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See discussions, stats, and author profiles for this publication at: https://www.researchgate.net/publication/287205479 Do Imperialismo à Primeira Guerra Mundial Article · December 2015 CITATIONS 0 READS 1,499 1 author: Some of the authors of this publication are also working on these related projects: econmi mundial View project Osvaldo Coggiola University of São Paulo 49 PUBLICATIONS 10 CITATIONS SEE PROFILE All content following this page was uploaded by Osvaldo Coggiola on 17 December 2015. The user has requested enhancement of the downloaded file. 1 DDEEPPRREESSSSÃÃOO EECCOONNÔÔMMIICCAA,, IIMMPPEERRIIAALLIISSMMOO CCAAPPIITTAALLIISSTTAA EE GGUUEERRRRAA MMUUNNDDIIAALL ((11887700--11991188)) Osvaldo Coggiola "O mundo está quase todo parcelado, e o que dele resta está sendo dividido, conquistado, colonizado. Penso nas estrelas que vemos à noite, esses vastos mundos que jamais poderemos atingir. Eu anexaria os planetas se pudesse, penso sempre nisso. Entristece-me vê-los tão claramente e ao mesmo tempo tão distantes" Cecil Rhodes, imperialista inglês “O crescimento das grandes companhias é meramente a sobrevivência do mais apto“ John Davison Rockefeller, capitalista monopolista norte-americano 2 A primeira expansão colonial se produziu na época moderna, entre o Renascimento e a Revolução Francesa, para configurar o antigo sistema colonial da era mercantilista, com um sistema especifico de relações da expansão colonizadora européia. A vitória do capitalismo industrial, primeiro na Inglaterra e depois em outras metrópoles européias, abalou e questionou esse sistema, em nome do livre-câmbio, sem chegar a destruí-lo; substituindo-o por outro, mais adequado e específico da colonização capitalista, que não pode ser visto como uma simples continuidade da europeização e “ocidentalização” do mundo iniciada no século XVI. Da Mercadoria à Canhoneira A primeira metade do século XIX foi caracterizada pelo capitalismo liberal e pelo Iaissez-faire (liberdade de comércio). A Inglaterra, pioneira no processo de industrialização, defendia a liberdade de vender seus produtos em qualquer país, sem barreiras alfandegárias, bem como o (seu) livre acesso ás fontes de matérias primas. A partir de meados do século, o desenvolvimento tecnológico levou ao surgimento de novos métodos de obtenção do aço, além de novas fontes de energia, como o gás e a eletricidade - que substituíram gradativamente o vapor - e do aperfeiçoamento dos meios de transporte. Desenvolveram-se as siderúrgicas, a metalurgia, a indústria petrolífera, o setor ferroviário e de comunicação. O aumento da mecanização e da divisão do trabalho nas fábricas permitiu a produção em massa, que reduzia os custos por unidade e incentivava o consumo. Os países industrializados alargavam o mercado interno e conquistavam novos mercados externos. A riqueza acumulava-se nas mãos da burguesia industrial, comercial e financeira desses países. Os trabalhadores continuavam submetidos a baixos salários.1 Os avanços técnico- científicos exigiam a aplicação de capitais em larga escala, produzindo fortes modificações na organização e na administração das empresas. As pequenas e médias firmas de tipo individual e familiar cederam lugar aos grandes complexos industriais. Multiplicaram-se as empresas de capital aberto, "sociedades anônimas" de capital dividido entre milhares de acionistas, o que permitia associações e fusões entre empresas. Nos bancos, o processo era semelhante: um pequeno número deles foi substituindo o antes grande número de pequenas casas bancárias. Paralelamente a isso, ocorria também uma aproximação das indústrias com os bancos, pela necessidade de créditos para investimentos e pela transformação das empresas em sociedades anônimas, cujas ações eram negociadas pelos bancos. O capital industrial, associado ao capital bancário, transformou-se em capital financeiro, controlado por poucas grandes organizações. A expansão do sistema capitalista, no entanto, também conviveu com crises econômicas que ocorreram com certa regularidade no século XIX, vistas como “naturais” pelos economistas liberais. Elas seguiam um padrão ou “ciclo”: uma fase de alta de preços, salários, taxas de juros e lucros, era seguida da falência de uma ou de várias empresas e bancos incapazes de saldar seus compromissos. A falência afetava a confiança do público e dos acionistas de outras empresas e bancos, reduzindo o consumo e o investimento. As indústrias diminuíam o ritmo da produção, caíam o emprego e o poder de compra da população, acarretando novas baixas de preços, lucros e mais falências. Quando os estoques de produtos esgotavam-se, a produção retomava lentamente o crescimento, com um menor número de empresas e maior concentração do capital, restabelecendo o “equilíbrio” do sistema. A chamada “era vitoriana”, começada por volta de 1850, testemunhou a unificação econômica (e logística, através de um sistema de transportes) do mundo. Ela foi acompanhada por um movimento de colonização, que se veria acentuado no último quartel do século XIX: a idéia de resgatar para a "luz da civilização" os povos atrasados tinha, como pano de fundo, ambições econômicas. Por volta de 1875, os outros continentes eram bem mais conhecidos do que três décadas antes, devido à interligação proporcionada pelas novas vias de comunicação, que permitiam maior velocidade e regularidade de deslocação de pessoas e mercadorias. Os caminhos de ferro, a navegação a vapor e o telégrafo possibilitaram esse processo. Na periferia o comboio tornou-se o complemento ideal da marinha mercante. Estabeleceu com rapidez a ligação entre as áreas produtoras de produtos primários (por exemplo, carne do Uruguai e lã da Austrália) com os portos marítimos, nos quais as poderosas marinhas européias embarcavam esses produtos em troca de manufatoras industriais. O aumento das ferrovias e o desenvolvimento da navegação constituíram os instrumentos europeus na formação do comércio marítimo internacional. 1 Entre 1850 e 1875 os salários reais subiram apenas para aqueles operários, mais qualificados, cuja renda em dinheiro se elevava mais depressa do que os preços. Só os trabalhadores com recursos podiam - individualmente, ou através de cooperativas - ter acesso aos artigos de consumo de boa qualidade, nos níveis de preço da classe média. Para o resto, os trapos e artigos de baixa qualidade bastavam; os alimentos baratos importados só começaram a chegar por volta de 1870, e a produção de artigos de consumo para o mercado barato de massa só começou na virada do século. 3 O telégrafo também se apresentou como uma revolução nas comunicações, permitindo um fluxo de informações eficiente entre as metrópoles e as colônias, auxiliando na vigia e na administração destes postos comerciais. Esta apertada rede de comunicações introduziu relações diretas entre o mundo europeu e zonas remotas, tornando a interdependência da economia mundial um marco histórico. Assistiu-se à criação de um novo mundo econômico, constituído por um único complexo de interligações. Esta unidade econômica teve como conseqüência a rivalidade entre os Estados europeus. As movimentações isoladas de cada nação afetavam, direta ou indiretamente, outros países, e nasciam conflitos de interesses entre as grandes potências. O sistema mundial do capitalismo baseou-se na rivalidade entre países. Esta concorrência econômica (acentuada na Grande Depressão) constituir-se-ia como antecedente para o novo imperialismo. A existência de uma «ordem mundial», que subordinava as situações nacionais, derivava-se diretamente do papel do mercado mundial na dinâmica do capitalismo: se o mercado mundial não se limitava à soma das economias nacionais, a «ordemmundial» não consistia só nos acordos entre os diversos Estados nacionais. O “novo imperialismo de investimento” seria, de fato, novo, mas também continuidade de um processo precedente. Na primeira onda colonizadora, à época da Revolução Comercial, os europeus concentraram-se sobre o continente americano. Já o imperialismo do século XIX concentrou-se na Ásia e na África. Esse “novo imperialismo”, que não mais buscava enriquecer principalmente o Estado e seus exércitos pela acumulação de ouro e prata, beneficiava mais diretamente a alta burguesia metropolitana, a partir do monopólio desses novos mercados, para onde seria destinado o excedente de capital metropolitano. Outros tipos de matérias primas eram priorizados na exploração colonial: ferro, cobre, petróleo e manganês, que eram os produtos requisitados para a nova indústria. A Ásia, em pouco tempo, transformou-se em simples abastecedor de produtos primários para a Europa. Teve assim sua indústria artesanal destruída. A Índia, depois de séculos de dominação, havia se transformado num protetorado inglês. Em 1857, no entanto, ocorreu a “Revolta dos Cipaios”, primeiro movimento nacionalista indiano, que estremeceria o poderio britânico na região, sendo derrotada, dois anos depois. A China foi pouco a pouco, desde o século XVII "domesticada" ao comércio com os europeus, não sem dificuldades.2 Conseguiu, diferentemente da Índia, sempre manter-se como unidade política. No século XIX, no entanto, o poder central praticamente já não detinha autoridade sobre seu território. Dessa forma, o comércio entre Europa e China foi tornando-se cada vez mais desigual, principalmente com a venda do ópio, droga ilegal na Grã-Bretanha, mas vendida largamente para os chineses. Os ingleses fomentaram o contrabando do ópio para a China. Uma vez criado o "mercado de consumo", reclamaram o direito de vendê-lo livremente em todo o território chinês (o governo chinês tinha proibido seu consumo). Frente à negativa, a invasão, as Guerras do Ópio (1840-1860), onde a Inglaterra exerceu cruelmente sua superioridade militar, assassinando milhares de chineses, saqueando suas cidades e suas riquezas, humilhando a nação chinesa (o palácio de Verão de Pequim, símbolo do império e da própria China, foi saqueado e incendiado; as coleções de arte roubadas pelos ingleses na época enfeitam, até hoje, o Museu Britânico) e, sobretudo, impondo tratados vantajosos para a Inglaterra após cada vitória. As guerras forçaram a China a permitir a importação de ópio e outros produtos. A Inglaterra obteve grandes concessões territoriais, com direito de "extraterritorialidade": as concessões (Hong Kong, Kowloon, Birmânia, Nepal) situavam-se, assim como os próprios ingleses residentes na China, fora do alcance das leis chinesas. Depois da Inglaterra, ao perceberem a fragilidade militar da China (agravada pela crise da dinastia Manchu), vieram a França, a Alemanha, os Estados Unidos e até uma nova potência asiática, o Japão. Através de guerras e 2 As primeiras tentativas de penetração econômica do ocidente na China datam dos séculos XV-XVI. Na época tratava-se de obter o intercâmbio de embaixadores com o império e a permissão de exercer o comércio. Não raro os imperadores chineses negavam-se a manter relações diplomáticas com os europeus, aos quais desprezavam por suas bárbaras atividades de pirataria na Índia e no Ceilão. O comércio foi autorizado, embora com muitas restrições e sob a permanente supervisão do Império. A China fez, sem se importar muito, algumas concessões territoriais em pontos inabitados, como Macau, que foi entregue aos portugueses. Até então, o país não corria o risco de colonização pelas potências marítimas da Europa. Segundo o historiador indiano K. M. Panikkar: "Os portugueses, até 1849, pagaram regularmente um foro sobre a terra e os chineses mantiveram em Macau tanto o controle das finanças quanto o da justiça civil ou criminal. Os portugueses encontravam-se em Macau em atitude de súplica. E a quem suplicavam? Nem mesmo à corte de Pequim, mas a um subcomissário qualquer de Cantão". Os europeus, claro, queriam muito mais: o comércio livre. Mas o imperador chinês dava-se ao luxo de responder ao rei da Inglaterra que os seus produtos não interessavam aos chineses. 4 "concessões", estes países foram obtendo o controle dos pontos estratégicos da China: à medida que o litoral chinês e os portos dos seus rios iam caindo sob o domínio estrangeiro, a China passou a ser uma semi-colônia, não de uma única nação, mas de todas as grandes potências industriais e navais. A imensidão do seu território impediu que fosse transformada em colônia – idéia que provavelmente passou pela cabeça dos colonizadores. As revoltas contra os novos dominadores estrangeiros foram freqüentes. As potências compreenderam que, embora fosse fácil vencer a China, era impossível conquistá-la completamente. Concessões territoriais, pagamento de pesadas indenizações, saques, formação de uma classe social comerciante nativa associada à exploração estrangeira (“burguesia compradora”): eis os principais resultados da forçada penetração européia. Mas o objetivo principal não foi atingido: o "negócio da China" não funcionou, porque os chineses recusaram o consumo dos produtos europeus. No fim do século XIX, as potências européias, os EUA e o Japão dividiam o imenso território chinês em diversas esferas de influência. O levante dos chineses em 1902 - a “Guerra dos Boxers” - foi derrotado, e a China foi obrigada a fazer novas concessões econômicas aos estrangeiros. Já a ocupação territorial do Próximo e Médio Oriente pelas “potências” esteve precedida por uma penetração econômica que levou a dissolução das estruturas sociais atrasadas do Império Otomano. Em 1849, o Egito (parte do Império Otomano) já dependia da Grã Bretanha em 41% de suas importações e de 49% de suas exportações. A dominação financeira se materializava no endividamento crescente, a tal ponto que a dívida otomana se elevava em fins do século XIX a 200 milhões de libras esterlinas. A princípios do século XX se constituiu o “Conselho de Administração da Dívida Pública Otomana”, dominado pelos credores europeus, que com seus 9 mil empregados (em 1912) se arrogou praticamente o arrendamento dos ingressos fiscais do Império Turco. O Império Otomano era, como disse o czar da Rússia, “o enfermo da Europa” e as “potências” tentavam repartir seus despojos. Porém, contra os apetites da França e Rússia, a Grã Bretanha se opôs ao desmembramento, considerando que um Império Otomano, ainda que débil, supunha a melhor garantia para preservar a “ordem” (já que a “dificuldade está em saber o que há para colocar em seu lugar”, declarava Lord Stanley) e proteger a rota das Índias do apetite dos rivais. A política britânica buscava manter o statu quo ante no Próximo Oriente e impedir que outras potências ali interviessem ali. Em 1839, Grã Bretanha ocupou Aden para proteger a rota das Índias, lançou seus navios contra os piratas do Golfo Pérsico para proteger a navegação comercial, e chegou de fato a exercer um domínio sobre os diferentes governadores do Golfo. Entretanto, a França desembarcou na Síria em 1860 para “proteger” a comunidade cristã de “conflitos religiosos” com os drusos (conflitos que o exército otomano já tinha debelado), na verdade provocados pelas potências européias (erigindo-se os franceses como defensores dos cristãos maronitas, os ingleses dos drusos, os russos dos ortodoxos...). O poder de Constantinopla teve que aceitar a criação de uma província autônoma na região do monte Líbano – dentro do Império Otomano – dirigida por um governo cristão. Na questão das colônias e das populações não européias, foi controvertida a posição adotada por Marx e Engels. Ao mesmo tempo em que denunciavam as mazelas provocadas pela açãocolonizadora dos ingleses na Índia e na China, enfatizavam o efeito progressista que a introdução das relações capitalistas poderia provocar sobre aquelas formações sociais.3 Desenvolvimento Desigual e Mercado Mundial Essa análise foi por vezes lida como demonstração do eurocentrismo, e até do «racismo» subjacente à consciência dos dois teóricos alemães. Marx identificou na constituição do mercado mundial e no advento da grande indústria, o marco fundamental do ingresso da humanidade na época da história mundial (Weltgeschichte). Atribuindo um papel central ao desenvolvimento do sistema de trocas e à grande produção industrial para a consecução deste avanço, ele via no aparecimento de um mercado mundial (Weltmarkt) o seu principal pressuposto. Afirmava também que tais sucessos constituíam a grande tarefa histórica realizada pela burguesia. O desenvolvimento desigual do capitalismo determinou a forma histórica concreta que assumiu a unificação econômica mundial. O imperialismo não seria uma etapa passageira de uma “economia-mundo” pré-existente, independentemente do regime social imperante, mas a forma histórica necessária que a unidade econômica do 3 Embora poucos europeus tivessem a coragem de dizer na cara dos seus compatriotas o que as revoltas chinesas significavam, ainda que nelas fossem mortas pessoas inocentes, como o fez Friedrich Engels em 1857: "Em suma, em vez de alardear a crueldade dos chineses (como costuma fazer a cavalheiresca imprensa britânica), melhor faríamos se reconhecêssemos que se trata de uma guerra popular pela sobrevivência da nação chinesa - com todos os seus arrogantes preconceitos, sua estupidez, sua ignorância douta, sua pedante barbárie, mas sempre uma guerra popular". 5 mundo capitalista poderia ter sobre a base do seu desenvolvimento desigual. "No mercado mundial a produção é posta como totalidade, assim como cada um de seus momentos, no qual ao mesmo tempo todas as suas contradições se põem em movimento": assim Marx iniciava uma observação sintética, sobre o papel histórico da unificação do mercado mundial, que abrira, no século XVI, a história moderna do capital. O uso do termo “imperialismo” tornou-se corrente no ultimo quartel do século XIX, para descrever tanto o processo quanto a conclusão da partilha do “mundo colonial” pelas potencias européias. Baseava-se numa analogia formal com os impérios precedentes da história da Europa. O imperialismo capitalista, porém, possuía outra significação histórica. A totalidade do mercado mundial concretiza as leis de movimento do capital, na sua máxima escala e em sua forma última. O mercado mundial dos capitais é uma realidade ao menos desde finais do século XIX, depois da depressão iniciada em 1873. A inovação consiste na modalidade de seu funcionamento: a maior incidência dos investimentos diretos externos, por parte de um capital mais móvel no mercado mundial, que determina a sua estruturação caracterizada por um completo processo de centralização estratégica, articulada e desarticulada em uma concatenação de unidades operativas descentralizadas em todo o planeta. O modo de existência do capital se torna adequado ao seu conceito no mercado mundial. No comércio mundial as mercadorias desfraldam universalmente seu valor, e sua forma autônoma de valor se apresenta diante delas como moeda mundial. O dinheiro funciona plenamente como mercadoria cuja forma natural é simultaneamente forma social de realização do trabalho humano abstrato. O comércio internacional, o desdobramento do mercado em mercado mundial, provoca o desenvolvimento do dinheiro em dinheiro mundial e do trabalho abstrato em trabalho social: o trabalho concreto se transforma em uma totalidade de diversos modos de trabalho, que compreendem o mercado mundial. As diferenças nacionais no interior do sistema capitalista mundial exprimem o “desenvolvimento desigual e combinado” desse modo de produção. Países inteiros foram forçados a se integrar ao capitalismo de maneira dependente e associada. Outros se impuseram como dominantes e expropriadores de nações. Uns existiam em função dos outros. O imperialismo seria a mais completa ilustração dessa lei. Segundo George Novack: “O capitalismo surgiu com muito mais força na Europa e nos Estados Unidos do que na Ásia e na África. Estes foram fenômenos interdependentes, lados opostos de um mesmo processo. O baixo desenvolvimento capitalista nas colônias foi um produto e uma condição do super-desenvolvimento das áreas metropolitanas, que se realizou às expensas das primeiras. A participação de várias nações no desenvolvimento capitalista não foi menos irregular. Holanda e Inglaterra tomaram a dianteira no estabelecimento de formas e forças capitalistas no século XVI e XVII, enquanto a América do Norte estava ainda em grande medida em posse dos indígenas. Entretanto, na fase final do capitalismo, no século XX, os Estados Unidos superaram amplamente a Inglaterra e a Holanda. À medida em que o capitalismo ia envolvendo em sua órbita um país atrás do outro, aumentavam as diferenças mútuas. Esta crescente interdependência não significa que sigam idênticas pautas ou possuam as mesmas características. Quanto mais se estreitam suas relações econômicas surgem profundas diferenças que os separam. Seu desenvolvimento nacional não se realiza, sob muitos aspectos, através de linhas paralelas, mas através de ângulos, algumas vezes divergentes como ângulos retos. Adquirem traços desiguais, mas complementares”. O primeiro país a industrializar-se fora da Europa, a partir de 1843, foi os EUA, depois da conquista do oeste e dos enormes recursos daí advindos; alguns autores preferem como marco a “Segunda Revolução Americana”, a Guerra de Secessão entre 1860 e 1865, momento em que a classe capitalista do norte aumentou sua fortuna financiando o governo federal, fornecendo provisões aos exércitos e desenvolvendo a indústria ligada às necessidades do conflito. O resultado foi a consolidação do capitalismo industrial, representado politicamente pelos republicanos. Enquanto a abolição da escravatura destruía a economia sulista, o protecionismo alfandegário, a legislação bancária, a construção de estradas de ferro e a legislação trabalhista garantiam a supremacia do norte e de sua economia industrial. Depois da guerra, o país tinha território unificado, rede de transportes em expansão, população crescente, poucas diferenças sociais. Isso permitia a produção para o consumo de massa, o que facilitava a racionalização da economia. O país dependia de seu próprio mercado, pois exportava apenas 10% do que produzia (Inglaterra, por exemplo, exportava 52%). O dinamismo do país atraiu capitais europeus, que se voltaram para setores estratégicos, como ferrovias. A descoberta de ouro na Califórnia acelerou ainda mais a economia capitalista, em 1848. Em 1890, algodão, trigo, carne e petróleo contribuíam com 75 % da exportação. O beneficiamento de produtos agrícolas foi a primeira grande indústria; as siderúrgicas e indústrias mecânicas superaram o setor agrícola apenas no início do século XX. Sua característica era a formação de enormes empresas, que produziam ferro, carvão, produtos siderúrgicos e ferroviários. Em 1913, os americanos assumiriam a liderança na produção de ferro, carvão, aço, 6 cobre, chumbo, zinco e alumínio. A indústria mecânica avançou, sobretudo á automobilística, com métodos racionais desenvolvidos pela Ford. A indústria têxtil deslocou-se para o sul. A indústria elétrica, estimulada pelas investigações científicas, que resultaram na fundação da Edison Electric Company, criou filiais em vários países, como Itália e Alemanha. Na Ásia, até meados do século XIX, o Japão vivia fechado, com sua sociedade dominada por uma aristocracia feudal que explorava a massa de camponeses. Desde1192, o imperador tinha poder simbólico; quem o exercia era o Xogum, supremo comandante militar. A economia monetária vinha se acentuando desde o século XVIII e á pressão dos EUA forçou, em 1852, a abertura dos portos aos estrangeiros, atendendo a interesses de expansão da indústria americana. O ponto de partida para as grandes transformações econômicas foi o ano de 1868, com a Revolução Meiji. Com apoio estrangeiro, o imperador tomou o poder do xogunato e passou a incorporar tecnologia ocidental, para modernizar o Japão. A Revolução Meiji aboliu o feudalismo, menos com a finalidade de melhorar a vida dos camponeses, e mais com a de torná-los mais produtivos. A fortuna dos grandes comerciantes e proprietários aumentou, em prejuízo dos aposentados e pequenos lavradores. A criação de um exército de trabalhadores, devido ao crescimento populacional, permitiu uma política de preços baixos, favorável à competição no mercado externo. Um aspecto importante foi a acumulação de capital nacional, decorrente da forte atuação do Estado, que concedeu patentes e exclusividades e integrou os investimentos. Depois de desenvolver as indústrias, o Estado as transferiu para particulares em condições vantajosas de pagamento. Formaram-se assim grandes concentrações industriais, zaibatsu, pois 40% de todos os depósitos bancários, 60% da indústria têxtil, 60% da indústria militar, a maior parte da energia elétrica, a indústria de papel e a de construção naval eram controlados por apenas quatro famílias: Sumitomo, Mitsubishi, Yasuda e Mitsui. A indústria pesada avançou lentamente pela falta de carvão e ferro. Os recursos hidrelétricos foram explorados a partir de 1891. No início do século XX, a siderurgia deu um salto, criando a base para a expansão da indústria naval. O Estado, assentado na burguesia mercantil e na classe dos proprietários, tinha apoio dos militares, que pretendiam construir o “Grande Japão”. O pequeno mercado interno impôs a busca de mercados externos e uma política agressiva, iniciada com a guerra contra a China (1894-1895), que proporcionou enorme indenização ao Japão. O mesmo aconteceu após a guerra contra a Rússia (1904-1905). A I Guerra Mundial (1914-1918) abriu espaços no mercado asiático (Coréia, Vietnã), imediatamente ocupados pelo Japão. O imperialismo capitalista foi o resultado do processo de concentração-centralização dos capitais nos países de capitalismo mais avançado, onde o monopólio tendeu a substituir à livre concorrência, assim como a exportação de capitais a exportação de mercadorias em direção ao mundo atrasado, mudança que dá lugar ao imperialismo, “como fase superior do desenvolvimento do capitalismo. Nos países avançados o capital ultrapassou o marco dos Estados Nacionais, substituiu a concorrência pelo monopólio, criando todas as premissas objetivas para a realização do socialismo” (Lênin). O nacionalismo burguês das nações capitalistas avançadas se armou então contra a perspectiva da revolução socialista, que se realizaria subjetivamente com o avanço da organização e da consciência do movimento operário, no último quartel do século XIX. O imperialismo adquiriu necessariamente um caráter agressivo e racista, que conduziu à guerra contra as nacionalidades oprimidas e à guerra mundial. Devido às desigualdades do desenvolvimento capitalista mundial, coube ao nacionalismo alemão exprimir ao máximo essas características, mas não devido só a suas peculiaridades nacionais: o irracionalismo hitleriano, que produziu o maior genocídio da história moderna, reconheceu suas fontes na França "democrática", onde o conde de Gobineau elaborou as teses da superioridade racial, e onde se desenvolveu o anti-semitismo de Estado (“caso Dreyfuss”). Diante do desenvolvimento internacional das forças produtivas, o nacionalismo tornou-se um anacronismo reacionário, refugiado nos mais velhos preconceitos. Primórdios do Imperialismo Capitalista Cabe destacar que Marx e Engels se anteciparam a esses desenvolvimentos. Depois das transformações referidas, Marx e Engels voltaram a apreciar o problema nacional na Europa: Marx não aprovava a formação de Estados nacionais pequenos e isto está ilustrado pela sua atitude (contrária) à independência irlandesa. Confiava em que as nações maiores e avançadas, em especial Inglaterra, instaurariam o socialismo, e emancipariam depois politicamente as nações pequenas e atrasadas, conduzindo-as pelo caminho do progresso econômico e social. Esta opinião mudou nas décadas de 1850 e 1860. Não houve revolução na Inglaterra, e Marx, invertendo a ordem anterior, postulou que a liberdade irlandesa devia preceder o socialismo inglês. Não se tratou, no caso, de uma mudança pontual, "irlandesa", mas sim de uma compreensão do novo caráter da questão nacional, a partir da constituição das grandes nações capitalistas. Em carta ao seu amigo Kugelmann, 7 Marx afirmava: "Estou cada vez mais convencido de que a classe operária inglesa não poderá fazer nada decisivo na Inglaterra enquanto não separe sua política a respeito da Irlanda da política das classes dominantes; enquanto não faça causa comum com os irlandeses; enquanto não tome a iniciativa de dissolver a União estabelecida em 1801, substituindo-a por uma livre relação federal. Isto deve ser feito, não por simpatia com a Irlanda, mas como exigência do interesse do proletariado inglês". Já na década de 1860, Marx viu na Irlanda, “a chave da solução da questão inglesa, a qual é, por sua vez, a chave da solução da questão européia". Em 1864, na fundação da Primeira Internacional, um dos eixos políticos, divisor de águas no movimento operário europeu, seria a tomada decidida de posição em favor da independência da Polônia contra o império czarista: era a irrupção no movimento socialista da luta em favor das nacionalidades oprimidas, pelas grandes nações capitalistas, ou pelos impérios multinacionais com sobrevivências feudais. Vinte anos depois, em 1882, Engels escreveria: “Duas nações européias têm não só o direito, mas o dever de serem nacionalistas antes de transformar-se em internacionalistas: Irlanda e Polônia. Estas nações atingem o máximo de internacionalismo quando são genuinamente nacionalistas”. Tratava-se da progressiva elaboração de uma estratégia para a revolução proletária européia e mundial. Os debates mais virulentos no interior da Segunda Internacional se deram, justamente, em torno da questão nacional e colonial. O fenômeno já observado por Marx no proletariado inglês, em relação à questão irlandesa, atingiu então proporções européias, influindo na própria social-democracia: uma ala da social-democracia alemã (Edward David) proclamou-se, abertamente, “social- imperialista”, enquanto o "austro-marxismo" (com Otto Bauer) propunha a “autonomia cultural” para as nacionalidades oprimidas, o que Lênin chamou de uma "teorização refinada do nacionalismo". A destituição do caráter histórico do imperialismo, como etapa do desenvolvimento capitalista, foi realizada por diversos teóricos. Samir Amin resume, em sua linha de raciocínio, muitas outras semelhantes: “O imperialismo não é uma etapa, sequer a mais alta do capitalismo: desde o começo é inerente à expansão do capitalismo. A conquista imperialista do planeta pelos europeus e seus filhos norte-americanos se realizou em duas fases. A primeira fase desta empresa em desenvolvimento se organizou em torno à conquista das Américas, dentro do marco do sistema mercantil da Europa atlântica daquela época. O resultado claro foi a destruição das civilizações indígenas e a hispanização/cristianização ou simplesmente o genocídio total sobre o qual se construiu os EUA. O racismo fundamental dos colonos anglo-saxões explica porque o modelo se reproduziu em todas partes, na Austrália, na Tasmânia (o genocídio mais completo da história) e na Nova Zelândia. Pois se os católicos espanhóis atuavam em nome da religiãoque devia ser imposta aos povos conquistados, os protestantes anglo-saxões derivavam de sua leitura particular da Bíblia o direito de eliminar os ‘infiéis’. “A escravidão infame dos negros, que se tornou necessária após o extermínio dos índios, se impôs bruscamente para garantir que as partes úteis do continente pudessem ser exploradas. Hoje em dia ninguém pode duvidar dos reais motivos de todos estes horrores, ao menos que se ignore sua relação íntima com a expansão do capital. No entanto, os europeus contemporâneos aceitaram o discurso ideológico que os justificava, e as vozes de protesto como a do Padre Las Casas não encontraram muitos simpatizantes. Os resultados desastrosos produzidos por este primeiro capítulo da expansão capitalista mundial, fizeram com que mais tarde as forças de liberação desafiassem a lógica de sua produção. A primeira revolução do hemisfério ocidental foi a dos escravos de Santo Domingo (atual Haiti), no final do século XVIII, seguida mais de um século depois pela revolução mexicana da década de 1910, e cinqüenta anos depois pela revolução cubana. E se não cito aqui a famosa ‘revolução americana’ ou aquelas das colônias espanholas que a seguiram, é porque estas apenas transferiram o poder de decisão das metrópoles aos colonos, de modo que estes continuaram fazendo o mesmo, perseguindo os mesmos projetos com brutalidade ainda maior, mas sem ter que compartir os lucros com ‘a pátria mãe’. “A segunda fase da devastação imperialista se baseou na revolução industrial e se manifestou na submissão colonial da Ásia e África. ‘Para abrir os mercados’ –como o mercado de ópio que foi imposto aos chineses pelos puritanos da Inglaterra- e apoderar-se dos recursos naturais do globo, foram os motivos reais neste caso, como todos já sabem. Só que mais uma vez a opinião européia –incluindo o movimento operário da Segunda Internacional- não enxerga estas realidades e aceita o novo discurso legitimador do capital. Desta vez tratou-se da famosa ‘missão civilizadora’. As vozes que expressaram o pensamento mais claro da época foram as dos burgueses cínicos, como Cecil Rhodes, que viu a conquista colonial como um antídoto à revolução social na Inglaterra. Uma vez mais, as vozes de protesto –da Comuna de Paris aos bolcheviques- tiveram pouca ressonância. Esta segunda fase do imperialismo está na origem do maior problema já enfrentado pela humanidade: a imensa polarização que aumentou a desigualdade social de uma proporção de dois a um ao redor 8 de 1800, à de 60 a 1 em nossos dias, onde apenas 20% da população mundial fica incluída nos centros que se beneficiam com o sistema. “Ao mesmo tempo, esses resultados prodigiosos da civilização capitalista deram lugar às mais violentas confrontações entre os poderes imperialistas que o mundo já viu. A agressão capitalista mais uma vez produziu as forças que resistiram a este projeto: as revoluções socialistas que ocorreram na Rússia e China (de um modo nada acidental, todas ocorreram em periferias que eram vítimas da expansão polarizadora do capitalismo realmente existente) e as revoluções de libertação nacional”. Apoiando-se em elementos históricos reais, Amin introduziu uma unilateralidade deformadora. Por trás da condena radical, transparece uma visão a-histórica do capitalismo, que aparece como a encarnação de um “mal absoluto”, portanto carente de contradições (pois nada que seja absoluto admite contradições), que constituiriam a base do desenvolvimento histórico contemporâneo. Amin pôs um signo de igualdade entre o sistema colonial mercantilista e o imperialismo capitalista, que impede compreender a especificidade do segundo. As “vantagens” do imperialismo capitalista, para as metrópoles, derivavam-se das próprias contradições do capitalismo. É impossível retirar da explicação da "divisão do mundo" a sua dimensão econômica. Fazendo uso da rede de transportes e comunicações, os europeus transformaram zonas atrasadas e, anteriormente, marginalizadas em extensões da sua “civilização”, expulsando os nativos do controle da sua própria terra. A "divisão do globo" tinha sua motivação, em primeiro lugar, na procura de novos mercados. Com a depressão econômica, como veremos, gerou-se a crença generalizada de que a superprodução poderia ser resolvida com um aumento geral das exportações. Sendo a necessidade de mercados comum aos vários estados desenvolvidos, verificou-se a «corrida» aos territórios ultramarinos. Com a obtenção das possessões coloniais, as potências metropolitanas garantiam o monopólio comercial para a economia nacional correspondente, impedindo a intromissão estrangeira (protecionismo colonial). O "novo imperialismo" era fruto de uma economia internacional madura, baseada na concorrência econômica e comercial de várias potências (Inglaterra, Alemanha, França, EUA, Japão, Rússia). Por outro lado, o crescimento do consumo de massas nos países metropolitanos originou a explosão do mercado de produtos alimentares. Para satisfazer a imensa procura, os estados imperiais especializaram várias regiões remotas (controladas por colonos brancos) para a produção de produtos alimentares a baixo custo. De igual forma, o setor dos tradicionais produtos tropicais (café, chá, açúcar, cacau, frutos tropicais), de que o ocidente se tornara dependente, sofreu um forte impulso. Por fim, importa realçar as áreas especializadas na produção de matérias-primas destinadas à máquina industrial européia (por exemplo, a Nova Zelândia - produtora quase exclusiva de lã). Finalmente, em conseqüência desses fatores ("especialização" e novos mercados), a civilização industrial avançada tornou-se dependente de produtos exóticos. Isto é, o novo desenvolvimento tecnológico da “segunda revolução industrial” (1880) baseava-se, em grande parte, em matérias-primas provenientes de regiões remotas. Face à grande procura, os empresários europeus, em paralelo às plantações agrícolas, abriram uma rede imensa de minas nas colônias, em busca desses novos produtos. As explorações agrícolas e minerais coloniais podem ser consideradas como os símbolos práticos do imperialismo: o “poder branco” explorava a riqueza e a mão de obra locais, atingindo lucros sensacionais. Toda esta exploração era perpetuada pelos negociantes da metrópole, que tinham nos locais os "mensageiros" e os "peões" da lógica imperial: os colonos brancos. Em suma, o capitalismo mundial da era do império consistia num complexo jogo de rivalidades econômicas entre "economias nacionais politizadas", que transpunham essa rivalidade para as terras anexadas. A teoria marxista deu conta do conjunto dessas contradições, por ter como base, justamente, a análise das próprias contradições do capital. Sua formulação mais abrangente foi realizada por Lênin, em um trecho que engloba a essência de seu pensamento à respeito: "Se fosse necessário dar uma definição o mais breve possível do imperialismo, dever-se-ia dizer que o imperialismo é a fase monopolista do capitalismo. Essa definição compreenderia o principal, pois, por um lado, o capital financeiro é o capital bancário de alguns grandes bancos monopolistas fundido com o capital das associações monopolistas de industriais, e, por outro lado, a partilha do mundo é a transição da política colonial que se estende sem obstáculos às regiões ainda não apropriadas por nenhuma potência capitalista para a política colonial de posse monopolista dos territórios do globo já inteiramente repartido”. Expansão e Depressão Capitalista Entre 1870 e 1914 vigorou no mundo capitalista o padrão-ouro, que indexava o preço da moeda nacional ao metal, podendo-se converter a moeda em ouro ou vice-versa. Segundo Barry Eichengreen, "em termos teóricos, o 9 padrão-ouro criava um mecanismo automático de eliminação dos eventuais desequilíbrios no comércio internacional e, não menos importante, promovia os investimentosexternos, uma vez que a estabilidade das taxas de câmbio dava aos investidores a segurança de que os valores dos seus investimentos externos seriam preservados". Isto foi decisivo em uma era dominada pela exportação de capitais. No século XIX, a expansão mundial da produção capitalista foi ampliando o escopo e a profundidade das crises comerciais e financeiras. A crise econômica iniciada em 1873, com o craque da Bolsa de Viena, atingiu dimensões mundiais ao atingir a economia inglesa, centro indiscutido do capitalismo mundial. De imediato, o craque “austríaco” foi seguido de falências bancárias na Áustria e depois na Alemanha; a indústria pesada alemã acabava de conhecer, devido ao esforço provocado pela guerra franco-prussiana, com a construção de estradas de ferro e de navios, uma forte ascensão, que se emperrou com a elevação dos custos e com a baixa da rentabilidade; a produção de ferro fundido caiu em 21% em 1874, e seu preço teve uma queda de 37%. O desemprego acarretou a volta de muitos novos operários industriais ao campo. Após vinte e dois anos de prosperidade (com algumas interrupções), entre 1851 e 1873, o capitalismo conhecia uma crise de grandes proporções, sua primeira crise contemporânea, que originou uma longa depressão, até 1895. Para Maurice Dobb, “o que se tornou conhecido como Grande Depressão, iniciada em 1873, interrompida por surtos de recuperação em 1880 e 1888, e continuada até meados da década de 1890, passou a ser encarada como um divisor de águas entre dois estágios do capitalismo: aquele inicial e vigoroso, próspero e cheio de otimismo aventureiro, e o posterior, mais embaraçado, hesitante e, diriam alguns, mostrando já as marcas de senilidade e decadência”. A crise, como vimos, originou-se na Áustria e Alemanha, que experimentava um intenso desenvolvimento industrial devido em parte às indenizações pagas pela França pela guerra de 1871. Também os Estados Unidos sofreram violentamente seu impacto. Os altos dividendos da indústria alemã incrementaram a especulação, que se alastrou para as ferrovias e imóveis, beneficiada pela grande oferta de crédito. Porém os custos aumentaram e a rentabilidade começou a cair. A crise em seu início foi financeira e estourou em Viena, com a quebra da bolsa de valores, seguido de falências de bancos de financiamento austríacos, alemães e norte-americanos. Nos Estados Unidos, a depressão esteve ligada à especulação ferroviária. A simultaneidade na aparição de dificuldades, tanto de um lado como de outro da Mancha e do Atlântico, ilustra a integração das economias industriais em matéria comercial, e mais ainda em matéria de movimentos de capitais. Se em, 1873, a crise não teve, logo de saída, um caráter agudo na Grã- Bretanha, no entanto a prosperidade industrial se interrompeu nesse país, iniciando-se um longo período de depressão. O número de falências aumentou progressivamente na Inglaterra: de 7.490 em 1873, para 13.130 em 1879. Em 1878 muitos grandes estabelecimentos bancários decretaram a suspensão de pagamentos; as quebras bancárias, em vez de preceder à crise industrial, se produziram no decorrer da depressão. Os preços caíram, as exportações inglesas se reduziram em 25% entre 1872 e 1879, o desemprego cresceu de modo inédito no país pioneiro da Revolução Industrial. A intensidade da crise seria proporcional ao eufórico crescimento precedente. Segundo Engels, “a Bolsa modifica a distribuição no sentido da centralização, acelera enormemente a concentração de capitais e, nesse sentido, é tão revolucionária quanto a máquina a vapor”: “A ausência de crises a partir de 1868 baseia-se na extensão do mercado mundial, que redistribui o capital supérfluo inglês e europeu em investimentos e circulação no mundo todo em diversos ramos de inversão. Por isso uma crise por super-especulação nas estradas de ferro, bancos, ou em investimentos especiais na América ou nos negócios da Índia seria impossível, enquanto crises pequenas, como a da Argentina, de três anos a esta parte viraram possíveis. Mas isto tudo demonstra que se prepara uma 10 crise gigantesca”. Nas crises precedentes, o sinal era dado pela Bolsa de Valores (desabamento dos preços das ações, pânico) ou pelos bancos (falência de um grande estabelecimento ou falências em cadeia). Na base do fenômeno, uma lógica aparente: os custos se elevavam (pela alta dos salários, ou por aumento dos preços dos trilhos para as estradas de ferro americanas), os mercados de venda se reduziam (diminuição do poder de compra rural e daquele dos trabalhadores de outros setores, redução dos investimentos públicos, dificuldades nos mercados estrangeiros), os preços de venda baixavam (concorrência nos preços, guerra de tarifas nas estradas de ferro norte-americanas); a rentabilidade declinava ou caia brutalmente, a realização do valor produzido por cada empresa se tornava mais difícil, a concorrência ficava acirrada, a situação das empresas se tornava cada vez mais precária. Assim, tudo podia desencadear a crise: um rumor na bolsa, um mercado perdido, uma empresa ou um banco que interrompia os pagamentos, bastavam para deflagrar a engrenagem incontrolável. Mas a “faísca” apenas deflagrava o fenômeno profundo, determinado pela sobre-produção e pela queda tendencial da taxa de lucro. Segundo a expressão de Marx, no livro III de O Capital, a acumulação capitalista (como fonte da sobre-produção) e a queda tendencial da taxa de lucro eram processos complementares, que se supunham mutuamente: “Queda da taxa de lucro e aceleração da acumulação são só expressões diversas de um mesmo processo, ambos indicando o desenvolvimento da força produtiva. A acumulação acelera a queda da taxa de lucro, ao causar a concentração do trabalho em grande escala e, em conseqüência, uma composição superior do capital. Por outro lado, a diminuição da taxa de lucro acelera a concentração de capital, sua centralização via expropriação dos pequenos capitalistas, dos produtores diretos sobreviventes que conservem alguma coisa a ser expropriada. A acumulação como massa se acelera, enquanto a taxa de acumulação diminui junto à taxa de lucro”. A baixa dos preços já era conhecida, acompanhando a compressão e a redução da produção. Mas essa baixa constituiu uma tendência pesada no decorrer desses pouco mais de vinte anos; assim, de 1873 a 1896, a baixa dos preços de atacado foi de 32% na Grã-Bretanha, de 40% na Alemanha, de 43 % na França e de 45 % nos Estados Unidos. Esse movimento envolveu mais alguns produtos, como o preço do ferro fundido, que caiu em 60% entre 1872 e 1886. Houve também o crescimento do desemprego: na Grã-Bretanha, a taxa de desemprego se elevou brutalmente, de 1 % em 1872 para mais de 11 % em 1879 (medida considerando só o universo de operários sindicalizados atingidos, ou seja, o desemprego real era bem maior). Nos salários reais, houve uma tendência à baixa nos setores atingidos pela crise. A organização dos trabalhadores, isto é, o aparecimento dos sindicatos nacionais, resultou em aumento real de salários entre 1860 e 1874. Por isso, os empresários preferiram investir em tecnologia, para aumentar a produção com menos trabalhadores. De um lado, produção e lucros se mantiveram; de outro, declinou a massa global de salários pagos, determinando a recessão do mercado consumidor. Os capitais disponíveis não poderiam ser investidos na Europa, pois a produção aumentaria e os preços cairiam. Teriam de ser aplicados fora do país, através de empréstimos com juros elevados ou na construção de ferrovias. De modo inesperado, a crise evidenciou uma grave sobre-produção de mercadorias e de capitais nas economias capitalistas, em relação ao mercado mundial da época. A ampliação, intensiva e extensiva, desse mercado, colocou-se como um imperativo: ela não seria atingida, no entanto, de modo pacífico e harmonioso, mas a través da concorrência econômica,de contradições políticas e de enfrentamentos bélicos. Entrou-se de modo acelerado em uma nova era tecnológica, determinada, não pelas invenções e métodos da primeira Revolução Industrial, mas por novos ramos industriais. Surgiram novas fontes de energia (eletricidade e petróleo, turbinas, motor a explosão), uma nova maquinaria baseada em novos materiais (ferro, ligas, metais não- ferrosos), indústrias baseadas em novas ciências, como a química orgânica. E também numa era de mercado de consumo doméstico, iniciada nos EUA, e desenvolvida pela crescente renda das massas trabalhadoras, potenciada pelo substancial aumento demográfico dos países desenvolvidos. De 1870 a 1910, a população de Europa cresceu de 290 para 435 milhões, a dos EUA de 38,5 para 92 milhões. Surgiu o período da produção de massa, incluindo alguns bens de consumo duráveis. A “depressão do comércio” foi, certamente, universal, mas foi uma queda de seu crescimento, não um retrocesso. A produção mundial, longe de estagnar, continuou a aumentar. Entre 1870 e 1890, a produção de ferro dos cinco principais países produtores mais do que duplicou (de 11 para 23 milhões de toneladas); a produção de aço, que agora passava a ser o indicador adequado da industrialização, multiplicou-se por vinte (de 500 mil para 11 milhões de toneladas). O crescimento do comércio internacional continuou a ser impressionante, embora a taxas menos vertiginosas que antes. Foi exatamente nessas décadas que as economias industriais americana e alemã avançaram a passos agigantados, e que a revolução industrial se estendeu a novos países, 11 como a Suécia e a Rússia. Muitos dos países ultramarinos recentemente integrados à economia mundial conheceram certo desenvolvimento, embora menor que o das metrópoles. Nas palavras de Hobsbawm, “o que estava em questão não era a produção, mas a sua lucratividade”. A era liberal tinha sido a do monopólio industrial inglês, dentro do qual os lucros eram garantidos pela competição de pequenas e médias empresas. A era “pós-liberal” caracterizou-se por uma competição internacional entre economias industriais nacionais rivais - a inglesa, a alemã, a norte-americana; uma competição acirrada pelas dificuldades que as firmas dentro de cada um destes países enfrentavam (no período da depressão) para fazer lucros adequados. A competição levava à concentração econômica e ao controle do mercado. O crescimento econômico era agora também luta econômica. O otimismo acerca de um futuro de progresso infinito dava lugar à incerteza. Tudo isto fortalecia e por seu turno era fortalecido pelas crescentes rivalidades políticas, as duas formas de competição fundindo-se na luta por territórios e na caça de "esferas de influência", que foi chamada de imperialismo. A crise eliminou as empresas mais fracas. As fortes tiveram de racionalizar a produção: o capitalismo entrou em nova fase, a fase monopolista. A nova estrutura da organização econômica foi, depois, denominada de "capitalismo monopolista". A crise abriu espaço para a crescente monopolização das economias nacionais, e permitiu a intensificação da expansão imperialista, acirrando a tensão entre as grandes potências capitalistas. Os limites do liberalismo econômico apareceram definitivamente. A teoria do laissez-faire triunfou enquanto perduraram as condições históricas favoráveis à adoção de uma política e uma economia liberais. Na Grã- Bretanha de meados do século XIX, mais do que em qualquer outro país do mundo, essas condições se fizeram presentes, até que a Grande Depressão dos anos 1873-1896 a atingiu, como havia alcançado todos os demais países ou colônias integrantes do sistema econômico capitalista. A expansão geográfica do capital e a exploração dos mercados externos, dando início ao imperialismo capitalista, foi a solução encontrada pela Europa para a crise. A rivalidade levou às potências a dividir o globo entre reservas formais ou informais para seus próprios negócios, mercados e exportações de capital, processo também devido à crescente não-disponibilidade de matérias-primas na maioria dos próprios países desenvolvidos. As novas indústrias demandavam petróleo, borracha, metais não-ferrosos. A nova economia de consumo demandava quantidades crescentes não apenas de matérias primas produzidas nos países desenvolvidos, mas também daquelas que não podia produzir. O outro motivo, essencial, do imperialismo, encontrava-se no aguçamento das contradições sociais, da luta de classes, nas metrópoles capitalistas. O imperialista (ele não teria tomado o qualificativo como um insulto...) inglês Cecil Rhodes afirmou: "A idéia que mais me acode ao espírito é a solução do problema social, a saber: nós, os colonizadores, devemos, para salvar os 40 milhões de habitantes do Reino Unido de uma mortífera guerra civil, conquistar novas terras a fim de aí instalarmos o excedente da nossa população, e aí encontrarmos novos 12 mercados para os produtos das nossas fábricas e das nossas minas. O Império, como sempre tenho dito, é uma questão de estômago. Se quereis evitar a guerra civil, é necessário que vos torneis imperialistas". Não era possível ser mais claro (o imperialismo inglês premiou Rhodes permitindo-lhe batizar com seu sobrenome, Rhodesia, uma inteira colônia, o atual Zimbábue). A crise econômica metropolitana, que Rhodes vira como um primórdio da “guerra civil”, tornou-se evidente quando, depois de forte crescimento e abertura comercial de suas economias (nas décadas de 1850 e 1860) Europa conheceu uma “depressão de preços, de juros e de lucros”, na expressão do economista neoclássico Alfred Marshall. • 1873 – Craque da bolsa de valores de Viena (Áustria): queda súbita na cotação da bolsa redução dos investimentos produtivos na Áustria e na Alemanha; • 1882 – Craque da bolsa de Lyon (França): redução da participação pública nos investimesntos paralisa as obras nos setores de construção; • 1884 – “ Pânico das estardas de ferro”, nos Estados Unidos. Redução do ritmo de crescimento das sociedades de construção civil Queda nas ações ligadas aos valores ferroviários • 1889 – Nova crise na bolsa de Lyon: Especulação com o cobre Quebra da empresa responsável pela construção de Canal no Panamá • 1890 – O banco inglês Baring Brothers suspende seus pagamentos. Crise atinge os Estados Unidos, a Argentina e a Austrália: redução do comércio internacional • 1893 – Queda da rentabilidade das sociedades de construção de estradas de ferro, nos Estados Unidos. Num ambiente deflacionário, a concorrência capitalista na Europa tendeu a se acirrar. Além de uma tendência para o protecionismo econômico (com a exceção, importante, da Grã Bretanha) desenvolveu-se um novo surto de conquista colonial, em direção da Ásia e da África. Expansão Colonial A conexão entre esses fenômenos demorou algum tempo para ser estabelecida. Na década de 1890, Friedrich Engels, no prólogo à primeira edição dos volumes II e III d´O Capital, procurou situá-los no contexto do desenvolvimento histórico geral do capitalismo: “A colonização é hoje uma efetiva filial da Bolsa, no interesse da qual as potencias européias partilharam a África, entregue diretamente como botim às suas companhias”. Não era uma colonização como as precedentes. O seu ritmo de expansão (560 mil km2 por ano) também não tinha precedentes. Mas tinha relação com a expansão dos interesses financeiros: em 1843, quando era o único país exportador de capital, a Inglaterra já possuía títulos da dívida pública dos países da América Latina por valor de 120 milhões de libras esterlinas (vinte vezes mais que o montante dos investimentos britânicos nas maiores 24 companhias mineiras além-mar). Em 1880, o montante desses mesmos títulos, da América Latina, dos EUA e do Oriente, já ascendia a 820 milhões de libras esterlinas. 13DIMENSÃO DAS POSSESSÕES COLONIAIS Inglaterra França Alemanha Anos Superfície (em milhões de milhas quadradas) Populaçã o (em milhões) Superfície (em milhões de milhas quadradas) Populaçã o (em milhões) Superfície (em milhões de milhas quadradas) Populaçã o (em milhões) 1815- 1830 ? 126,4 0,02 0,5 -- -- 1860 2,5 145,1 0,2 3,4 -- -- 1880 7,7 267,9 3,4 7,5 -- -- 1899 9,3 309,0 7,5 56,4 1,0 14,7 Nas décadas finais do século XIX, o capital vinculou a conquista colonial com a especulação financeira e com o novo papel da Bolsa. A expansão do mercado mundial, na segunda metade do século XIX, deu vazão ao capital supérfluo inglês, em investimentos e circulação em diversos ramos de inversão. O uso do termo imperialismo tornou-se corrente no ultimo quartel do século XIX, para descrever a partilha do “mundo colonial” pelas potencias européias. O ministro francês Jules Ferry, em seu livro Le Tonkin et Ia Mère Patrie, de 1890, escreveu: “Um movimento irresistível se apoderou das grandes potências européias por conquistar novos territórios. Foi como uma imensa carreira de obstáculos na rota para o desconhecido. Esta course au clocher tem apenas cinco anos e se movimenta por inércia de um ano para outro”. Em 1884, Charles Faure já tinha usado o termo, comentando a Conferência de Berlim (que estabeleceu acordos para a partilha da África entre as potências): “O movimento tomou o caráter de uma verdadeira course au clocher. Parece que o vencedor será aquele que primeiro chegue e hasteie a bandeira de seu país em qualquer lugar da costa da África que ainda não esteja sob a dominação de uma nação européia”. O colonialismo do século XIX foi impulsionado pela ideologia de que cabia aos europeus cumprir uma missão civilizadora na África, missão que seria, na expressão do poeta e romancista inglês Rudyard Kipling — partidário fervoroso do imperialismo vitoriano —, o "fardo do homem branco". Foram estes “ideais” que levaram, por exemplo, Cecil Rhodes a iniciar o saque dos diamantes da Namíbia e da África do Sul, principal fonte de sustento do monopólio fundado por ele, a De Beers, e a Anglo American. A África foi o grande teatro da expansão colonial. % DE TERRITÓRIO PERTENCENTE ÀS POTÊNCIAS EUROPEIAS E AOS EUA 1876 1900 Diferença África 10,8% 90,4% 79,6% Polinésia 56,8% 98,9% 42,1% Ásia 51,5% 56,6% 5,1% Austrália 100% 100% -- América 27,5% 27,2% 0,3% Nas décadas finais do século XIX, o capital vinculou a conquista colonial com a especulação financeira e com o novo papel da Bolsa. A expansão do mercado mundial, na segunda metade do século XIX, deu vazão ao capital supérfluo inglês, em investimentos e circulação em diversos ramos de inversão. O uso do termo imperialismo tornou-se corrente no ultimo quartel do século XIX, para descrever a partilha do “mundo colonial” pelas potencias européias. A base desse processo era a maturidade atingida pelo capitalismo metropolitano. Em finais do século XIX, o capitalismo se afirmou como modo de produção dominante, destruindo as formas pré-capitalistas, em diversos países europeus, de modo desigual. A depressão de 1873-1890 não foi uma queda, mas uma desaceleração. A produção mundial, como vimos, continuou a aumentar. O capital penetrou também países com escasso desenvolvimento industrial, mas que conservaram sua soberania nacional (a já mencionada Rússia, ou a maior parte da América Latina), mas também territórios - na Ásia e na África, principalmente - que se transformaram em colônias. Finalmente, penetrou territórios vazios, ou esvaziados (através de genocídios) nas Américas. 14 Em 1830, França invadiu a África e iniciou a conquista da Argélia, completada em 1857. Dez anos mais tarde, Leopoldo II da Bélgica deu novo impulso ao colonialismo ao reunirem Bruxelas, a capital, um congresso de presidentes de sociedades geográficas, para difundir a civilização ocidental dizia o rei; mas os interesses eram econômicos. Dali resultaram a Associação Inter¬nacional Africana e o Grupo de Estudos do Alto Congo, que iniciaram a exploração e a conquista do Congo. Leopoldo era um dos principais contribuintes das entidades, financiadas por capitais particulares. Outros países europeus se lançaram à aventura africana. A França, depois da Argélia, rapidamente conquistou Tunísia, África Ocidental Francesa, África Equatorial Francesa, Costa Francesa dos Somalis e Madagascar. A Inglaterra dominou Egito, Sudão Anglo-Egípcio, África Oriental Inglesa, Rhodesia, União Sul-Africana, Nigéria, Costa do Ouro e Serra Leoa. A Alemanha tomou Camarões, Sudoeste Africano e África Oriental Alemã. A Itália conquistou Eritréia, Somália Italiana e o litoral da Líbia. Porções reduzidas couberam aos antigos colonizadores: a Espanha ficou com Marrocos Espanhol, Rio de Ouro e Guiné Espanhola; Portugal, com Moçambique, Angola e Guiné Portuguesa. A corrida para a África foi “regulamentada” na Conferência de Berlim (1884 - 1885), proposta por Bismarck e Jules Ferry. Seu objetivo principal foi legalizar a posse do Congo por Leopoldo II. Sobre a base do desenvolvimento do comércio mundial (cujo volume decuplicou entre 1848 e 1914) o movimento foi desigual e contraditório: nos países avançados a indústria avançara, sobretudo a pesada; os países se urbanizaram, a renda nacional progrediu, assim como a percentagem dos trabalhadores industriais. Nos outros países houve também “modernização”, mas em ritmo mais lento, aumentando a sua distancia econômica em relação aos países adiantados, havendo, em alguns casos, estagnação, e até regressão. O violento movimento de re-colonização do planeta permitiu ao capitalismo (europeu, em primeiro lugar) sair da “grande depressão”. Mas o “remédio” ampliava as contradições em escala inédita. A expansão mundial do capital tinha um efeito deletério sobre a troca comercial entre o berço histórico do capitalismo e as regiões periféricas, fator de estabilidade da Europa, assim como sobre a possibilidade de que a Rússia e a América jogassem o papel de guardião da reação internacional. Marx e Engels assim escreviam no prefácio à primeira edição russa do Manifesto Comunista (1882): “Foi a imigração européia que possibilitou à América do Norte a produção agrícola em proporções gigantescas, cuja 15 concorrência está abalando os alicerces da propriedade rural européia - a grande como a pequena. Ao mesmo tempo, deu aos Estados Unidos a oportunidade de explorar seus imensos recursos industriais, com tal energia e em tais proporções que, dentro em breve, arruinarão o monopólio industrial da Europa ocidental, especialmente o da Inglaterra. Essas duas circunstâncias reprecutem de maneira revolucionária na própria América do Norte. Pouco a pouco, a pequena e a média propriedade rural, a base do regime político em sua totalidade, sucumbe diante da competição das fazendas gigantescas; ao mesmo tempo formam-se, pela primeira vez nas regiões industriais, um numeroso proletariado e uma concentração fabulosa de capitais. E a Rússia? Durante a revolução de 1848-49, os príncipes e a burguesia europeus viam na intervenção russa a única maneira de escapar do proletariado que despertava. O czar foi proclamado chefe da reação européia. Hoje ele é, em Gatchina, prisioneiro de guerra da revolução e a Rússia forma a vanguarda da ação revolucionária na Europa”. Na virada para o século XX, mais da metade da superfície terrestre, e mais de um terço da população do planeta, se encontrava nas colônias: 56% da superfície do planeta (75 milhões de quilômetros quadrados, para um total de 134 milhões) estava colonizado por potências cuja superfície (16,5 milhões de quilômetros quadrados) mal ultrapassava 12% do total das terras emergidas, isto pese às potências incluírem dois países de dimensões continentais (os EUA e a Rússia). Nos territóriosdiretamente colonizados habitava mais de 34% da população da Terra, não incluindo a população das chamadas semi-colônias (China, Argentina, ou Brasil, por exemplo). A corrida das potências européias por colônias era uma busca por supremacia, apresentada como uma busca pela sua sobrevivência. Em 1800, os europeus ocupavam ou controlavam 35% da superfície terrestre do mundo; em 1878, esse percentual tinha aumentado para 67%, e em 1914, para 84%. Eric Hobsbawm sintetizou assim o processo: “Entre 1876 e 1915, cerca de um quarto da superfície continental do globo foi distribuído ou redistribuído, como colônia, entre meia dúzia de Estados. A Grã-Bretanha aumentou seus territórios em cerca de dez milhões de quilômetros quadrados, a França em cerca de nove, a Alemanha conquistou mais de dois milhões e meio, a Bélgica e a Itália pouco menos que essa extensão cada uma. Os EUA conquistaram cerca de 250 mil, principalmente da Espanha, o Japão algo em torno da mesma quantidade às custas da China, da Rússia e da Coréia. As antigas colônias africanas de Portugal se ampliaram em cerca de 750 mil quilômetros quadrados; a Espanha, mesmo sendo uma perdedora líquida (para os EUA), ainda conseguiu tomar alguns territórios pedregosos no Marrocos e no Saara ocidental. O crescimento da Rússia imperial é mais difícil de avaliar, pois todo ele se deu em territórios adjacentes e constituiu o prosseguimento de alguns séculos de expansão territorial do Estado czarista; ademais, a Rússia perdeu algum território para o Japão. Dentre os principais impérios coloniais, apenas o holandês não conseguiu, ou não quis, adquirir novos territórios, salvo por meio da extensão de seu controle efetivo às ilhas indonésias, que há muito "possuía" formalmente. Dentre os menores, a Suécia liquidou a única colônia que lhe restava, uma ilha das índias Ocidentais, vendendo-a à França, e a Dinamarca estava prestes a fazer o mesmo, conservando apenas a Islândia e a Groenlândia como territórios dependentes”. POSSESSÕES COLONIAIS DAS GRANDES POTÊNCIAS (Em milhões de quilômetros quadrados e de habitantes) Colônias Metrópoles Total 1876 1914 1914 1914 Km2 Hab. Km2 Hab Km2 Hab Km2 Hab Inglaterra 22,5 251,9 33,5 393,5 0,3 46,5 33,8 440,0 Rússia 17,0 15,9 17,4 33,2 5,4 136,2 22,8 169,4 França 0,9 6,0 10,6 55,5 0,5 9,6 11,1 95,1 Alemanha -- -- 2,9 12,3 0,5 64,9 3,4 77,2 Estados Unidos -- -- 0,3 0,39,7 9,4 97,0 9,7 106,7 Japão -- -- 0,3 19,2 0,4 53,0 0,7 72,2 Total para as seis grandes potências 40,4 273,8 65,0 523,4 16,5 437,2 81,5 960,6 Colônias de outras potências (Bélgica, Holanda, etc.) 9,9 45,3 Outros países 14,5 361,2 Total na Terra 133,9 1.657,0 No século XIX, o capitalismo britânico pôde, durante longo tempo, ter uma balança comercial deficitária; suas exportações de produtos industriais manufaturados eram cronicamente inferiores às suas importações de 16 matérias-primas. Mas este déficit era mais que compensado pelas entradas "invisíveis" provenientes dos lucros dos capitais britânicos investidos no estrangeiro. Alemanha considerava impróprio que o seu superior poder não encontrasse reflexo nas possessões territoriais, muito inferiores em relação às inglesas. No mundo metropolitano, o imperialismo detinha maior importância na velha Inglaterra. A sua anterior hegemonia tinha como base à capacidade de dominar os mercados internacionais e as fontes de matérias primas, através da sua incomparável marinha mercante. Preservar o acesso privilegiado ao espaço não-europeu seria a bandeira essencial da política econômica britânica. Conscientes disso, os governantes da Inglaterra vitoriana empreenderam uma campanha de conquistas notável, atingindo o feito de governar 25% do globo terrestre (Canadá, Austrália, Nova Zelândia, Índia, Birmânia, África do Sul, etc.). COLÔNIAS DAS POTÊNCIAS (COMPARATIVO DE 1870 A 1914) A chave para o sucesso britânico esteve, em primeiro lugar, na exploração das possessões anteriores, sobretudo da Índia, a colônia mais importante, o pilar de toda a estratégia global. A política imperial inglesa tinha em grande consideração a proteção das rotas para o subcontinente. Para além do controle absoluto do Oceano Índico (verdadeiro "lago" inglês), os britânicos controlavam a antiga “rota do cabo” (África do Sul; parcelas da costa oriental africana), bem como as rotas mais diretas (Egito - canal do Suez; Mar Vermelho; Omã - Golfo Pérsico). A aquisição de territórios africanos pode ser vista como uma medida defensiva dos interesses orientais, que agora sofriam o ataque de outras potências. 17 A especificidade da Grã-Bretanha também se pode medir pela sua capacidade de continuar a manter posição privilegiada de parceiro econômico único de certas regiões (por exemplo, Uruguai, Argentina, Brasil, Portugal). A Inglaterra tornou-se o principal importador de produtos primários, constituindo o "mercado mundial" de grande parte dos produtos alimentares produzidos em outros lugares. Em troca, os ingleses exportavam os seus produtos industrializados. Aqui reside à base da ligação Grã-Bretanha - mundo subdesenvolvido: o abandono da agricultura por parte dos ingleses origina a total dependência dos países "atrasados" em relação à Inglaterra. Por fim, o terceiro alicerce inglês foi a sua tradicional capacidade de investimento. Os britânicos investem fortemente no seu império (como a expansão dos caminhos de ferro), garantindo um relativo desenvolvimento das colônias e, como conseqüência, grandes lucros (capitalismo financeiro). Por todas estas razões a Inglaterra mantinha-se fiel ao liberalismo econômico (em claro contraste com a Europa continental protecionista) e, acima de tudo, continuava no centro da economia mundial. Apesar da perda da hegemonia industrial, os ingleses souberam manter a liderança, pois constituíam a única nação capaz de retirar o máximo partido das suas possessões coloniais: o capitalismo industrial da Alemanha e dos EUA não pôde superar, nesse plano, o capitalismo financeiro britânico. Paralelamente, o imperialismo era um modo de compensação para a inferior capacidade econômica de países europeus menos desenvolvidos (França, Itália). As novas colônias destes países transformaram-se em simples “ornamentos”, em pesos mortos, pois com a falta de investimento o comércio colonial desses países não cresceu em comparação com o comércio total (era o fracasso do colonialismo protecionista diante do colonialismo liberal inglês). O mundo não-europeu (com exceção do Japão) encontrava-se completamente indefeso face ao ímpeto europeu. Portanto, grande parte do mundo foi conquistada pela força. A divisão do mundo conduzida pelas grandes potências européias (Inglaterra, Alemanha, França, Rússia, Itália) acarretaria importantes conseqüências. Importa também assinalar a queda dos antigos impérios pré-industriais de Portugal e Espanha, incapazes de resistir à máquina industrial moderna dos seus vizinhos europeus. Na Ásia, apesar da permanência da independência dos grandes impérios (China, Japão, Turquia, Sião), os europeus consolidaram grandes áreas de influência (Índia, Birmânia, Tibete, Pérsia - Inglaterra; Indochina - França; Indonésia - Holanda). Mesmo os países mais fechados abriram a sua economia à influência estrangeira (época Meiji na Japão, China concedeu liberdades comerciais em certas zonas). Perante esta investida européia, apenas a América se manteve “intacta” (com a exceção do Canadá). Isto porque, além do nacionalismo proveniente das independências estar ainda vivo, os EUA surgiram como potência industrial e, em conseqüência, iniciaram um processo de expansão da sua esfera de influência no continente. Os europeus compreenderam que o "novo mundo" era inacessível devido à influência continental dos EUA, que já se expressava na ideologia do pan-americanismo. Monopólios eExportação de Capital E, dentro da Europa, o velho monopólio industrial da Inglaterra enfraqueceu no último quartel do século XIX, pois outros países metropolitanos, por meio de políticas alfandegárias protecionistas, tinham-se transformado em Estados capitalistas independentes que concorriam vantajosamente com Inglaterra nos ramos de produção mais importantes.4 As exportações da periferia acompanharam essa tendência: em 1860, metade do total das exportações da Ásia, África e América Latina se dirigiu a um só país, a Grã-Bretanha. Por volta de 1900, a participação britânica nas exportações desses continentes caíra para um quarto do total, e as exportações 4 Vejamos alguns exemplos: o carvão, principal fonte de energia, tinha um rendimento anual de 900 kg/trabalhador na França, 1100 na Inglaterra, 1200 na Alemanha e... 3800 nos EUA. A produção mundial de carvão era de 1215 milhões de toneladas em 1913 (contra 240 em 1870), 82% dos quais extraídos pelos EUA, Inglaterra e Alemanha. A produção de petróleo, por sua vez, central a partir da invenção do motor a explosão, passou de 700 mil toneladas em 1871 para 20 milhões em 1900, 52 milhões em 1913. A indústria metropolitana modificou a sua fisionomia, deslocando para a periferia os setores menos intensivos em capital: a Europa só produzia 42% dos têxteis que consumia, importando o restante das colônias e semi-colônias. A indústria química progrediu com a invenção do plástico, da nitroglicerina e das indústrias sintéticas: seus centros eram os EUA e a Alemanha. A metalúrgica era a indústria principal: 500 mil toneladas de aço foram produzidas em 1875, 74 milhões em 1913; 13 toneladas foi a produção de alumínio em 1885, 65 mil em 1913. A agricultura se transformou em função do progresso industrial, de modo desigual, pois o rendimento era muito maior nos países em que se industrializou e se praticou a especialização das terras. As comunicações terrestres experimentaram também uma explosão, com 209 mil quilômetros de estradas de ferro em 1870, e mais de um milhão em 1913. As carreteiras experimentaram crescimento semelhante, especialmente nos EUA, com a produção industrial do automóvel: 2 milhões em 1913 (63% nos EUA). A navegação marítima explodiu com o barco em metal e o encurtamento das distâncias através dos canais (Suez, Corinto, Panamá, Kiel). Começou a navegação aérea: Blériot atravessou o Canal da Mancha em 1909; Roland Garros, o Mediterrâneo em 1913. Surgia a aviação militar... 18 periféricas para outros países da Europa ocidental já superavam as destinadas à Grã-Bretanha (totalizando 31%, contra os 25% britânicos). No plano tecnológico, houve a chamada “segunda revolução industrial”, baseada no motor a explosão, na telefonia, no rádio e na química. No aspecto institucional, houve o aparecimento das grandes empresas, em substituição àquelas que operavam num só ramo da economia. No cenário internacional, a novidade foi a emergência da Alemanha como potência industrial (anteriormente, a Inglaterra reinava praticamente sozinha) e, em seguida, os Estados Unidos surgiram como o maior país industrial. Também neste período, embora ainda em escala menor, também o Japão começava a despontar como um poderio econômico e militar ponderável. Por fim, a belle époque foi o período de uma mudança drástica na forma de organização do trabalho, com a introdução do taylorismo e do fordismo, e o surgimento da empresa múltipla de negócios. Com a tecnologia de produção na composição de novos produtos com novos materiais, as possibilidades do uso de componentes ainda não desenvolvidos evidenciaram a necessidade de reservas territoriais. Em função disso, o capital financeiro não restringiu seus interesses apenas às fontes de matérias-primas já conhecidas, passando a interessar-se igualmente por fontes possivelmente dispostas em regiões diversas. A expansão dos domínios do capital financeiro pode ser considerada, não apenas pela necessidade de manutenção de excedentes crescentes e influência sobre fontes de produção de mercadorias de baixo valor agregado, mas, principalmente, pela garantia estratégica da possibilidade constante de exploração de novos recursos, originando a tendência do capital financeiro para alargar o seu território econômico. Houve também o enorme crescimento da população da Europa entre 1870 e 1910, com aumento da renda per capita (nos EUA e na Europa) e a integração dos mercados nacionais e internacionais pela ferrovia. Esse ambiente econômico não permitia pequenas escalas de produção, a concorrência era feroz e levava à centralização e concentração de capitais, os derrotados eram engolidos. Na indústria automobilística não foi diferente. A empresa clássica, de propriedade individual ou familiar, cedera lugar à empresa multi-divisional, que internalizou uma série de atividades antes regidas pelo mercado, substituindo a “mão invisível” deste, pela mão visível do staff que comandava as grandes empresas múltiplas. A concorrência clássica foi substituída pela concorrência oligopolista, baseada na constante diferenciação de produtos. Os oligopólios conquistaram amplas fatias do mercado e a gestão totalmente instintiva passou a ser planejada estrategicamente. Países antes afastados do convívio das nações que se consideravam civilizadas foram obrigados a vincular suas economias a interesses externos. Na América, os Estados Unidos passaram a tentar dominar economicamente todo o continente. Se fosse preciso estabeleciam “protetorados”, como na América Central e no Caribe. A Europa retalhou o continente africano. Controlou direta ou indiretamente vastas porções da Ásia. O Japão conquistou territórios à Rússia e à China. No limiar do século XX assistimos também à formação de uniões monopolistas de capitalistas em todos os países de capitalismo desenvolvido; e ao crescente monopólio mundial de uns poucos países ricos, nos quais a acumulação do capital alcançara proporções gigantescas. Constituiu-se um enorme "excedente de capital" nos países avançados. Num opúsculo publicado em 1916, Lênin sintetizou: “O que caracterizava o velho capitalismo, no qual dominava plenamente a livre concorrência, era a exportação de mercadorias. O que caracteriza o capitalismo moderno, no qual impera o monopólio, é a exportação de capital”. Entre 1848 e 1875, as exportações (de mercadorias) européias tinham mais que quadruplicado, ao passo que entre 1875 e 1914, elas “só” duplicaram. O imperialismo caracterizou-se pela produção multinacional. A própria mistificação capitalista da livre concorrência entre indivíduos independentes cedia lugar à produção em larga escala e à concentração e centralização de capitais. Assim, a absorção dos indivíduos em massa às leis do modo de produção capitalista podia exprimir-se diretamente como subordinação de uma classe a outra, não como relações entre indivíduos singulares, o que deu base para um novo sindicalismo e novos conflitos políticos com o movimento dos trabalhadores.5 5 As novas condições das negociações salariais na Inglaterra, no entanto, emergiram do regateio dos inumeráveis mercados de trabalho, seccionais e regionais. Como aponta Hobsbawm, em geral, elas não foram, pelo menos inicialmente, conseqüência de uma política consciente. Os patrões eram hostis aos sindicatos em princípio, exceto quando forçados a negociar com eles. Não foi senão até as décadas de 1860 e 1870 que descobriram que os mecanismos formais para facilitar as relações trabalhistas eram “desejáveis”, de um ponto de vista comercial, e que a negociação de corpos de trabalhadores com corpos de patrões recebia vários graus de reconhecimento oficial ou não-oficial. Este foi o período da legislação sindical de 1867- 75, de vários corpos para a conciliação e 19Os países industriais importavam as matérias-primas dos atrasados: só conseguiam fazer face ao seu próprio consumo via importação da Europa oriental, Ásia, África, América e Oceania. Condição e produto desse processo foi a concentração do capital industrial (em cartéis ou konzern), com o papel dominante da banca de negócios, as big five banks da Inglaterra (Barclays, Lloyds, Midland, National, Provincial), o Deutsche Bank e o Dresdner Bank na Alemanha, a BFCI na França, a Société Générale na Bélgica, a Kreditanstalt na Áustria; e as exportações de capital: 3,7 bilhões de libras pela Inglaterra (47% no Império, 41% nas Américas, 6% na Europa); 23 bilhões de marcos pela Alemanha (53% na Europa); 120 bilhões de francos-ouro pela França (12% na Rússia; 3,3% na Turquia; 4,7% na Europa central; 8% nas colônias). Como conseqüência da exportação de capital, os países “independentes” da periferia tornam-se semi-colônias do “centro”, com limitações nas suas taxas de alfândega, e propriedade estrangeira da indústria, das obras públicas e das comunicações. O capitalismo gerara uma “poupança excedente”, as oportunidades de investimento ficaram mais raras nos países capitalistas, surgindo três alternativas para superar a depressão dos negócios decorrente: 1) Aumentar os salários reais para ampliar o mercado interno, fazendo cair ainda mais a taxa de lucro; 2) Manter os salários iguais e canalizar toda a acumulação para o progresso técnico, aumentando a parte constante do capital; 3) Investir no exterior, onde a taxa de lucro do capital era maior. A terceira alternativa era a “melhor” para os capitais excedentes nas metrópoles: investir em espaços econômicos vazios, mão de obra e matérias primas baratas e em abundância.6 A tendência do movimento do capital foi definida pela diferença da taxa de lucro de região para região, de pais para pais. Até que, finalmente, a partilha econômica e política do mundo completou-se, incluindo as ultimas zonas não ocupadas. Começou então a luta pela sua redistribuição entre as associações monopolistas e seus Estados, na procura de novos mercados e fontes de matérias primas: “As etapas de repartição pacifica são sucedidas pelo impasse em que nada resta para distribuir. Os monopólios e seus Estados procedem então a uma repartição pela força. As guerras mundiais inter-imperialistas se transformam em uma componente orgânica do imperialismo” (Lênin). Para que isso acontecesse, foi necessária uma fusão inédita entre o capital (monopolista), o interesse privado, e o Estado, suposto representante do interesse público, subordinando o segundo ao primeiro, transformando qualitativamente a função do Estado, num processo em que a aparência invertia a essência, pois se manifestava como “estatização da vida social”: o Estado absorvendo as funções antigamente desempenhadas de modo independente pela “sociedade civil”, transformando-se num monstro multi-tentacular, processo que foi estudado por Bukharin em O Imperialismo e a Economia Mundial (onde o teórico bolchevique usou a imagem do “novo Leviatã” para referir-se ao Estado imperialista). acordos de escala móvel, da defesa dos sindicatos pelos comerciantes como meio para evitar perturbações. Mas isto foi em grande parte um reconhecimento de fatos estabelecidos, embora fosse sem dúvida apressado pelo medo da força política dos artesãos e trabalhadores urbanos, que obtiveram o voto parlamentar em 1867. A transformação dos “trabalhadores militantes” em “aristocratas do trabalho” respeitáveis, teve lugar, de modo aparente, “espontaneamente”, sem qualquer mudança importante da política capitalista. Com o reconhecimento oficial do sindicalismo e a chegada da depressão na década de 1870, a colaboração das classes, consciente e deliberada, fez-se abertamente. Nesse período, nos países metropolitanos, na Inglaterra em primeiro lugar, o capital atingiu um grau de concentração inédito. A organização do movimento operário acompanhou, rápida ou tardiamente, essa concentração. Os sindicatos formados na expansão do fim da década de 1880 recrutaram trabalhadores de todos os graus de habilitação, e adotaram numerosas formas de organização. 6 Para Rosa Luxemburgo, a acumulação de capital era impossível num sistema fechado, e no âmago do problema estaria a questão da mais-valia. Para ela, “o valor de todas as mercadorias e, portanto, do capital social total, consiste no capital constante mais o capital variável mais a mais-valia. O capital constante é realizado através das compras de reposição dos próprios capitalistas; o capital variável é realizado através dos gastos que os operários fazem de seus salários; até aí tudo claro. Mas o que ocorre com a mais-valia? Uma parte é adquirida pelo capitalista para seu consumo, outra parte ele deseja acumular, e nisso está a dificuldade: ‘onde está a procura pela mais-valia acumulada?’ Os capitalistas certamente não podem realizar a mais-valia que desejam acumular vendendo-a aos trabalhadores, pois estes já esgotam seus salários na realização do capital variável. Não podem vendê-la a si mesmos, para consumo, porque estaríamos de volta à reprodução simples. ‘Quem então pode ser o recipiendário ou consumidor da poção social das mercadorias, cuja venda é um pré-requisito necessário da acumulação de capital?”. A conclusão de Rosa Luxemburgo foi que a realização da mais-valia só era possível na medida em que se abrissem ao modo de produção capitalista mercados não capitalistas. Com boa parte do globo ainda fora do sistema capitalista, a crise final só poderia acontecer num futuro longínquo. Isto não significa que Rosa propusesse uma espera passiva do colapso, pois, segundo ela, “quanto mais violentamente o capital - através de métodos militares no mundo externo, e também internamente - afasta os elementos não-capitalistas e deprime as condições de vida de toda a classe trabalhadora, tanto mais a história diária da acumulação de capital no cenário mundial se transforma numa cadeia contínua de catástrofes sociais e políticas e de convulsões que, juntamente com catástrofes econômicas periódicas na forma de crises, tornarão impossível a continuação da acumulação e farão necessária a rebelião da classe operária internacional contra o domínio do capital, antes mesmo que este se choque contra as barreiras econômicas por ele mesmo criadas”. 20 Parasitismo Capitalista John A. Hobson, economista liberal inglês, dizia em livro seminal (O Imperialismo) publicado em 1902: “Nação atrás de nação entra na máquina econômica e adota métodos avançados industriais e, com isso, se torna mais e mais difícil para seus produtores e mercadores venderem com lucro seus produtos. Aumenta a tentação de que pressionem seus governos para lhes conseguir a dominação de algum Estado subdesenvolvido distante. Em toda parte, há excesso de produção, excesso de capital à procura de investimento lucrativo. Todos os homens de negócios reconhecem que a produtividade em seus países excede a capacidade de absorção do consumidor nacional, assim como há capital sobrando que precisa encontrar investimento remunerativo além-fronteiras. São essas condições econômicas que geram o imperialismo”. A demanda de bens de consumo caíra relativamente, em função da distribuição desigual da renda líquida e da acumulação crescente de capital, que incrementara a oferta de mercadorias em proporção muito maior que o crescimento, bem mais modesto, da demanda agregada. Parte do lucro acumulado não podia ser reinvestida, resultando improdutiva, fazendo cair a taxa de expansão do capital e, sobretudo, a taxa média de lucro (ou retorno do investimento). Para fazer frente à superprodução derivada do consumo insuficiente, fazia-se necessáriaa conquista de mercados externos, o que explicava a expansão imperialista. O monopólio, o processo de fusão de empresas, contribuiu para colocar o poder na mão de poucos empresários industriais e uma enorme quantidade de riquezas, criando uma poupança automática. O investimento dessa poupança em outras indústrias contribuiu para concentra- Ia sob o controle das primeiras empresas fusionadas. Paralelamente, o desenvolvimento da sociedade industrial elevava a demanda da população, com novas necessidades. O problema surgia quando o aumento do consumo nacional era proporcionalmente menor que o aumento do índice de poupança, resultando numa capacidade de produção superior ao consumo. A solução seria a redução contínua dos preços até que as empresas menores quebrassem, privilegiando as empresas de melhor instalação, provocando mais acumulação de capital, aumento do nível de riqueza e, conseqüentemente, maior poupança. Isso induz os capitalistas a buscarem outros investimentos, para dar destino à poupança gerada, já que o mercado não podia mais absorver tal excesso, restando ao capitalista exportar mercadorias para onde não houvesse concorrência, ou investir capital em áreas mais lucrativas. Para Hobson, desde David Ricardo e Stuart Mill, a economia centrava suas atenções na produção e acumulação de riquezas, negligenciando o consumo e a utilização das riquezas já acumuladas. Hobson rechaçava a essência econômica do Imperialismo e via como a sua força motriz o patriotismo, a aventura, o espírito militar, a ambição política e a filantropia. Entretanto, Hobson não concebia o imperialismo como um negócio rentável a nenhuma nação, a não ser para os grupos financeiros, especuladores de bolsas de valores e investidores, que chamou de "parasitas econômicos do imperialismo", por colocarem no exterior o excedente ocioso de capital que não podiam investir mais lucrativamente em seu país, obtendo com isso inúmeras vantagens. Hobson propunha uma reforma social, com elevação dos salários e aumento dos impostos e gastos públicos. Ele considerava o “fenômeno imperialista” como um desajuste temporal e uma enfermidade curável do capitalismo da época, associando a expansão colonial e o desenvolvimento capitalista das metrópoles nos finais do século XIX ao excesso de poupança e ao subconsumo, em conjunto com os aspectos políticos, ideológicos e morais da época. Para Hobson, as últimas anexações da Grã-Bretanha tinham sido de alto custo e só capazes de proporcionar mercados “pobres e inseguros”. Também classificava como imperialismo o processo de submissão ao poder absoluto das metrópoles por parte das colônias. Funcionários, mercadores e industriais exerciam seu poder econômico sobre "as raças inferiores", consideradas como incapazes de auto-governo. A única vantagem real do imperialismo, segundo Hobson, era o escoamento da sobre-população industrial da Inglaterra; o movimento migratório para as colônias poupara a grande potência de “uma revolução social”. Neste ponto, não havia diferenças entre o liberal Hobson e o imperialista-racista Rhodes. Em 1885, os quatro maiores investidores mundiais - Grã-Bretanha, França, Alemanha e Estados Unidos - haviam colocado no exterior 2.681 milhões de libras esterlinas. Em 1914, essa cifra já era de 7.659 milhões; o crescimento foi espantoso. O imperialismo também provocou, mediante a importação de capitais, o desenvolvimento do comércio e das forças produtivas de vários países periféricos, incluindo o Brasil (ou mais especificamente São Paulo e Rio de Janeiro). Nos anos 1920, a participação maior no mercado brasileiro era, em primeiro lugar, de produtos norte-americanos, seguida de produtos ingleses, italianos e franceses. Cidades como São Paulo e 21 Buenos Aires eram cosmopolitas. Consumiam-se as últimas modas de Paris e se convivia com inúmeras empresas de capital totalmente estrangeiro. Em 1915, calculava-se em 40 bilhões de dólares (200 bilhões de francos), os capitais exportados pela Inglaterra, Alemanha, França, Bélgica e Holanda. Num relatório do cônsul austro-húngaro em São Paulo dizia-se: "A construção das estradas de ferro brasileiras realiza-se, na sua maior parte, com capitais franceses, belgas, britânicos e alemães; os referidos países, ao efetuarem-se as operações financeiras relacionadas com a construção, reservam-se as encomendas de materiais de construção ferroviária". O novo capital financeiro estendia assim as suas redes em todos os países do mundo, desempenhando um papel importante os bancos, bem como suas filiais “coloniais”.7 CAPITAL INVESTIDO NO ESTRANGEIRO (Em bilhões de francos) Anos Inglaterra França Alemanha 1862 3,6 -- -- 1872 15 10 -- 1882 22 15 ? 1893 42 20 ? 1902 62 27-37 12,5 1914 75-100 60 44 Diversamente do passado, os investimentos externos intra-europeus perdiam terreno diante dos investimentos nas regiões periféricas ou no mundo colonial: por volta de 1850, Europa e os EUA ainda recebiam cerca de metade das exportações de capital inglês, mas, entre 1860 e 1890, os investimentos externos para Europa caíram sensivelmente (de 25% para 8%); os investimentos diretos para os EUA passaram a declinar até sofrerem uma brusca queda durante a guerra (quando passaram de 19% para 5,5 % dos investimentos externos britânicos; Inglaterra ainda era a principal investidora mundial). DISTRIBUIÇÃO DOS CAPITAIS INVESTIDOS NO ESTRANGEIRO (1910: em bilhões de marcos) Inglaterra França Alemanha Total Europa 4 23 18 55 América 37 4 10 51 Ásia, África e Austrália 29 8 7 44 Total 70 35 35 140 7 A Inglaterra tinha em 1904 um total de 50 bancos coloniais com 2279 filiais (em 1910 eram 72 bancos com 5449 filiais); a França tinha 20 com 136 filiais; a Holanda possuía 16 com 68; enquanto a Alemanha tinha 13, com 70 filiais. 22 Hobson explicou as “contradições do imperialismo” a partir das “recorrentes crises do capitalismo, quando a superprodução se manifesta nas principais indústrias”. Hobson não escondeu que o novo imperialismo capitalista, apesar de ser um “mau negócio para a nação”, era um bom negócio para certas classes, cujos “bem organizados interesses de negócios são capazes de sufocar o débil e difuso interesse da comunidade” e de “usar os recursos nacionais para seus lucros privados”. Por outro lado, Hobson assinalava que “os termos credor e devedor, aplicados aos países, mascaram a principal característica deste imperialismo. Já que se as dívidas são ‘públicas’, o crédito é quase sempre privado”. Dentro da classe capitalista tendia a predominar a figura do rentier (que o marxista russo Nikolai Bukharin analisou na sua obra A Economia Política do Rentista) desvinculado da produção; o capital financeiro passava a comportar-se como um prestamista e, finalmente, como um agiota internacional, criando um sistema internacional de dividas cada vez maior. O imperialismo capitalista se apoiou: 1) No entrelaçamento inédito entre o capital e o Estado; 2) Na desigual força dos Estados a escala mundial, que chega ao seu extremo nas relações entre as metrópoles e as colônias. Mas isto se traduz sempre em resultados econômicos. O Brasil, por exemplo, entrou na era das ferrovias nos anos 1850, com forte presença do Estado. Políticos imperiais preferiram mobilizar capitais privados garantindo retornos de 7% ao ano sobre o capital investido. Em 1893, todas as empresas estrangeiras com garantia de lucros, excetuando-se apenas a próspera São Paulo Railroad, obtiveram a média de rentabilidade de apenas 0,3% antes do subsídio. A maioria das empresas não poderia ser construída se dependessem da própria rentabilidade, pois esta vinha exclusivamente das garantias de pagamento de taxas fixas. Em 1898, o peso destas garantias chegou a comprometer um 1/3 do orçamentoda União, motivando em 1901 o governo Campos Salles, a contragosto, à "expropriação" de doze companhias. Antes da Primeira Guerra Mundial as aquisições de ferrovias estrangeiras em dificuldades cresceram. Já em 1898, o governo detinha 34% das ferrovias diretamente e indiretamente bancava a rentabilidade. A estatização estava ligada a salvação do patrimônio privado. DÍVIDA EXTERNA BRASILEIRA (US$ MILHÕES) Não havia países onde substanciais garantias não foram oferecidas aos capitais ingleses. Nos Estados Unidos, suposto berço da livre iniciativa, o procedimento era mais sofisticado: o Estado comprava as ações das empresas ferroviárias mesmo sabendo da baixa rentabilidade. Por trás da exportação de capital para os países coloniais, estava não a aventura de capitalista "empreendedores", mas a certeza do risco zero. Uma das características do capital, para alguns sua "justificativa social", era o risco que assumia, ao imobilizar capital, de conseguir ou não a 23 rentabilidade desejada. O que vemos, porém, é um capital que se imobiliza, mas avesso a risco e dependente da intervenção do Estado. Apesar de se tratar de “capital produtivo”, sua remuneração, com garantia de rentabilidade, não é diferente daquela do capital-dinheiro aplicado em títulos da dívida pública. A possibilidade de fixação de “preços de monopólio” fez desaparecer, até certo ponto, a tendência para o progresso cientifico e técnico (inclusive quando isto se expressava, não como estagnação tecnológica, mas como ratio cada vez menor de uso do fundo acumulado de conhecimentos científicos e potenciais inovações tecnológicas, ou como uso improdutivo dos mesmos, por exemplo, através do gasto armamentista); nos países atrasados a pobreza e o desemprego tenderam a se tornar cada vez piores, incrementando incessantemente o fosso da desigualdade entre países “ricos” e “pobres”; finalmente, o desenvolvimento anárquico da produção provocou um saque dos recursos naturais que criou uma tendência para a destruição do meio natural. Ao realizar a unificação imediata da economia mundial sob a égide do capital financeiro,8 o imperialismo fez nascer, como conseqüência da exacerbação das suas contradições e da própria tendência para a intervenção estatal, a idéia e a realidade de uma ordem mundial a ser preservada por meios políticos supranacionais. A Conferência de Berlim, de 1884, não foi simples continuidade da Santa Aliança de 1815, embora perseguisse também um objetivo “ordeiro”. E foi a ante-sala de tentativas mais ousadas. Racismo e Darwinismo Social Hobson, via por trás das classes “imperialistas”, o grande “capital cosmopolita”, em primeiro lugar a indústria pesada, direta e indiretamente interessada nos gastos de armamento: “O imperialismo agressivo, que custa caro ao contribuinte, é fonte de grandes lucros para o investidor que não encontra no interior um emprego lucrativo para o seu capital”. Leva a que “malvados demagogos políticos controlem a imprensa, as escolas e se necessário as igrejas, para impor o capitalismo às massas”. Hobson conhecia as raízes profundas do imperialismo, “cuja essência consiste no desenvolvimento dos mercados para o investimento e não para o comércio”, e não em “missões de civilização” ou “manifestações de destino”. A monopolização industrial mudou a composição e a organização da classe operária, assim como a sua composição política. A organização do movimento operário acompanhou, rápida ou tardiamente, a concentração econômica. Os sindicatos formados na expansão do fim da década de 1880 recrutaram trabalhadores de todos os graus de habilitação, e adotaram numerosas formas de organização. Muitos sindicatos se fundiram para formar “sindicatos gigantes” (dois deles incluíram ao redor de um quarto do total dos membros dos sindicatos ingleses). A classe operária transformou-se numa força social incontornável, de um modo sem precedente. A política nas metrópoles capitalistas mudaria de modo definitivo devido a esse fato. Foi no auge do imperialismo inglês que surgiu, na Inglaterra antes que na Europa continental, o primeiro movimento político socialista reformista, isto é, que renunciava à via revolucionária para se opor à exploração capitalista. A Fabian Society, baseada no nome do cônsul reformador da antiga Roma (Quinto Fabio Máximo, chamado “o contemporizador”), foi fundada em Londres em 1884, por um grupo de intelectuais entre os que se destacavam o dramaturgo George Bernard Shaw e o casal Sidney e Beatrice Webb. O gradualismo reformista dos “fabianos” se contrapunha explicitamente ao socialismo revolucionário marxista. Os fabianos se engajaram em numerosas lutas pela melhora material e moral da classe operária. Mas fizeram isto chegando a apoiar, declaradamente, a política imperialista da Inglaterra, que era, supostamente, benéfica para a economia inglesa no seu conjunto e, portanto, também para as camadas populares. Junto com as trade-unions (sindicatos), a Fabian Society foi um ponto de apoio para a criação do Labour Party (Partido Trabalhista) em 1906. O imperialismo especificamente capitalista, como vimos, resultou de uma crise e uma depressão de dimensões inéditas, que marcou um ponto de virada na história do capitalismo, cujas conseqüências seriam o redimensionamento do mapa industrial e econômico do mundo, a conseqüente redistribuição do poder político e militar, e a redefinição do sistema monetário internacional no quadro do surgimento do capital financeiro como figura dominante do capital. Todo o sistema econômico mundial testemunhou a marcha acelerada para um período de tensões sem precedentes. A vantagem comparativa na sua construção de indústrias novas (aço, química, energia e máquinas elétricas) passou da Inglaterra para os EUA e a Alemanha, que poderiam agora desfrutar de uma economia externa, já usada pela Inglaterra no século XIX, e de uma enorme ampliação do 8 “A exportação de capital influi sobre o desenvolvimento do capitalismo nos países onde o capital é aplicado, acelerando-o extraordinariamente. Se, por esta razão, tal exportação pode ocasionar, até certo ponto, uma determinada estagnação do desenvolvimento dos países exportadores, isto só pode ser produzido à custa da ampliação e do aprofundamento do desenvolvimento do capitalismo no mundo todo”, disse Lênin. 24 mercado interno. Os elementos decisivos foram a unificação alemã e o grande crescimento da sua população, e a emigração em massa da Europa para os EUA. A maior parte da população dos países imperialistas acreditava que a dominação colonial era justa e até benéfica à humanidade, em nome de uma ideologia do progresso etnocêntrica, baseada na idéia de que existiam povos - europeus - superiores a outros; o racismo e o darwinismo social interpretavam a teoria da evolução à sua maneira, afirmando a hegemonia de alguns pela seleção natural. Na medida em que amadureceram as contradições do processo de acumulação nacional nos países capitalistas avançados, os aparelhos de Estado (repressivos e ideológicos) passaram a ser usados no sentido de garantir a exportação de capital, atenuando a resistência das classes sociais oprimidas. Os “darwinistas sociais” eram a variante mais resoluta daqueles que, com Herbert Spencer à cabeça, transpunham para a sociedade as (reais ou supostas) leis da evolução biológica. Presumiam que a sociedade estava condenada à luta eterna. Essa foi a ideologia central da época. Segundo Arno Mayer, “com o renascimento do estatismo, a ênfase da fórmula sincrética social-darwinista se deslocou da santificação da competição desregrada da economia e da política do laissez-faire para a justificação das lutas disciplinadas do imperialismo social, tanto a nível interno como externo. No final do século XIX, a luta organizada pela sobrevivência entre as nações eclipsouos conflitos desordenados no interior da sociedade. Essa transposição da disputa permanente da esfera nacional para a internacional coincidiu com uma grande transformação na concepção de mundo das classes dominantes e governantes: de um tradicionalismo confiante e flexível para um conservadorismo, para não dizer reação, pessimista e rígido. As antigas elites estavam preparadas para empregar a supremacia ressurgente da política exterior e imperial para reforçar suas posições internas. Apoiadas pela casta guerreira poderiam, até, se declarar especialmente qualificadas para dirigir a guerra de todos contra todos na arena mundial, onde a vitória militar constituiria a suprema prova de aptidão”. A segunda metade do século XIX deu lições às potências determinadas a lutar pela supremacia internacional, mais do que pela mera sobrevivência. A conquista da Alemanha pela Prússia, a ascendência do Piemonte na Itália e o triunfo do norte na Guerra Civil americana haviam validado a “lei dos fortes”. Por sua vez, a derrota da França em 1870, a rendição da Espanha em 1898 e os malogros da Inglaterra na guerra dos bôers mostraram as conseqüências da fragilidade e decadência nacionais. Os conflitos sociais, outrora glorificados como fonte e sinal de vigor, agora eram acusados de roubar a força externa da nação.9 As bases reais do imperialismo, no entanto, residiam, como dizia Hobson, no “excesso de capital em busca de investimento” e nos “recorrentes estrangulamentos do mercado”. O imperialismo europeu transformara a Europa em uma área dominada por “um pequeno grupo de aristocratas ricos, que tiram suas rendas e dividendos do Extremo Oriente, junto com um grupo um pouco mais numeroso de funcionários e comerciantes, e um grupo maior ainda de criados, trabalhadores de transportes e operários das indústrias manufatureiras. Desaparecem então os mais importantes ramos industriais, e os alimentos e semi-elaborados chegam como tributo da Ásia e África”. Hobson considerava que uma perspectiva de “federação européia”, neste caso, “não apenas não faria avançar a obra da civilização mundial, como apresentaria o gravíssimo risco de um parasitismo ocidental, sob o controle de uma nova aristocracia financeira”. Do liberal Hobson ao marxista Lênin (passando por diversos outros autores) foi enfatizada a base econômica (capitalista) do imperialismo finissecular. A relação entre a Bolsa (as companhias capitalistas), a partilha colonial, e o desenvolvimento do capital financeiro, foi o eixo da interpretação 9 Certamente, não faltou ao darwinismo social uma expressão filosófica mais sofisticada, como já tinha acontecido com o laissez- faire. Segundo o mesmo Mayer: “O darwinismo social justificou mais do que provocou o realinhamento europeu quanto a perspectivas e políticas. Proporcionou um apoio pseudocientífico para as antigas classes dominantes e governantes que vinham se reafirmando. O darwinismo social se adequava à sua mentalidade elitista, onde a idéia de desigualdade estava profundamente enraizada. Em sua concepção, homens eram desiguais por natureza, e o mesmo ocorria quanto à estrutura da sociedade, para sempre destinada a ser dirigida pela minoria dos mais aptos a governa-Ia. O darwinismo social e o elitismo brotaram de um único e mesmo solo. Ambos desafiavam e criticavam o Iluminismo do século XIX, e mais particularmente as pressões pela democratização social e política. O termo elite, carregado de valores, só se definiu como tal de forma plena no final do século XIX, e recebeu sua mais ampla e corrente aceitação em sociedades ainda dominadas pelo elemento feudal. Mas, por toda a Europa, as teorias da elite espelhavam e racionalizavam práticas predominantes correntes, ao mesmo tempo em que serviam como arma na batalha contra o nivelamento político, social e cultural. Nietzsche foi o menestrel-mor dessa batalha. Não obstante as contradições e elipses propositadamente provocadoras de seus textos, seu pensamento era coerente e consistentemente antiliberal, antidemocrático e anti-socialista. Nietzsche era um social darwinista inveterado, e do tipo pessimista e brutal. Para ele, o mundo era um lugar de luta permanente, não só pela mera existência ou sobrevivência, mas também pela dominação, exploração e subjugação criativas”. No início do século XX, Leon Trotsky foi o primeiro marxista a criticar as teorias elitistas nietzscheanas, cujo sucesso, no mundo intelectual, Trotsky qualificou de expressão passageira de uma pequena burguesia metropolitana. 25 objetiva do novo imperialismo. Os aspectos políticos (nacionalistas) e ideológicos (racistas ou etnocêntricos) eram considerados conseqüência, e não causa, do fenômeno.10 Hobson também se referiu ao novo imperialismo japonês. Em inícios do século XX já era clara a percepção do fato de que o crescimento da potência imperialista do Japão ia incidir profundamente no curso da história, com suas próprias características específicas e muito além das convencionais considerações militaristas ou ideológicas: “Este novo capítulo da história mundial muito depende da capacidade japonesa de manter sua própria independência financeira”. Superada uma primeira fase de dependência, “a grande potência industrial do Extremo Oriente pode rapidamente lançar-se sobre o mercado mundial como o maior e mais válido competidor na grande indústria mecânica, conquistando primeiro o mercado asiático e pacífico e logo invadindo os mercados ocidentais- empurrando assim estas nações a um protecionismo mais rígido, como corolário de uma proteção diminuída”. O imperialismo também desdobrou-se em “aculturação” dos povos dominados: nos países sem uma língua oficial, o idioma do colonizador tornou-se língua nacional. As línguas européias (inglês, francês, espanhol, português) assumiram um caráter universal. A dominação da cultura ocidental teve como resultado imediato à desnacionalização das classes dominantes das colônias, através da imposição de uma elite local "ocidentalizada". Estes líderes nativos "importavam", cada vez mais, a cultura ocidental, desprezando a sua cultura tradicional. Outra grande influência cultural foi a religião. O ocidente impôs as duas variantes do cristianismo (catolicismo e protestantismo) ao mundo não-cristão. Apesar de não penetrar no sólido Islã, a religião ocidental triunfou nas populações animistas da África subsaariana. Nesta época se realizaram missões de caráter maciço, que submeteram os povos "inferiores" à “verdadeira religião de Deus”. Também no ocidente os efeitos sócio-culturais do imperialismo mostraram durabilidade, estando presentes até hoje, especialmente na sociedade européia. A grande novidade sócio-cultural do século XIX na sociedade ocidental foi a emergência da xenofobia e do racismo. Os povos não-europeus passaram a ser considerados inferiores, atrasados e indesejados. Os valores destas culturas eram irrelevantes e vítimas do desprezo e opressão da sociedade positivista. Era o fim do mito do "bom selvagem" (nativo não corrompido pela sociedade). Esta idéia de superioridade branca estava intimamente ligada ao imperialismo. Os europeus consideravam-se os guardiões da "luz" da civilização: à usual tríade do orgulho "branco" (ciência, tecnologia e indústria) juntou-se um novo elemento de glorificação: as colônias e a submissão das raças inferiores (dominação mundial da raça branca). O racismo percorria toda a sociedade burguesa. Além de contaminar a alta burguesia, a xenofobia era genuinamente popular, sobretudo na crescente classe média (veículo privilegiado do emergente nacionalismo). Nas colônias o mais simples funcionário branco humilhava os locais, visto que não eram considerados totalmente humanos ou merecedores da cidadania. Ao colonialismo era dada uma imagem de tarefa árdua que beneficiava muito mais o colonizado do que o colonizador,caracterizada como missão e um "dever moral", que levaria aos "povos atrasados" a higiene, a ciência, o cristianismo - o progresso. A “obra civilizadora” legitimava a dominação política e econômica. Construiu-se a imagem de que os europeus seriam sempre superiores aos habitantes das colônias, aos quais davam ordens. Nas palavras de Hobsbawm, “em Dakar ou Mombaça, o mais modesto funcionário era um amo e era aceito como um gentleman por pessoas que não teriam notado sua existência em Paris ou Londres; o operário branco era um comandante de negros". A sistematização do preconceito racial tornou-se numa realidade, bem como a formação de facções racistas por toda a Europa. Os sentimentos racistas eram realçados pela emigração dos povos inferiores. As “remessas” constantes de estrangeiros agravavam os problemas das cidades metropolitanas (miséria, criminalidade, etc.), sendo, por isso, encaradas como um perigo para a sociedade burguesa dominada pela classe média. Era perfeitamente visível a ligação entre sentimentos nacionalistas - racismo – e classe média metropolitana, que ganhava força através da direita política. As idéias da extrema direita detinham um enorme eco junto a esta 10 As conseqüências bélicas do imperialismo levariam o racismo à sua conclusão lógica em termos históricos: o genocídio. Armênios e judeus, na Eurásia, foram vítimas de uma tendência mundial que, mais silenciosa, vicejou na África dos “holocaustos coloniais” estudados por Mike Davis, no livro de mesmo nome. Em A Era dos Extremos, Eric Hobsbawm tentou explicar o aumento da dimensão dos massacres no século XX a partir da disseminação de uma “cultura da violência” e do desprezo pela vida dos outros, que teria sido gerada pela Primeira Guerra Mundial, a qual teria acostumado à população européia a ser indiferente às carnificinas sistemáticas. E, também, a ser tão profundamente pacifista que não se dispunha a enfrentar atentados violentos à própria “legalidade civil”, criando uma massa de veteranos de guerra dispostos a guiar os seus povos para renovadas hecatombes. A principal causa da reprodução do imaginário da indiferença e da brutalidade teria sido a invenção de meios assépticos e impessoais de matar, como o bombardeiro e o rifle de longo alcance, os quais facilitariam a aceitação da violência a partir de desenvolverem a impessoalidade da guerra. 26 comunidade (comerciantes, lojistas, artesãos, funcionários públicos), erguendo-a contra o inimigo declarado: o estrangeiro. Com a resposta positiva de parte da população, a ala direita nacionalista tomou o papel de líder do racismo, com atitudes agressivas em relação a judeus e estrangeiros. Assim, a extrema direita do século XIX (antecessores do fascismo) constituiu-se num movimento chauvinista, fundamentado na idealização da superioridade e expansão nacional. Esta mensagem (base do racismo em geral) era bem aceite pelo “cidadão comum” (common people), ao acreditar piamente na superioridade natural do seu povo sobre os estrangeiros.Segundo Hobsbawm "é impensável que os soldados da Primeira Guerra Mundial não detivessem um certo egoísmo nacional incondicional". A era do império foi a era clássica do racismo. A solidificação deste sentimento será talvez o efeito mais marcante do imperialismo. Os números da colonização, vistos nos quadros e tabelas precedentes, não cabalmente expressam sua realidade espantosa, em especial no chamado “continente negro”. A catástrofe africana já começara no antigo sistema colonial, com a conquista da cidade de Ceuta, no norte da África, em 1415, estendendo-se em seguida, pela costa africana, e transformando a sua população negra, nos séculos posteriores, na principal commodity da economia mundial. A população da África “negra” era, no final do século XIX, de três a quatro vezes menor do que no século XVI. A conquista colonial capitalista (com uso de artilharia contra, no máximo, fuzis dos povos coloniais), o trabalho forçado multiforme e generalizado, a repressão das numerosas revoltas por meio do ferro e do fogo, a subalimentação, as diversas doenças locais, as doenças importadas e a continuação do tráfico negreiro oriental, reduziram ainda mais a população que baixou para quase um terço. Apesar de alguns territórios africanos já pertencerem a europeus antes de 1870, é só a partir dessa década que começou o imperialismo capitalista no continente. Em 1876, só 10,8% do território africano estava dominado por povos colonialistas. Em 1900, a porcentagem era 90,4%. Um dos pioneiros dessa dominação foi o rei belga, Leopoldo II, que em 1876 tomou posse de todo o território do Congo, e em 1908 vendeu-a ao próprio governo de seu país. França, por sua vez, conquistou a Argélia em 1832, a Tunísia em 1881 e logo depois o Marrocos. A Grã- Bretanha tornou o Egito seu protetorado em 1882 e, pouco depois, apossou-se do Sudão. Em 1902, o Sul da África também seria colocado sob sua tutela. Em 1884, 14 países europeus, junto com os Estados Unidos e a Rússia, celebraram o acordo da Conferência de Berlim, onde firmaram as regras de dominação desse território. Essa conferência passou a ser conhecida historicamente como a "partilha da África", e acabou por acirrar ainda mais as disputas territoriais por áreas livres no continente africano. A história colonial de Leopoldo II, rei da Bélgica (1835-1909), no Congo, expõe um dos genocídios mais sangrentos da era contemporânea. Na Europa, Leopoldo disfarçava sua “obra” de uma aureola de altruísmo, defesa do livre comércio e luta contra o comércio de escravos, mas, na África, expropriava os povos locais de todas suas terras e recursos, com seu exército privado, que submetia à população a trabalhos forçados. A crueldade repressiva incluía assassinatos, violações, corte de partes do corpo e decapitações. 10 milhões de congoleses, estimadamente, perderam a vida entre 1885 (ano do reconhecimento internacional do “Livre Estado do Congo” [sic]) até 1908 (alguns autores elevam a cifra até 20 milhões). Leopoldo morreu em 1909; durante seu reinado a população do Congo se reduziu, estimadamente, em dois terços (de 30 para nove milhões de habitantes). A devastação da população do mundo colonial e semi-colonial combinou a violência direta e a “indireta” (a dizimação populacional como resultado da marginalização social), o que levou Mike Davis a questionar por que, no século em que a fome desapareceu para sempre da Europa ocidental, ela “aumentou de forma tão devastadora em grande parte do mundo colonial? Do mesmo modo, como pesarmos as presunçosas afirmações sobre os benefícios vitais do transporte a vapor e dos modernos mercados de grãos, quando tantos milhões, sobretudo na Índia britânica, morreram ao lado dos trilhos das ferrovias ou nos degraus dos depósitos de grãos? E como explicarmos, no caso da China, o drástico declínio na capacidade do Estado de proporcionar assistência social popular, em especial no socorro à fome, que pareceu seguir a passo travado a forçada "abertura" do império para a modernidade pela Grã-Bretanha e as outras potencias... “Não estamos tratando de "terras de fome" paradas nas águas estagnadas da história mundial, mas do destino da humanidade tropical no exato momento (1870-1914) em que sua mão-de-obra e seus produtos eram dinamicamente recrutados para uma economia mundial centralizada em Londres. Milhões morreram, não fora do "sistema mundial moderno", mas exatamente no processo de violenta incorporação nas estruturas econômicas e políticas desse sistema. Morreram na idade de ouro do capitalismo liberal; na verdade, muitos foram assassinados, como veremos, pela aplicação teológica dos princípios sagrados de Smith, Bentham e Mill. Mas o único historiador do século XX que parece ter claramente compreendido que as grandes fomes vitorianas (pelo menos, no caso indiano) eram capítulosintegrais na história da modernidade capitalista foi Karl Polanyi, em seu 27 livro de 1944, The Great Transformation. "A verdadeira origem das fomes nos últimos cinqüenta anos", escreveu, "foi a livre comercialização de grãos, combinada com a falta de rendimentos locais"”.11 A fúria da conquista colonial, que teve em considerações racistas de “superioridade civilizacional” seu principal alicerce ideológico (até setores da Internacional Socialista, confinada basicamente à Europa, como vimos, admitiam a expansão colonial em nome da “obra civilizadora” de seus países) produziu vítimas em número maior aos holocaustos europeus do século XX, e fez também nascerem movimentos de resistência, que, finalmente, incorporaram os povos coloniais à luta política mundial contemporânea.12 Na “era do imperialismo”, no entanto, não houve convergência entre a resistência dos povos coloniais e a luta do proletariado metropolitano. A maioria da classe operária das metrópoles achava que poderia tirar vantagem da conquista colonial (e, de fato, tirava-as, pelo menos suas camadas mais bem posicionadas, que foram denominadas de “aristocracia operária”). O exemplo dos exilados franceses da Comuna de Paris, confinados pelas autoridades na Nova Caledônia, e que ali se opuseram à luta do povo local pela sua independência, é talvez o exemplo mais acabado de um drama histórico que só começaria a ser superado no século XX, com a vitória da Revolução de Outubro, e o chamado da Internacional Comunista (IC) à unificação da luta dos povos coloniais com a luta de classe dos operários das metrópoles, o que já justificaria a existência da IC, quaisquer que fossem seus desdobramentos ulteriores. Teorias do Imperialismo A teoria do imperialismo de Lênin se inseriu no quadro de um amplo debate com a participação de autores marxistas e não-marxistas (Bukharin, Kaustsky, Hobson, Hilferding, Rosa Luxemburgo) e de longos anos de discussão no interior do movimento operário e socialista internacional. Suas características essenciais são conhecidas: papel decisivo do monopólio, surgimento do capital financeiro como produto da fusão do capital bancário e industrial, predomínio da exportação do capital sobre a exportação de mercadorias, divisão do mercado mundial entre os monopólios capitalistas e competidores, conclusão da divisão territorial do mundo. A definição mais breve possível do imperialismo seria, segundo Lênin, “a fase monopolista do capitalismo”. A visão antitética à de Lênin foi posta, ulteriormente, por Schumpeter, para quem o imperialismo contemporâneo não era parte orgânica do capitalismo, mas fruto de sobrevivências pré-capitalistas, ainda não eliminadas: situadas em diversas esferas (política, cultural, econômica) essas sobrevivências se contraporiam à lógica do capital, mas seriam capazes de se impor politicamente, gerando a política imperialista. Em O Capital, de Marx, a concentração e centralização do capital como resultado inevitável da luta competitiva são mencionados no volume I, e são tratados mais especificamente no volume III, onde se relacionam com as mudanças estruturais já visíveis no capitalismo e que estavam preparando o caminho para o capitalismo monopolista. Veja-se, por exemplo, as observações de Marx sobre o surgimento da empresa comercial e os empresários, o papel da bolsa de valores e dos bancos. Engels também trata brevemente dessas tendências no Anti-Dühring, e no resumo dessa obra, Do Socialismo Utópico ao Socialismo Científico, onde as sociedades anônimas são caracterizadas como o ponto mais alto da organização capitalista da produção, ou seja, como a ante-sala da socialização dos meios de produção. Não só o monopólio encontrava-se antecipado n’O Capital, mas também a base para a análise dos super- benefícios obtidos pelo capital monopolista da exploração das nações atrasadas, baseada nos diversos níveis de desenvolvimento das forças produtivas: “Conforme a produção capitalista se desenvolve em um país, a 11 “Cada seca global foi o sinal verde para uma corrida imperialista pela terra. Se a seca sul-africana de 1877, por exemplo, foi a oportunidade de Carnarvon para atacar a independência zulu, a fome etíope de 1889-91 foi o aval de Crispi para construir um novo Império Romano no Chifre da África. Também a Alemanha guilhermina explorou as inundações e a seca que devastaram Shandong no final da década de 1890 para expandir agressivamente sua esfera de influência no norte da China, enquanto os Estados Unidos, ao mesmo tempo, usaram a fome e a doença causadas pela seca como armas para esmagar a República das Filipinas de Aguinaldo. Mas as populações agrícolas de Ásia, África e América do Sul não entraram tranqüilamente na nova Ordem Imperial. As fomes são guerras pelo direito de existência. Embora a resistência à fome na década de 1870 (à parte o sul da África) fosse esmagadoramente local e turbulenta, com poucos casos de organização insurrecional mais ambiciosa, sem a menor dúvida teve muito a ver com as recentes lembranças do terror de estado da repressão do Motim Indiano e da Revolução de Taiping. A década de 1890 foi uma história inteiramente diferente, e os historiadores modernos têm estabelecido com muita clareza a contribuição da seca/ fome na Rebelião dos Boxers, no movimento coreano de Tonghak, na sublevação do Extremismo Indiano e na Guerra de Canudos brasileira, além de inúmeras revoltas no leste e no sul da África. Os movimentos milenaristas que varreram o futuro "terceiro mundo" em fins do século XIX extraíram grande parte de sua ferocidade e escatológica da agudeza dessas crises de subsistência e ambientais”. 12 No fundo, a isso se restringiu a “progressividade” do colonialismo capitalista. 28 intensidade e a produtividade do trabalho dentro dele vai remontando-se sobre o nível internacional. Por conseguinte, as diversas mercadorias da mesma classe produzidas em países distintos durante o mesmo tempo de trabalho têm valores internacionais distintos expressos em preços distintos, quer dizer, em somas de dinheiro que variam segundo os valores internacionais... De acordo com isto, o valor relativo do dinheiro será menor nos países em que impere um regime progressivo de produção capitalista do que naqueles em que impere um regime capitalista de produção mais atrasado. Daqui se segue igualmente que o salário nominal, o equivalente de força de trabalho expresso em dinheiro, tem que ser também maior nos primeiros países que nos segundos: o que não quer dizer, de modo algum, que este critério seja também aplicável ao salário real. Ainda prescindindo das diferenças relativas em relação ao valor relativo do dinheiro nos diferentes países, encontramos com freqüência que o salário (diário, semanal, etc.) é maior nos primeiros países do que nos segundos, enquanto que o preço relativo do trabalho, isto é, o preço do trabalho em relação tanto com a mais-valia como com o valor do produto, é maior nos segundos países do que nos primeiros”. Marx já chegara à conclusão de que se produzia um movimento de capitais desde os países mais adiantados até os mais atrasados, em busca de taxas de lucro superiores. Cria-se uma taxa de lucro média internacional, na qual as taxas de lucro dos países ricos estavam abaixo da média internacional e a dos pobres, acima, o que era a base do super-benefício dos monopólios. Para Lênin, o capital monopolista expressava as leis básicas de movimento de capital em condições históricas concretas: “Essa mudança é devida ao desenvolvimento, ampliação e extensão das tendências mais profundas e essenciais do capitalismo e da produção mercantil em geral. As trocas comerciais crescem, a produção aumenta. Estas tendências marcantes foram observadas ao longo dos séculos no mundo todo. Ora, a um certo nível do desenvolvimento das trocas, a um certograu de desenvolvimento da grande produção, atingido mais ou menos na virada para o século XX, o movimento comercial determinou uma internacionalização das relações econômicas e do capital; a grande produção adquiriu proporções tais que os monopólios substituíram a livre concorrência”. A relação entre a Bolsa (as companhias capitalistas), a partilha colonial, e o desenvolvimento do capital bancário, foi o eixo da interpretação feita por Lênin, em seu opúsculo O Imperialismo, Fase Superior do Capitalismo, que associaria as noções de capital monopolista, capital financeiro e imperialismo: “Os bancos se transformam e, de modestos intermediários, viram poderosos monopólios, que dispõem da quase totalidade do capital-dinheiro do conjunto dos capitalistas e dos pequenos proprietários, assim como da maior parte dos meios de produção, e das fontes de matérias primas de um dado país, ou de vários países”. Marx já tinha se adiantado a esse processo. Em O Capital, a concentração e centralização do capital como resultado inevitável da luta competitiva eram mencionados no volume I, e tratados no volume III, relacionados com as mudanças estruturais já visíveis no capitalismo e que estavam preparando o caminho para o «capitalismo monopolista»: “a teoria do imperialismo trata da forma fenomênica especial que adota o processo (capitalista) em uma etapa particular do desenvolvimento do modo de produção capitalista” (Tom Kemp). Para Nikolai Bukharin, o imperialismo era “a reprodução ampliada da concorrência capitalista”: “não é pelo fato de constituir a época do capitalismo financeiro um fenômeno historicamente limitado que se pode, entretanto, concluir que ela tenha surgido como um deux ex machina. Na realidade, ela é a seqüência histórica da época do capital industrial, da mesma forma que esta última representa a continuidade da fase comercial capitalista. Esta é a razão por que as contradições fundamentais do capitalismo - que, com seu desenvolvimento, se reproduzem em ritmo crescente - encontram, em nossa época, expressão particularmente violenta”. Bukharin resumiu as características essenciais do imperialismo econômico, tirando delas conclusões históricas e políticas: “O desenvolvimento das forças produtivas do capitalismo mundial deu um salto gigantesco nas últimas décadas. No processo de luta pela concorrência, a grande produção saiu vitoriosa em todas as partes, agrupando os magnatas do capital em uma férrea organização que estendeu sua ação à totalidade da vida econômica. Uma oligarquia financeira instalou-se no poder e dirige a produção, que se encontra reunida em um só feixe por meio dos bancos. Este processo de organização partiu de baixo para se consolidar no marco dos Estados modernos, que se converteram nos intérpretes fiéis dos interesses do capital financeiro. Cada um das economias nacionais desenvolvidas, no sentido capitalista da palavra, transformou-se em uma espécie de trust nacional de Estado. De outro lado, o processo de organização das partes economicamente avançadas da economia mundial é acompanhada de um agravamento extremo da concorrência mútua. “A superprodução de mercadorias, inerente ao desenvolvimento das grandes empresas, a política de exportação dos cartéis e a redução dos mercados por causa da política colonial e aduaneira das potências capitalistas; a desproporção crescente entre a indústria, de desenvolvimento formidável, e a agricultura, atrasada; enfim, a 29 imensa proporção da exportação de capital e a submissão econômica de países inteiros por consórcios de bancos nacionais, levam o antagonismo entre os interesses dos grupos nacionais do capital até o paroxismo. Estes grupos confiam, como último recurso, na força e potência da organização do Estado e em primeiro lutar da sua frota e de seus exércitos... Uma unidade econômica e nacional, auto-suficiente, aumentando sem fim sua força até governar o mundo em um império universal, tal é o ideal sonhado pelo capital financeiro”. Trotsky analisou em que medida essa mudança histórica se contrapunha à perspectiva inicialmente traçada por Marx (“O país mais desenvolvido industrialmente - escreveu Marx no prefácio da primeira edição d’ O Capital - não faz mais do que representar a imagem futura do menos desenvolvido”): “Somente uma minoria de países realizou completamente a evolução sistemática e lógica desde a mão-de-obra, através da manufatura doméstica até a fábrica, que Marx submeteu à uma análise detalhada. O capital comercial, industrial e financeiro invadiu, desde o exterior, os países atrasados, destruindo em parte as formas primitivas da economia nativa e, em parte, sujeitando-os ao sistema industrial e banqueiro do Oeste. Sob a imensa pressão do imperialismo, as colônias e semi-colônias se viram obrigadas a abrir mão das etapas intermediárias, apoiando-se ao mesmo tempo artificialmente em um nível ou em outro. O desenvolvimento da Índia não duplicou o desenvolvimento da Inglaterra; não foi para ela mais que um complemento”. Bukharin também criticou as fórmulas expostas por Kautsky (com a sua teoria do “super-imperialismo”, um imperialismo tão concentrado que superaria as contradições nacionais, incluídas as contradições entre as potências): “O processo de internacionalização dos interesses capitalistas obriga imperiosamente à formação de um trust capitalista estatal mundial. Qualquer que seja, entretanto, seu vigor, este processo se vê contrariado por uma tendência mais forte à nacionalização de capital e ao fechamento de fronteiras”. Assim como o intercâmbio comercial com as regiões periféricas tinha sido, no século XIX, um pilar da ordem européia, os super-benefícios monopolistas cumpririam, no século XX, um papel semelhante, ao permitir à burguesia dos países imperialistas a elevação artificial do nível de vida de uma camada da classe operária metropolitana (a “aristocracia operária”), pondo um obstáculo ao desenvolvimento revolucionário. O fenômeno já tinha sido embrionariamente captado por Engels: “O proletariado inglês está-se tornando cada vez mais burguês; de modo que, ao que parece, esta nação mais burguesa que todas as demais tende a ter, em última instância, tanto uma aristocracia burguesa, como uma burguesia. Certamente, isto se explica até certo ponto no caso de uma nação que explora o mundo inteiro” 11. Mas Engels ainda “afirmava que esta aristocracia operária se tornara possível graças ao monopólio industrial da Inglaterra e que, portanto, desapareceria ou se confundiria com o resto do proletariado com o fim daquele monopólio” 13. Foi justamente a análise do conjunto dos desdobramentos da expansão mundial do capital, em sua situação histórica concreta, o que faltou à teoria do imperialismo de Rosa Luxemburgo, para quem o imperialismo era a necessidade inelutável do capital, de qualquer capital e não necessariamente do monopolista. Se para Lênin o imperialismo era a fase monopolista do capitalismo, para a Rosa Luxemburgo era a forma concreta que adota o capital para poder continuar sua expansão, iniciada nos próprios países de origem e levada, por sua própria dinâmica interna, ao plano internacional, em que se implanta e cria as bases de seu próprio desmoronamento. Na conclusão mais geral, Rosa Luxemburgo afirmou que “deste modo o capital prepara duplamente sua derrubada: por um lado, ao estender-se a custa das formas de produção não-capitalistas, aproxima-se o momento em que toda a humanidade se comporá efetivamente de operários e capitalistas, situação em que a expansão ulterior e, portanto, a acumulação, far-se-ão impossíveis. Por outro lado, à medida que avança, exaspera os antagonismos de classe e a anarquia econômica e política internacional a tal ponto que provocará uma rebelião do proletariado mundial contra seu domínio muito antes que a evolução econômica tenha chegado a suas últimas conseqüências: a dominação absolutae exclusiva do capitalismo no mundo”. A suposta necessidade orgânica para o capital de setores não capitalistas para expandir-se, foi objeto da critica de Grossman: “Se os partidários da teoria de Rosa Luxemburgo querem reforçar esta teoria mediante a alusão à crescente importância dos mercados coloniais de saída; se eles se remetem ao fato de que a participação colonial no valor global das exportações da Inglaterra representava em 1904 pouco mais de um terço, enquanto que em 1913 esta participação se aproximava de 40%, então esta argumentação que sustentam a favor daquela concepção carece de valor, e, mais que isto, com ela conseguem o contrário do que pretendem obter. Pois estes territórios coloniais têm realmente cada vez mais importância como áreas de colocação. Mas só na medida em que se industrializam; na medida em que abandonam o seu caráter não capitalista”. 30 A teoria marxista do imperialismo foi objeto de inúmeras controvérsias. A “teoria do intercâmbio desigual” foi defendida por Arghiri Emmanuel e resumida por Samir Amin: “O imperialismo, no sentido leninista do termo, aparece quando as possibilidades do desenvolvimento capitalista se esgotam, depois de terminada a primeira revolução industrial na Europa e América do Norte. Então se impõe uma nova extensão geográfica. Surge a periferia, em sua forma contemporânea, amparada pela conquista colonial. Esta volta a pôr em contato -ainda que sob formas novas- formações sociais diferentes: as do capitalismo central e as do capitalismo periférico em vias de constituição. O mecanismo de acumulação primitiva em benefício do centro reaparece. “O próprio da acumulação primitiva, por oposição à reprodução ampliada normal, é precisamente o intercâmbio desigual, quer dizer, o intercâmbio de produtos cujos preços de produção, no sentido marxista, são desiguais. A partir deste momento, a remuneração do trabalho começará também a ser desigual. Esta nova especialização internacional constituirá a base de intercâmbio das mercadorias (produtos de base por produtos manufaturados, fazendo uma descrição superficial) e o movimento de capitais, posto que as possibilidades da primeira revolução industrial se esgotaram precisamente quando se constituíram os monopólios, que tornaram possível esta exportação de capital”. Segundo essa teoria, o proletariado metropolitano estaria objetivamente interessado na exploração das nações atrasadas, porque compartilharia com “sua” burguesia os frutos da exploração dos operários e camponeses da periferia. Segundo Marx, por outro lado, o “próprio da acumulação primitiva” não era a troca desigual, mas a violência. Partindo de uma premissa diversa, para Amin, a “troca desigual” de produtos com preços de produção diferentes configuraria uma nova “acumulação primitiva”, o que significaria afirmar que o capitalismo está nascendo novamente. A este absurdo se chega ao identificar o inidentificável, a saber, a troca (desigual, mas igualmente troca) com a expropriação compulsória e violenta, características da acumulação originária. O caráter combinado da economia dos países atrasados é justamente uma conseqüência do desenvolvimento desigual do capitalismo em escala mundial: naqueles o capitalismo nasce sem que tivesse podido se desenvolver plenamente a acumulação originária, sob a influência da penetração do capital financeiro internacional. Juan Pablo Bacherer deixou claro o equívoco da concepção citada: “A frustração da acumulação originária (nos países atrasados) explica essa obrigada combinação do capitalismo com modos de produção pré-capitalistas. No organismo do cachorro nascem cotidianamente novas células, mas isso não autoriza a dizer que está acontecendo cada dia a gestação e o nascimento do cachorro. Temos que distinguir o nascimento das células daquele do organismo total, que são fenômenos qualitativamente diferentes. O fundo do erro (de Samir Amin) consiste em não levar em conta a unidade mundial da economia capitalista, que tem suas próprias leis e atua sobre cada uma de suas partes”. O imperialismo não expressa uma “segunda infância” do capital a nível mundial. Debates Teóricos sobre a Crise Capitalista Na ausência de uma teoria marxista geral sobre a época, que não faltava a autores liberais como Hobson, coube a Rudolf Hilferding formulá-la no seu Capital Financeiro, de 1910, onde se analisou de modo pioneiro a nova figura do capital, resultante da fusão entre o capital bancário e o capital industrial. No que diz respeito à crise, Hilferding sustentou que, se se produzisse nas proporções corretas, a produção poderia se ampliar infinitamente sem conduzir à sobre-produção de mercadorias. As crises não poderiam ser explicadas pelo consumo escasso. Hilferding atribuiu muita importância tanto aos movimentos acumulativos como aos efeitos dos desequilíbrios parciais das diferentes trocas de preços, dos momentos de atraso e dos fatores institucionais. Observou, por exemplo, o efeito de aumentos irregulares da oferta, os quais devem ser atribuídos a longos prazos de maturação dos investimentos, e que multiplicam, por sua vez, o perigo de investimentos exagerados quanto mais o desequilíbrio entre oferta e demanda durar. Já havia, na obra de Marx (nas Teorias sobre a Mais-Valia) fragmentos claros que vinculavam a sobre-produção ao consumo (“A sobre-produção deriva precisamente do fato, que a média da população não pode consumir mais que a quantidade média dos meios de subsistência; que o seu consumo não cresce proporcionalmente à produtividade do trabalho”). A procura de um “equilíbrio dinâmico” do capitalismo a partir dos esquemas de reprodução de Marx não se justificava teoricamente, no entanto, a partir dele. A grande depressão recolocou a questão do estatuto teórico da crise na teoria econômica. Para Fritz Sternberg, “no capitalismo, o problema da reprodução em escala ampliada não pode se separar do fenômeno da crise. É evidente que a crise faz sua aparição como conseqüência da reprodução ampliada. Quando tem lugar a reprodução simples - como ocorreu durante séculos em estratos econômicos pré-capitalistas (tanto no Egito como na Índia, na China como na Europa e na Idade Média) - quer dizer, quando o plus-trabalho é absorvido pelo 31 consumo pessoal da classe dos senhores, a crise, que é específica do capitalismo, resulta impossível. Quando se produziam desequilíbrios no processo econômico, estes se originavam em fatores extra econômicos”. No entanto, no meio do auge econômico produzido pela consolidação do imperialismo, M. J. Tugan Baranowsky sustentou que: 1) O sistema capitalista não enfrentava problemas de realização e que, portanto, podia reproduzir-se de maneira ampliada de modo indefinido; 2) Posto que não existiam problemas de realização, as crises e os desequilíbrios deviam ser interpretados como simples “desproporções”; 3) Se o sistema se desenvolvesse, deviam ser consideradas falsas as outras teorias da crise que Tugan acreditava reconhecer na obra de Marx, a saber, a teoria da baixa tendencial da taxa de lucro e a teoria do subconsumo. Embora muito criticado, Tugan teve uma influência decisiva em toda uma geração de economistas marxistas, ao deduzir o equilíbrio tendencial do capitalismo da modificação dos esquemas de reprodução ampliada de Marx. A posição de Tugan encontraria partidários inclusive muitos anos mais tarde. Para Otto Bauer, só a anarquia da produção (a ausência de plano) seria responsável pelas crises. Em Kapitalismus und Sozialismus nach dem Weltkrieg (de 1931) colocou: “Nenhum aperfeiçoamento das investigações sobre a conjuntura, das análises de mercado, da planificação no quadro de cada fábrica, pode estancar semelhante fonte, de onde emana uma enorme quantidade de elementos antieconômicos; pelo menos enquanto a própria sociedade não dirigir seus aparelhos produtivos, e não regular sua renovação e ampliaçãocom base num plano social, uniformemente repartido por cada ano e proporcionalmente redistribuído por cada um dos ramos da produção”. Anos mais tarde (1936), em Zwischen zwei Weltkriege?, vincularia a queda da taxa de lucro à taxa de mais-valia: “Quando a taxa de mais-valia já não aumenta, ou não aumenta o suficientemente rápido como para compensar o aumento da composição orgânica do capital, começa a descender a taxa de lucro social. Tão logo os capitalistas descobrem que a taxa de lucro desce, que os dividendos das sociedades por ações começam a baixar, se apresenta o desastre financeiro. A crise é verificada apenas quando começa a descer a taxa de lucro, tão logo ela tem que descer devido a que o aumento da composição orgânica do capital não pode ser já compensado pelo aumento de mais-valia”. Para a economista polonesa Natalie Moszkowska, em Das Marxzche System, a queda tendencial da taxa de lucro simplesmente não existia. Mas, independentemente de citações isoladas, a estrutura interna da argumentação de Marx sobre as crises referia-se à queda da taxa de lucro, por sua vez decorrente das contradições da reprodução do capital. O máximo que seria possível dizer, neste plano, é que a economia capitalista está em equilíbrio quando a produção de bens de produção suscita uma demanda de bens de consumo igual à demanda de bens de produção, suscitada pela produção de bens de consumo, o que tem valor puramente lógico. Nos artigos de Die Neue Zeit de 1901-1902, Karl Kautsky, máximo ideólogo da Internacional Socialista depois da morte de Engels, atacou as teorias de Tugan-Baranowsky, sem atacar, porém, a sua “teoria da desproporcionalidade” como causa fundamental das crises (em vez da sobre-produção e a tendência para a queda da taxa de lucro), assinalando que toda produção tem por objetivo final a produção de bens de consumo. O equilíbrio, em si, careceria de significado prático, pois “os capitalistas, e os trabalhadores que eles exploram, proporcionam, com o crescimento da riqueza dos primeiros e do número dos segundos, o que constitui certamente um mercado para os meios de consumo produzidos pela indústria capitalista; o mercado cresce, porém, menos rapidamente do que a acumulação de capital e o aumento da produtividade do trabalho. A indústria capitalista deve, portanto, procurar um mercado adicional fora de seu domínio nas nações não- capitalistas e nas camadas da população em situação idêntica. Encontra tal mercado e se expande cada vez mais, porém não com a necessária velocidade... Dessa forma, cada período de prosperidade, que se segue a uma significativa ampliação do mercado, está destinado a uma vida breve, e a crise se torna seu fim necessário”. Chegaria, então, uma época em que “a superprodução será crônica para todas as nações industriais. Mesmo então, os altos e baixos da vida econômica são possíveis e prováveis; uma série de revoluções técnicas, que desvalorizam a massa dos meios de produção existentes exigem a criação em larga escala de novos meios de produção, a descoberta de novos campos auríferos ricos, etc., podem mesmo então, durante certo tempo, estimular o ritmo dos negócios. Mas a produção capitalista exige uma expansão ininterrupta, rápida, para que o desemprego e a pobreza dos operários, de um lado, e a insegurança do pequeno capitalista, de outro, não atinjam a uma tensão extrema. A existência continuada da produção capitalista perdura mesmo nesse estado de depressão crônica, mas se torna completamente intolerável para a massa da população; esta é forçada a procurar uma saída da miséria geral, e só pode encontrá-la no socialismo”. Esboçada esta teoria de uma “depressão crônica” como futuro do capital, Kautsky não foi muito além, o que motivou o comentário de Paul Sweezy: 32 “Kautsky foi pouco além da repetição dos conceitos de Marx sobre a dependência geral em que a produção está do mercado para os bens de consumo.” O excesso de capital “não será empregado para elevar o nível de vida das massas do respectivo país, porque isto diminuiria o lucro dos capitalistas” (Lênin). De acordo com o objetivo de auto-valorização do capital, este será enviado ao exterior. O capital encontrará a possibilidade de tomar novo fôlego nos países “menos avançados”, onde a mão-de-obra é abundante e as matérias primas, baratas. A taxa de mais-valia é, de fato, bem maior e, conseqüentemente, obtêm-se melhores resultados de auto-valorização, considerando-se o maior grau de exploração. A exportação de capital tem o mérito, além de diminuir a queda tendencial da taxa de lucro, criar uma nova massa de exército industrial de reserva no país de origem. O capital ganharia, dessa forma, posteriormente, através de um lucro mais elevado adquirido no exterior e uma taxa mais elevada de mais-valia na pátria mãe. O capital financeiro, que desenvolveu os monopólios, agora “estende literalmente os seus tentáculos no mundo todo”. Assim, o capitalismo se torna imperialismo apenas em um determinado estágio do seu desenvolvimento: é portanto o resultado natural da qualidade fundamental do mesmo. “Os principais marcos”, indicados por Lênin, que assinalam a sua existência são: 1. A concentração da produção e, portanto, o desenvolvimento dos monopólios; 2. A fusão capital bancário-industrial que dá origem ao capital financeiro e à sua “oligarquia”; 3. A grande importância que assume a exportação de capital com respeito à simples troca de mercadorias; 4. A divisão do mundo pelos grandes trustes; 5. A sub-divisão do mundo em zonas de influência por parte das grandes potências capitalistas. Por ser a fase mais avançada do capital, que testemunha a maturidade mundial das forças produtivas capitalistas para a passagem para uma nova ordem social, o imperialismo seria uma era de guerras e revoluções, que evidenciam a crescente inadequação daquelas às relações de produção imperantes. A essa interpretação marxista se opôs, já avançado o século XX, uma escola revisionista, que rejeitou a dimensão econômica do imperialismo, negando a ligação entre a política imperialista do século XIX com o capitalismo em geral; recusaram que a exploração econômica tivesse conseqüências benéficas para as potências "imperialistas" e, por conseguinte, não aceitaram que a exploração das zonas atrasadas fosse essencial para o capitalismo e prejudiciais para as economias locais. Por último, defenderam que o imperialismo não provocou rivalidades definitivas entre as potências européias e, dessa forma, não tiveram grande influência para a eclosão da Primeira Guerra Mundial. Hannah Arendt e René Rémond introduziram explicações ideológicas, culturais e políticas, para explicar o imperialismo. O pilar dessa explicação foi o nacionalismo: a exaltação da nacionalidade atingiu a maturidade no último quarto do século XIX. Transformou-se em peça chave da política interna e externa dos estados europeus. A emergência do nacionalismo provocou a formação de governos agressivos no exterior, que tinham como objetivo fundamental o engrandecimento da nação, além de ser essencial nas unificações de Itália e Alemanha. Os Estados - Nações europeus negaram a condição de nação aos povos pequenos e subdesenvolvidos, restringindo o seu futuro à integração em "verdadeiras" nações, o que era legitimado pela ideologia de superioridade européia (à luz do positivismo, Europa era considerada a portadora exclusiva da civilização, destinada a prevalecer na história) e pelas teorias social-darwinistas (os europeus seriam os vencedores da luta pela existência, derrotando os povos inferiores). A ideologia do nacionalismo agressivo embasou, mas não antecedeu, à expansão econômica. Impérios em Colisão A principal conseqüência do imperialismo foi acirrar as disputas entre as potencias européias. Até 1870, a única potência realmente mundial fora a Inglaterra, que possuía um império que começou a ser erguido noséculo XVII, com uma marinha cada vez mais eficiente, e uma política econômica liberal a partir de meados do século XVIII. A condição histórica que diferenciava o país era que a burguesia havia feito uma revolução vitoriosa, que lhe permitiu criar condições institucionais favoráveis. Depois das revoluções do século XVII, a Inglaterra consolidou-se como um império colonial. A sua localização, na parte ocidental da Europa, facilitava seu acesso às principais rotas de comércio internacional, e permitia conquistar mercados ultramarinos. Através da guerra dos sete anos (1756-1763) tomou colônias francesas na América, Ásia e África; assinou tratados vantajosos com Portugal (Methuen, 1703) e com a Espanha (Utrecht, 1713). Pôde então contar com um mercado externo em crescimento, depois das independências dos países latino-americanos e da abolição da escravidão no século XIX, além da sua penetração na Índia e na China. A 33 Europa oriental era um mercado consumidor de produtos ingleses.13 Entre 1850 e 1914, o fluxo de capitais britânicos para os Estados Unidos – em investimentos e empréstimos – somou 3 bilhões de dólares. Neste período, os EUA remeteram à Grã-Bretanha, como pagamento de juros e dividendos, cerca de 5 bilhões de dólares. Marx, em O Capital, publicado na década de 1860, ainda se referia aos EUA como “uma colônia econômica da Grã-Bretanha”. A “grande depressão” provocou mudanças nas tendências principais nas relações internacionais. Em 1871, ano no qual a França foi derrotada na guerra franco-prussiana e em que nasceu a Alemanha unificada, começou uma nova época nas relações internacionais que terminaria em 1914¬1918, com a catástrofe da Europa na Primeira Guerra Mundial. A fundação do Império Alemão, realizada em três guerras de unificação e acompanhada de uma industrialização dramática, completou a reestruturação do sistema europeu de Estados. Esses processos transformaram o antigo “vácuo de poder” no centro da Europa, em uma superpotência continental. Entre 1871 e 1914, o Império Alemão influenciou o caráter das relações internacionais mais fortemente do que todos os outros grandes-países. A Alemanha exerceu um potencial de hegemonia sobre o continente e, depois de 1897, agiu como uma potência mundial não satisfeita. O medo frente ao domínio alemão da Europa e às ambições alemãs em escala mundial superou as rivalidades; as linhas de conflito tradicionais entre Inglaterra, França e Rússia, ficaram subordinadas, concentrando a orientação da política exterior desses Estados numa aliança defensiva contra a Alemanha. O triunfo dos nacionalismos, na Alemanha e na Itália, dissolveu vários pequenos países que, até aquela época, desempenhavam o papel de Estados - tampão entre as grandes potências, subtraindo destas últimas o campo de expansão dentro da própria Europa. Da mesma forma, a parte européia do decadente Império Otomano deixou de ser, para as grandes nações, uma área de expansão moderadora de conflitos e transformou-se em uma região explosiva (que acabaria por produzir a centelha inicial da Primeira Guerra Mundial). Depois de 1871, o sistema de Estados não mais retomou os objetivos principais do “concerto europeu”, com suas bases no equilíbrio de poder, baseado em normas e consenso “entre amigos”, e não na ameaça; a partir de 1890, tal consenso foi destruído. A ausência de alianças permanentes no “sistema de Viena”, e as alianças frouxas e ocasionais das grandes potências, em tempos de crise, cederam lugar, após 1879, a um sistema de alianças permanentes, mesmo em tempos de paz. Essas alianças transformaram-se, até 1907, na bipolaridade de dois blocos de poder (Tríplice Aliança: Alemanha, Áustria-Hungria, Itália; Tríplice Entente: França, Rússia, Grã- Bretanha). No âmbito mundial, o período entre 1871 e 1914-1918 caracterizou-se pelo apogeu da hegemonia global européia. O novo imperialismo forçou a entrada no sistema internacional europeu daquelas partes do mundo que ainda se encontravam fora. Com isso, o imperialismo completou a construção da rede global de relações econômicas, estratégicas e políticas, que foram dominadas pelos principais Estados da Europa. Isso ocorreu de forma violenta, principalmente no contexto da partilha da África, da ocupação territorial de grande parte da Ásia e da abertura da China. Após essa segunda onda de expansão colonial, não havia mais no mundo qualquer verdadeiro “vácuo de poder”. Com exceção da Áustria-Hungria, todas as grandes potências européias, bem como os Estados Unidos e o Japão, entraram no círculo das potências coloniais. Durante o período de 1871 até 1914, as potências principais alcançaram sua hegemonia, direta ou indireta, com relativa facilidade. Nunca, na história mundial, a brecha militar, tecnológica e econômica entre os Estados industrializados da Europa e o resto do mundo foi ou seria maior. Esta supremacia uniu-se, no final do século XIX, com uma decidida vontade européia de dominar o mundo. Os limites do poder europeu em escala mundial, porém, já eram perceptíveis durante a mesma época. No último quartel do século XIX, tornou-se comum a idéia de que cada país devia transformar-se em uma potência mundial, vinculada com o prestígio da nação, o equilíbrio político europeu, e a influência que a nação 13 Até meados do século XIX, o mundo tinha, na Grã-Bretanha, sua única oficina mecânica, seu único importador e exportador em grande escala, seu único transportador, seu único país imperialista e seu único grande investidor estrangeiro; sua única potência naval e o único país que possuía uma política mundial. A moderna economia mundial foi edificada em torno dela. A burguesia industrial foi impondo suas reivindicações econômicas contra a velha aristocracia, na forma do liberalismo econômico: a polêmica envolvendo as elites agrárias e industrial terminou com a aprovação, em 1846, pelo Parlamento, de leis que eliminavam o protecionismo econômico e instituíam o livre-câmbio, levando à vitória do capitalismo. O impacto do colonialismo inglês foi diferenciado: criou um novo país (os EUA), mudou completamente outros (a Índia e os países africanos), mudou bastante a América Latina, quase não mudou a China, além de um impacto econômico limitado. A cultura, os hábitos e esportes ingleses (futebol, rugby, críquete) invadiram o mundo (o football e o beisebol americanos são variantes deles). 34 podia e devia exercer no mundo. Desde 1870, quando Itália e Alemanha concluíram sua unificação nacional, a concorrência internacional e as relações entre os países se tornaram mais complexas. Surgiram grandes blocos de poder. Os Estados, levados a uma concorrência política crescente com os vizinhos, estabeleceram alianças para evitar o isolamento. A supremacia européia, em termos militares, sobre os países não-industrializados não significou que o planeta se tivesse tornado mero objeto dos desenhos colonialistas europeus, sem nenhuma capacidade de defesa ou iniciativa própria. A África e a Ásia resistiram, às vezes veementemente, à conquista européia.14 Embora as resistências raramente conseguissem seu alvo imediato, ou seja, a expulsão dos europeus, elas tiveram repercussões importantes no exercício da dominação colonial que, muitas vezes, aceitou compromissos com os interesses dos colonizados. E as resistências contra a conquista européia fundaram uma tradição de oposição contra o colonialismo que se desdobrou plenamente nas lutas de descolonização do século XX. Internamente, o sistema europeu de Estados manteve, após 1871, a sua hierarquia e estratificação entre, de um lado, as cinco grandes potências (Alemanha, Franca, Grã-Bretanha, Rússia e Áustria-Hungria) e, de outro, as potências de segunda e terceira categoria. Embora as grandes potências fossem as mesmas da primeira metade do século XIX, a balançade poder entre elas alterou-se significativamente. A Prússia, a mais fraca entre as cinco, catapultou-se (com o Império Alemão) para uma posição de potência hegemônica no continente. A França perdeu em 1870-1871 seu potencial de hegemonia. A monarquia austro-húngara correu o perigo de deixar o círculo das grandes potências, devido a problemas internos, originados na heterogeneidade étnica do Estado e no atraso econômico. A Rússia combinou a sua força de país mais populoso da Europa com a fraqueza do seu atraso industrial. A Itália unificada qualificou-se fracamente como potência, dado seu atraso econômico e sua insuficiência militar. Depois de 1871, ela foi chamada várias vezes a integrar o clube exclusivo das grandes potências, mas principalmente por razões de cortesia. O teste decisivo para o status de grande potência continuou sendo a capacidade de fazer a guerra. Tal capacidade, porém, não mais correspondia apenas à força populacional de um Estado, vale dizer, ao número de soldados de infantaria, mas dependia crescentemente da força industrial. A dinâmica diferenciada na industrialização dos diversos Estados europeus, desde a segunda metade do século XIX, refletia-se na sua posição relativa de poder no sistema de Estados. Da mesma forma, a vantagem na industrialização da Europa (e dos Estados Unidos) embasava o seu domínio no sistema mundial. A origem social das pessoas imediatamente envolvidas nas relações internacionais (diplomatas, ministros), durante todo o século XIX, apresentava uma continuidade: com exceção parcial dos franceses, elas vinham quase que exclusivamente da nobreza. A primeira aliança internacional foi a austro-alemã de 1879, que se transformou em Tríplice Aliança em 1882, com o ingresso da Itália. A França, isolada, buscou seus próprios aliados: primeiro a Rússia, com a qual firmou uma aliança em 1894, e em seguida, em 1904, a Grã-Bretanha. Finalmente o acordo anglo-russo de 1907 fez surgir a Entente Cordiale. Os blocos beligerantes da I Guerra Mundial estavam já formados. A formação de um império colonial por parte de um país foi vista como instrumento de força e prestígio que podia romper o equilíbrio entre as potências. Um exemplo disto foi a disputa pelo Egito entre Grã-Bretanha e França. As potências chegadas tardiamente na corrida colonial enfatizaram, política e ideologicamente, a idéia de sua superioridade nacional. Em 1894 criou-se a Liga Pan-Germânica (All-Deutscher Verband). Começou por reivindicar os territórios em que se falava alemão, ou um dialeto germânico: teoria da Muttersprache (língua materna) e, depois, dos territórios que no passado tinham sido “alemães” (teoria da “Grande Alemanha”), mas já se manifestava também a teoria da raça eleita: “Somos o povo mais capaz em todos os domínios do saber e das belas artes. Somos os melhores colonos, os melhores marinheiros, e mesmo os melhores comerciantes; e, todavia, não conseguimos alcançar a nossa parcela na herança do mundo, porque não queremos aprender a ir buscar à história as lições salutares. Que o Império Alemão seja, não o fim, mas o inicio da nosso desenvolvimento 14 Na rebelião Taiping (1850-1864), os camponeses chineses, dirigidos por um chinês convertido ao cristianismo (Hung Xiu-chuan) que se proclamava irmão mais novo de Jesus Cristo, sublevaram-se contra o poder dinástico central, derrotado pelos “estrangeiros”. A rebelião controlou - estabelecendo temporariamente um novo poder - um vasto setor da China durante mais de dez anos, chegando até os muros de Pequim, a capital do império. Os taiping retomaram a velha tradição camponesa de reivindicação da propriedade coletiva da terra: os exércitos rebeldes participavam na produção e trabalhavam nos campos numa base comum. Mas na direção "ideológica" da revolta encontrava-se uma espécie de sincretismo místico que já denotava a influência ocidental (o cristianismo, religião introduzida na China pelas potências européias). Os taiping foram, segundo Perry Anderson, "o maior levantamento das massas oprimidas e exploradas do mundo em todo o século XIX". 35 nacional!”, escrevia Fritz Sely, em Die Weltstellung des Deutschtums (A Situação Mundial do Poder Alemão) de 1897.15 O apelo à identidade nacional, o nacionalismo, foi um elemento central, na época, para transformar a participação política em “psicose de massa”. Nacionalismo não significava apenas a manipulação da consciência das massas, com o propósito de desviar as contradições sociais internas, e a ameaça dos trabalhadores, para xenófobas imagens de supostos inimigos externos. O nacionalismo do final do século XIX, num sentido amplo, refletia a tentativa de encontrar novas identidades e novos pontos de referência para os mais diversos grupos sociais e classes. As principais correntes do nacionalismo na Europa alteraram o seu caráter: o nacionalismo do risorgimento, liberal e libertário, cedeu lugar a um nacionalismo integrista, militante, expansionista e chauvinista. Na primeira metade do século XIX, o nacionalismo associava-se à auto-determinação democrática dos povos e dos indivíduos, assim como à luta contra o domínio aristocrático. A partir da década de 1880, a direita política reivindicou o monopólio do patriotismo expurgado de ideais democráticos. Como fenômeno de massas, tal nacionalismo direitista caracterizou especialmente países como a Alemanha, com a oferta compensatória de grandeza nacional. A emergência de um nacionalismo integrista foi um fenômeno geral na Europa, e chegou também aos Estados Unidos. Na Franca, assumiu a forma do chauvinismo francês, na Grã-Bretanha, a do jingoísmo e, nos Estados Unidos, a do chamado “novo imperialismo”. Tais ideologias, que colocaram as suas próprias nações acima de tudo, se tornaram forças políticas efetivas sobre toda a sociedade na virada do século. O nacionalismo integrista francês, por exemplo, foi politicamente periférico durante muito tempo, pois não representava qualquer movimento de massa. Ele popularizar-se-ia somente após a segunda crise marroquina, em 1911, unindo duas correntes - a do revanchismo anti-alemão e a do imperialismo colonial. Como resultado do avanço do nacionalismo integrista, o pensamento social-darwinista influenciou a percepção das relações internacionais de modo cada vez mais forte: os Estados estariam em posições opostas entre eles mesmos, permanentemente, numa luta pela sobrevivência, e o crescimento do poder de um Estado ocorreria apenas à custa da perda de poder de outro, numa lógica de soma-zero. Contemporaneamente à emergência dos nacionalismos integristas nos principais Estados europeus, no último quartel do século XIX, continuaram os nacionalismos irredentistas na parte européia do Império Otomano e no Estado multi-étnico da Áustria-Hungria. Nos Bálcãs, esses nacionalismos irredentistas produziram grandes tensões entre Estados, conjuntamente com os nacionalismos sérvio e bósnio e no contexto internacional de um conflito iminente e agudo entre Rússia e Áustria-Hungria (esse quadro forneceu a ocasião imediata para o início da Primeira Guerra Mundial). O planejamento militar ganhou uma dinâmica própria e demarcou os limites das decisões políticas. Essa tendência foi explicitada por meio do papel importante que o chamado “Plano Schlieffen”, o planejamento alemão de uma guerra em duas frentes, desempenhou na eclosão da Primeira Guerra Mundial. Alianças e Crise Internacional A alteração sofrida pelo conceito de Estado conciliador, baseado no ideário liberal, acompanhou o fim do capitalismo da livre concorrência. No capitalismo monopolista a ideologia prevalecente passou a ser a que assegurava à própria nação o domínio internacional. A expansão do capital era justificada ideologicamente pelo desvio conceitual da idéia de nação, onde uma poderia sobrepujar outras por considerar-se“eleita” entre as demais. Embutida nessa afirmação, e acompanhando o próprio desvio conceitual, surgiu a noção de realidade natural, fundamentada na afirmação “cientifica” da superioridade racial. A “nação” imperialista pavimentava o caminho do Estado racista, ou, como disse Trotsky, “para elevar à nação por cima da história, deu-se lhe o apoio da raça. A história passou a ser considerada como uma emanação da raça. E as qualidades da raça são construídas de modo independente das condições sociais”. A maioria dos historiadores subdivide as relações internacionais entre 1871 e 1918 em dois períodos, cuja dinâmica característica é derivada da política externa alemã. O primeiro deles estende-se de 1871 a 1890, quando a diplomacia da Europa e as relações internacionais foram dominadas pelas alianças do sistema de Bismarck. O segundo período vai da renúncia forçada de Bismarck (em 1890) até 1918; inicia-se com ofensivas alemãs na 15 Sob o reinado de Guilherme II, a partir de 1890, a Alemanha procurou recuperar o terreno perdido na corrida imperialista das grandes potências. A participação do país no movimento colonial, porém, deu-se em proporções modestas. Suas possessões incluíam o Togo, Camarões, o Sudoeste Africano e territórios denominados de África Oriental Alemã. O nacionalismo alemão de final do século XIX buscava recuperar o tempo perdido. 36 política externa e caracteriza-se por tensões crescentes, pela polarização em blocos de poder permanentes e pela Primeira Guerra Mundial. Sobre os princípios básicos que governaram o funcionamento do sistema europeu de Estados nessa época, existem duas visões. A primeira supõe a existência de um equilíbrio de poder entre as potências. A segunda abordagem encara a hegemonia alemã como característica das relações internacionais no continente. Argumenta-se que o equilíbrio de poder (isto é, o princípio básico de que nenhuma potência poderia dominar o continente) teria tido real validade nas relações internacionais, mesmo no último quartel do século XIX, com um equilíbrio instável e tenso entre os dois blocos de poder em formação. Esse equilíbrio teria sido seriamente ameaçado pela Alemanha e seus aliados apenas a partir de 1905. Contrariamente, argumenta-se que a idéia de equilíbrio de poder entre as grandes potências continentais corresponderia somente aos interesses britânicos, tendo, sobretudo, pouca relevância prática no continente, como princípio básico consensual. A segurança teria sido o conceito dominante. A paz, depois de 1871, não se fundamentaria num consenso moral, mas sim no brutal fato da superioridade militar alemã sobre a França. A definição britânica de equilíbrio seria unilateral, uma vez que se relacionaria só com a Europa, sem levar em conta o poder britânico além-mar. Os alemães teriam tentado substituir essa definição britânica pela sua própria, que possibilitaria à Alemanha estabelecer-se como potência mundial. Watson argumenta que a Alemanha se teria tomado potência européia hegemônica após a vitória sobre a França, mas que Bismarck manteve o status quo, mediante a sua habilidosa diplomacia. Embora fosse a maior potência militar e industrial do continente depois de 1871 e tivesse potencial hegemônico, a Alemanha não chegou a transformar esse potencial em uma prática política consistente. A política exterior da Alemanha, até 1890, era guiada mais pela pressuposta vulnerabilidade do país a coalizões inimigas do que por seu poder como primeira potência no continente. Por isso, embora o potencial militar e econômico permitisse uma predominância mais acentuada do Império Alemão, a sua cautelosa política e a prática das relações entre os outros países fizeram que as relações internacionais até 1890 parecessem mais equilibradas. Depois de 1890, a Alemanha reivindicou um status político internacional correspondente ao seu poderio econômico e, ao mesmo tempo, a França conseguiu quebrar seu isolamento, concluindo uma aliança com a Rússia em 1894. Entre esses blocos em formação, estabeleceu-se uma espécie de equilíbrio, que não pode ser visto como parte da tradição dos princípios do “Concerto Europeu”: era mais um equilíbrio inspirado por medo mútuo - uma "paz armada"; desafiado desde o início, mais parecido com uma situação de “Guerra Fria” do que com o suposto “consenso moral” da tradição anti-hegemônica européia do início do século XIX. O capital monopolista precisava do Estado que lhe assegurasse o mercado interno mediante a política aduaneira e de tarifas externas, que devia facilitar a conquista de mercados estrangeiros. Precisava de um Estado politicamente poderoso que, na sua política comercial, não tivesse necessidade de respeitar os interesses opostos de outros Estados. Necessitava, em definitivo, de um Estado forte para fazer valer seus interesses financeiros no exterior, para extorquir dos Estados menores vantajosos contratos de fornecimento e tratados comerciais. Um Estado que pudesse intervir em toda parte para converter o mundo inteiro em área de investimento para seu capital financeiro. É dessa forma que o conceito liberal de Estado conciliador modifica-se ao se acrescentar à sua função o papel de “agregador”, contemplando outras sociedades inferiores ou atrasadas, para “ajudá-las em seu desenvolvimento”. Os conflitos inter-imperialistas não pouparam as potências coloniais dominantes. A principal rivalidade anglo- francesa ocorreu na Indochina. Os ingleses, procurando garantir seu império indiano, avançaram para o leste (Birmânia), e na Malásia para o norte. Os franceses, tentando chegar à China, ocuparam sucessivamente o Camboja, a Cochinchina, o Anã, o Tonquim e o Laos; à medida que se instalavam, seus interesses fixaram-se na exploração dos recursos naturais: minerais, carvão, seda, arroz, etc. Os rivais defrontaram-se no Sião (Tailândia), sendo a disputa resolvida pelos acordos de 1896 e 1907 que estabeleceram áreas de influência na região. A rivalidade anglo-russa, por sua vez, tinha sido uma constante na questão relativa ao Império Otomano. Essa rivalidade se refletiu na Ásia devido à decisão russa de expandir-se na Ásia Central (Turquestão) na década de 1880, aproximando-se assim das fronteiras da Índia, principal colônia inglesa. Em reação, Inglaterra impôs um quase protetorado ao Afeganistão, que se constituiu assim num Estado-tampão entre as duas potências. A tensão levou à iminência de uma guerra anglo-russa, provisoriamente sufocada. A rivalidade russo-japonesa pela supremacia na bacia do Pacífico eclodiu na guerra russo-japonesa de 1905, vencida pelo Japão. A guerra concluiu com o Tratado de Portsmouth (em New Hampshire, nos EUA), a 5 de agosto 37 de 1905. Os EUA estavam inquietos com os progressos do império japonês no Pacífico, que banhava toda sua costa ocidental. Os EUA inauguraram, com a mediação do presidente Theodore Roosevelt, sua ascensão como potência com aspirações mundiais. Com sua intervenção na guerra hispano-americana (1898) e na ocupação das Filipinas, na repressão à revolta boxer na China (1902), e sua arbitragem no conflito russo-japonês, desenhavam- se as bases do imperialismo norte-americano.16 A vitória sobre a Rússia permitiu ao Japão, por sua vez, ascender à categoria de potência mundial: o seu governo investiu na indústria militar; o imperialismo japonês se desenvolveu ainda mais. PAÍSES IMPERIALISTAS E COLÔNIAS EM 1914 Na Europa, contra Alemanha, França agitava a questão da Alsácia-Lorena para preparar sua opinião pública para uma guerra (no fundo, uma disputa franco-germânica pelo Norte da África). A Inglaterra, principal potência colonial, pretendia manter o statu quo, aparecendo como defensor da paz (britânica). A Rússia advogava a questão nacional, de olho no iminente desmembramento do obsoleto Império Otomano. Itália, potênciamenor, 16 Em finais do século XIX, este já apontava na expansão dos EUA para o Sul. O termo “pan-americanismo” foi utilizado pela primeira vez nas colunas do jornal The New York Evening Post em 1882 durante agitação do Secretario de Estado James Blaine para organizar um congresso das nações americanas em Washington, com o objetivo de conformar um zollverein comercial de todo o hemisfério. O conceito reproduzia o formato das ideologias espalhadas desde meados do século para definir os projetos de unificação de nações no contexto do crescente poder das potencias capitalistas européias. Desde o surgimento do pan-eslavismo em torno a 1850, se sucederam o pan-helenismo, o pan-germanismo, o pan-islamismo, o pan-celticismo e outras denominações similares, designando movimentos que se voltavam para o passado no intuito de justificar estratégias de construção de grandes espaços econômicos e políticos. No caso norte-americano, o conceito de pan-americanismo não se tornou corrente de imediato, ressurgindo em ocasião da Conferência de Washington de 1889, e ganhando força nas primeiras décadas do século XX. 38 reivindicava territórios do decadente império (austríaco) dos Habsburgo, e alguns despojos do próprio Império Otomano (a Entente lhe ofereceu o Trentino, Trieste e a Valônia). Guerra Mundial e Ordem Internacional A perspectiva de uma guerra européia (que, pela extensão dos interesses coloniais das potências, seria mundial) era já visível em finais do século XIX, sendo denunciada em março de 1897 no parlamento francês pelo deputado republicano-socialista Jean Jaurès: “Por toda parte os orçamentos da guerra expandem-se e crescem de ano para ano; e a guerra, por todos amaldiçoada, por todos temida, por todos condenada, pode rebentar sobre todos de um momento para o outro”. Embora potente, a voz de Jaurès era quase isolada:17 o período que foi do final do século XIX à Grande Guerra ficou conhecido como a belle époque, uma espécie de fuga, ou fuite en avant, diante das perspectivas sombrias que se desenhavam no horizonte histórico. Nos países avançados, a burguesia dominante se viu obrigada a organizar novos reagrupamentos políticos em virtude da ascensão dos partidos operários (socialistas), que constituíam verdadeiras “sociedades dentro da sociedade”: na Alemanha, o SPD tinha 4 milhões de eleitores, 111 deputados, uma rede de sindicatos, cooperativas, escolas, assim como o “trabalhismo” na Inglaterra ou o SFIO na França. O socialismo começou a se desenvolver fora da Europa: na Rússia, nos EUA (com 6% dos votos para o candidato socialista Eugene Debs nas eleições presidenciais de 1912), no Japão. Nos países periféricos, em troca, reforçou-se a concentração agrária e o atraso rural, que se combinava em alguns deles (em Rússia, especialmente) com uma forte concentração industrial, dominada pelo capital estrangeiro. O primeiro plano, porém, tendia a ser ocupado pelas contradições inter-imperialistas, em especial entre as velhas potências e as novas, em expansão (Alemanha e EUA). Para Fritz Sternberg, “o coração da Europa está ocupado por um país que, em poucas décadas, tornou-se o mais industrializado, cuja velocidade de desenvolvimento industrial e comercial ultrapassa à dos países industriais mais antigos, que apareceu nos mercados mundiais no momento em que os territórios antes livres da dominação européia já estavam todos ocupados, como colônias ou semi-colônias dos Estados industriais mais antigos”. Para a Alemanha só restavam duas possibilidades: a constituição de um bloco colonial fora da Europa, ou uma expansão em direção da Turquia, ao longo da linha Berlim-Belgrado. Ambas possibilidades se chocam diretamente com as posições britânicas. O conjunto das contradições acumuladas provocaria crises internacionais a partir dos últimos anos do século XIX e dos primeiros do século XX (guerra hispano-americana, guerra dos bóers, guerra russo-japonesa) até literalmente explodir na Primeira Guerra Mundial, cuja principal conseqüência foi a revolução russa. O sistema econômico mundial testemunhou, nesse período, a marcha acelerada para uma etapa de tensões sem precedentes. Segundo Marcello De Cecco: «A vantagem comparativa na construção de indústrias novas (aço, química, energia e máquinas elétricas) passou da Inglaterra para o Estados Unidos e Alemanha, que poderão desfrutar de uma economia externa, já utilizada pela Inglaterra no século XIX: uma enorme ampliação do mercado interno. Os elementos decisivos foram a unificação alemã e o grande crescimento de sua população e a emigração em massa para os EUA. “A Inglaterra não conseguiu, em 1890-1914, responder ao desafio da segunda revolução industrial: sua indústria continua ligada aos produtos velhos, não aos novos. No mesmo período, o sistema financeiro se desenvolveu de modo semelhante ao industrial e comercial. A Inglaterra perdeu importância em relação ao período 1870-90, em que Londres dominava absolutamente os mercados financeiros: devido à sua derrota (militar) Paris havia desaparecido e Berlim ainda não era candidata a centro financeiro internacional. Nova York, capital financeira dos países devedores, era ainda pouco desenvolvida nesse sentido. Contrariamente, nos vinte anos seguintes, grandes instituições se desenvolveram nos principais países europeus e nos Estados Unidos. O sistema-ouro se estendeu às nações ‘civilizadas’. Nesses anos, assistimos à transformação de um sistema monetário internacional baseado na certeza da paz, em outro que exprime a espera da explosão de uma guerra de dimensões mundiais». Quando a guerra de fato explodiu, não era, portanto, sobre terreno virgem que Lênin andava para afirmar: “A guerra européia, preparada durante dezenas de anos pelos governos e partidos burgueses de todos os países, rebentou. O crescimento dos armamentos; a exacerbação da luta pelos mercados, no atual estágio imperialista de desenvolvimento dos países capitalistas avançados, os interesses dinásticos das monarquias mais atrasadas - as da Europa Oriental - tinham de, inevitavelmente, conduzir à guerra, e conduziram. Apoderar-se de territórios, e 17 O “pacifismo” do imperialismo inglês era a defesa do statu quo ante, e era puramente verbal (pois a Inglaterra, tanto quanto as outras potências européias, armava-se até os dentes). 39 subjugar nações estrangeiras, arruinar a nação concorrente, pilhar as suas riquezas, desviar a atenção das massas laboriosas das crises políticas internas da Rússia, da Alemanha, da Inglaterra e de outros países, dividir e iludir os operários com a mentira nacionalista, dizimar a sua vanguarda para enfraquecer o movimento revolucionário do proletariado; tal é o único conteúdo real, o verdadeiro significado da guerra atual. A burguesia alemã encontra-se à cabeça de um dos grupos de nações beligerantes. Engana a classe operária e as massas laboriosas, garantindo que faz a guerra para defender a pátria, a liberdade e a cultura, para libertar os povos oprimidos pelo czarismo, para destruir o czarismo reacionário”. A síntese das características do imperialismo (exploração das ações atrasadas, tendência para as guerras mundiais e para a militarização do Estado, aliança dos monopólios com o Estado, tendência geral à dominação e à subordinação da liberdade) levou Lênin a definir a nova etapa histórica como a época da “reação em toda a linha, e da exacerbação da opressão nacional”. Em contrapartida, o enorme desenvolvimento das forças produtivas, a concentração da produção, a acumulação sem precedentes de capital, tornavam a produção cada vez mais social nos ramos econômicos decisivos. Isto entrava cada vez mais em contradição com o modo de apropriação, ou seja, a propriedade privada nas mãos de um numero cada vez menorde capitalistas, o que marcava o sintoma da transição para um novo regime social de produção. A Guerra Mundial só poderia ser entendida, portanto, como revolta das forças produtivas sociais contra o quadro, tornado historicamente estreito, das relações capitalistas de produção e dos Estados nacionais, que abria a era histórica da revolução socialista. Bem depois, ao lado dessa interpretação, e em concorrência com ela, desenvolveu-se uma literatura e uma historiografia que enfatizaram as responsabilidades alemãs (ou francesas) na deflagração da guerra, deslocando a análise objetiva da estrutura histórica para a análise subjetiva dos motivos imediatos (reais ou imaginários) de seus protagonistas. Esse tipo de interpretações, de caráter principalmente jurídico, foi a base para uma abundante história diplomática e militar, que não deixou de dar contribuições importantes sobre aspectos parciais, mas que não foi capaz de apresentar uma interpretação global, que vinculasse, em um todo coerente (estrutural), crise (depressão) econômica, expansão colonial, exportação de capital, disputas geopolíticas, nacionalismo racista e guerra mundial, como fez a linha interpretativa inaugurada por Hobson e concluída (sintetizada) por Lênin em O Imperialismo, Fase Superior do Capitalismo, entre 1902 e 1916, em que foram lançadas as bases de análise da nova etapa histórica. Hobsbawm tentou explicar a amplitude e radicalismo da Grande Guerra - que desencadearia toda a “cultura da brutalidade” - pelo fato dos interesses econômicos e políticos das grandes potências imperialistas serem radicalmente excludentes. A Grande Depressão 1873-1896 só é compreensível situada na dinâmica histórica de conjunto, não como um fenômeno aleatório. Para Trotsky, “a curva do progresso econômico põe em evidência dois tipos de movimento: um, fundamental, que expressa a elevação geral; outro, secundário, que corresponde às flutuações periódicas constantes, relativas aos dezesseis ciclos de um período de 138 anos. Nesse tempo, o capitalismo viveu aspirando e expirando de maneira diferente, de acordo com as épocas. Desde o ponto de vista do movimento de base, quer dizer, desde o ponto de vista do progresso e decadência do capitalismo, a época de 138 anos pode dividir-se em cinco períodos: de 1783 a 1815, o capitalismo se desenvolve lentamente, a curva sobe penosamente; depois da revolução de 1848, que amplia os limites do mercado europeu, assistimos a uma volta muito brusca. Entre 1851 e 1873, a curva sobe de repente. Em 1873, as forças produtivas desenvolvidas chocam-se com os limites do mercado. Produz-se um pânico financeiro. Em seguida, começa um período de depressão que se prolonga até 1894. As flutuações cíclicas têm lugar durante esse tempo; porém a curva básica cai aproximadamente no mesmo nível. A partir de 1894, começa uma época nova de prosperidade capitalista, e até a guerra, a curva vai subindo com vertiginosa rapidez. No fim, o fracasso da economia capitalista no curso do quinto período tem efeito a partir de 1914”. As soluções precárias das crises diplomáticas não evitaram a constituição e o aprofundamento das grandes linhas fundamentais de conflito que se descarregaram a partir de agosto de 1914. Os anos entre 1871 e 1914-1918 foram um período marcante e peculiar na história das relações internacionais. Certamente, cabe apontar as continuidades que transcendem essa periodização: não foi apenas a partir de 1871, mas já no primeiro quartel do século XIX, que os processos diferenciados de industrialização e o capitalismo crescente influenciaram a divisão de poder no sistema mundial. O novo imperialismo e a partilha da África tornaram-se inteligíveis também no contexto de uma longa continuidade da expansão colonial. O Concerto Europeu ainda funcionou na partilha da África (década de 1880), no caso da intervenção conjunta na China, e, finalmente, em 1912, na conferencia londrina dos embaixadores, que evitou a escalada das tensões entre Áustria-Hungria e a Rússia no contexto das guerras balcânicas. As 40 continuidades marcantes desse período não podem, no entanto, ocultar as peculiaridades significativas das relações internacionais, no período de 1871 a 1914-1918. Os principais debates acerca desse período concentraram-se em: a) O problema sobre o caráter do sistema internacional e das relações internacionais; a existência de um equilíbrio de poder ou de uma hegemonia da Alemanha após 1871; b) O problema da nova expansão imperial européia, depois de 1870; c) A explicação das causas profundas da Primeira Guerra Mundial. O confronto entre os paradigmas metódicos, de análise da política exterior e das relações internacionais, desaguou no debate acerca do primado da política interna versus o primado da política externa. A finalidade principal do processo político imperialista teria sido a estabilização interna de um sistema ultrapassado, ou seja, a oposição das elites governantes ao processo “liberador” da sociedade industrial (capitalista). Sob tal perspectiva, o imperialismo de Bismarck aparece como desvio das tensões políticas internas, num processo de expansão colonialista, que seria irrelevante em si mesmo. A política mundial guilhermina aparece nessa interpretação como política interna, e a deflagração da Primeira Guerra Mundial é vista como uma fuga para a frente, tentada pelas elites alemãs, que se sentiram, interna e externamente, num beco sem saída. As elites teriam procurado evitar as conseqüências do processo geral de modernização, mesmo às custas de uma guerra, para elas limitada. Nesta versão, o peso do fator subjetivo torna- se decisivo. O paradigma sócio-histórico do primado da política interna se sobrepôs às interpretações que alegavam a relativa independência da política externa, na interpretação de Raymond Aron, que emancipa o imperialismo e a guerra mundial das contradições capitalistas, e ecoa a idéia schumpeteriana do conflito arcaísmo/modernidade capitalista, como motivo da conflagração mundial. Internacionalmente, a guerra mundial iniciada em 1914 assinalou o fim da Pax Britannica, que dominou o mundo durante um século (1815-1914), e foi o berço do imperialismo contemporâneo, no qual, depois de duas tentativas fracassadas da Alemanha (imperial e nazista), os EUA ocupariam o lugar dominante no século XX, substituindo sua antiga potência colonizadora. A I Guerra Mundial debilitou o poder do Reino Unido, e a moeda norte-americana entrou no período de pós-guerra com uma paridade em relação ao ouro superior à da libra esterlina. MORTES NA GUERRA (EM MILHÕES) Tríplice Entente Impérios Centrais MORTES CIVIS 6M 4M MORTES MILITARES 5M 4M TOTAL 11M 8M Conclusão Em 1917, a entrada dos EUA na guerra mundial foi, junto com a revolução russa, o fator fundamental de mudança das relações econômicas e políticas mundiais. Não diretamente implicados no conflito, divididos em função da origem nacional da sua população, impedidos de comerciar com os impérios centrais devido ao bloqueio britânico, os EUA triplicaram seu comércio exterior de 1914 a 1917, como abastecedores não só de alimentos, mas também de manufaturas, armas e munição aos futuros aliados (a banca americana tinha sido autorizada a realizar empréstimos à Entente desde outubro de 1914: em 1917 a dívida “aliada” com os EUA já atingia 2,7 bilhões de dólares, cifra enorme para a época). A guerra submarina alemã, que ameaçava os fornecedores dos EUA, decidiu a intervenção destes na Primeira Guerra Mundial. A intervenção norte-americana foi decisiva, pois o seu primeiro resultado foi a realização (atuando sobre as nações neutras) do bloqueio da Alemanha, que a partir desse momento viu-se condenada à asfixia econômica. 41 No entanto, o Tratado de Versalhes, que determinou o resultado final da guerra, criou na Europa seis novas nações, imprensadasentre a Rússia soviética uma Alemanha humilhada: Finlândia, Estônia, Letônia, Lituânia, Polônia e Tchecoslováquia. Nas duas últimas, havia cinco milhões de alemães. Nenhuma delas teria condições de preservar a própria independência diante da ressurreição da Alemanha ou do fortalecimento da Rússia (ou da URSS). O Império Britânico, por sua vez, saiu de Versalhes como o maior beneficiário da Grande Guerra. Os impérios Hohenzollern, Romanov, Habsburgo e Otomano estavam em ruínas. O desafio da Alemanha, que havia superado a produção britânica em 1914, fazia parte do passado. Inglaterra tomou os cabos submarinos que a Alemanha possuía no Atlântico e a maior parte de sua frota mercante, para compensar a perda de 40% de seus próprios navios para os submarinos alemães. As ilhas germânicas no sul do Pacífico foram delegadas a Austrália e Nova Zelândia. A África do Sudoeste, que pertencia à Alemanha, foi entregue à África do Sul. A África Oriental Alemã (Tanganica) se transformou em um mandato inglês. Camarões e Togo foram divididos entre Inglaterra e França. A Mesopotâmia e a Palestina, tomadas dos turcos, passaram para os ingleses. Como resultado da guerra travada para tornar o mundo “mais seguro para a democracia”, o Império Britânico acrescentou à sua extensão 950 mil milhas quadradas e milhões de súditos. Segundo Lord Curzon: '”A bandeira britânica jamais tremulou sobre um império mais poderoso e unido do que este”. Mas, em 11 de novembro de 1918, a elite alemã não se via como derrotada. Seus exércitos estavam se retirando no lado ocidental, mas nenhum soldado aliado pisara em solo alemão. No momento em que se deu o cessar-fogo, a situação militar mostrava tropas alemãs na Finlândia, na Rússia, na Ucrânia; tropas alemãs tomavam a Criméia e estacionavam na Transcaucásia. A crise interna, com a revolução de novembro de 1918, que derrubou a monarquia, levou a que Alemanha aceitasse um armistício na base dos Quatorze Pontos de Wilson, informados em discurso ao Congresso dos EUA em janeiro de 1918. Alemanha deveria sair da Bélgica e restituir à França os direitos sobre a Alsácia - Lorena, perdidos em 1871. O Tirol do Sul, que pertencera à Áustria por 600 anos, foi entregue à Itália por meio de um tratado secreto com a Inglaterra, em 1915, e todas as ilhas alemãs do Pacífico Norte foram dadas ao Japão, em cumprimento a um acordo sigiloso com a Inglaterra, em 1917. Em que pese o ponto n° 3 invocasse a "remoção de todas as barreiras econômicas e o estabelecimento de igualdade de condições no comércio entre todas as nações", para a Alemanha, contudo, foi negado o direito de criar uma união 42 aduaneira com a Áustria e imposta a obrigação de conceder aos aliados o acesso irrestrito aos seus mercados, sem qualquer reciprocidade. Vitoriosa na guerra, a economia dos EUA emergiu dela como a principal credora do mundo, e como a principal potência industrial. Apesar de sua vitória militar e diplomática, a Inglaterra devia renunciar à sua histórica supremacia naval. A dívida nacional tinha se multiplicado por quatorze durante a guerra. Metade da arrecadação tributária do país destinava-se ao pagamento de juros. Lloyd George, primeiro ministro inglês, confidenciava que, se a Inglaterra enfrentasse o desafio americano à sua supremacia por meio da construção de navios, os americanos demandariam o pagamento imediato de sua dívida de guerra. Os ianques agora controlavam a hipoteca do Império Britânico. Após uma breve recessão, a economia dos EUA conheceria o período de prosperidade chamado de "os anos loucos da década de 20", época áurea do rádio e do automóvel. Uma nova era do imperialismo capitalista, a American Century, nascia. E, com ela, ressurgia a idéia de uma ordem mundial a ser preservada por meios políticos supranacionais. O desfecho da Primeira Guerra Mundial testemunhou um esforço nesse sentido quando, a partir do plano elaborado pelo país que surgiu crescentemente como grande arbitro da política mundial depois da conflagração bélica, os EUA, criou-se a SDN (Sociedade das Nações) sobre a base da idéia de uma ordem internacional justa e eqüitativa, que eliminasse, por meios diplomáticos discutidos prévia e coletivamente, os conflitos que poderiam levar a novas guerras, transferindo supostamente o principio parlamentar-democrático para o plano internacional. Mas a “nova ordem” nascia prenhe de contradições. Os Estados Unidos logo viraram as costas para os conflitos de poder da Europa. Os líderes norte-americanos concluíram que foram enganados quando aderiram à causa dos aliados. Suas tropas tinham atravessado o oceano, supostamente para criar “um mundo livre para a democracia”, e acabaram por ver o Império Britânico aumentado em quase um milhão de milhas quadradas. A "guerra para acabar com as guerras" se configurava como o prelúdio para um conflito ainda maior. Os EUA emprestaram bilhões à causa dos aliados, mas foram ludibriados na hora de receber o pagamento das dívidas. A paz imposta à Alemanha, supostamente justa e baseada no princípio da autodeterminação dos povos e nações, não evitou que os aliados europeus despedaçaram a Alemanha e forçaram milhões de alemães a viver sob domínio estrangeiro, e levaram a Alemanha à falência com as reparações de guerra. Nos EUA, surgiram vozes que culparam os 43 "mercadores da morte" - aqueles que lucravam a guerra - e os propagandistas ingleses, que haviam mentido sobre freiras violentadas e bebês pendurados nas pontas das baionetas prussianas. Os lideres da revolução que surgira dos escombros do país que fora mais abalado pela “Grande Guerra”, a nova Rússia soviética, transformada em 1922 em URSS (União das Republicas Socialistas Soviéticas), posta à margem da SDN (e atacada militarmente pelos seus membros principais) não vacilaram em qualificar essa nova “instituição mundial”, de “covil de bandidos”, colonialistas e opressores. As bases do desenvolvimento político mundial, e dos conflitos internacionais, do século XX, estavam lançadas. Pois o surgimento da SDN era, também, uma resposta ao surgimento da URSS, cujo nome veiculava, de modo direto e aberto, o projeto de uma revolução socialista mundial, como meio para superar as contradições que tinham levado o mundo à maior catástrofe bélica da sua história. A idéia, porém, de uma ordem econômica mundial capitalista unificada, como base para uma ordem política internacional, deveria aguardar a catástrofe econômica de 1929, e seus novos desdobramentos bélicos na Segunda Guerra Mundial, assim como as novas formas de prevenção da revolução. Bibliografia ACOSTA SÁNCHEZ, José. El Imperialismo Capitalista. Barcelona, Blume, 1977. AMIN, Samir. El Desarrollo Desigual. Barcelona, Planeta-De Agostini, 1986. AMIN, Samir. L´Accumulation à l´Échelle Mondiale. Paris, UGE, 1976. ANDERSON, Perry. Linhagens do Estado Absolutista. São Paulo, Brasiliense, 1981. ANGELL, Norman. A Grande Ilusão. Brasília, Editoria UnB, 2004. ANGELL, Norman. The Story of Money. Nova York, Frederich A. 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