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DA ANÁLISE SINTÉTICA DA SÚMULA 331 DO TST

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DA ANÁLISE SINTÉTICA DA SÚMULA 331 DO TST:
Segundo a doutrina[4] a terceirização consiste na “relação trilateral entre trabalhador, intermediador de mão-de-obra (empregador aparente, formal ou dissimulado) e o tomador de serviços (empregador real ou natural), caracterizada pela não coincidência do empregador real com o formal.”
Assim, é viabilizado ao tomador de serviço fazer uso de mão-de-obra prestada por trabalhador cuja relação empregatícia se dá com outra empresa, fato este que lhe é bastante conveniente ante a diminuição dos custos (já que a tomadora, a princípio, não se compromete com o pagamento de encargos trabalhistas) e melhora na qualidade dos produtos ou serviço[5] (tendo em vista a possibilidade de voltar sua atenção tão somente para a atividade que consiste em seu objeto principal - atividade fim).
Face ao objetivo específico do presente estudo, deixaremos de analisar em profundidade maiores aspectos referentes ao tema, tais como o desenvolvimento histórico, passando diretamente a uma rápida análise do teor da Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho, analisando cada um de seus incisos individualmente. Vejamos :
Inicialmente, a Súmula 331 dispõe em seu inciso I que: “A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).”
Sergio Pinto Martins [6], ao analisar o inciso supra transcrito, tece uma interessante observação. Aduz que, na verdade, a contratação por empresa interposta não se afigura, por si só, ilegal. Deverá ser assim considerada tão somente quando exista fraude com o objetivo de frustrar a aplicação da lei trabalhista.
Vale dizer, constatando-se a existência dos elementos da relação de emprego[7] previstos no art. 2º e 3º da CLT, o vínculo empregatício será formado diretamente com o tomador de serviços. Trata-se, na verdade, da aplicação do princípio da primazia da realidade, tão presente no Direito do Trabalho.
Outra exceção quanto à possibilidade de formação do vínculo empregatício com o tomador de serviços, se tem no inciso II da súmula. Neste caso, de acordo com a lição de Maria Alice Monteiro de Barros[8], preocupou-se o TST em resguardar o mandamento constitucional contido no art. 37, II da Constituição Federal, deixando clara a impossibilidade de reconhecimento de relação de emprego entre o trabalhador e os órgãos da administração direta ou indireta, em razão da prestação de serviços por meio de contratação irregular, sem o necessário concurso público. 
Neste ponto, saliente-se a previsão contida na súmula 363, também do TST a qual vaticina que em tais hipóteses será garantido ao trabalhador irregularmente contratado pela administração pública (direta ou indireta) tão somente o pagamento da contraprestação pactuada, em relação ao número de horas trabalhadas, observando-se, para tanto, o valor do salário mínimo bem como aqueles referentes aos depósitos do FGTS.
Passando-se à análise do inciso III da súmula em comento, se depreende a possibilidade de utilização do contrato de terceirização nas hipóteses de serviços de vigilância, conservação e limpeza, ou de serviços especializados. Dispõe o aludido inciso que: “Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados a atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinaçãodireta”.(grifamos)
A princípio, a questão que mais chama atenção do referido inciso, tem relação com a dicotomia entre “atividade-meio” e “atividade-fim”, havendo discussões sobre a possibilidade ou não desta última figurar como objeto de serviço terceirizado.
Fato é que, por hora, a doutrina e jurisprudência majoritárias se inclinam pela negativa. Para ilustrar tal posicionamento, trazemos à colação a decisão abaixo transcrita, in verbis:
“EMPRESA DE TELEFONIA CELULAR – TRABALHO EM CALL CENTER – ATIVIDADE-FIM – TERCEIRIZAÇÃO ILÍCITA – RECONHECIMENTO DO VÍNCULO DE EMPREGO DIRETAMENTE COM A TOMADORA DOS SERVIÇOS – A prestação de serviços do trabalhador perante a tomadora, no desempenho de tarefas ligadas à atividade essencial da empresa, em hipótese distinta de labor temporário ou de misteres de vigilância, conservação e limpeza, conduz à ilegalidade da contratação. Nesta hipótese, é de se reconhecer a formação de vínculo empregatício diretamente com a tomadora- No caso, a concessionária de telefonia móvel BCP S.A- Real beneficiária da força de trabalho despendida pelo obreiro, atendente de call center. Aplicação da diretriz da súmula 331, I e III, do Colendo Tribunal Superior do Trabalho. Recurso ordinário autoral a que se dá provimento, neste aspecto.” (TRT 6ª R. – RO 01042-2007-013-06-00-6 – 2ª T. – Relª Juíza Dinah Figueirêdo Bernardo – J. 09.07.2008) (grifamos)
Assim, ad cautelam e considerando o cunho preventivo do presente trabalho, tem-se por desaconselhável a utilização de serviços terceirizados em atividade-fim da empresa, entendida esta como a atividades núcleo da empresa, as quais definem a essência da dinâmica empresarial do tomador de serviços.
Note-se ainda a referência, no inciso III da súmula 331 do TST, à necessidade de inexistência pessoalidade ousubordinação direta, em relação aos trabalhadores que executam serviços terceirizados, por parte das empresas tomadoras de serviços para que não se configure o vínculo de emprego. 
Esclareça-se que a preocupação com a presença de tais características na relação entre o tomador de serviços tem relação com o fato de tratar-se de elementos da relação de emprego. Ora, se associarmos a presença destes elementos com aqueles já presentes na “terceirização”, quais sejam, habitualidade, onerosidade e alteridade, resta evidente que a essência daquela relação será empregatícia.  Tratar-se-ia, portanto, em terceirização ilícita, na medida em que haveria burla a legislação, em especial, tendo em vista o teor dos arts. 2º e 3º da CLT.
Reitere-se a informação de que, mesmo diante da presença de todos os elementos caracterizadores da relação de emprego, devemos sempre ter atenção às hipóteses em que a própria lei veda o reconhecimento desta, a exemplo do que ocorre nos casos de terceirização ilícita onde a Administração Pública figure como tomadora de serviços (conforme já exposto) e ainda o caso de serviço de vigilância armada, uma vez que a respectiva lei nº 7.102/83 exige que a arma seja de propriedade de empresa de segurança, inviabilizando assim o que qualquer outra empresa figure como empregadora de vigilante armado.
Outra observação que merece nota tem relação com a expressão subordinação “direta”. 
Parece que tal expressão acolhida pela súmula vem gerando controvérsias, havendo questionamentos sobre a possibilidade de haver a chamada “subordinação indireta”, a qual consistiria numa espécie de repasse de ordens (por parte do tomador de serviços) a um preposto/supervisor do prestador de serviços visando que este exerça o poder diretivo nos moldes almejados pelo tomador.
Em termos simples e para melhor compreensão, pode-se fazer uso de uma analogia singela, mas não menos pertinente, com a brincadeira de criança conhecida por “telefone sem fio”, onde o repasse de informações vai se dando um a um.
Assim, é fato que, a tentativa de mascarar existência de subordinação mediante tal manobra não pode se prestar a maquiar a subordinação.
Outro conceito que vem ganhando espaço no que tange à subordinação é que merece atenção, consiste na chamada subordinação estrutural.
Neste caso, o exercício do poder diretivo no sentido de aferir-se a existência ou não de uma subordinação direta ou mesma a indireta, cede espaço para a concepção de inserção ou não do trabalhador na estrutura empresarial.  Para melhor visualização, veja-se o que dispõe a jurisprudência sobre o assunto:
“SUBORDINAÇÃOESTRUTURAL. SUBORDINAÇÃO ORDINÁRIA. O Direito do Trabalho contemporâneo evoluiu o conceito da subordinação objetivapara o conceito de subordinação estrutural como caracterizador do elemento previsto no art. 3o. da CLT. A subordinação estrutural é aquela que se manifesta pela inserção do trabalhador na dinâmica do tomador de seus serviços, pouco importando se receba ou não suas ordens diretas, mas se a empresa o acolhe, estruturalmente, em sua dinâmica de organização e funcionamento. Vínculo que se reconhece. (TRT 3ª Reg. –3ª T. – RO 01352-2006-060-03-00-3 – Red.ª Juíza Conv. Adriana Goulart de Sena – DJMG 25/08/2007, p. 11)”. (grifos nossos)
Tem-se portanto que, eventual caracterização de subordinação (seja a direta, a indireta ou a estrutural), aliada à presença da pessoalidade entre trabalhador e empresa tomadora de serviços poderá (considerando a presença dos demais elementos) vir a configurar a relação empregatícia entre estes, descaracterizando, portanto, o contrato de prestação de serviços, conforme já ressaltado.
Conclui-se assim que o tomador de serviços deve limitar-se a direcionar sua atenção ao resultado do trabalho contratado e não com a gestão desta mão de obra, evitando ainda a inserção deste trabalhador “terceirizado”[9], na dinâmica organizacional e de funcionamento da empresa.
Finalmente, temos o inciso IV da Súmula 331 do TST, o qual fixa a responsabilidade subsidiária do tomador de serviços pelas obrigações trabalhistas que venham a ser inadimplidas pela empresa prestadora de serviços contratada. Aduz que “o inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação processual e constem também do título executivo judicial (art. 71 da Lei nº 8.666, de 21.06.1993).”
Note-se que o mesmo inciso, em sua parte final, fixa a possibilidade de responsabilização do ente público que figure como tomador de serviços, de forma subsidiária, quanto às obrigações trabalhistas decorrentes do contrato de trabalho. Para tal exige tão somente que tal ente tenha integrado a relação processual, bem como o título executivo judicial.
Insta ressaltar que a possibilidade de responsabilização subsidiária prescinde da ilicitude da terceirização, bastando que haja o inadimplemento das obrigações por parte do empregador (empresa prestadora de serviços), devendo-se, é claro, observar-se o pré-requisito de que a empresa tomadora de serviços tenha participado da relação processual, constando também no título executivo, conforme bem enfatizou a súmula em tela visando garantir o exercício dos princípios do contraditório e da ampla defesa por parte desta.
Em outras palavras, a responsabilização subsidiária pelas verbas trabalhistas não quitadas pela empresa prestadora de serviços ao seu empregado e cujo labor teve como beneficiário a empresa tomadora de serviços, será atribuído a esta, ainda que inexistentes a subordinação e a pessoalidade. Deverá, entretanto, ser limitada ao pagamento de valores referentes ao período em que foi beneficiada por aquela mão-de-obra.
Neste sentido, colhe-se, a propósito, o magistério de HOMERO BATISTA MATEUS DA SILVA[10] segundo o qual:“(...) O tomador está eximido de cobrir as dívidas trabalhistas contraídas pelo subcontratado relativamente a período em que o trabalhador não prestou serviços ali, seja porque ainda não havia contrato entre as pessoas jurídicas, seja porque o trabalhador ainda não estava lotado naquele estabelecimento, seja porque havia sido deslocado para a base, seja, por fim, por motivo de suspensão do contrato. (...)”
Destarte, da análise da súmula 331 e seus incisos, pode-se inferir como principal conseqüência a responsabilização subsidiaria do tomador de serviços, o qual deverá arcar com o pagamento de todas as parcelas que sejam, inicialmente, de responsabilidade do devedor principal, ante ao entendimento de configuração das chamadas culpa in eligendo (má escolha da empresa contratada) e culpa in vigilando (ausência de fiscalização quanto ao cumprimento por parte desta em relação a suas obrigações para com os empregados que atuaram junto à tomadora de serviços).
Em suma, na hipótese de inadimplemento da obrigação pelo devedor principal, segundo a doutrina, incidirá a plena responsabilidade do tomador de serviços.[11] Na esteira desta linha de raciocínio, manifesta-se a jurisprudência:
“TERCEIRIZAÇÃO – RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DO TOMADOR DOS SERVIÇOS – No âmbito da responsabilidade subsidiária do tomador de serviços, não basta a regularidade da terceirização, há que se perquirir sobre o cumprimento das obrigações trabalhistas pela contratada durante a vigência do contrato de trabalho. O tomador de serviços, ainda que Ente da Administração Pública, é responsável subsidiário pelos créditos trabalhistas do empregado adquiridos diante do trabalho que para ele é executado em cumprimento de contrato estabelecido com terceiro, sendo-lhe atribuída a culpa in eligendo e a culpa in vigilando. Se o real empregador for inadimplente nas suas obrigações trabalhistas, deve o beneficiário dos serviços prestados responder subsidiariamente quanto a estas obrigações, conforme determina o inciso IV, do Enunciado 331, do TST”. (TRT 16ª R. – RO 00184-2008-008-16-00-7 – Rel. Des. Luiz Cosmo da Silva Júnior – DJe 22.09.2009 – p. 9) (grifos nossos)
Note-se que, em que pese a relação civil estabelecida entre as empresas que contratam entre si a prestação se serviços terceirizados, não se cogita da exclusão de responsabilidade da tomadora de serviços com base neste fundamento em razão exatamente do teor da súmula 331 do TST.
Por certo existem diversos questionamentos teóricos acerca da aplicabilidade e sujeição a tal disposição, não obstante, por hora, dificilmente o tomador de serviços vem conseguindo esquivar-se da responsabilidade imputada pela súmula, acaso enquadrado nas situações que desafiam sua incidência. 
No mais, pensamos ser pertinente apenas lembrar que, mesmo tendo-se em vista a ausência de uma norma legal específica fixando a responsabilidade subsidiaria do tomador de serviços, é preciso ter em vista que também os contratos de natureza civil são regidos por princípios que poderiam justificar o alcance desta responsabilização, em especial em relação à “função social do contrato” , valendo-se registrar que, nesta seara, também os arts. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil, bem como os arts. 186 e 927 do Código Civil podem ser invocados.
Neste sentido, trazemos a colação trecho de julgado que bem destaca a questão:
“(...) RESPONSABILIZAÇÃO SUBSIDIÁRIA – TOMADORA – EMPRESA PARTICULAR – IMPOSIÇÃO CALCADA EM SÚMULA DO TST – VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE – INOCORRÊNCIA – Embora não haja, efetivamente, qualquer dispositivo legal que trate especificamente da condenação subsidiária da empresa tomadora de serviços, esta se escora na construção jurisprudencial representada pela Súmula nº 331, do C. TST. Esta, por sua vez, encontra suporte nos arts. 186 e 927 do CCB, no art. 8º, da CLT, no art. 4º da LICC e no art. 127 do CPC, eis que se trata "de princípio de responsabilidade trabalhista que todo aquele que se beneficia direta ou indiretamente do trabalho do empregado deve responder com seu patrimônio pelo adimplemento das obrigações correspondentes". A imposição condenatória segundo estes parâmetros, portanto, não implica em violação ao princípio da legalidade. (...)” (TRT 15ª R. – RO 1604-2007-034-15-00-3 – (43301/09) – 12ª C. – Relª Olga Aida Joaquim Gomieri – DOE 17.07.2009 – p. 178)
Há ainda que se ter em vista também a diretriz fixada pela Constituição Federal, segundo a qual, o valor social do trabalho e a dignidade da pessoa humana - dentre outras tantas disposições que zelam pelos direitos dos trabalhadores – também se prestam a sustentáculos a teses favoráveis a responsabilização do tomador de serviços.
Finalmente, registre-se apenas a possibilidade de exclusão da responsabilidadesubsidiária (e esta devidamente albergada pelo próprio Tribunal Superior do Trabalho) caso o tomador de serviços apresente-se como mero dono da obra, como no caso da contratação de serviço de empreitada, ressalvando-se as empresas que tenham como objetivo social a construção civil, conforme denota a decisão abaixo colacionada:
“DONO DA OBRA – RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA E SUBSIDIÁRIA – NÃO CONFIGURAÇÃO – Diante da inexistência de previsão legal, o contrato de empreitada entre o dono da obra e o empreiteiro não enseja responsabilidade solidária ou subsidiária nas obrigações trabalhistas contraídas pelo empreiteiro, salvo sendo o dono da obra uma empresa construtora ou incorporadora” (OJ 191, SDI-1/TST). (TRT 5ª R. – RO 00356-2007-134-05-00-6 – 1ª T. – Rel. Marama Carneiro – J. 15.12.2008) (grifamos)
Como dito, outros questionamentos buscando a exclusão da responsabilidade subsidiária existem, mas como, de forma geral, estes não têm sido acatados pelos tribunais, deixamos de abordá-los no presente estudo.

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