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Anemia falciforme resumo

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Doença falciforme
 Grupo de anemias hemolíticas hereditárias crônicas que têm em comum a presença da hemoglobina S dentro da hemácia. Apresenta várias formas: homozigota (SS), também chamada de anemia falciforme, hemoglobina S associada a outra hemoglobina variante ou dupla, hemoglobinopatia SC e hemoglobinopatia SD e hemoglobina S associada à talassemia Sb (Sbtal).
A heterozigose da hemoglobina S com a hemoglobina A constitui o traço falcêmico, que o fenótipo semelhante ao normal não estando dentro das doenças falciformes. NÃO OCASIONA ANEMIA.
¨A anemia falciforme é considerada a forma mais grave dentro das doenças falciformes. Sua expectativa de vida para homens é de 42 anos e para mulheres 48 anos.
É a enfermidade hereditária monogênica mais prevalente no mundo. A OMS aponta 1 caso para cada 700 nascidos vivos.
A primeira descrição da doença ocorreu em 1910, entretanto o marco científico mais importante foi o resultado do trabalho de Linus Pauling no qual demonstrou que a hemoglobina de uma paciente com anemia falciforme apresentava motilidade eletroforética distinta à hemoglobina de um indivíduo normal. Devido a forma da hemácia na hematoscopia, Pauling a denominou de hemoglobina S que tem propriedade de formar polímeros quando desoxigenada.
Esta alteração é proveniente da África, há milhões de anos atrás e resulta da troca do ácido glutâmico (GAG) pela valina (GTG) na posição 6 da cadeia da globina beta.
No Brasil, em virtude da grande miscigenação, é frequente a ocorrência da doença de indivíduos com fenótipo caucasoide, cuja herança africana não é mais evidente na cor da pele. Os estados do Rio de Janeiro e Minas Gerais apresentam números intermediários com um caso para cada 1.200 nascimentos aproximadamente.
A incidência em Minas é significativa nas regiões norte e nordeste. Nas demais regiões ela também é expressiva. NORTE E NORDESTE: 103 A 154 em cada 100.000 (dados de 1999-2004). O centro de referência em Minas Gerais é a Hemominas organizadora dos processos que determinam o fluxo de agendamento de consultas oriundas da triagem neonatal. O Hemocentro em MOC constitui o pólo de referência na região do norte de Minas.
A partir do estudo do DNA ficou demonstrado que o gene da variante da HbS está presente em 4 arranjos polimórficos de DNA no cromossomo 11, levando a possibilidade de a mutação ter ocorrido em diferentes regiões do mundo. Todas estas regiões são fortes áreas malarígenas com alta prevalência do traço falciforme, o que apontam para uma maior resistência à infecção por malária naqueles portadores do traço falciforme. Estudos posteriores mostraram que os fagócitos retiram da circulação a célula parasitada de forma mais eficaz, devido a meia-vida reduzida da hemácia.
Fisiopatologia
Dentro da hemácia há uma grande concentração de hemoglobina (32 a 34 g/dl), por isso é importante que elas se apresentem bastante solúveis para impedir a precipitação dentro da célula. Na hemoglobina S, quando desoxigenada, sofre interações hidrofóbicas, o que compromete a solubilidade e acarreta a formação de um polímero de moléculas de hemoglobina.
Quando uma determinada quantidade de hemoglobina S se polimeriza, o resultado final é o dano celular irreversível. Quanto maior o período em que a hemácia permanece desoxigenada, maior é a possibilidade de polimerização no seu interior.
Esse mecanismo de falcização ocorre quando a hemoglobina S submetida à baixa concentração de oxigênio inicia um processo em que um tetrâmero 2 alfa e 2 beta se polimeriza. Esse polímero insolúvel se organiza em 14 cadeias helicoidais que coalescem formando cristais, altera a distribuição dos eletrólitos intracelulares modificando a célula, que adquire formato alongado, perdendo sua capacidade de deformidade. Com repetição do fenômeno as células se tornam irreversivelmente deformadas.
Quando deformadas já se pode perceber alterações permanentes na membrana celular causadas, principalmente, pela perda de potássio intracelular causando desidratação progressiva e contribuição para a formação de novos polímeros. Essas modificações da membrana culminam com alterações no citoesqueleto celular causada pela geração de superóxidos intracelulares. Algumas hemácias sofrem lise intravascular promovendo a liberação de hemoglobina. Esta hemoglobina livre tem a capacidade de inibir a formação de óxido nítrico, um potente agente vasodilatador do endotélio, atuando no processo de vasoclusão. Os neutrófilos também contribuem para esta oclusão, pois além de serem encontrados em maiores quantidades no sangue periférico de pacientes com doença falciforme expressam um maior número de moléculas de adesão, potencializando o fenômeno inflamatório.
Também pode ser observado o número e volume das plaquetas, bem como diminuição da capacidade de agregação e redução dos níveis de proteína C e S. Entretanto ainda não está comprovada a participação desse fenômeno na oclusão.
A vasoclusão acontece mais na microcirculação quando a hemácia transita nos vasos de pequeno calibre. Ademais as hemácias expressam maior quantidade de moléculas de adesão CD36 e a4b1 integrinas. Moléculas correspondentes estão presentes no endotélio vascular e parecem ser mais reativas do que em indivíduos normais.
Na interação da hemácia atuam também componentes da matriz subendotelial, como a laminina, o FvW, a proteína TSP liberada pelas plaquetas e que também apresenta propriedades de adesão.
**O tempo de trânsito da hemácia no leito capilar é maior do que o tempo necessário para que a desoxigenação induza a polimerização da hemoglobina S.
 
Hemoglobina fetal
O gene g é responsável pela produção de hemoglobina fetal 2 alfa e 2 gama. Esta Hb tem maior afinidade com o oxigênio do que as Hb S e A. Por isso, quanto maior sua quantidade, mais oxigênio estará retido e menores serão os efeitos da baixa de oxigênio.
Talassemia alfa
No Brasil, estudos realizados com população de pacientes com doença falciforme apontam para a prevalênica de 30%. A interação com a talassemia afeta o fenótipo da doença falciforme por reduzir a concentração de hemoglobina corpuscular média, aumentando a solubilidade intracelular, modulando positivamente o curso clínico da doença. Por outro lado, os portadores do fenótipo doença falciforme/talassemia a, têm hematócritos mais elevados, o que aumenta a viscosidade sanguínea, acarretando em aumento de episódios de dor e de osteonecrose.
Diagnóstico
PRIMEIRAS FERRAMENTAS: hemograma e hematoscopia do sangue periférico.
No entanto, a definição do genótipo da doença falciforme é facilitada quando se dispõe também da amostra de sangue dos familiares. O diagnóstico final é feito pelo estudo das hemoglobinas.
Exames hematológicos e bioquímicos: o paciente após 3 meses de idade e em fase estável apresenta Hb entre 6 e 8 g/dl. Nos pacientes com curso mais brando, a Hb se encontra entre 10 e 11 g/dl. Apesar variar entre os indivíduos, a Hb costuma ficar estável no mesmo indivíduo e por isso serve de parâmetro para acompanhamento do quadro clínico. Observa-se uma anemia normocrômica e normocítica junto com pecilocitose (alteração da forma) com presença de hemácias em foice, em alvo e em formas bizarras, anisocitose (hemácias de tamanho variável) e policromatofilia (indicação de basofilia, o que traduz grande quantidade de hemácias jovens).
Portadores de SS - apresentam drepanócitos;
Portadores de SC - apresntam drepanócitos e hemácias em alvo;
Talassemia SB - células bizarras, microcitose e alguns drepanócitos.
Achado hematológico comum: presença de corpúsculos de Howell-Jolly no interior das hemácias, o que se relaciona à diminuição da função esplênica.
O percentual de reticulócitos, em geral em torno de 10%, reflete a hiper-hemólise crônica destes pacientes. São ainda observados, ocasionalmente, eritroblastos em número significativo (podem ser contadas como leucócitos pelo aparelho de automação simulando uma leucocitose elevada).
A leucocitose (6.000 a 20.000/dl) com desvio à esquerda e plaquetose (600.000a 1.000.000/dl) são quase sempre observadas e estão associadas à hiperfunção da medula óssea, que ocorre como resposta à anemia hemolítica.
Sinais laboratoriais da hemólise também estão presentes: aumento de bilirrubina indireta, redução da haptoglobina, aumento da excreção de urobilinogênio urinário e aumento da desidrogenase láctica (DHL). O VHS estará baixo, pois mesmo havendo uma resposta inflamatória a hemácia é incapaz de formar o rouleaux.
Estudo da hemoglobina
A eletroforese de hemoglobina em pH básico norteia o diagnóstico. Ela deve ser complementada pela eletroforese em ágar em pH 6,1 separando Hb D de Hb S. Estas técnicas são as mais utilizadas no Brasil. N entanto, só podem ser utilizados após o primeiro mês de vida, pois a alta concentração de Hb fetal reduz sua especificidade.
Os testes moleculares com o PCR são dispendiosos e não estão largamente disponíveis no Brasil, mas são úteis para a detecção de talassemia a, variantes da hemoglobina D e definição dos halótipos S.
As técnicas de cromatografia líquida de alta resolução (HPLC, high performance liquid chromatography) e as de focalização isoelétrica permitem a quantificação das frações de hemoglobina, exigem pouco volume de sg e possibilitam a utilização de dados de automação. Pela especificidade, conseguem separar a hemoglobina fetal das outras frações e por isso têm grande utilização no diagnóstico neonatal.
A triagem neonatal é realizada desde 2001 e tem representado o início da mudança da história natural da doença.
O diagnóstico pré-natal pode ser feito pelo DNA retirado do líquido amniótico obtido após a 15ª semana de gestação ou por biópsia da vilosidade coriônica a partir da 10ª semana de gestação.
Quadro clínico
A hemólise é responsável pela anemia que raramente é sintomática. Muitos toleram Hb entre 5 e 7 g/dl. A transfusão deve ser realizada quando ocorrer queda de 20% do hematócrito basal do paciente. A reposição deve ser feita com concentrado de hemácias na dose média de 300ml para adultos e de 10 ml/kg para crianças.
A hiperbilirrubinemia direta representa sofrimento do parênquima hepático. Os cálculos biliares traduzem a hemólise crônica estando presente em cerca de 50 a 70% dos adultos.
**A insuficiência de órgãos vitais é a maior causa de morte no adulto com doença falciforme e corresponde a diminuição da expectativa de vida nos indivíduos.
Evolução clínica, tratamento e prevenção
Dor aguda (crises de falcização): é a forma mais frequente de vasoclusão. É caracterizado pelo surgimento de dor óssea, abdominal ou torácica. Costuma ser a primeira manifestação em 25% dos pacientes e o sintoma mais frequente após 2 anos de vida. É mais comum em paciente HbSS e talassmia Sb0.
Obs.: 39% dos pacientes não apresentam crises de dor.
A dor é o resultado da obstrução da microcirculação ocasionada pelo afoiçamento das hemácias. As crises álgicas ocorrem de forma inesperada, muitas vezes sem pródromos. Elas podem ocorrer após episódio infeccioso (febre, desidratação e acidose), resfriamento súbito da pele ou exposição à estresse físico ou emocional.
A dor resultante da isquemia pode ser muito intensa e progressiva e a hipóxia tecidual secundária à oclusão promove a percepção nociceptiva da dor. Componentes neuropáticos podem também estar presentes, como sensação de queimação ou dormência.
O quadro álgico pode agudo, subagudo ou crônico e vir acompanhado de febre, edema e calor na área acometida. Os ossos mais acometidos são: úmero, tíbia e fêmur, entretanto o infarto ósseo pode ocorrer em qualquer osso, sendo mais acometido os da face. Os exames radiológicos, na maioria das vezes, são inconclusivos.
A crise de dor abdominal está relacionada com o infarto de pequenas veias mesentéricas e das vísceras abdominais. É caracterizada por uma dor intensa acompanhada com sinais de irritação peritoneal. Pode ser diferenciada da apendicite pela presença de RHA.
Crise vasoclusiva localizada
1)Síndrome mão-pé: frequentemente, o primeiro episódio de crise vasoclusiva na infância acomete os pequenos ossos das mãos e pés e ocorre me cerca de 50% das crianças portadoras da doença falciforme SS até os 2 anos de idade. O dorso da mão ou do pé se torna extremamente edemaciado e doloroso. Alterações radiológicas só são evidentes após 2 a 3 semanas do início do episódio. A síndrome dura em média 1 a 2 semanas e quando ocorre no primeiro ano de vida é sinal de doença de pior prognóstico.
2)Osteonecrose: aos 35 anos, cerca de 50% dos pacientes com doença falciforme SS apresentam osteonecrose de cabeça do fêmur ou do ombro. A instalação do quadro pode ocorrer na infância quando há microinfarto nas trabéculas dos ossos longos. A doença no ombro é, na maioria das vezes, assintomática, mas a lesão coxofemoral é extremamente dolorosa apresentando limitações físicas.
Nos casos mais brandos o repouso,uso de bengalas, AINES, fisioterapia e hidroterapia podem retardar a evolução da lesão. Contudo se houver progressão, a dor pode se tornar muito importante e o tratamento cirúrgico deve ser considerado. Por isso deve ser monitorado por RM em adolescentes as articulações coxofemorais.
3)Priapismo: é resultante da vasoclusão dentro dos sinusoides e do corpo cavernoso peniano, ocorre em 5 a 45% dos pacientes. A prevalência deste sintoma costuma ser subnotificado. A maioria dos episódios tem curta duração e cede espontaneamente, todavia crises com duração superior a 24 horas estão associadas com o aparecimento de impotência sexual. Podem ocorrer em crinaças e adultos, sendo estes últimos frequente a necessidade de intervenção cirúrgica. O tratamento consiste inicialmente em hidratação e analgesia. Caso não haja melhora nas primeiras 12 horas, pode-se tentar a tranfusão de troca para diminuir a quantidade de Hb S em 30%. Após esse período se houver manutenção, a aspiração do corpo cavernoso e a irrigação com salina ou realização de shunt ou bypass cirúrgico devem ser consideradas.
4) Cérebro: o AVC é a segunda causa de mortalidade. Acomete preferencialmente as artérias do polígono de Willis e a carótida interna. O quadro tem início abrupto com hemiparesia, alteração do sensorio ou afasia. A RM pode ser normal, mas deve ser realizada para estabelecer diagnóstico diferencial com AVC hemorrágico. Com a suspeita clínica de AVC, as medidas iniciais são manter o paciente estável e com hidratação venosa. Entretanto, com a suspeita clínica de AVC, o paciente deve ser submetido à transfusão sanguínea imediata para aumentar a oxigeação e reduzir o risco de nova vasoclusão.
Em geral, por causa da natureza progressiva da doença, sem tratamento, há recorrência do AVC em 80% dos casos. Com a manutenção do esquema de transfusão 10% dos casos apresenta recorrência.
Outro fenômeno observado desde a infância é a formação aneurismática. Presume-se que seja uma resposta à lesão progressiva da íntima nos locais de enfraquecimento da parede vascular. É o principal mecanismo para AVC hemorrágico apresentando pico de incidência entre 20 e 29 anos de idade e taxa de mortalidade de 26%. O tratamento do AVC hemorrágico inclui hidratação, medidas gerais de estabilização e nimodipino para reduzir o vasospasmo. Drenagem e ligadura dos aneurismas, acessíveis cirurgicamente, devem ser consideradas. 
5) Síndrome torácica aguda: é a maior causa de mortalidade (2% em crianças e 5% em adultos). Apresenta este nome devido a ausência de comprovação quanto à sua fisiopatologia. É caracterizada pela presença de infiltrado pulmonar sem etiologia definida. A infecção geralmente está associa a STA em crianças e a vasoclusão é o fenômeno desencadeante em adultos.
A hipóxia devido a oclusão ou infecção aumenta a adesão do eritrócito ao endotélio vascular pela interação da molécula VLA4 do eritrócito com a VCAM-1 vascular presente no endotélio. Além disso, a hipóxia reduz a produção do óxido nítrico.
A STA é acompanhada de febre, dor tipo pleurítica, tosse e hipoxemia que variam de intensidade de um indivíduo para o outro. Ocorre pelo menos 1 vez em 30% dos pacientes. Os micro-organismosmais comumente envolvidos são: Chlamydia Mycoplasma, vírus sincicial respiratório, Staphilococcus coagulase-positivo, Streptococcus pneumoniae, Mycoplasma hominis, parvovírus B19 e rinovírus.
Metade dos pacientes adulto admitidos por dor óssea evoluem para STA.É importante salientar que todo paciente que chegue à emergência com clínica de dor, principalmente em 
região torácica, seja monitorado com raios X seriados e oximetria de pulso. 
Em vigência de saturação de O2 abaixo de 92%, a oxigenação por máscara deve ser implementada.
É importante salientar que todo paciente que chegue à emergência com clínica de dor, principalmente em região torácica, seja monitorado com raios X seriados e oximetria de pulso. Em vigência de saturação de O2 abaixo de 92%, a oxigenação por máscara deve ser implementada.
6) Baço e infecção: a infecção é a principal causa de morbidade e mortalidade em crianças durante o primeiro ano de vida e o principal patógeno é o Streptococcus pneumoniae. Os pacientes com doença falciforme perdem a função do sistema reticuloendotelial precocemente. O defeito imunológico parece estar relacionado com defeito na opsonização, em decorrência da redução da produção de anticorpos específicos. Os indivíduos são mais vulneráveis por germes encapsulados, com Streptococcus pneumoniae e Haemophilus influenzae. Além da hipoesplenia, existe evidência de função anormal de granulócitos, afetando ainda mais a capacidade de eliminação dos micro-organismos.
Septicemia, pneumonia, meningite e otite são as infecções mais comuns na infância, podendo assumir proporções devastadoras em curto espaço de tempo. No adulto, além de meningite e pneumonia, existe aumento na frequência de osteomielites. Septicemia, pneumonia, meningite e otite são as infecções mais comuns 
na infância, podendo assumir proporções devastadoras em curto espaço de tempo. 
No adulto, além de meningite e pneumonia, existe aumento na frequência de osteomielites.
7) Úlcera de perna: a úlcera afeta aproximadamente 20% dos pacientes adultos com doença falciforme, sendo mais prevalente naqueles com SS e talassemia Sb0. Surge na adolescência com o pico de incidência após 20 anos de idade. As lesões ocorrem de preferência nos maléolos medial e lateral, uni e bilateralmente. É normalmente associado a pequenos traumatismos, mas pde ocorrer enspontaneamente ou através de pele ressecada e fissuras.
O tratamento da úlcera de perna inclui utilização de câmara hiperbárica, bota de Unna, enxertos de pele, zinco oral e medicamentos tópicos variados. A multiplicidade de opções reflete a ineficácia de todos esses métodos em cicatrizar e prevenir a recorrência da lesão. A realização de transfusão de troca, em pacientes com lesões muito extensas ou dolorosas, pode contribuir para a cicatrização da ferida e a diminuição da utilização de analgésicos. A profilaxia inclui o uso de tênis e meias de cano alto, além de uso de cremes.
*Gravidez: não está contraindicada mas é necessário um acompanhamento especial. O aumento da morbidade está associada ao curso crônico da doença com a condição circulatória da placenta, pois a alta taxa de extração de oxigênio provê substrato para o afoiçamento e o infarto.
As complicações ocorrem predominantemente no 3 trimestre e incluem pielonefrite, hematúria e infarto ósseo. Para o bebê relaciona-se com baixo peso.
A mulher deve ser acompanhada a cada 2 semanas e durante o parto o feto deve ser monitorado continuamente. A reposição de ferro dever ser feita quando a ferritina estiver reduzida. Mesmo com o acompanhamento 1 a 20% das pacientes apresentam aborto espontâneo.
Podem ser utilizados ACO com baixa quantidade de estrógeno, pois não aumenta a morbidade.
Para os melhores resultados algumas precauções devem ser obedecidas: • Realizar transfusão simples para elevar hemoglobina a 10 g/dℓ ou transfusão de troca para reduzir a hemoglobina S a 30%77 • Manter boa oxigenação durante a cirurgia e no pós­-operatório imediato • Realizar exercícios expiratórios no pós-­operatório tardio para prevenir episódios de STA.
Crises álgicas
Os principais fatores desencadeantes são: frio, trauma, esforço físico, desidratação, infecções e hipóxia. A dor deve ser tratada, inicialmente, com analgésicos comuns (dipirona e paracetamol), em doses habituais e fixas por via oral. Além disso deve ser iniciada a hidratação oral com água e outros líquidos (1,5 a 2 vezes os valores das necessidades hídricas para a idade). É importante instituir o tratamento no início do quadro, pois a própria dor pode levar à piora da crise.
Se não haver melhora da crise o paciente deve ser internado. A dipirona venosa regular, então pode ser instituída. Não se observando melhora, associa-se com codeína a 2% por via oral ou um AINE, podendo-se optar por medicamentos que tenham em sua formulação a associação de paracetamol com codeína. Essa analgesia deve ser mantida de 6 em 6 horas ou até mesmo de 4 em 4 horas. Não havendo melhora ou constando-se intolerância imediata (por vômitos por exemplo), deve-se manter o analgésico comum e substituir a codeína por um outro opioide, como a morfina ou metadona.
A analgesia deve ser mantida pelo menos após 24 a 48 horas após a remissão completa da dor, podendo retornar para a via oral. O opioide usado por até uma semana pode ser descontinuado abruptamente. O uso por mais de 7 a 10 dias exige retirada gradual, reduzindo a dose nos primeiros dois a 50%, 25% nos dois dias seguintes e assim sucessivamente até que o opioide esteja com o valor analgésico equivalente da morfina (0,6mg/kg/dia para crianças e 30mg/dia para pacientes acima de 50kg).
É importante a manutenção de hidratação venosa adequada com soro 4:1 (quatro partes de SGI 5% e uma parte de SF 0,9%), mantendo-se as necessidades básicas, mas respeitando as condições cardiopulmonares do paciente. Recomenda-se o início precoce de fisioterapia respiratória e motora.
Fatores desencadeantes e mantenedores da dor, principalmente infecções, devem ser prontamente tratados. Dor óssea e edema localizado (com restrição de movimentos e febre) requerem avaliação ortopédica, além de exame radiológico, hemograma, hemocultura e dosagem de proteína C reativa (PCR) para investigação de osteomielite, que deverá ser tratada com antibioticoterapia específica sistêmica. A dor abdominal pode simular abdome agudo cirúrgico. Deve ser tratada com analgesia e hidratação, como os outros episódios dolorosos. A observação contínua da evolução do quadro, com propedêutica adequada para abdome agudo, permite afastar outros diagnósticos.
 
Referências: USP, Antônio Carlos Lopes, Manual de eventos agudos em doença falciforme MS-2009

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