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1 Educação Ambiental - Unidade 04 Educação Ambiental CENTRO DE CIÊNCIAS TECNOLÓGICAS NÚCLEO DE EDUCAÇÃO À DISTÂNCIA FUNDAÇÃO EDSON QUEIROZ UNIVERSIDADE DE FORTALEZA ENSINANDO E APRENDEND O Sumário 1. Noções iniciais 2. Bases filosóficas da Educação Ambiental 3. Epistemologias da Educação Ambiental: holismo, interdisciplinaridade e hermenêutica 4. A Educação Ambiental e o lugar do educador ambiental Unidade 04 - Educar para a sustentabilidade Olá! Seja bem-vindo a Nota de Aula da Unidade 4, da dis- ciplina de Educação Ambiental. Aqui você encontra o texto produzido pelo professor conteudista, além de outras fon- tes de pesquisa. Não esqueça de desenvolver seus estudos acompanhando a web-aula da unidade. Agora veja o que você vai aprender nessa unidade. Boa leitura! 2 Educação Ambiental - Unidade 04 Na Unidade 4 você identificará as diferentes relações estabelecidas entre as sociedades e a natureza ao longo da história, identificando também os principais marcos históricos que assinalaram mudanças de cunho pedagógico nessas relações. Objetivo 1. Noções Iniciais A noção de educação para a sustentabilidade abarca um conjunto de princípios, valores, atitudes e comportamentos que demonstram uma percepção do planeta como uma única comunidade, sendo muito mais ampla do que uma simples relação com a economia. Trata-se, portanto, de um ponto de referência ético indissociável da civilização planetária e da ecologia e supõe o reconhecimento do planeta como um ser vivo e inteligente. A educação para a sustentabilidade não pode ser apenas ambiental, deve ter como foco a superação das desigualdades, a eliminação das diferenças econômicas e a integração. Este é um dos desafios da cidadania ambiental promovida através da educação. Uma educação para a cidadania ambiental deve conduzir sua proposta para o desenvolvimento de uma cultura de sustentabilidade, uma cultura de vida e da convivência equilibrada entre os seres humanos e a natureza – equilíbrio dinâmico. (GUTIÉRRES; PRADO, 1999.) É nesse contexto que se pode falar de uma Educação Ambiental que promove a aprendizagem – promove o sentido das coisas – desenvolvendo-se a partir da vida cotidiana. 3 Educação Ambiental - Unidade 04 2. Bases filosóficas da Educação Ambiental O momento atual é marcado pela necessidade de definição da identidade da Educação Ambiental frente a outros campos da educação, e encontra no conceito de interdisciplinaridade um recurso muito conveniente para lhe dar a especificidade requerida por um campo que se reconhecia como de convergência disciplinar de áreas em conflito epistemológico e socioprofissional: as ciências naturais e as ciências sociais. No documento final gerado pela Conferência Intergovernamental de Educação Ambiental, realizada em Tbilisi em 1977, afirmou-se que: [...] educação ambiental não é uma matéria suplementar que se soma aos programas existentes, exige interdisciplinaridade, quer dizer, uma cooperação entre as disciplinas tradicionais, indispensável para poder se perceber a complexidade dos problemas do meio ambiente e formular sua solução. Em Tbilisi (1977) foram recuperadas algumas estratégias de desenvolvimento do currículo buscando “compreender, segundo uma perspectiva holística, os diversos aspectos ecológicos, sociais, culturais e econômicos do meio ambiente, quer dizer, os currículos devem ter caráter interdisciplinar”. 4 Educação Ambiental - Unidade 04 Atualmente, a noção de interdisciplinaridade está começando a ser deslocada para a de complexidade. O pensamento complexo representa uma das mais recentes contribuições para a reformulação das fronteiras e dos objetos de estudo das disciplinas científicas, destruindo assim, os mitos da acumulação, progressiva e depurada, do conhecimento científico, da inviolabilidade do sujeito humano e das verdades universais. Entretanto, a interdisciplinaridade encontra-se longe de se materializar em extensas propostas curriculares que transformem o positivismo predominante na organização do conhecimento escolar. A complexidade é vislumbrada apenas como um horizonte de possibilidades para se construir novos territórios do pensamento e da ação crítica, não só do ambiental como de todas as esferas do conhecimento. Importante Do ponto de vista filosófico, não se pode imaginar a interdisciplinaridade como solução para todos os problemas da educação, mas sim como uma proposta epistemológica vigorosa que tende a superar a excessiva especialização disciplinar surgida da racionalidade científica moderna. É, portanto, uma forma de reorganizar o conhecimento para responder melhor aos problemas da sociedade. Parte-se da premissa de que a realidade é divisível desde o teórico, para fins de estudo, mas os diferentes componentes cognitivos, que dão origem às diversas disciplinas, estão de fato absolutamente relacionados. A interdisciplinaridade trata-se de uma abordagem mais avançada sobre a questão ambiental. Conceito 5 Educação Ambiental - Unidade 04 No entanto, torna-se importante perceber e compreender como o pensamento sistêmico e interdisciplinar se desenvolveu ao longo do tempo, buscando um melhor entendimento acerca da evolução do pensamento ambiental na perspectiva filosófica. A seguir você acompanhará as ideias compiladas da obra “Pensar o Ambiente: bases filosóficas para a Educação Ambiental”, desenvolvida com apoio da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) e do Ministério da Educação brasileiro. Essas visões tratam sobre as diversas referências epistemológicas e abordagens filosóficas que influenciaram o pensamento ambiental atual. Platão Em Crítias (2010), Platão lamenta a devastação das paisagens gregas. O filósofo fala sobre um universo original, onde os conceitos como physis, ethos, aletheia, entre outros, nos remetem a um saber e a uma experiência ainda sem tradução nos dias atuais. A ideia de ethos como morada dá pistas desta outra experiência do real e da convivência, anterior às dicotomias que posteriormente vieram a constituir o modo moderno de pensar o mundo. Os Pré-Socráticos, com seus fragmentos, permitem imaginar outros sentidos para habitar o mundo como ambiência, uma noção que pode ser referência para a Educação Ambiental. Aristóteles Construiu um grande sistema de saber que influenciou muito o desenvolvimento tanto da ciência grega, como medieval. Aristóteles concebe o ser humano como parte da natureza e ambos são dotados de um telos (finalidade). 6 Educação Ambiental - Unidade 04 A Ética, em Aristóteles, consiste na busca do equilíbrio, situando o saber instrumental – o qual provoca tantos problemas ambientais hoje – como dependente do saber prudencial. Para o filósofo, a ação ética deve evitar os extremos, caracterizando-se pelo equilíbrio e prudencia. Para o pensamento aristotélico, a dificuldade em fazer o bem está em achar o meio termo, a justa medida. Importante Aristóteles entende que a pólis (cidade) também faz parte das coisas naturais e o homem, por sua vez, é um animal político. Esta abordagem pode ser muito útil à Educação Ambiental, pois trata-se de um saber prático que permite a tomada de decisões em relação ao meio ambiente, às políticas públicas etc., evitando as soluções fáceis ou meramente técnicas, desvinculadas de um contexto ético. Santo Agostinho e São Tomás Consideram a natureza como uma livre criação de Deus no tempo e, como todo ser criado do nada, é essencialmente boa. Toda natureza é sempre um bem. Para estes filósofos, a natureza do espírito é sempre superior à natureza do corpo. Essa noção de natureza é uma forma de ver o mundo de maneira unificada,ainda sem a distinção entre natureza e cultura, estabelecida por Descartes no séc. XVII, e que está na base do materialismo Ocidental. A ideia principal da filosofia da natureza é a de que o céu e a natureza dependem da razão, e até mesmo Deus se rege por razões. Há um componente holístico em Tomás de Aquino que pode interessar à Educação Ambiental. Francis Bacon O projeto epistemológico de Bacon expressa o pensamento da modernidade e encarna o ideal de alcançar um conhecimento racional autônomo. 7 Educação Ambiental - Unidade 04 Bacon lança as bases do que viria a desenvolver-se no método experimental- matemático nas mãos de Galileu, Newton, entre outros. A natureza, enfim, pode ser dominada. René Descartes Descartes é considerado um dos responsáveis pela dominação da natureza pela ciência e técnica mecanicistas. É também lembrado pelo seu profundo antropocentrismo e pela famosa frase que diz que, com a aplicação de sua filosofia prática, nos tornaremos ‘senhores e possuidores da natureza’. A René Descartes pode-se imputar a perda de memória ocorrida na modernidade com seu projeto de um entendimento puro, livre das influências culturais. Mauro Grün (2007, p.34) afirma “que sem memória e historicidade não há conservação ambiental nem educação ambiental, pois os problemas ambientais estão sempre inscritos em uma perspectiva histórica que nos ultrapassa amplamente”. Espinosa Filósofo do séc. XVII que propagou o pensamento holista, o qual se mostra preocupado com a denúncia da servidão e a proposição de uma ética baseada na liberdade e na alegria, tomadas como potência do ser. Seu pensamento o aproxima dos problemas ecológicos contemporâneos, contribuindo para uma ética ambiental focada na libertação das tiranias entre os humanos e na relação entre humanos e natureza. Entende que o sujeito humano submete-se à servidão porque é triste, o que o deixa exposto à tirania do outro, em quem ele deposita a esperança de felicidade. Importante 8 Educação Ambiental - Unidade 04 Denuncia a utilização política das paixões tristes pelos tiranos, especialmente a esperança, a humilhação e o medo. Por analogia, seria como se denunciasse que o estado de servidão imposto à natureza pelos homens é o que está gerando a degradação de ambos. Esta situação decorre da condição de passividade e de submissão (reino das paixões tristes) vividas pelas pessoas, do qual elas precisam sair para promover a integração com o meio ambiente. Rousseau A natureza é um conceito filosófico fundamental no pensamento de Rousseau. Nele o filósofo questiona a relação entre ciência e virtude, opondo-se à ideia de progresso que domina seu século. Nesta perspectiva, o homem está ‘junto com’ e ‘na’ natureza e mantém para com ela um sentimento subjetivo, que lhe permite preservá-la, ao mesmo tempo em que faz um distanciamento para construir sua liberdade. Portanto, Rousseau oferece argumentos importantes para a Educação Ambiental e seu projeto de formação de um sujeito virtuoso que toma nos dias de hoje a forma de um sujeito ecológico. Kant Este filósofo escreveu três grandes críticas: a “Crítica da Razão Pura” (1781), a “Crítica da Razão Prática” (1788) e a “Crítica do Juízo” (1790). Esta última tem grandes implicações para a Ética Ambiental e a Educação Ambiental por apresentar duas espécies de juízos reflexivos: ৵ os juízos de gosto; ৵ os juízos teleológicos voltados, principalmente, para organismos biológicos. Esses juízos são importantes para a Educação Ambiental por focarem suas abordagens pelo sentimento de vida responsável pelas sensações de prazer ou desprazer. Esta perspectiva é fundamental para compreendermos como podemos chegar a uma apreciação estética da natureza, e é justamente através do juízo do 9 Educação Ambiental - Unidade 04 gosto que os seres humanos aprendem a “amar a natureza e a vida e, portanto, a cuidar dela”. Através do prazer estético o ser humano sente-se bem no mundo e isso faz com que ele cuide da natureza. Karl Marx Marx realiza em sua obra um profundo questionamento da relação capital- trabalho e do modo de produção capitalista. Utiliza, para tanto, uma concepção dialética das relações sociais e históricas, que expõem as contradições que movem novas reordenações da realidade, pensada como síntese complexa de múltiplas determinações. Para Marx, a natureza é unidade complexa e dinâmica, auto-organizada em seu próprio movimento contraditório. Nesta perspectiva, o ser humano é parte da relação “eu-mundo” constitutiva das dimensões materiais e simbólicas da vida em sociedade. Na perspectiva marxiana, mudar comportamentos, atitudes, aspectos culturais e formas de organização significa transformar o conjunto das relações sociais nas quais os seres humanos estão inseridos e as quais constituem e são constituídos, exigindo ação política coletiva, intervindo na esfera pública e conhecimento das dinâmicas social e ecológica. Martin Heidegger Heidegger apresenta uma dimensão do pensar que supera a racionalidade unidimensional, contribuição de grande importância para o pensamento ecológico e à Educação Ambiental. 10 Educação Ambiental - Unidade 04 As noções heideggerianas de habitar, em seu sentido ético, restituem o sentido originário do ethos grego como ambiência e modo como o ser humano realiza sua humanidade. Para o pensamento de Heidegger, todo morar autêntico está ligado a um preservar, sendo assim, preservar não é apenas não causar danos a alguma coisa. Importante O preservar genuíno tem uma dimensão positiva, ativa e acontece quando deixamos algo na paz de sua própria natureza, de sua força originária. Desta forma, salvar não significa unicamente resgatar uma coisa do perigo, mas é restituir ou dar condições para que ela se revele naquilo que lhe é mais próprio. O pensamento de Heidegger constitui uma das mais importantes referências para o pensamento ambiental de nosso tempo. Hannah Arendt O conceito fundamental no pensamento de Hannah Arendt é o de ação política como condição humana de existência e de convivência democrática. No que se refere ao conceito de natureza, faz o contraponto entre a natureza no sentido romano-cristão – cuja tradução latina, natura, está na origem etimológica e cultural do nosso conceito de natureza – e a noção grega de physis. A natura está submetida às leis que lhe impõem uma regularidade desde o exterior, ou seja, às “leis da natureza”. Entende-se, assim, que quem regula as leis da natureza é uma ordem divina, que está fora do mundo. O mundo natural é uma coordenação de organismos, impelidos e destinados, para um fim determinado, por um espírito inteligente que lhe é exterior, ou seja, o Deus Criador e Senhor da natureza. Arendt compreende os seres humanos como criados por Deus, passando a ser imortais, enquanto a natureza é mortal. Contrapõe-se, neste ponto, a lógica grega, 11 Educação Ambiental - Unidade 04 onde a physis era eterna e a vida do indivíduo humano era mortal. Gadamer O pensamento de Gadamer nos leva a compreender o papel que a ciência moderna exerce nos desdobramentos da crise ecológica e de que modo uma Educação Ambiental, ética e política, pode intervir nesse processo objetificador. Este filósofo defende a ideia de que ainda há tempo de uma convivência dos seres humanos com a natureza. Para tanto, é necessário respeitar a natureza como um “outro”, ou seja, em nossa relação com esse outro, devemos aprender a respeitar não só a reciprocidade, mas também a diferença. Gadamer chama a atenção para um aspecto primordial: […] nós não podemos simplesmente explorar nossos meios de poder e possibilidades efetivas,mas precisamos aprender a parar e respeitar o outro como outro, seja esse outro a Natureza ou as crescentes culturas dos povos e nações; e assim sermos capazes de aprender a experienciar o outro e os outros, como outros de nós mesmos, para participar um com o outro. (GADAMER, 2002, p.56) Vygotsky A questão posta por Vygotsky é: como os seres humanos, em sua curta tra jetória de vida, avançam e se distanciam tanto de suas características biológicas iniciais em tão diversas direções? Para ele, os seres humanos não se limitam à herança genética e libertam-se devido ao pensamento e à linguagem, diferente das demais espécies que se baseiam na percepção. Este pensador oferece uma diversidade de direções para educadores, pois seu pensamento funda as bases para uma teoria da aprendizagem, que compreende a psicologia humana mediada pela cultura. 12 Educação Ambiental - Unidade 04 No processo de aprendizagem, a linguagem e o simbolismo são usados como mediações no contato com o meio ambiente e, somente em seguida, aparecem em nosso contato interior, podendo esta ser a origem de um sujeito ecológico ou socioambiental. Importante Paulo Freire Freire desenvolveu os conceitos de diálogo e consciência, muito atuais para a Educação Ambiental, pois incorpora uma orientação que significa buscar, eticamente, práticas de convivência social em que as relações socioculturais e econômicas não se dão mais de forma hierarquizada, mas com o objetivo de possibilitar novas articulações entre sujeitos históricos contextualizados, na construção de projetos coletivos de reação à desigualdade e à exclusão social. Conceito Isto requer a construção de novos conhecimentos e formas críticas de intervenção na realidade. Nesta visão, uma ação dialógica implica na solidariedade entre pares que se reconhecem como humanos, com a capacidade potencial de serem sujeitos históricos e pronunciar o mundo. Para este pensador, o diálogo verdadeiro implica no pensar ético, a ação politicamente comprometida com o “outro”, em que não existe a dicotomia entre Homem e Mundo, mas a inquebrantável solidariedade que, criticamente, analisa e intervém, captando o dever da realidade e promovendo a superação do pensamento ingênuo. 13 Educação Ambiental - Unidade 04 3. Epistemologias da Educação Ambiental: holismo, interdisciplinaridade e hermenêutica O atual prestígio que o enfoque holístico desfruta em Educação Ambiental e ética ambiental tem contribuído para que tal postura seja aceita, sem maiores questionamentos, como uma solução para o trabalho em Educação Ambiental. O problema ecológico não é somente um problema técnico, mas também ético. O mecanicismo apresentado na filosofia de René Descartes (1596-1650) é um importante parâmetro para compreender como o antropocentrismo se firmou no mundo moderno, conduzindo a separação entre sujeito e objeto, e natureza e cultura, sendo apontado como um dos principais motivos da devastação ambiental. Importante A mente e a matéria são completamente distintas para Descartes. A mente que indaga é o local da verdade sobre o mundo natural. Paradoxalmente, a mente de Descartes era uma mente desprovida de corpo, que estava fora da natureza. Esta visão antropocêntrica influenciou fortemente a educação moderna. O ideal cartesiano postula que os seres humanos seriam os senhores e possuidores da natureza. Este processo é compreendido como a objetificação do mundo natural, ou seja, tornar a natureza um simples objeto à disposição da razão humana. Esta visão gera um problema epistemológico convergindo para a fragmentação do objeto que nos impede de ter uma visão complexa do meio ambiente em Educação Ambiental e ética ambiental. O antropocentrismo fica evidente na tentativa de Descartes de conferir autonomia à razão, que faz do mundo um objeto manejável. Assim, tanto a objetivação quanto a fragmentação da natureza são frutos de um mesmo processo. 14 Educação Ambiental - Unidade 04 Essa objetivação e a fragmentação resultam da busca da autonomia da razão, reafirmando o antropocentrismo e consagrando o domínio do ser humano sobre a natureza. Neste contexto, o enfoque holístico passa a ser compreendido como uma abordagem que pretende integrar o ser humano à natureza com o propósito de superar a crise ambiental. Assim, os seres humanos seriam parte da natureza. Um dos maiores problemas éticos e epistemológicos de algumas dessas posturas é que estaríamos de tal modo “integrados” à natureza, que não seria mais possível fazer nenhuma distinção entre natureza e cultura, criando alguns problemas quanto à conservação ambiental. Salienta-se, no entanto, que nem todas as substituições da visão cartesiana fragmentada, reducionista, mecanicista e antropocêntrica pelas posturas holísticas estão isentas de problemas éticos, políticos e epistemológicos. Entretanto, consideramos a filosofia hermenêutica como uma possibilidade para a superação dos impasses expostos. A hermenêutica parte do princípio no qual podemos compreender algo que desejamos ao compará-lo com algo que já conhecemos. Aquilo que compreendemos agrupa-se em unidades sistêmicas, estabelecendo uma relação indissociável entre as partes o todo e vice-versa. Por meio da hermenêutica podemos verificar quais das abordagens holísticas mantêm uma relação, entre o todo e as partes, que permita algumas distinções entre natureza e cultura e, portanto, propicie também a alteridade da natureza. 4. A Educação Ambiental e o lugar do educador ambiental A Educação Ambiental não é uma tarefa isenta de intencionalidade e propósitos. Na sua essência, não se trata de ensinar as pessoas como o mundo é cheio de conflitos, nem tão pouco ocultá-lo. Refere-se à totalidade de cada ser, de cada realidade e à rede de relações que une os seres entre si em conjuntos nos quais adquirem sentido. 15 Educação Ambiental - Unidade 04 O acúmulo de conflitos, valores e culturas que se cruzam na realidade atribui ao ambiental um valor superestimado de complexidade epistemológica e um status disciplinar de riqueza inigualável, pois nele se encontra uma diversidade de interesses contrapostos, de ideologias contrárias, de pressupostos filosóficos divergentes, de éticas díspares e de práticas cotidianas desiguais e variadas. Esta heterogeneidade não poderia ser entendida a partir da linearidade de um modelo de pensamento simplista estritamente lógico-positivista que ignore subjetividades, significados, intenções e interesses. Nesse sentido é preciso começar chamando as coisas por seus nomes e encerrar o debate sobre o que é e o que não é o meio ambiente ou formação ambiental, e sobre quais são ou deveriam ser os âmbitos de intervenção como setor profissional. Neste contexto, os educadores ambientais, preocupados com a intervenção profissional em qualquer setor, seja na formação, gestão, política, indústria, lazer, turismo, dentre outras, devem entender que um debate em profundidade acerca dos modelos de trabalho mais adequados para atuação no campo ambiental não se reduz a uma mera questão de crítica às tradições, metodologias e formas de atuação, diagnóstico, avaliação e análise de necessidades. No âmbito do debate contemporâneo sobre a Educação Ambiental e o papel do educador ambiental, temos que considerar a capacidade para explicitar, revisar e analisar o que pensamos, sobre quais são e o que escondem os diferentes motivos por trás de cada recurso natural, o que escondem os diferentes modos de entender cada política ambiental, como se gera o conhecimento e se estrutura a formação. Assim como as explicações dadas sobre os problemas ambientais e os condicionantes históricos, sociais e contextuais quehá por trás de cada forma de indagar, analisar e resolver cada questão ambiental. Importante 16 Educação Ambiental - Unidade 04 O educador ambiental tem a responsabilidade de desvendar o que está oculto na realidade, tornando-o visível diante dos interlocutores e dos destinatários das ações. As grandes transformações econômicas, políticas, culturais, sociais, educativas e tecnológicas e as crises de diferentes naturezas mudaram o cenário profissional, impondo um novo contexto de trabalho fundamentado em outro conceito do mesmo, em outras maneiras de organizá-lo e de entender o que afetam as relações profissionais, os setores ocupacionais e as qualificações, exigências e competências dos que devem realizá-lo. Surge assim uma nova ideia de profissionalidade ambiental, modificando e construindo novos perfis profissionais em sintonia com as mudanças e pressões impostas pela realidade. De acordo com Sato e Carvalho (2005), hoje são diversos os empregos e novas profissões derivados do meio ambiente. Vejamos então alguns dos setores que tiveram essas ofertas: ৵ As melhoras no âmbito da moradia; ৵ Os temas relacionados com segurança e risco; ৵ Transportes coletivos; ৵ A revalorização dos espaços públicos urbanos; ৵ Os comércios de bairro; ৵ O setor turístico; ৵ A valorização do patrimônio cultural; ৵ O desenvolvimento cultural local; ৵ A gestão do lixo; ৵ A gestão da água; ৵ A proteção e a sustentabilidade de zonas naturais; ৵ A aplicação de normas, o controle de contaminação e a instalação de tecnologias corretoras. 17 Educação Ambiental - Unidade 04 No âmbito destes setores, destacam-se aplicações específicas tais como: ৵ Avaliações de impacto; ৵ Gestão do lixo urbano; ৵ Gestão do lixo tóxico; ৵ Prevenção de catástrofes; ৵ Sistemas de qualidade ambiental; ৵ Avaliação de riscos e prevenção no trabalho; ৵ Saúde no trabalho e ergonomia; ৵ Implantação de agendas 21 e desenvolvimento local; ৵ Gestão ambiental municipal; ৵ Economia energética; ৵ Transporte, mobilidade e deslocamento; ৵ Consultoria ambiental; ৵ Normas ambientais; ৵ Marketing e publicidade; ৵ Educação ambiental. A incorporação dos desafios ambientais ao mundo das profissões já consolidadas, como o jornalismo, o turismo e a educação, além de outros, fica refletida nos saberes específicos das diferentes profissões contemporâneas. Paralelo a tudo isso, as exigências profissionais do trabalhador integrado ao mundo profissional de hoje mudaram quantitativamente e qualitativamente para se adaptarem às características do sistema econômico e socioprofissional atual. Esta situação afeta diretamente o meio ambiente e a institucionalização da profissional. Por fim, quando nos referimos à prática profissional no setor do meio ambiente, enfatizamos o papel do educador ambiental como profissional que atua no processo de intervenção socioambiental, empresarial, administrativo ou educativo, de suas tarefas, suas funções, suas atribuições e das exigências profissionais. 18 Educação Ambiental - Unidade 04 Finalizamos aqui as Notas de Aula da disciplina de Educação Ambiental. Esperamos que a disciplina tenha sido agradável e proveitosa. Acompanhe ainda as web-aulas da disciplina e lembre- se que você conta com o apoio do Ambiente Virtual de Aprendizagem para esclarecer suas dúvidas. Até a próxima! 19 Educação Ambiental - Unidade 04 Referências GADAMER, Hans-George. Hermenêutica da Obras de Arte. São Paulo: Martins Fontes, 2002. GRÜN, Mauro. Ética e educação ambiental: a conexão necessária. São Paulo: Papirus, 2007 GUTIÉRREZ, Francisco; PRADO, Cruz. Ecopedagogia e cidadania planetária. São Paulo: Cortez: Instituto Paulo Freire, 1999. MICHÈLE, Sato; CARVALHO, Isabel Cristina Moura (Orgs). Educação ambiental: pesquisa e desafios. Porto Alegre: Artmed, 2005. MOURA, Isabel Cristina de et al (Org). Pensar o ambiente: bases filosóficas para a Educação Ambiental. Disponível em: <http://unesdoc.unesco.org/ images/0015/001545/154579por.pdf>. Acesso em: 09 Jul 2012. MOURA, Isabel Cristina de et al (Org). Pensar o ambiente: bases filosóficas para a Educação Ambiental. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/ publicacao4.pdf>. PLATÃO. Crítias. (Tradução do grego, introdução e notas Rodolfo Lopes) Portugal: Universidade de Coimbra, 2010. 20 Educação Ambiental - Unidade 04 Créditos Núcleo de Educação a Distância O assunto estudado por você nessa disciplina foi planejado pelo professor conteudista, que é o responsável pela produção de conteúdo didático, e foi desenvolvido e implementado por uma equipe composta por profissionais de diversas áreas, com o objetivo de apoiar e facilitar o processo ensino- aprendizagem. Roteiro de Áudio e Vídeo José Glauber Peixoto Produção de Áudio e Vídeo José Moreira Sousa Identidade Visual / Arte Diego Silveira Maia C. da Silva Francisco Cristiano L. de Sousa Sérgio Oliveira Eugênio de Souza Viviane Cláudia Paiva Ramos Programação / Implementação Antônia Suyanne Lopes Alves Jairo Araújo dos Santos Coordenação do Núcleo de Educação a Distância Lana Paula Crivelaro Monteiro de Almeida Supervisão Administrativa Denise de Castro Gomes Produção de Conteúdo Didático João Batista Vianey Design Instrucional Andrea Chagas Alves de Almeida Projeto Instrucional Bárbara Mota Barros Régis da Silva Pereira Editoração Camila Duarte do Nascimento Moreira Revisão Gramatical Luís Carlos de Oliveira Sousa