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1 Unidade 2 – Texto Base - Datilologia 
 
 
 
Datilologia 
 
 
 
A datilologia significa em grego “falar com os dedos”. É uma forma de 
comunicação muito antiga. Por exemplo, quando assistimos a uma partida de 
futebol observamos alguns gestos do árbitro que indica falta, saída de campo etc. 
Esta comunicação que não é falada, nem escrita, é realizada pelo movimento dos 
braços e das mãos. Quando observamos um avião pousar em um porta-aviões, 
um marinheiro dá as instruções por um código visual realizado pelos braços, mãos 
e, às vezes, por um bastão nas mãos. Dois mergulhadores também têm sinais 
específicos para se comunicarem embaixo de água. Os sinais do árbitro, do 
marinheiro ou dos mergulhadores são sinais convencionados e todos os que 
fazem parte da mesma situação os entendem. 
 
No nosso cotidiano também falamos com os dedos. Quando alguém nos pergunta 
se estamos bem e levantamos o polegar, significa “sim, estamos bem”. Os dedos 
indicador e médio na forma de V faz com que todos entendamos como V da 
vitória, muito usado para expressar o desejo de diferentes torcidas ou mesmo de 
jogadores. Enfim, na nossa história, a datilologia está presente em várias 
situações. Mesmo sendo ouvintes, em algumas situações usamos os dedos para a 
comunicação. 
 
Em relação à comunicação dos surdos, uma questão que nos mobiliza é saber 
como os sinais foram criados e como chegaram até nós. 
 
 
 
 
Os monastérios 
 
Os monges que viviam nos monastérios faziam voto de silêncio e assim para se 
comunicarem foram desenvolvendo sinais específicos com as mãos. Havia nos 
monastérios pessoas que trabalhavam em várias atividades e durante o trabalho 
para que houvesse comunicação, com o voto de silêncio, muitos sinais manuais 
foram desenvolvidos e até trocados entre os próprios monastérios. Estes sinais 
também eram usados para as bênçãos aos enfermos e para as confissões. 
 
Os surdos, bem como os deficientes, considerados loucos, eram atendidos nos 
monastérios, alimentados e preparados para seguirem em frente. Os deficientes 
eram considerados pessoas que vieram ao mundo para expiarem os pecados e 
deveriam viver andando para um dia encontrarem a paz. Nos monastérios, os 
monges cuidavam dessas pessoas, dando banho, arrumando as roupas e cabelos 
e as alimentando. 
2 Unidade 2 – Texto Base - Datilologia 
 
 
 
Os bem-nascidos também usavam os monastérios para educarem os seus filhos. 
Foi assim que uma família da Espanha, os Velasco, que devido a casamento 
consanguíneo possuíam filhos surdos, os enviou para serem educados num 
monastério onde vivia Ponce de León que acabou transformando-se no “anjo da 
guarda” destas crianças. 
 
Pedro Ponce de León era um monge beneditino espanhol, viveu na metade do 
século XVI (1520 – 1584) e com o trabalho realizado com os Velasco passou a 
receber surdos de outras famílias e especializou-se na orientação de crianças 
surdas de filhos de aristocratas. Demonstrou que eles tinham condições de 
aprender e que, diferente da crença da época não possuíam lesões cerebrais que 
impediam a aprendizagem. Na época em que ele viveu, os surdos eram 
colocados à margem da sociedade e não podiam nem ser educados como 
cristãos. 
 
Ponce de León era professor no Monastério de San Salvador em Madrid e graças 
ao seu trabalho, a sua escola foi considerada a primeira escola de surdos. Ele 
conseguia ensinar os surdos apontando objetos, escrevendo rótulos e colando nos 
objetos o nome deles, por escrito, e depois repetindo oralmente as palavras 
correspondentes aos nomes. Alguns autores atribuem a ele um alfabeto de sinais 
com as mãos, bem simples, que ajudava a soletração das palavras. Apesar de ter 
conseguido bons resultados ele não deixou nenhum registro da forma como 
ensinava e não preparou outros professores para seguirem sua metodologia. Há 
registros que indicam que ele usou sinais, escrita e fala e levou seus três alunos 
surdos a falarem grego, latim e italiano e ao domínio dos conhecimentos da física 
e da astronomia da época. Alguns historiadores acreditam que ele usou como 
primeiros sinais os próprios sinais usados pelas crianças Velasco. 
 
Na mesma época, o franciscano Melchior de Yebra (1526 a 1586) também 
desenvolvia trabalho com sinais. É possível que, embora Ponce de León fosse da 
ordem beneditina e Yebra da ordem dos franciscanos, eles tenham se encontrado, 
pois ambos frequentavam a corte espanhola. A publicação de Yebra “Consolo de 
los Enfermos” apresenta 5 páginas de ilustrações de configurações de sinais 
manuais muito parecidas com as letras. Esta publicação foi realizada quando 
Ponce de León já havia morrido. 
 
Segundo os historiadores há uma ruptura entre o trabalho que vinha sendo 
desenvolvido por Ponce de León e o de Juan Pablo Bonet que publicou a obra 
Reducción de las Letras y Arte de Enseñar a Hablar a los Mudos, publicado em 
1620, no qual propôs um método de ensino oral aos surdos mediante o uso de 
sinais alfabéticos com apenas uma das mãos. Este sistema de sinais foi divulgado 
por toda a Europa, e acabou expandindo-se por todo o mundo. 
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Para Bonet, os surdos eram impedidos de manifestar sua alma racional, tornando- 
se inábeis para a comunicação, pois não conseguiam falar. 
 
Bonet era um mercenário que viveu de 1573 a 1633. Ele começou a trabalhar 
como secretário da família Velasco a partir de 1607, em particular de Juan 
Velasco, cujo pai era irmão dos alunos surdos atendidos por Ponce de León. 
Depois da morte de Juan Velasco, a viúva manteve Bonet como secretário de 
Bernardino, seu filho de 4 anos. Havia ainda outra criança, Luis com 3 anos, que 
era surda. Carrión, tutor especializado de um marquês que era surdo, foi 
contratado para a orientação de Luis. Carrión orientou a criança por 4 anos (1615 
a 1619) e depois foi substituído por Bonet. Embora ele não tenha tido sucesso 
como professor, ficou conhecido pela publicação da metodologia. Para alguns 
autores, ele deve ter acompanhado nos 4 anos de trabalho de Carrión no uso de 
sua metodologia com o menino e então a publicou. A metodologia publicada era 
diferente da de Ponce de León, pois diferentemente do que este enfatizava - que 
eram os sinais para primeiro atingir a escrita e ao final a fala - Bonet e Carrión 
desenvolveram uma pedagogia da fala para depois, somente ao final, chegar à 
escrita. 
 
O livro de Bonet serviu de base para o desenvolvimento do alfabeto de sinais pelo 
abade Charles Michel de l’Èpèe. Este abade envolveu-se com o trabalho de 
surdos atendendo a duas gêmeas surdas. Usava a linguagem dos olhos, 
apontando as figuras e escrevendo na lousa o nome dos objetos. Passou a usar 
também um alfabeto bimanual para expressar algumas palavras. Mas, percebeu 
que a falta de uma gramática o impedia de continuar o ensino. E foi observando as 
meninas que comunicavam-se entre si que inferiu que elas tinham uma gramática 
e começou a aprendê-la e a lançar mão dela para avançar o ensino. O sucesso do 
abade se espalhou e ele começou a receber mais alunos surdos para ensinar. 
 
L’Épèe teve contato com o alfabeto manual espanhol em 1764 ao conhecer a 
publicação de Bonet. Aprendeu espanhol para dominar melhor a metodologia do 
livro, abandonou o alfabeto bimanual e passou a usar o unimanual. 
 
O abade sistematizou os sinais, apropriando-se daqueles que os próprios surdos 
usavam e criou outros tantos. Divulgou seu trabalho junto a outros interessados, 
convidando-os a conhecer sua metodologia; suas idéias foram, então, 
disseminadas por outros centros e foi assim que os Estados Unidos e o Brasil 
herdaram o sistema francês de sinais em vez da metodologia oralista inglesa ou 
alemã. Uma das críticas feitas ao método é que ele era suficiente para ensinar no 
contexto rígido do ensino religioso,mas não atendia a espontaneidade da 
comunicação em situações do cotidiano. 
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Foi graças a L’Épèe que registrou e publicou textos com os sinais, metodologia e 
seus resultados que tivemos acesso às informações dos primórdios da educação 
dos surdos. 
 
 
 
 
Alfabetos bimanuais 
 
O alfabeto dos sinais tem duas formas: a unimanual e a bimanual. O alfabeto 
bimanual, envolvendo as duas mãos, é muito antigo e era usado no século VII 
pelos monges da Irlanda. A origem dele não é muito clara. Hoje, ele ainda é usado 
pelos surdos no Reino Unido, Austrália, África do Sul e Nova Zelândia. 
 
Têm-se notícias, por exemplo, de que em 1680, Dalgarno criou um alfabeto 
bimanual, mapeado nas mãos. Ele sugeria que os surdos calçassem uma luva em 
que estavam escritas letras que poderiam ser apontadas e, com isso, escrever 
mais rapidamente. As vogais ficavam na ponta dos dedos. Este método embora 
tenha despertado o interesse não permaneceu na educação dos surdos. Com a 
exceção naturalmente de alguns países onde ainda é usado como o Reino 
Unido e suas colônias. A figura apresentada a seguir ilustra um alfabeto bimanual. 
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Alfabeto Unimanual 
 
 
 
No alfabeto unimanual, a mão direita é quem faz a representação dos sinais do 
alfabeto. Este alfabeto, como vimos, tem sua origem na Espanha e é usado até 
hoje, na maioria dos países. A figura a seguir apresenta ilustrações do alfabeto 
unimanual. 
 
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No Brasil usamos este alfabeto até hoje e ele serve para identificar o nome das 
pessoas, datas e endereços. Todavia, ele pode ser feito com a mão direita ou 
esquerda. 
 
 
 
Referências 
 
REILY, Lucia. O papel da igreja nos primórdios da educação dos surdos. 
Revista Brasileira de Educação, Maio/Agosto de 2007, v.12, nº 35, páginas 308 a 
326. 
 
RAMOS, Clélia Regina. História da Datilologia. Disponível em 
www.editora-arara-azul.com.br Acesso em: out/07.

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