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Segurança de Grandes Eventos

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A segurança de grandes eventos é algo extremamente complexo e com 
incontáveis nuances. Uma coisa, porém, ninguém discute: sem um bom e
abrangente planejamento, jamais se conseguirão resultados ideais. O 
presente trabalho se concentra exatamente nesse aspecto.
n VINÍCIUS D. CAVALCANTE
Eventos internacionais de grande porte, com significativo afluxo de visitan-tes, acarretam também inúmeros benefícios urbanísticos, ambientais, tec-nológicos e sociais, proporcionando uma ótima veiculação da imagem do
país no exterior. Mas há preços a pagar, entre eles garantir que, do ponto de vista
da segurança, tudo transcorrerá sem maiores percalços.
O anúncio da realização de grandes eventos no Brasil gerou uma imediata
demanda por mais segurança. A vinculação da imagem do país — e em parti-
cular do Rio de Janeiro — à insegurança proporcionada pela violência do tráfico
de drogas, obrigou a um maior esforço do Estado para assegurar à opinião pú-
blica mundial sua capacidade de fazer com que tudo se desenvolva dentro da
normalidade.
A criminalidade violenta, inclusive associada ao tráfico de drogas, jamais
ameaçou eventos do calendário turístico, como o Carnaval. Entretanto, às auto-
ridades gestoras de eventos dessa monta não é facultado contar com a boa sorte
ou com uma pretensa compreensão de parte dos criminosos. Até agora, a pers-
pectiva dos riscos que pesavam sobre os eventos nacionais estava limitada às
ações da criminalidade local, e as providências não excediam as demandas de re-
forço de um policiamento ostensivo convencional.
Os Jogos Pan Americanos de 2007 acrescentaram às tradicionais ameaças a
componente de risco do terrorismo. Acontecimento desportivo internacional
completamente novo no Rio de Janeiro, o Pan trouxe à cidade grande quantidade
de atletas e visitantes, os quais tinham de ser convenientemente protegidos du-
rante sua estada. Para não arriscar a imagem da cidade e a credibilidade do país
para sediar tais eventos, era necessário que se implementassem os mais moder-
nos conceitos de planejamento e gestão de segurança.
Num evento assim, as responsabilidades de segurança são partilhadas entre
diversas instituições, segundo sua especialização ou obedecendo aos requisitos
da Lei. O Pan foi um marco na cooperação inter-agências e na adoção de pro-
cedimento centralizados de comando e controle. Pela primeira vez, instituições
como Ministério da Justiça, Forças Armadas, ABIN, Polícia Federal, Polícias
Civil e Militar, Guarda Municipal, Corpo de Bombeiros, Secretarias Estaduais e
Municipais de Defesa Civil interagiram com enorme antecedência na elabora-
ção de um planejamento abrangente e extremamente minucioso, cobrindo uma
grande gama de riscos e contemplando a atuação de todos os agentes envolvidos
na segurança dos jogos. Pela primeira vez no país, um evento desse porte con-
templou até a atuação de voluntários civis, responsáveis por uma variedade de ta-
refas de apoio e controle de acesso. Inseridos numa conceituação sistêmica de
segurança, eles se fizeram indispensáveis na recepção de visitantes, na detecção
de problemas e na comunicação de emergências.
A segurança do Pan transcorreu sem problemas, e o know-how auferido
46 SEGURANÇA & DEFESA
SSEEGGUURRAANNÇÇAA PPÚÚBBLLIICCAA
Planejamento de segurança 
de grandes eventos
Acima Prover segurança
para um grande evento é
tarefa complexa. Durante a
Copa do Mundo de 2010,
aeronaves Gripen da South
African Air Force faziam
parte do esquema de de-
fesa aérea (Foto: Saab).
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em sua execução capacitou o Brasil a almejar receber eventos ainda maiores. A
tarefa de sediar um evento esportivo de grande magnitude acarreta inúmeros de-
safios, que vão desde providenciar a adequada infra-estrutura de estádios, hote-
laria, suporte de rede para comunicação e transmissão de dados, além de
transporte público, até a implementação de medidas de segurança que assegu-
rem um transcurso tranquilo das atividades do evento e a integridade física dos
cidadãos locais e visitantes que a eles compareçam.
No campo da segurança, há que se efetuar preliminarmente um extensivo
levantamento dos riscos que envolvem o evento. Tudo deve ser pensado: Qual
a natureza do evento (desportivo, religioso, show,...), sua escala e duração? Vai se
processar em um único local ou em várias instalações diferentes? O que pode
acontecer de adverso? Planejadores verificam desde a possibilidade de catástro-
fes naturais até incidentes que envolvam a ação humana, como a atuação de cri-
minosos comuns, sabotagem e terrorismo. Cada possibilidade de ocorrência de
problema, ainda que simplesmente potencial, deve ser previamente detectada e
vai motivar a definição de medidas cautelares e reativas que serão inseridas no
planejamento.
Ressalte-se que, muitas vezes, a segurança não escolhe o cenário em que vai
atuar (em alguns casos até pode exercer um poder de veto, contudo isso nem
sempre é politicamente exequível), e na maioria das vezes se vê diante da neces-
sidade de satisfazer uma demanda de reforços de efetivos que atuem antes, du-
rante e depois do evento.
Uma grande preocupação dos planejadores em eventos que envolvam gran-
des multidões é definir que tipo de público comparecerá e antever o ânimo des-
sas pessoas. Qual a faixa etária do público? Haverá torcidas? Qual o perfil de
seus integrantes ou o histórico de atuação deles em eventos análogos? Serão pa-
cíficos e ordeiros, ou haverá uma grande concentração de hoolligans? A defini-
ção do tipo de público é essencial para o processo de análise de riscos,
determinando o tipo da segurança que se deverá adotar. Participantes de even-
tos desportivos podem ou não suscitar uma presença mais forte de efetivos po-
liciais de choque, especializados no controle de distúrbios civis. 
Um público pacífico e de forte religiosidade talvez não requeira uma segu-
rança forte e ostensiva. Contudo, se houver perspectiva de opositores radicais que
professem fé contrária, tal posição poderá ser totalmente revista. A Jornada Mun-
dial da Juventude, grande evento do catolicismo que terá lugar no Rio de Janeiro
entre 23 e 28 de julho de 2013, promete trazer para a cidade um público predo-
minantemente jovem, superior ao da Copa do Mundo e talvez até que o dos
próprios Jogos Olímpicos em 2016. São esperadas cerca de dois milhões de pes-
soas, além do próprio Papa Bento XVI, que celebrará uma missa campal. Em-
bora não tenhamos contundente histórico de intolerância religiosa no Brasil, a
preocupação com radicais religiosos não é algo que possa ser descartado, so-
bretudo considerando a perspectiva de um atentado perpetrado por um único
desequilibrado, como o ocorrido em Toulouse (França) em março de 2012,
quando o jovem muçulmano Mohamed Merah assassinou um rabino, três
crianças de uma escola judaica e três soldados desarmados.
Há que se pensar não só na proteção dos locais onde transcorrerão ativida-
des, mas também no reforço da segurança de pontos como aeroportos, estações
rodoviárias, portos, pontos turísticos que receberão uma maior quantidade de
visitantes e rede hoteleira. Deverá também haver maior policiamento ostensivo
à pé, motorizado ou montado, a fim de aumentar a sensação de segurança tanto
do público visitante quanto da própria população local. O trânsito também preo-
cupa muito, sobretudo considerando as características viárias do Rio de Janeiro.
Para os jogos Pan Americanos, corredores especiais de tráfego foram demarca-
dos a fim de permitir um deslocamento mais ágil das delegações de atletas, que
contavam também com motociclistas batedores. Nos Jogos Mundiais Militares,
o deslocamento dos atletas foi feito com escolta.
Dignitários
Altos dignitários, sob o sempre presente risco de atentados, vão requerer
círculos de segurança bastante cerrados, envolvendo agentes de segurança pes-
soal, batedores e efetivos de escoltapara os deslo-
camentos, segurança permanente em todos os lo-
cais onde que irão freqüentar, seguranças “velados”
no meio do público, efetivos uniformizados e os-
tensivamente armados, etc. 
Na conferência internacional Rio+20, a solu-
ção de estabelecer corredores para assegurar o rá-
pido deslocamento não foi repetida. Em vez disso,
as autoridades optaram pela decretação de feriado
durante três dias de semana (entre quarta e sexta-feira). A atitude, embora res-
tritiva ao lucro do comércio, se justificou ante a necessidade de garantir a segu-
rança de 93 Chefes de Estado e de Governo estrangeiros, bem como de 209
delegações, muitos dos quais de alto risco. Não devemos esquecer que, muitas
vezes, é mais fácil atingir tais alvos num terceiro país do que enquanto na prote-
ção de suas próprias fronteiras. Ainda em 22 maio de 2012, cerca de um mês
antes da Rio+20, uma bomba que deveria vitimar o ex-presidente colombiano
Álvaro Uribe foi desativada num teatro da capital argentina.
Uma das questões mais polêmicas de um grande evento como a Rio+20 é
a de como o país anfitrião garantirá a segurança do grande número de dignitá-
rios. São inúmeras personalidades, e cada uma traz consigo a perspectiva de ris-
cos que vão desde a eliminação física por antagonistas até a possibilidade de
males súbitos de saúde enquanto sob nossa proteção. Como experiências vivi-
das pelo próprio Papa e pelo Dalai-Lama muito bem demonstram, nenhuma ce-
lebridade consegue despertar e manter sentimentos favoráveis em 100% das
pessoas. Uma autoridade, qualquer que seja ela, por mais que angarie simpatias,
sempre atrairá para si uma razoável dose de antagonismo. O exercício das fun-
ções da autoridade sempre desagradará aos interesses de pessoas, grupos e até
mesmo de governos estrangeiros, que podem tramar e executar ações, contra as
quais a segurança de tais dignitários deverá estar preparada para se opor.
Em dezembro de 1993, um espectador de cerca de 50 anos, aparentemente
inocente, saiu do meio de um público amistoso e agrediu fisicamente o então pre-
sidente da Alemanha Ocidental, Richard Von Weizsaecker, com um violento
soco. O Primeiro Ministro da Suécia, que morreu numa via pública de Esto-
Acima Grandes ven-
tos, como a jornada
Internacional da Ju-
ventude (na foto, a
de Madrid em 2011),
requerem cuidados
especiais (Foto: Ana
Belart, WYD2011).
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colmo, em 1986, atingido por tiros à queima-roupa,
não via necessidade de usar seguranças. No mesmo
erro incorreu a Ministra de Relações Exteriores da-
quele país, Anna Lindh, assassinada a facadas numa
loja de departamentos, em 2003, quando já vinha sis-
tematicamente recebendo correspondências amea-
çadoras. Independentemente do forte esquema de
segurança que há muito protege os presidentes norte-
americanos, em 1981 um jovem desequilibrado
mental disparou seis tiros contra o presidente Ronald
Reagan, ferindo-o com gravidade. A ninguém é facultado descrer dos riscos,
muito menos aos seguranças!
Receber terceiros consiste numa enorme responsabilidade. O esquema de se-
gurança montado deve ser capaz de assegurar que o visitante (e seu staff) esteja
a salvo de toda sorte de ocorrências adversas que se possa antever. Em geral, o pla-
nejamento é dimensionado em função direta das pessoas e grupos antagônicos
que possam pretender desmoralizar, sequestrar, ferir ou matar aqueles que são
alvo da proteção. Em geral, esse tipo de segurança pessoal será condicionado
pela necessidade de sobrepujar seus opositores potencialmente mais poderosos;
e se qualificando obstinadamente para fazer frente ao mais perigoso, a tendên-
cia (embora não a regra) é que se consiga prevenir, dissuadir e atuar com su-
cesso, em face de ocorrências adversas de menor gravidade, risco e sofisticação.
Inteligência
Num grande evento, a segurança sempre estará vinculada ao suporte pres-
tado pelos organismos de inteligência, nas esferas civil, militar e policial. O risco
de ações de terrorismo, sobretudo advindas de grupos estrangeiros, suscita in-
tenso intercâmbio com serviços de inteligência estrangeiros, bem como com a
Interpol. Norteando todo o planejamento, há uma enorme quantidade de in-
formações obtidas de fontes sigilosas ou mesmo abertamente disponíveis, e que
são fruto de um processo preciso de análise especializada. Trazendo essas infor-
mações inestimáveis, a inteligência permite tentar antever os passos dos poten-
ciais adversários, avaliar os riscos de suas ações e melhor nortear o curso de ação
da segurança.
O inimigo terrorista pode estar em qualquer lugar. Em Oklahoma, os auto-
res do brutal atentado a bomba em 19 de abril de 1995, ao contrário do que se
pensava, não eram muçulmanos fundamentalistas, mas sim americanos; o as-
sassino do Ministro Rabin pertencia a um grupo de radicais israelenses. Esses e
outros casos, como o do norueguês desajustado, que perpetrou sozinho as vio-
lentíssimas ações que nos estarreceram em julho de 2011, nos lembram que não
se pode descartar a possibilidade de que grupos (ou indivíduos) nacionais tam-
bém estejam por trás de atos abomináveis.
Por mais que tal prática venha a encontrar opositores no âmbito da nossa so-
ciedade (potencialmente avessa a tudo que lhe pareça "policialesco" ou "anti-de-
mocrático"), todo grupo ou organização que possa vir a conspirar, bem como
executar ações de atentado ou sabotagem contra o evento a ser realizado, deve
ser objeto prioritário da investigação e vigilância constante dos órgãos de inteli-
gência. Esses procurarão munir os responsáveis pela segurança com todos os
indícios e informações disponíveis sobre possíveis ações adversas. E se a detec-
ção de complôs ou de grupos terroristas já é uma tarefa difícil, a tarefa pode se
complicar quando se está diante de um terrorista desconhecido, tipo “Lobo So-
litário”, que age sozinho e de forma indetectável, até desencadear seu ataque mo-
vido pelo ódio, vingança, ou por questões de fundo religioso que só ele conhece.
Quem quer que planeje a segurança de um grande evento deve estudar mi-
nuciosamente um grande histórico de ocorrências de atentados, aprender como
eles se processaram e sobre os meios que foram empregados. Com base em tais
informações é que será possível ensejar todos os esforços para impedir que essas
ações possam ser repetidas contra os eventos que estivermos promovendo no
Brasil. Planejadores escrupulosos sabem que não existe “segurança perfeita”, e
que mesmo serviços de segurança estrangeiros, altamente profissionais, já amar-
garam sérios reveses.
Num evento como a conferência Rio+20, o maior temor da segurança era
ver algum de seus protegidos assassinado, ferido ou desmoralizado por um aten-
tado bem executado. Por isso, não se deveria estranhar o excesso de rigor caute-
lar em tudo que envolveu a preservação da
integridade dos visitantes. Por mais que deva ser
evitada a ostentação de aparato bélico ou a des-
necessária perturbação na vida da população (re-
presentada pelo fechamento de ruas, mudanças
de mão de tráfego, cordões de isolamento e de-
cretação de feriado), num evento da magnitude
da Conferência Rio+20 eles fatalmente advirão.
Quer se queira, quer não, trata-se de algo bem di-
ferente de recepcionar uma única autoridade es-
trangeira de risco mais baixo, quando se pode
Acima Por exigência
da FIFA, os estádios
deverão empregar
profissionais da se-
gurança privada. Na
foto, um grupo de
Stewards recebe ins-
trução (Foto: S&A
Security Solutions).
Ao lado Para permitir a
detecção de armas, 
drogas e explosivos (na
foto, um IED acoplado a
uma lata de spray) em lo-
cais controlados, muito
rigor se deve imprimir às
inspeções de volumes nos
aparelhos de raios-X
(Foto: Scanna Msc Inc.).
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bem explorar o sigilo e a descrição da segurança comoum aliado mais vantajoso.
Embora para o cidadão comum seja difícil compreender as razões dos pro-
fissionais encarregados de prover a segurança daqueles visitantes importantes,
muito poucos dos nossos compatriotas imaginariam que, para assassinar o pre-
sidente checheno Ahmad Kadyrov, os separatistas plantaram uma bomba sob a
estrutura de concreto da tribuna presidencial de um estádio desportivo com mais
de um ano de antecedência! Na percepção do público leigo, a referência a esses e
outros exemplos absolutamente reais só teria paralelo nos livros de Tom Clancy.
Copa das Confederações e a Copa do Mundo
Eventos dos mais esperados pelo público, a Copa das Confederações, em
2013, e a Copa do Mundo, em 2014, proporcionarão ao Brasil a oportunidade
de melhorar sua infra-estrutura de estádios de futebol, com a construção de
novas instalações, e a reforma de outras mais antigas, tornando-as compatí-
veis com os modernos requisitos técnicos da FIFA. No Brasil, a estimativa é
de que 16 estádios serão construídos ou completamente
atualizados para que neles possam se processar os jogos da
principal competição, em 2014. Para que os jogos aconte-
çam será necessário que nos adequemos às exigências
quanto às instalações e equipamentos, e também no que se
refere à segurança dos locais e de todos que estarão envol-
vidos nessa competição.
Com larga experiência na segurança de competições fu-
tebolísticas, sobretudo por ter que lidar com torcedores que
se notabilizaram por provocar violentíssimos distúrbios civis
(hoolligans), as autoridades européias desenvolveram novos
conceito em gerenciamento de segurança em estádios de fu-
tebol, onde o Steward(Comissário), exerce uma função fun-
damental. O Steward é um
profissional de segurança pri-
vada, embora com atribuições
diversas dos nossos vigilantes
tradicionais. Atende as necessi-
dades do público sem deixar de
se inserir num contexto de pre-
venção, atento a tudo que possa
causar prejuízo aos espectado-
res, dano às instalações ou
ameaça à integridade física de
todos os presentes. O Steward atuará na supervisão dos acessos, impedindo a
entrada não autorizada no estádio e as fraudes, e conduzindo buscas pessoais, de
forma gentil e amigável, que permitam a detecção de objetos não autorizados no
interior do estádio (armas de fogo, lâminas de corte, fogos de artifício e outros
pirotécnicos, bastões, soqueiras etc.). Posicionados no interior do estádio, acom-
panharão toda a movimentação do público buscando qualquer indício de anor-
malidade, detectando-o, informando o problema aos superiores e reagindo —
segundo um planejamento previamente estabelecido — para enfrentar qual-
quer tipo de contingência no menor tempo possível. Sua atuação se resume ao
emprego da inteligência e da boa educação. Para os grandes eventos esportivos
de 2013 e 2014, a FIFA determinou que os estádios brasileiros adotem segurança
interna privada. Para os profissionais brasileiros, acostumados a uma maciça
presença policial como garantia de segurança em todos os eventos que os está-
dios de futebol costumam sediar (como jogos e shows), o novo padrão de segu-
rança pressupõe uma completa mudança de paradigmas.
Ao lado A possibilidade
de emprego de aerona-
ves para ações terro-
ristas não pode ser
descartada. Canhão do
3ºGAAAe posicionado
no Autódromo do Rio
de Janeiro durante a
Rio+20 (Foto: Cap
Jantsch, 3º GAAAe).
Ao lado Para pode-
rem atuar eficaz-
mente como first
responders, profis-
sionais como esses
soldados da Polícia
Militar do Estado de
São Paulo precisam
receber treinamento
específico sobre uma
série de situações
(Foto: Milton Michida,
Gov. Est. SP).
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Treinamento
Quando pensamos nos grandes eventos que pro-
ximamente acontecerão no Brasil, não podemos dei-
xar de pensar nos homens e mulheres, tanto do setor
público quanto da esfera privada, em cujas mãos a se-
gurança desses eventos estará. Na preparação para os
eventos, muito se está gastando na aquisição de equi-
pamentos, na adoção de novas tecnologias de co-
mando, controle, comunicações e inteligência, no gerenciamento de informações
e na aquisição de armamento. Contudo, o treinamento dos profissionais que
serão empregados nas missões continua sendo um grande “calcanhar de Aqui-
les” no âmbito da segurança que se espera proporcionar.
Não se trata de treinar os comandantes, os técnicos, ou mesmo os operado-
res dos dispendiosos equipamentos, mas de capacitar aqueles que vão receber as
ordens e atuar diuturna e ostensivamente no policiamento, no trânsito e na se-
gurança de instalações. A maioria dos problemas, das ameaças e ocorrências cri-
minosas ou de terrorismo, é inicialmente enfrentada pelo profissional comum
— o guarda de trânsito, o policial que ronda o quarteirão, o guarda municipal,
os policiais em ronda na viatura comum ou o vigilante privado. São estes pro-
fissionais que normalmente tomam pé do que está acontecendo e que ensejam
as primeiras providências (ou “respostas”) que o fato requer: eles são os first res-
ponders.
Como pudemos acompanhar no combate aos terroristas em Mumbai, no
final de novembro de 2008, na maioria das vezes os first responders são heróis
anônimos, pessoas comuns, que não são tratadas de forma glamourosa e cuja
atuação, individual ou em pequenos grupos, quase nunca figura nos livros de his-
tória ou nos filmes de ação. Entretanto, suas ações podem bem significar a dife-
rença entre vitória e derrota, ou sucesso e fracasso. Em boa parte dos incidentes
criminosos ou de terrorismo, se os procedimentos de resposta forem adotados
de forma correta, há sempre a possibilidade de que se consiga neutralizar a
ameaça ou minimizar seus danos de forma mais rápida e muitíssimo menos dis-
pendiosa. 
Ainda que desempenhando uma importante tarefa, no Brasil tais first res-
ponders são os profissionais desprestigiados, a quem falta bom , e que na maio-
ria das vezes agem por instinto e improvisadamente. Via de regra, não têm a
consciência da importância de sua missão e daquilo que devem fazer em face de
cada tipo de ocorrência nas quais podem precisar atuar. Como agir diante de
uma ocorrência de roubo em que os criminosos, premidos pela necessidade de
garantir sua fuga, façam reféns? O que fazer sozinho, no caso de presenciar a
ação de um grupo de criminosos fortemente armados? Quando se deve atirar?
Como se deve atirar? O que fazer em face de um objeto que se suspeite tratar-se
de uma bomba? Como fazer para tentar detectar intenções suspeitas antes do cri-
minoso ou terrorista perpetrar seu intento?
Embora em qualquer planejamento de segurança seja importantíssimo que
cada homem conheça muito bem o papel que lhe cabe desempenhar, nós sabe-
mos o quanto algumas viciosas práticas brasileiras contrariam a boa norma. Nós,
brasileiros, nos habituamos a acreditar que o pior nunca irá nos acometer, e que
mesmo em face dos problemas mais “cabeludos”, sempre poderemos resolver
tudo com um bom “jeitinho”. O autor já perdeu a conta das vezes em que ouviu
de profissionais experientes coisas como: “não esquenta, pois na hora a gente vê
como é que faz”!
Ensinar técnicas de contra-vigilância e análise da linguagem corporal aos
policiais, guardas municipais e vigilantes pode lhes permitir detectar uma situa-
ção potencial de perigo muito antes dela se materializar, e a segurança só tende
a lucrar com isso. Identificando um terrorista ou criminoso antes dele agir, o
profissional terá um melhor controle situacional da ocorrência e, após reportar
o que viu, pode escolher qual o curso de ação será mais adequado. Devemos dar
aos nossos profissionais a opção de se deverão apenas observar o que lhes pare-
cer suspeito, partir para uma abordagem ou mesmo, em caso extremo, disparar
sua arma com maiores chances de sucesso do que se a surpresa estivesse favore-
cendo ao outro lado.Profissionais melhor treinados podem até não resolver as todas as emer-
gências que surgirão, mas por certo estarão em condições de melhor auxiliar as
Unidades Especiais a fazê-lo. Aos avaliarmos uma segurança, costumamos dizer
que “a força da corrente de proteção se afere pela capacidade do seu elo mais
fraco”. Logo, eles podem não “ganhar a guerra”, mas, quando deixam de fazer
aquela que seria a sua parte, podem estar irremediavelmente comprometendo
o sucesso do trabalho dos grupos de operações especiais e contra-terror como
BOPE, COT, GATE, GOE e CORE. Uma melhoria no treinamento dos qua-
dros mais básicos da segurança pública e privada, de forma a melhor capacitá-
los como first responders, é algo que dificilmente redundará em publicidade fácil,
mas pode fazer a diferença diante das ocorrências que podem advir nesses dias
de visita do Papa, Copa do Mundo e Olimpíadas. 
Considerações finais
Os profissionais de segurança envolvidos na preparação de um grande
evento não podem se permitir confundir boa sorte com boas táticas. Em se tra-
tando da segurança de um grande evento, o fato de nenhuma adversidade ter
ocorrido deverá estar associado ao bom planejamento da segurança, à sua exe-
cução disciplinada e escrupulosa, à colaboração da autoridade, ao emprego de ar-
mamento, equipamentos e recursos adequados e à excelência do treinamento
dos agentes e não apenas ao fato de que atentados espetaculares não são coisas
que costumam acontecer todo o dia, principalmente no Brasil. Os planejadores
da segurança de um grande evento não podem se fiar no dito de que somos um
país pacífico, sem inimigos, que o nosso povo é ordeiro, tranqüilo e de boa ín-
dole; portanto eles não devem se preocupar com as regras, mas sim buscar acau-
telar-se contra as mais graves, violentas e às vezes imponderáveis exceções!
Poderíamos listar uma extensa relação de personalidades assassinadas, feri-
das ou sequestradas, cidadãos vitimados por tiros, explosões de bombas ou agen-
tes químicos tóxicos, mas, na verdade, é impossível apresentar estatísticas de
ações adversas que foram desencorajadas pela existência de bons "esquemas de
segurança". Na verdade, a atividade de segurança só vem a merecer comentários
quando se vê sobrepujada pela ação inventiva e ousada dos criminosos, loucos
ou terroristas. Nesses infortúnios, não falta quem critique, com alegações do tipo
"eu avisei" ou ainda "estava na cara que poderia acontecer"... 
Como é próprio de qualquer atividade dessa envergadura, com o envolvi-
mento de tantos profissionais de segurança das mais diversas origens e com o em-
prego de tantos recursos logísticos, por certo ocorrerão erros, sobretudo na
execução. Contudo, ao final de quaisquer dos eventos, o que importa é tudo haja
transcorrido dentro de um contexto de normalidade e que todos aqueles que
deles participaram possam retornar aos seus lares em segurança, levando uma
visão positiva do Rio de Janeiro e do Brasil e nos proporcionando o reconheci-
mento internacional pela realização de alguns dos mais seguros e notáveis even-
tos da nossa História recente. n
Acima Para que a
segurança de 
grandes eventos seja
eficaz, é necessário
um cuidadoso 
planejamento (Foto:
Daniel Guimarães,
Gov. Est. SP).
Segurança Eventos.QXD 20/08/12 18:47 Page 50

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