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SUICÍDIO E TECNOLOGIA; BENEFÍCIOS E MALEFÍCIOS DA REDE

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SUICÍDIO E TECNOLOGIA; BENEFÍCIOS E MALEFÍCIOS DA REDE 
 
Ana Carolina da Silva 
Psicóloga 
 
A morte é uma realidade evitada na pós-modernidade ou modernidade líquida, 
como bem colocou Baumam (2001). Nessa realidade fluida, mutante, o tempo 
é célere e relativo, tão relativo que perde-se a noção de limite, de borda, 
estende-se infinitamente nos mares da rede. O sujeito da pós-modernidade 
encontra novos espaços de construção da própria substância, mas 
desenraizado da história, das suas raízes, permanecendo como algo 
vaporizado e volátil, capaz de assumir várias formas, construindo com outras 
substâncias, constituindo-se assim o que se chama de intersubjetividade. 
 Nesse universo líquido há espaço para uma reflexão sobre o ser, cada 
vez mais complexa, pois com a existência da rede de conexão que a tecnologia 
oferece, as comunicações são mais rápidas, instantâneas. Debord em A 
Sociedade do Espetáculo (2003), aborda a construção da identidade mediada 
pela imagem em lugar do Ser; ou seja, o processo de constituição de 
identidade não é mediado pelo outro, mas pela imagem que o outro projeta, na 
aparência de uma realidade mutante, submetida ao império midiático. Os 
interesses de uma economia que incentiva o consumo desenfreado é um 
indicativo que há a inserção do discurso capitalista nas relações e que as 
mesmas se pautam, entre outras possibilidades, através desse consumo. 
Poderíamos falar de um sujeito de consumo? 
 Nesse universo intersubjetivo, de relações pouco enraizadas 
historicamente, permeado pelas seduções da mídia através do consumo das 
imagens que levam ao consumo de produtos, a morte não é cogitada, não é 
bem vinda e pode-se inferir a razão. Pensar sobre a morte é fazer um retorno 
para si mesmo, para a própria história, para a finitude e o tempo. O tempo é o 
tecido da vida humana, diz-nos Hillman em Suicídio e Alma (1993). 
 Aí mora a razão de se evitar falar sobre a morte. Traria risco para o 
consumo da “vida”. Enquanto consome a vida, numa fome desvairada, o ser 
evita pensar na morte, em sua finitude, em sua essência, esquecendo-se da 
Vida. 
O que é chamado de morte pelo neurótico, basicamente porque 
é escuro e desconhecido, é uma nova vida tentando irromper 
na consciência; o que ele chama de vida, pelo fato de ser 
familiar, nada mais é do que um padrão moribundo que ele 
tenta manter vivo (HILLMAN 1993, pag. 82). 
 Onde essa morte pode ser expressada e vivida senão no 
símbolo?(HEIDEGGER 2005). As construções simbólicas são desenvolvidas 
na quintessência das relações genuína (JUNG 2009), permitindo a elaboração 
da própria metáfora, tanto no plano individual como coletivo. Mas como o 
sujeito líquido da atualidade tem uma identidade ameaçada, desvinculada da 
própria história, não consegue fazer a leitura simbólica, recaindo na concretude 
primária. Recorre ao próprio corpo como fronteira entre o interno e o externo e 
atua sobre ele para demarcar essa fronteira. 
 Um símbolo é elaborado na existência (HEIDEGGER 2005). Onde, na 
pós-modernidade, podemos encontrar um espaço para elaborar a morte como 
realidade psíquica? Onde esse discurso pode ser acolhido? 
 É aí que surgem com estrondoso sucesso o jogo da Baleia Azul, como 
um lugar de viver a morte, de forma perversa, com seu fascínio, pois arrasta as 
psiques que não encontram espaços relacionais que favoreçam a elaboração 
simbólica da morte. 
 A pele, sendo um órgão simbólico, pois é um elemento de fronteira entre 
o que está dentro e fora – marca-se a pele, nas práticas de auto-mutilação – 
para viver uma experiência de dor que não encontra expressão na linguagem 
falada, na arte, na poesia, na música. O corpo é vivido como um texto onde o 
inconsciente encontra um caminho de expressão. 
 O mito da Fênix se comunica nos pensamentos suicidas. A morte que se 
deseja é a da vida que não dá mais conta de fazer sentido para a alma. Quer 
ressurgir das cinzas do que foi um dia, numa versão atualizada, usando uma 
metáfora da tecnologia. Mas como se não soubesse como realizar essa 
metamorfose simbólica, o ser atua sobre seu corpo, buscando 
inconscientemente realizar o mito citado. 
 Reproduz individualmente um fenômeno que também atinge o 
inconsciente coletivo: Através da Bomba, vivemos a sombra da morte 
(HILLMAN 1993, pag. 84). O esgotamento dos recursos naturais do planeta, a 
escassez da água, o superaquecimento devido ao buraco na camada de 
ozônio, fruto de uma produção desenfreada, não seria um suicídio coletivo 
inconsciente? 
O mundo está mais próximo de um suicídio coletivo, é verdade; 
que este suicídio precise realmente ocorrer; isto não é verdade. 
O que precisa ocorrer, se o suicídio real não vier, é uma 
transformação na psique coletiva (HILLMAN 1993, pag. 84). 
 A frase também é válida para os casos individuais. Talvez tenhamos de 
pensar em criar espaços para o ser vivenciar a morte como realidade psíquica, 
ajudando-o a elaborar seu “ritual de passagem”, ressurgindo na própria vida, 
mas numa nova configuração, atualizada e congruente com a noção de 
identidade em construção, ou expansão? 
 Os benefícios da rede se estabelecem em formatos e conteúdos que 
auxiliem a caminhada do ser, facilitando o processo de individuação, 
valorizando os aspectos fundamentais para o desenvolvimento de uma psique 
saudável. Os benefícios da tecnologia nas redes podem ser vividos em 
relações que aproximem as pessoas de valores humanos que possam ser 
compartilhados. Elementos que contribuam para a solidariedade e sentimento 
de pertencimento a uma comunidade. Uma rede que sirva à sustentabilidade 
da ética nas relações, o cuidado consigo e com o outro, onde o conhecimento 
do processo de morrer produza o encantamento pela vida e o respeito pelo 
tempo existencial onde ela é rara e insubstituível.

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