Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
1 HERMENÊUTICA JURÍDICA – AS DIFERENÇAS ENFÁTICAS ENTRE ZETÉTICA E DOGMÁTICA APLICADA AO CONCEITO DE CRIME NA CRIMINOLOGIA E NO DIREITO PENAL Ricardo Fidelis 1 RESUMO Este artigo cientifico tem como objetivo fazer uma abordagem ao conceito de crime, sob a ótica das diferenças enfáticas entre Zetética Jurídica aplicada a Criminologia e da Dogmática Jurídica aplicada ao Direito Penal. As aplicações zetéticas ao conceito de crime na Criminologia vão ao encontro de aspectos sociológicos, antropológicos, psicológicos, históricos, filosóficos e políticos. Já a abordagem Dogmática Jurídica aplicada ao Direito Penal, conceitua o crime tendo com referência formal e material o ordenamento jurídico positivado. Palavras Chave: Crime. Zetética Jurídica. Dogmática Jurídica. Criminologia. Direito Penal. 1 Aluno de graduação em Direito. Universidade Central Paulista – UNICEP. E-mail: ricardofidelissp@gmail.com 2 1 INTRODUÇÃO A ciência jurídica não apenas informa, mas também conforma o fenômeno que estuda através do direito, que se encontra de acordo com BOBBIO (2014, p.38), em uma complexa organização que determina a natureza e a entidade das sanções, as pessoas que devem exercê-las e sua execução, ou seja, as normas jurídicas gravitando dentro de seu universo, o ordenamento jurídico. Para que seja possível interpretar esse universo jurídico, é imprescindível que se faça um estudo Hermenêutico. Para MAXIMILIANO (2011, p.1), a Hermêneutica é a teoria científica da arte de interpretar, e juridicamente é a ciência que permite de forma sistematizada determinar o sentido e o alcance das expressões do Direito. O Direito é por assim dizer, um resultado que só existe e se realiza numa prática interpretativa, e como objeto, o Direito pode ser estudado de diferentes ângulos. De modo sistematizado esse estudo fará uma abordagem, juridicamente hermenêutica sobre as diferenças enfáticas entre Zetética e Dogmática. (TÍTULO) Para FERRAZ JUNIOR (2003, p.35), a palavra Zetética vem de zetein, que significa perquirir, e Dogmática vem de dokein, que significa ensinar, doutrinar. A título de exemplo, podemos tomar o problema de Deus na Filosofia e na Teologia, que Tercio Sampaio Ferraz Junior traz para nosso entendimento. Nesse momento é interessante fazer uma consideração a respeito das definições das palavras Filosofia e Teologia feita por Marilena Chaui, ilustríssima professora de História da Filosofia e de Filosofia Política da USP, onde lecionou desde 1967, e ver que por definição existe uma relação biunívoca entre elas e respectivamente as definições feitas das palavras Zetética e Dogmática, por Tercio Sampaio Junior. Para CHAUI (2002, p.15), Filosofia é a nova forma inusitada de pensar dos gregos e é composta de filo (vinda de philía 2 , amizade) e sofia (sophía 3 , sabedoria), philosophía: amizade pela sabedoria amor ao saber, e Teologia, conhecimento teorético racional das coisas divinas e da divindade. Composta de théos (deus, o divino) e –logía4. 2 Viva afeição, amor (sem ideia de sensualidade), sentimento de reciprocidade entre os iguais, (CHAUI, 2002, p.509). 3 Sabedoria moral ou prudente do homem razoável e sensato, (CHAUI, 2002, p.511). 4 Vem de lógos, que sintetiza vários significados, que em português, estão separados, mas unidos em grego. Vem do verbo légo (no infinitivo: légein) que significa: 1) reunir, colher, contar, enumerar, calcular, (CHAUI, 2002, p.512). 3 Feitas as considerações, e retomando o problema de Deus na Filosofia e na Teologia, observa-se que a palavra Zetética, que vem de zetein, tem como significado o verbo perquirir e como sinônimo, os verbos investigar, pesquisar ou interrogar. Pelas definições acima a palavra Zetética tem uma relação muito próxima da palavra Filosofia, que busca a sabedoria, pesquisando e questionando as coisas no plano real de suas existências, ou seja, o ser. Por essas razões a interpretação Zetética é também Filosófica, pois seus questionamentos tendem ao infinito decompondo opiniões, inclusive se a questão sobre Deus tem algum sentido. Já a palavra Dogmática vem de dokein, que tem como significado o verbo ensinar ou doutrinar e como sinônimo, os verbos educar, adestrar, instruir, treinar e orientar, que se aproxima da Teologia, que tem o estudo teorético racional das coisas divinas e da divindade, e que parte da existência de Deus como uma premissa inatacável, e se for uma teologia cristã, parte religiosamente da Bíblia como fonte que não pode ser desprezada, tornando-se um questionamento finito, partindo de dogmas relacionados a uma dúvida que, não podendo ser substituída por uma evidência, exige uma decisão de como deve ser a existência de algo, situando-se num plano do deve ser. 2 CRIMINOLOGIA E O CONCEITO DE CRIME Para a criminologia o conceito de delito é encarado como um fenômeno comunitário e como um problema social, porém esse conceito ainda é muito vago e insuficiente, SCHECAIRA (2013) conceitua o delito como sendo um problema social que tem como referência os atos humanos pré-penais definindo-os sobre quatro elementos, que serão adotados aqui, para aplicar as quatro classificações dos limites zetéticos. Para o criminologista SCHECAIRA (2013, p.44), o primeiro elemento é que tal fato tenha incidência massiva na polpulação, o que o autor quis dizer é que, o crime não há de ser reconhecido como fato isolado da sociedade, mesmo que a conduta cause indignação no seio social. Por exemplo é o caso da lei n° 7.643, de dezembro de 1987, que proíbe a pesca, ou qualquer forma de molestamento intencional, de toda espécie de cetáceo nas águas jurisdicionais brasileiras. 4 O segundo elemento conceitual de delito para SCHECAIRA (2013, p.44), é que haja incidência aflitiva do fato praticado. Para o autor é natural que o crime produza efeitos de dor, tanto para as vítimas do fato criminoso como para a comunidade como um todo, caso contrário será ilógico falar em crime. A exemplo de que para SCHECAIRA não conceitua crime por conta da ausência de dor, é a lei n° 4.888 de 9 de dezembro de 1965, que proíbe o emprego da palavra couro em produtos industrializados, e dá outras providências. Terceiro elemento constitutivo do conceito criminológico de crime, de acordo com SCHECAIRA (2013, p.45 - 46) é que haja persistência espaço-temporal do fato que se quer imputar de delituoso. Para SCHECAIRA a configuração do delito não basta ser massivo e aflitivo, é necessário que o fato, distribua-se pelo território nacional ao longo de um certo tempo, como exemplo é a subtração de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior, artigo 155, § 5º do Código Penal. O quarto e último elemento que configura um fato como delitoso, para SCHECAIRA (2013, p.46 - 47) é que se tenha um inequívoco concenso a respeito de sua etiologia e de quais técnicas de intervenção seriam mais eficazes para o seu combate. Tomemos o exemplo do próprio SCHECAIRA que faz referência ao uso do álcool: Seguramente poderíamos qualificar o álcool como uma droga lícita, mas uma droga que produz profundas consequências não somente para todos os dependentes, bem como para todos quantos tem que se relacionar com o adicto. Não se tem dúvida, pois, de que o uso indiscriminado de bebidas alcoólicas produz consequências massivas, aflitivas, e de que tais consequências tem uma persistência espaço-temporal. Mas quantos estudiosos sérios proporiam a criminalização do uso ou contrabandodo álcool? Quantos cometeriam o mesmo erro do passado, no período da Lei Seca nos Estados Unidos? Sem dúvida, não são todos os fatos que, aflitivos e massivos, com persistência espaço-temporal, devem ser considerados crimes. (SCHECAIRA, 2013, p.46 - 47) Por fim SCHECAIRA (2013, p.47) conclui seu conceito de crime, com uma crítica ao direito penal, dizendo que: “na realidade, qualquer reforma penal deveria averiguar o preenchimento dos critérios acima elencados para a verificação do juízo de necessidade da existência de cada fato delituoso”. 2.1 Zetética jurídica, criminologia e o conceito de crime O questionamento zetético do fenômeno jurídico é imensurável e se apresenta de modo multidisciplinar, ou seja, surge como um espaço aberto no campo da perquirição de 5 outras áreas do conhecimento, como por exemplo, da Sociologia, da Antropologia, da Psicologia, da História, da Filosofia, da Ciência Política etc. Esse espaço é preenchido no campo das investigações jurídicas, sob os nomes de Sociologia do Direito, Filosofia do Direito, Psicologia Forense, História do Direito etc. Para FERRAZ JUNIOR (2003, p.38) existem investigações que se valem de métodos, técnicas e resultados daquelas áreas, compondo, com investigações dogmáticas, outros âmbitos, como é o caso da Criminologia, da Penalogia, da Teoria da Legislação etc. Sob essa ótica as investigações zetéticas tem sua característica principal na abertura constante para o questionamento dos objetos em todas as direções, é por conta desse aspecto que FERRAZ JUNIOR (2003, p.38) observa que por exemplo: alguns pressupostos admitidos como verdadeiros passam a orientar os quadros da pesquisa, é possível distinguir limites zetéticos. De acordo com o autor esses presupostos zetéticos tidos como verdadeiros possuem alguns níveis, por exemplo: um nível empírico, que tem seus limites na experiência; um nível formal da lógica, que ultrapassa os limites da experiência; e, um nível puramente especulativo. A esses limites zetéticos FERRAZ JUNIOR chamou-os de zetética empírica e zetética analítica, e ainda com base em suas aplicações no campo das investigações, de zetética pura e aplicada. Agora vamos aplicar esses limites zetéticos ao conceito de crime no campo da Criminologia, porém antes vamos conceituar basica e rapidamente o que é Criminologia. O conceito de Criminologia, que sera adotado aqui é o mesmo compactuado com SCHECAIRA 5 5 Sergio Salomão Schecaira. Professor Titular da Universidade de São Paulo em regime de dedicação integral à docência e pesquisa. Possui graduação em Direito pela Universidade de São Paulo (1982), Especialização em Direito Público (1987), Mestrado em Direito Penal pela Universidade de São Paulo (1991), Doutorado em Direito Penal pela Universidade de São Paulo (1997), Livre-docência em criminologia (2004). Pós doutorado na Universidade do País Vasco (2012). Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Penal e Criminologia. É ex-presidente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária e ex- presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais - IBCCRIM. Vice presidente do Instituto Manoel Pedro Pimentel (Fadusp). Membro do Conselho de Direção da Associação internacional de Direito Penal -AIDP- (reeleito no 19º Congresso da AIDP, realizado em agosto de 2014) e ex-membro do Comitê de redação do Cahiers de Defense Sociale (Société Internationale de Défense Sociale). Atualmente é Secretário Geral Adjunto para a América Latina da Société Internacionale de Défense Sociale. Membro do Comité Científico Internacional da International Academic Network for the abolition of capital Punishment. Fonte: https://uspdigital.usp.br/tycho/CurriculoLattesMostrar?codpub=C7A25CF0513C 6 que compactuando com o pensamento de Antonio Garcia-Pablos de Molina 6 , citado em seu livro CRIMINOLOGIA (2013, p.40) que diz: A criminologia é "uma ciência empírica e interdisciplinar, que se ocupa do estudo do crime, da pessoa do infrator, da vítima e do controle social do comportamento delitivo, e que trata de subministrar urna informação válida, contrastada, sobre a gênese, dinâmica e variáveis principais do crime - contemplado este como problema individual e como problema social -, assim como sobre os programas de prevenção eficaz do mesmo e técnicas de intervenção positiva no homem delinquente". (SCHECAIRA, 2013, p.40) Visto as definições básicas acima, valtamos a aplicabilidade dos limites zetéticos ao conceito de crime no campo da Criminologia. Os limites zetéticos estão sintetizados e ordenados em quatro classificações, uma analítica pura, a segunda analítica aplicada, a terceira empírica, e a quarta em empírica aplicada, as quais FERRAZ JUNIOR classificou-as da seguinte forma: a) zetética analítica pura: desse ponto de vista, o teórico ocupa-se com os pressupostos últimos e condicionantes bem como com a crítica dos fundamentos formais e materiais do fenômeno jurídico e de seu conhecimento; b) zetética analítica aplicada: desse ponto de vista, o teórico ocupa-se com a instrumentalidade dos pressupostos últimos e condicionantes do fenômeno jurídico e seu conhecimento, quer nos aspectos formais, quer nos materiais; c) zetética empírica pura: desse ponto de vista, o teórico ocupa-se do direito enquanto regularidades de comportamento efetivo, enquanto atitudes e expectativas generalizadas que permitam explicar os diferentes fenômenos sociais; d) zetética empírica aplicada: desse ponto de vista, o teórico ocupa-se do direito como um instrumento que atua socialmente dentro de certas condições sociais. (FERRAZ JUNIOR, 2003, p.40). Abordaremos tais aplicações de forma genéria a aplicação da zetética analítica e zetética empírica, como veremos asseguir. O conceito de crime que segundo SCHECAIRA (2013, p.45 - 46), é necessário que haja persistência espaço-temporal do fato que se quer imputar de delituoso, por exemplo a subtração de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior, artigo 155, § 5º do Código Penal, aqui se faz uma investigação interpretativa dos pressupostos lógicos realizando uma investigação zetética analítica. 6 Antonio García-Pablos de Molina é doutor e professor catedrático de Direito Penal na Universidade Complutense de Madrid, onde é diretor do Instituto Universitário de Criminologia. Fonte: http://www.rt.com.br/?sub=conteudo&id=50&autor_id=92990 7 Outro exemplo de conceito de crime para SCHECAIRA (2013, p.44), é que tal fato tenha incidência massiva na polpulação, ou seja, o crime não pode ser reconhecido como fato isolado da sociedade, ainda que, a conduta cause indignação no seio social. Por exemplo é o caso da lei n° 7.643, de dezembro de 1987, que proíbe a pesca, ou qualquer forma de molestamento intencional, de toda espécie de cetáceo nas águas jurisdicionais brasileiras, sendo assim o legislador deve fazer uma investigação da conduta com vistas na realidade social, política e econômica, no plano da experiência, sendo, pois, uma investigação nos limites da zetética empírica. Partimos agora para o conceito de crime no campo do Direito Penal e da Dogmática Jurídica. 3 DIREITO PENAL E O CONCEITO DE CRIME O Direito Penal é uma das áreas da ciência jurídica que tipifica o fenômeno delito, como sendo a consequência de um fato e como resultado a pena, isto é, sinteticamente de acordo NORONHA(2004, p.4) “conjunto das prescrições emanadas do Estado, que ligam ao crime, como fato, a penacomo consequência”, ou seja, um conjunto de normas que regulam o jus puniendi, tendo em vista os fatos de natureza criminal e as medidas aplicáveis a quem os pratica, e assim começamos a definição de crime. No Brasil doutrinariamente o ordenamento jurídico penal é esparço, e encontra-se em códigos, estatutos, leis, etc. O Código Penal brasileiro lei n° 3.914 de 9 de dezembro de 1941, usa as expressões infração e contravenção, como sendo uma abrangência da palavra crime que reflete nas outras leis, como por exemplo, o Código Penal brasileiro aplica o conceito de crime e seuas regras gerais à lei n° 3.688, de 3 de outubro de 1941, Lei das Contravenções Penais; Ato infracional descrito na lei n° 8.069, de 13 de julho de 1990, que dispõe sobre o Estatuto da Crinça e do Adolescente, e tantas outras mais. Para DAMÁSIO (1995, p.192) existem quatro sistemas de conceituação do crime, que são: Formal; Material; Formal e Material; Formal, material e sintomámico. Formalmente o conceito de crime deriva do aspecto jurídico do preceito legal, esse sistema formal é um parâmetro dogmático da conduta humana qualificada como crime por uma norma penal, à exemplo, DAMÁSIO ensina a seguinte dogmática: No sentido substancial, para Manzini, delito é a ação ou omissão, imputável a uma pessoa, lesiva ou perigosa a interesse penalmente protegido, 8 constituída de determinados elementos e eventualmente integrada por certas condições, ou acompanhada de determinadas circunstâncias previstas em lei (DAMÁSIO 1995, p.193). Materialme, o crime conceitua-se sob o pensamento filosófico e idealista da razão, que levou o legislador a determinar como crime uma tal conduta humana, sua natureza danosa bem como as consequências, resumindo materialmente crime é: um fato típico, um comportamento ou uma conduta humana, uma ação ou omissão, que provoca um resultado (em regra) e é previsto na lei penal como infração; é antijurídico pois o fato tipico é contrário a lei penal; e, é culpável porque a todos cumpre conformar a conduta com o mandamento do ordenamento jurídico, e sendo assim todos tem a possibilidade de fazer e se não o fizer, revela no fato de não o ter feito uma vontade contrária àquela obrigação, exprimindo na conduta, uma contradição entre sua vontade e a vontade da norma. Formal e Material, refere-se aos dois conceitos acima descrito atuando somaticamente, para DAMÁSIO (1995, p.192) as duas formas reseultam da “infração da lei do Estado, promulgada para proteger a segurança dos cidadãos, resultante de um ato externo do homem, positivo ou negativo, moralmente imputável e politicamente danoso”. O critério Formal, Material e Sintomático, é a soma do conceito de crime “Formal e Material” decrito acima incluindo na conceituação da personalidade do agente, DAMÁSIO por esse conceito ensina o seguinte pensamento: Ranieri, sob esse aspecto, define o delito como “fato humano tipicamente previsto por norma jurídica sancionada mediante pena em sentido estrito (pena criminal), lesivo ou perigoso para bens ou interesses considerados merecedores da mais enérgica tutela”, constituindo “expressão reprovável da personalidade do agente, tal como se revela no momento de sua realização” (DAMÁSIO 1995, p.192-193) Por essas definições de crime na doutrina do Direito Penal veremos sua aplicação no campo da Dogmática Jurídica. 3.1 Dogmática jurídica direito penal e o conceito de crime A dogmática pode ser definida como sendo o a aceitação de certas premissas, consideradas com resultantes de uma decisão, como vinculantes para o estudo, renunciandose, assim, ao postulado da pesquisa independente, tratando-se de questões limitadas e de acordo com FERRAZ JUNIOR (2003, p.40), são regidas pelo princípio da proibição da negação. 9 Como exemplo do princípio da proibição da negação, decorre outro princípio fundamental do pensamento jurídico iluminista-leberal, com reflexos no ordenamento jurídico penal e constitucional brasileiro, princípio que tende a garantir a liberdade do indivíduo contra os arbítrios do poder do Estado, estamos nos referindo ao princípio da legalidade ou reserva legal que em latim significa, nullum crimen, nulla poena sine lege, isto é, não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal, positivado na Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5°, inciso XXXIX, e no Código Penal brasileiro, artigo 1°, em que os dois ordenamentos dizem: não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal, CAPEZ (2009, p.28-29) complementa dizendo que: (...) anterioridade da lei penal, o da reserva legal , reserva para o estrito campo da lei a existência do crime e sua correspondente pena (não há crime sem lei que o defina, nem pena sem cominação legal), e o da anterioridadeo princípio da legalidade é gênero que compreende duas espécies: reserva legal e, exige que a lei esteja em vigor no momento da prática da infração penal (lei anterior e prévia cominação). (CAPEZ, 2009, p.28-29) Pelo princípio do nullum crimen nulla poena sine lege é evidente a tipificação dogmática dentro do ordenamento jurídico, pelo qual conceitua o crime como sendo tudo aquilo que se encontro de maneira positivada nos preceitos legais normativos, por exemplo no Código Penal brasileiro, Crimes Contra a Pessoa; Crimes Contra o Patrimônio; Crimes Contra a Propriedade Imaterial; Crimes Contra a Organização do Trabalho; Crimes Contra o Sentimento Religioso e Contra o Respeito aos Mortos; Crimes Contra a Dignidade Sexual; Crimes Contra a Família; Crimes Contra a Incolumidade Pública; Crimes Contra a Paz Pública; Crimes Contra a Fé Pública; Crimes Contra a Administração Pública; e tantas outra leis esparças em nosso ordenamento jurídico penal. Apesar de todos esses dogmas os juristas teóricos de acordo com FERRAZ JUNIOR (2003, p.42), (...) não pode desprezar as investigações a respeito de qual é o direito efetivo de uma comunidade, quais os fatores sociais que condicionam sua formação, qual sua eficácia social, qual sua relevância como instrumento de poder, quais os valores que o justificam moralmente etc. Ou seja, ele valese também da pesquisa zetética. Apesar disso, porém, em sua perspectiva prepondera o aspecto dogmático. (FERRAZ JUNIOR, 2003, p.42) E complementa: Essa limitação teórica pode comportar posicionamentos cognitivos diversos que podem conduzir, por vezes, a exageros, havendo quem faça do estudo do direito um conhecimento demasiado restritivo, legalista, cego para a realidade, formalmente infenso à própria existência do fenômeno jurídico 10 como um fenômeno social; pode levarnos ainda a crer que uma disciplina dogmática constitui uma espécie de prisão para o espírito, o que se deduz do uso comum da expressão dogmático, no sentido de intransigente, formalista, obstinado, que só vê o que as normas prescrevem. (FERRAZ JUNIOR, 2003, p.42) E por fim como conclusão compactuaremos com o pensamento de FERRAZ JUNIOR, no que diz respeito ao pensamento dogmático e zetético, e a diferença entre Criminologia e Direito Penal com aplicação ao conceito de crime, mais zetético que proriamente dogmático por SCHECAIRA. 4 CONCLUSÃO Para FERRAZ JUNIOR (2003, p.42): Por todos esses motivos, é óbvio que o direito, enquanto objeto de conhecimento, há de ser visto de forma diferente, se o enfoque é dogmático ou zetético. Nos limites desta Introdução, é nossa intenção fixar uma perspectiva, com o intuito pragmático de orientar o estudo. Nossa opção é pelo estudo da visão dogmática, e a razão é evidente: este é o ângulo privilegiado com que o direitoé conhecido e ensinado nas Faculdades de Direito. Não que isso signifique um desprezo pela perspectiva zetética. Tratase, apenas, de escolher uma tônica dominante. A intenção é desvendar, para o principiante, o que seja o direito aos olhos do jurista e de sua ciência stricto sensu, com o fito de propor uma redefinição, com toda sua dimensão persuasiva. (FERRAZ JUNIOR, 2003, p.42) Por fim SCHECAIRA, ocupa-se com a diferença entre Criminologia e Direito Penal, a melhor lucidez vem das palavras de SCHECAIRA: Ocupa-se a criminologia do estudo do delito, do delinquente, da vítima e do controle social do delito e, para tanto, lança mão de um objeto empírico e interdisciplinar. Diferentemente do direito penal, a criminologia pretende conhecer a realidade para explica-la, enquanto aquela ciência valora, ordena e orienta a realidade, com o apoio de uma série de critérios axiológicos. A criminologia aproxima-se do fenômeno delitivo sem prejuízos, sem mediações, procurando obter uma informação direta deste fenômeno. Já o Direito Penal limita interessadamente a realidade criminal, mediante os princípios da fragmentariedade e seletividade, observando a realidade sempre sob o prisma do modelo típico. Se a criminologia interessa saber como é a realidade, para explica-la e compreender o problema criminal, bem como transforma-la, ao direito penal só Ihe preocupa o crime enquanto fato descrito na norma legał, para descobrir sua adequação típica. (SCHECAIRA, 2013, p.38) 11 REFERÊNCIAS BOBBIO, N. Teoria do Ordenamento Jurídico. 2. ed. São Paulo: EDIPRO, v. Único, 2014. CAPEZ, F. Curso de Direito Penal: parte Geral. 13. ed. São Paulo: Saraiva, v. 1, 2009. CHAUI, M. Introdução à história da filosofia: dos pré-socratas a Aristóteles. 2. ed. São Paulo: Companhia das Letras, v. 1, 2002. DAMÁSIO, E. D. J. Direito Penal Parte Geral. 19. ed. São Paulo: Saraiva, v. 2, 1995. FERRAZ JUNIOR, T. S. Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão, dominação. 4. ed. São Paulo: Atlas, v. Único, 2003. MAXIMILIANO, C. P. D. S. Hermanêutica e aplicação do direito. 20. ed. Rio de Janeiro: Forense, v. Único, 2011. NORONHA, E. M. Direito Penal: introdução e parte geral. 38. ed. São Paulo: Saraiva, v. 1, 2004. SCHECAIRA, S. S. Criminologia. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, v. Único, 2013.
Compartilhar