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Vida aristocrata feminina e a literatura no Período Heian

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Vida aristocrata feminina e a literatura no Período Heian
Visão geral do período Heian
Para entender a vida da aristocracia e o papel feminino da nobreza do Período Heian, é necessário antes dar o contexto da época. Na introdução de “Cambridge History of Japan - Volume 2”, Shivelly e McColough (2008) dão as noções gerais deste momento histórico. Os autores mencionam que o período Heian foi marcado pela implementação de uma nova capital em 794, Heian-kyo, conhecida hoje como Kyoto. Em volta po Palácio Imperial, acredita-se que a cidade chegou a atingir entre 100 e 150 mil habitantes. Foi nessa época que o poder do imperador atingiu um ápice, afinal, nenhum predecessor havia construído uma cidade capital de tamanha magnitude. Medidas efetivas foram tomadas no sentido da centralização do poder imperial, porém com o passar dos séculos essa efetividade declinou-se. 
A vida aristocrática, com seus costumes e rotina, foi a mais bem retratada ao longo da história dos tempos Heian, afinal, a elite japonesa foi intensamente influenciada pela China, inclusive em relação a hábitos de leitura, escrita e vida intelectual. Por isso, muitos nobres descreveram suas atividades diárias em chinês ou chinês híbrido, deixando-nos um legado de relatos da aristocracia em Heian. Outros relatos importantes estão na literatura desenvolvida na época, a exemplo dos monogataris.
Neste trabalho, temos por interesse aprofundar essa parcela minoritária da população, dedicando às mulheres especial atenção, e como seu modo de vida influenciou a literatura do período Heian.
Família imperial, aristocracia e mulheres
Em um capítulo dedicado à sociedade e sua capital, McCoulogh (2008) propõe-se a falar sobre a nobreza, que tinha grande poder sobre o Japão da época. Como em outras culturas, o imperador permanecia de maneira inquestionável no topo da estrutura política e social, fato também ajudado por motivos religiosos, já que acreditava-se que vinha de uma linhagem divina proveniente de Amaterasu. Seu prestígio e autoridade eram absolutos e inquestionáveis, ainda que por questões políticas, a família real Yamato tenha se deixado influenciar fortemente pelo clã Fujiwara. Ainda que na época não houvesse um documento sucessório, a linhagem de trono foi exclusivamente masculina, preferencialmente passada de pai para filho, e em alguns casos de irmão para irmão. Mais raramente, podia-se observar também a passagem de tio para sobrinho, sobrinho para tio. 
Chama atenção que, embora houvesse na sucessão de trono uma flexibilidade incomum, ela era direcionada apenas a homens, sem nenhum tipo de abertura às mulheres. Até mesmo nos dias atuais, a questão da mulher como sucessora continua um tabu, já que pelas atuais leis sucessórias a princesa Aiko, que seria a herdeira direta do trono após seu pai Naruhito, não teria este direito. Assim, a sucessão passaria de Akihito, o atual imperador, para Naruhito e depois para Akishino, irmão de Naruhito, até chegar ao filho de Akishino, príncipe Hisahito.
São muitas as relações em que percebemos uma diferença entre homens e mulheres. McColough (2008) pontua que originalmente, a família imperial deveria ser endogâmica, porém a regra só permaneceu para as mulheres descendentes da linhagem, enquanto aos homens era permitido o casamento fora do clã. Apenas na geração da neta do imperador Nimmyo, houve registro de casamento de uma mulher com um não integrante do clã. 
Tal fato é importante pois tornou-se comum nas gerações seguintes, representando uma conquista feminina. Ao mesmo tempo, torna claro os privilégios concedidos aos membros masculinos em detrimento das mulheres, já que estas tinham menor liberdade inclusive de escolha de seu cônjuge. 
Outro fato que chama atenção na relação das mulheres no período Heian é que as esposas do Imperador continuavam a fazer parte dos seus clãs de origem, ou seja, não eram incorporadas à família real. A ressalva se dá pelo tratamento especial oferecido a essas mulheres, igualitário em relação aos membros do clã imperial durante a vida delas. Era possível que títulos fossem concedidos a elas, dando preferência às que dessem à luz um filho homem ao imperador.
McColough (2008) ainda relata que as consortes ficavam disponíveis para o imperador, sendo separado a elas um espaço reservado do palácio. Essas mulheres viviam com suas acompanhantes e serviçais, e a parte do palácio que lhes era reservada era protegida por eunucos. No entanto, as mulheres que ali viviam não eram prisioneiras, pois, podiam receber visita de parentes e também podiam sair do palácio para visitar seus familiares.
Ainda assim percebemos que em relação à mulher havia um domínio, um controle, que as fazia estar disponíveis para o imperador, e até mesmo criando uma certa rivalidade pela sua preferência. Por isso, procuravam pelas mais belas damas de companhia e se esforçavam para criar a melhor atmosfera em torno de si.
Em relação ao matrimônio, é interessante o fato de que eles ocorriam em idade muito jovem, em geral na puberdade. No primeiro casamento, a idade dos noivos costumava ser mais igualitária, porém no segundo casamento, a mulher costumava ser muito mais jovem que o homem. A poligamia era permitida apenas para os homens, Às mulheres era permitido casar uma segunda vez apenas em caso de morte do marido ou divórcio, mas nunca ter mais de um marido ao mesmo tempo.
Uma das explicações a isso é o fato de haver uma alta taxa de mortalidade entre mulheres principalmente ao dar à luz. Portanto, o homem teria ainda outras mulheres após a morte da esposa. Haruko (1984) atenta ao fato de que essa prática poligâmica levou as mulheres à solidão e ansiedade. Pelo fato dos homens terem muitas mulheres e as mulheres só poderem ter um homem por vez, o tempo disponível era passado esperando e pensando, levando-as a desenvolver a literatura, que reflete seus sentimentos e experiências.
A primeira esposa era em geral a principal pelos seguintes motivos: era esperado que a residência do marido fosse ao seu lado, seus filhos homem recebem uma posição hierárquica mais conceituada em relação aos filhos das demais mulheres.
O casamento no período Heian é diferente da ideia que temos hoje de casamento como sociedade ocidental. O casamento não era oficializado em documento e em geral era uxorilocal (próximo ou na residência da família da esposa), ou uxorilocal seguido de neolocal (uma casa separada de ambas as famílias, do noivo e da noiva). 
Isso pode nos dar a ideia de que a mulher tem uma posição mais relevante em relação ao homem, já que este deve mudar-se para a residência da família da mulher. Haruko (1984), no entanto, reitera a importância do pai da esposa nessa situação, que é quem ordena a vinda do genro à residência. A mesma autora lembra ainda que nos períodos Nara e Heian, diferentemente da era medieval, mulheres e homens tinham direitos relativamente igualitários em relação à herança de terras. Mas o fato de as mulheres aristocratas do período Heian gozarem de certo status, não significa que a sociedade em si era patriarcal.
É atribuído ao período Heian, no século sétimo, o início da sociedade patriarcal, que culminou numa perda massiva de direitos das mulheres no período medieval. Com a centralização do poder dos Yamato, criou-se uma federação de famílias patriarcais. Aumentando a autoridade patriarcal das famílias ligadas aos Yamato, outras famílias ficaram sob seu controle cessando com a independência de famílias menores.
As mulheres e a literatura: Genji Monogatari
Como já mencionado anteriormente, os moldes poligâmicos exclusivos ao homem permitiram à mulher aristocrata tempo para dedicar-se à literatura. Aos homens, era reservada a cultura chinesa, e a escrita em chinês ou chinês híbrido. Por este motivo, a produção feminina foi escrita em grande parte em onna-de, tipo de escrita para mulheres.
No período Heian, a literatura por mãos femininas tornou-se tradicional, segundo Schallow e Walker (1996). Os autores lembram da importância da produção desse período que não só inspirououtras escritoras japonesas até o período moderno como foi pioneiro em relação a outras culturas.
De todas as produções da época, destaca-se a primeira novela já escrita no mundo, Genji Monogatari. A palavra monogatari é uma junção de mono (coisa) e gatari (falar, contar narrar). Assim, uma das traduções possíveis para monogatari seria “contar coisas” (KEENE, 1999, p.433). 
Em Genji Monogatari, a autoria é usualmente atribuída à fidalga Murasaki Shikibu, ainda que haja discordâncias a respeito. Dentre as importâncias de Genji Monogatari está a descrição da vida aristocrática japonesa do Período Heian. Foi elogiada inclusive pelo imperador Ichijo, que reconheceu o grande conhecimento da história japonesa por Shikibu (GATTEN, 1981, p.6).
A obra foi escrita por uma mulher para a leitura de outras mulheres. É considerada uma literatura difícil até mesmo para os japoneses. Conta a história de Hikaru Genji, filho do imperador com uma mulher de baixa patente. Genji recebe o sobrenome Minamoto, e por isso, é considerado um homem comum e não parte do clã imperial. A mãe de Genji morre, e assim o imperador, sem conseguir se esquecer de sua mulher, ouve falar de Fujitsubo, muito semelhante à falecida. Genji se apaixona pela madrasta e juntos eles vivem um amor proibido. Fujitsubo dá à luz um filho que todos acreditam ser do imperador, mas na realidade é o filho de Genji. Genji tem uma série de relações amorosas mal resolvidas e chega a sequestrar uma garota de 10 anos, sobrinha de Fujitsubo, a jovem Murasaki. Ele a cria para se tornar sua esposa perfeita. Com a morte da sua esposa Aoi, quando do nascimento do filho deles, Genji se entristece mas encontra consolo em Murasaki. Com o passar da trama, Genji tem novos envolvimentos amorosos e seu filho com Fujitsubo torna-se o imperador.
É interessante a interpretação de Okada (1991), que mostra como a mulher é substituída por outra na narrativa. A exemplo disso, Fujitsubo, madrasta e amante de Genji, é uma substituta da mãe morta de Genji e depois substituída pela jovem Murasaki. 
Genji é um homem valorizado durante a narrativa, podendo ter a mulher que quiser. Suas parceiras, no entanto, demonstram sofrimento. Sua esposa Aoi martiriza-se pelo relacionamento de Genji e Fujitsubo. Murasaki, descontente com o novo casamento de Genji, deseja tornar-se freira e posteriormente, morre.
Podemos novamente perceber como a figura masculina é exaltada em detrimento da feminina. Isso se dá mesmo com a autora sendo mulher, pois trata-se muito mais de um retrato da situação vivida na realidade de uma sociedade em que a mulher tem papel menor.
Considerações Finais
O tipo de sociedade, o tratamento e vida das mulheres na aristocracia japonesa no período Heian foram determinantes para o desenvolvimento literário da época. Tanto pela condição a que elas eram submetidas, que as levava a ter um tempo livre maior, como também porque deixava rastros de sentimentos que eram transportados para a expressão literária. A solidão, o sofrimento causado pela poligamia masculina, a vida na corte, o amor e o desamor, são assuntos recorrentes.
Graças a essas mulheres, deixou-se um imenso legado literário do período, com obras de qualidade que até hoje são clássicos e estudados não só pelos japoneses como por outros acadêmicos no mundo. A importância dos relatos em monogataris e outros gêneros são ricos em história, detalhes e talento.
Referências
GATTEN, Aileen. The Order of the Early Chapters in the Genji monogatari. Harvard Journal of Asiatic Studies, v. 41, n. 1, p. 5-46, 1981.
HARUKO, Wakita; GAY, Suzanne. Marriage and property in premodern Japan from the perspective of women's history. Journal of Japanese Studies, v. 10, n. 1, p. 73-99, 1984.
KEENE, D. Seeds in the Heart: Japanese Literature from Earliest Time to the Late Sixteenth Century. New York: Columbia University Press, 1999.
OKADA, Richard H. Figures of Resistance: Language, Poetry, and Narrating in The Tale of the Genji and Other Mid-Heian Texts. Duke University Press, 1991.
SCHALOW, Paul Gordon; WALKER, Janet A. (Ed.). The woman's hand: gender and theory in Japanese women's writing. Stanford University Press, 1996.
SHIVELY, Donald ; MCCULLOUGH, William H.; HALL, John Whitney. The Cambridge History of Japan: Heian Japan. Cambridge University Press, 2008.

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