva. 2006. 436p. ZYLBERSZTAJN, D,; NEVES, M. F. (organizadores). Economia e gestão dos negócios agroali- mentares: indústria de alimentos, indústria de insumos, produção agropecuária, distribuição. São Paulo: Pioneira Thomson Learning. 2005. 428p. LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 32LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 32 31/10/2006 11:29:2031/10/2006 11:29:20 Formação e Recuperação de Pastagens 33 Formação e Recuperação de Pastagens Elcivan Bento da Nóbrega / Antonio Clementino dos Santos 1.INTRODUÇÃO A pecuária bovina é considerada uma das principais atividades econômicas no bioma Cerrado, onde o rebanho corresponde, atualmente, a 44% do efetivo bovino nacional, com apro- ximadamente 49 milhões de cabeças, observando-se que as pastagens são a principal fonte alimentar desse rebanho. Estima-se que existem nessa região em torno de 117 milhões de hectares ocupados com pastagens e, desse total, 50 milhões são destinados a pastagens cultivadas (Sano et al., 1999). Estimativas da Embrapa, no entanto, indicam que cerca de 80% dessas pastagens encontram- se atualmente em algum processo de degradação. Considerando a área total de pastagens, obtém-se lotação média de 0,4 animal/ha, índice muito aquém do potencial produtivo das principais espécies forrageiras tropicais, um indicativo de que a grande maioria das pastagens do Cerrado encontra-se em processo de degradação. Nos estados do Tocantins e Pará, a bovinocultura, especialmente a de corte, tem sido explorada em grandes propriedades, em sistema extensivo sob pastejo contínuo, quase sempre mal manejado. A implantação das pastagens no norte do Tocantins e no sudeste do Pará, onde concentra a maior parte do rebanho desses dois estados, teve início na década de 70, após a derrubada e a queima da vegetação de mata de transição entre os biomas Amazônia e Cerrado. O capim-colonião (Panicum maximum) foi a forrageira introduzida na abertura desta fronteira pastoril. Depois de 15 anos de extrativismo pecuário, findou-se o efeito da queimada sobre a ferti- lidade do solo, comprovado pela perda de vigor e de produtividade das pastagens de colonião, quase totalmente substituídas pelo capim-braquiarão (Brachiaria brizantha) a partir de meados da década de 80. Nas operações para a substituição do capim-colonião pelo braquiarão, muitos pecuaristas não fizeram investimentos visando à maior fertilidade do solo, tampouco, à correção e adubação para a manutenção da produtividade forrageira em níveis desejáveis. Estes fatos, aliados à ado- ção de manejos inadequados (excesso de lotação), ao uso freqüente do fogo e do monocultivo (tapetão de braquiarão vulnerável ao ataque de pragas e doenças), provocaram a degradação da maioria das pastagens, refletindo diretamente em baixos índices de produtividade animal (carne e leite) e gerando prejuízos ao meio ambiente, à sociedade e à economia regional. Atualmente, a degradação das pastagens é o maior obstáculo para a produção animal exclusivamente em pastagem no Brasil Central. Portanto, a recuperação dessas áreas degra- dadas constitui hoje o principal desafio para a manutenção da atividade com rentabilidade e LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 33LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 33 31/10/2006 11:29:2031/10/2006 11:29:20 34 Elcivan Bento da Nóbrega / Antonio Clementino dos Santos sustentabilidade. Entretanto, as pastagens em processo avançado de degradação necessitam de recuperação e/ou renovação completa para o restabelecimento de sua capacidade produtiva. Segundo Vilela et al. (2001), as alternativas tecnológicas empregadas para restabelecer a produtividade das pastagens caracterizam-se, a maioria, por operações para a correção da acidez e para fertilização do solo, associadas à mecanização com implementos agrícolas para movimentação do solo visando à sua descompactação superficial e à incorporaçãode insu- mos. Essas operações permitem o estabelecimento de consórcio ou rotação de pastagens com culturas anuais de grãos (arroz, milho, soja, milheto, feijão, entre outras), o que proporciona a viabilidade econômica e a sustentabilidade dos sistemas de produção, tendo em vista os bene- fícios imprimidos pelo sistema integrado lavoura-pecuária, que potencializa o sinergismo dos componentes do ecossistema de pastagens, solo-planta-animal. Diante desta problemática, realizou-se este trabalho com o objetivo de fornecer subsídios tecnológicos e conhecimentos gerados pela pesquisa sobre formação e recuperação de pasta- gens em processo de degradação. A realização desses estudos tem como finalidades promover o restabelecimento de sua capacidade produtiva, a reincorporação das áreas de pastagens de- gradadas aos sistemas produtivos e a desaceleração da expansão da fronteira pecuária sobre áreas de vegetação nativa, evitando o desmatamento de novas áreas para o estabelecimento de pastagens e amenizando o impacto negativo da atividade sobre o meio ambiente. 2. FORMAÇÃO E RECUPERAÇÃO DIRETA DE PASTAGENS As pastagens cultivadas de gramíneas constituem atualmente a base da alimentação do rebanho bovino brasileiro. Durante o processo de ocupação e expansão da pecuária bovina no Brasil Central, iniciada na década de 70 com a introdução de várias espécies do gênero Brachiaria, pouca atenção foi dispensada aos aspectos de correção e fertilização do solo, impe- rando a visão de que as pastagens deveriam ser formadas em áreas marginais (piores terras), enquanto as melhores terras (de cultura) seriam reservadas para lavouras. Esta premissa equivocada, associada ao manejo inadequado dos solos e das pastagens, tem contribuído, em curto espaço de tempo para sérios danos ao meio ambiente, marcado pela degradação e pelo surgimento de juquira, pragas, doenças, compactação e erosão do solo. Veri- fica-se que, na maioria dos casos, estas áreas são abandonadas e novas áreas são desmatadas para a formação de pastagens, justificando a visão de que é uma atividade nômade e destrui- dora dos recursos naturais. Com a economia em vias de estabilização, o desenvolvimento e a modernização da pecuá- ria bovina se tornou cada dia mais necessária, principalmente pela crescente demanda de carne e leite e, sobretudo, pela exigência e competitividade imposta pelo mercado. Neste contexto, é necessário considerar as pastagens como uma cultura agrícola de grãos. Os pecuaristas devem ser bons agricultores, capazes de produzir forragem em grande quantidade e qualidade com máxima eficiência de utilização. Com esta nova visão, é necessário dispensar mais atenção ao estabelecimento de pas- tagens. Neste sentido, cinco aspectos básicos devem ser considerados para se obter sucesso na formação de pastagens em áreas degradadas com vegetação em fase inicial de regeneração (juquira): escolha da área; escolha da espécie forrageira; preparo da área; semeadura e manejo de formação. LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 34LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 34 31/10/2006 11:29:2031/10/2006 11:29:20 Formação e Recuperação de Pastagens 35 2.1. ESCOLHA DA ÁREA Na definição do local para o estabelecimento de pastagem em áreas degradadas, deve-se dar preferência àquelas áreas com topografia plana a levemente ondulada em vez de áreas de relevo ondulado. Se possível, preferir solos de textura média, sem afloramento de rochas (pe- dregosos), e que permitam com facilidade a realização de operações de mecanização agrícola visando ao preparo do solo. É importante observar também a disponibilidade de fontes naturais de água para o consu- mo dos animais. Na inexistência dessas fontes de água e, caso a área definida tenha potencial e atenda aos demais requisitos, deve-se analisar a possibilidade e a viabilidade econômica de utilização de rede hidráulica de distribuição para abastecimento a dos bebedouros serem insta- lados na pastagem. Outro aspecto importante a ser avaliado é o potencial de drenagem do solo. Deve-se evitar solos mal drenados ou que permaneçam inundados durante determinado período do ano, ape- sar da existência de espécies forrageiras bem adaptadas estas condições ambientais. 2.2. ESCOLHA DA ESPÉCIE FORRAGEIRA Este é um dos aspectos mais importantes para o sucesso na formação e persistência das pastagens. O objetivo de se cultivar a pastagem; a categoria animal a que se destina a forragem; a forma de multiplicação; a facilidade de germinação e pegamento; e a resistência a secas, ge- adas, pragas, doenças, pastejo e cortes são alguns fatores importantes (Evangelista, 1995) que devem ser considerados na definição da espécie forrageira a ser implantada. O nível de fertilidade do solo é outro fator importante a ser analisado. Normalmente, ve- rifica-se considerável variação nas características físicas e químicas dos solos dentro e entre as fazendas. Do mesmo modo, uma considerável variação é observada entre e dentro das espécies forrageiras quanto à adaptação aos diferentes níveis de fertilidade do solo. Assim, é necessário realizar um diagnóstico prévio da fertilidade do solo da área escolhida mediante a análise quí- mica e física do solo, com vistas a adequar o nível da fertilidade do solo, por meio da correção e adubação, objetivando elevar o nível para patamares que atendam às exigências da planta forrageira desejada, para que ela possa expressar seu potencial produtivo. Portanto, para a es- colha da espécie forrageira, é imprescindível considerar o nível de fertilidade do solo ao qual ela melhor se adapta. Outro fator importante é o nível tecnológico a ser adotado, que pode ser alto, médio ou baixo. Algumas espécies forrageiras só apresentam viabilidade econômica para exploração pe- cuária se acompanhadas por outras medidas, às vezes de custo elevado, como investimentos para a melhoria da fertilidade do solo e mudanças no sistema de manejo da pastagem para torná-lo mais intensivo, exigindo maior número de divisões das pastagens (piquetes) e maior capacidade de gerenciamento do sistema produtivo, dentre outras. É preciso considerar também outros fatores, como clima, topografia, textura e drenagem do solo. Solos com declividade acentuada e de textura arenosa estão mais sujeitos aos efeitos maléficos da erosão, principalmente quando ocupados com espécies de crescimento cespitoso (touceiras), que apresentam pouca proteção contra o excesso das águas das chuvas. Segundo Vieira e Kichel (1995), espécies de crescimento estolonífero, como os capins quicuio da Ama- zônia, grama-estrela, tifton, pangola, coastcross e tangola, devem ser preferidas para áreas com solos mais sujeitos à erosão, por conferir melhor cobertura. 2.3. PREPARO DA ÁREA LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 35LIVRO_PROF_NEUMAN.indd 35 31/10/2006 11:29:2031/10/2006 11:29:20 36 Elcivan Bento da Nóbrega / Antonio Clementino dos Santos 2.3.1. Limpeza da área A limpeza da área é uma operação necessária quando o local encontra-se com vegetação densa, composta de arbustos, rebrote de tronqueiras, invasoras perenes, juquira, ou seja, uma vegetação em fase de regeneração (capoeira). Neste caso, a limpeza pode ser feita com corren- tão arrastado a partir de suas extremidades, por dois tratores de pneus traçados, ou utilizando tratores com lâmina frontal, tendo-se o cuidado de observar a legislação ambiental vigente. Em seguida, o material vegetativo deve ser enleirado no sentido perpendicular à declividade do ter- reno ou amontoado na forma de coivara (montes) para ser queimado controladamente depois de seco. É importante ressaltar que, para a execução do enleiramento, a lâmina frontal do trator deve ser substituída pelo garfo, que não causa o arraste agressivo e indesejável da camada su- perficial do solo, rica em matéria orgânica para as leiras ou os montes. Quando a vegetação da área apresenta pequena densidade de plantas,
Compartilhar