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121 Org. Soc., Iturama (MG), v. 6, n. 5, p. 121-132, jan./jun. 2017 IMPORTÂNCIA DA LINGUAGEM JURÍDICA PARA O OPERADOR DO DIREITO Gabriela Rezende Freitas Severino RIBEIRO 1 Érica Cristina Molina dos SANTOS 2 RESUMO A linguagem é imprescindível ao operador do Direito, daí o fundamento de desenvolver este artigo voltado ao aludido tema, visto que, além do conhecimento específico e doutrinário, se faz primordial o domínio técnico da comunicação objetiva e concisa para o êxito da profissão. Nesse sentido, pretendeu-se, por meio do trabalho, demonstrar a importância e a necessidade do linguajar próprio para o desempenho eficaz das atividades exercidas pelos juristas. Utilizou-se como metodologia a estratégia de pesquisa bibliográfica com o uso de fontes primárias e secundárias, sob o âmbito das ciências jurídicas, com enfoque específico na linguagem e na comunicação, tendo como método a abordagem dedutiva, a fim de responder ao problema e objetivos propostos. Com a finalidade de se obter excelência nas carreiras jurídicas, o estudo e o aprimoramento do vernáculo, seja na forma escrita ou falada, precisa integrar a construção do aprendizado dos acadêmicos de Direito e daqueles que já exercem seus afazeres neste ramo. Palavras-chave: Linguagem jurídica. Comunicação. Direito. IMPORTANCE OF LEGAL PERSONALITY FOR THE LAW OF THE OPERATOR ABSTRACT Language is essential to the operator of the Law, hence the basis of developing this article addressed to the aforementioned subject, since, in addition to specific and doctrinal knowledge, the technical domain of objective and concise communication becomes paramount for the success of the profession. In this sense, it was intended, through work, to demonstrate the importance and necessity of the language itself for the effective performance of the activities carried out by lawyers. The methodology used was the bibliographic research strategy with the use of primary and secondary sources, under the scope of the legal sciences, with a specific focus on language and communication, using as a method the deductive approach in order to respond to the problem and objectives proposed. In order to obtain excellence in legal careers, the study and improvement of the vernacular, whether in written or spoken form, must integrate the learning construction of law scholars and those who already carry out their duties in this field. Keywords: Legal Language. Communication. Law. 1 Bacharel em Farmácia, pelo Centro Universitário do Triângulo (UNITRI), Uberlândia/MG. Graduanda em Direito, Faculdade Aldete Maria Alves (FAMA), Iturama/MG. gabrielarfsribeiro@hotmail.com 2 Advogada. Especialista em Direito Civil e Processual Civil pelo Centro Universitário de Rio Preto (UNIRP) e em Docência do Ensino Superior pela Faculdade Aldete Maria Alves (FAMA). Docente da Faculdade Aldete Maria Alves (FAMA), Iturama/MG. ericacmolinas@hotmail.com 122 Org. Soc., Iturama (MG), v. 6, n. 5, p. 121-132, jan./jun. 2017 1 INTRODUÇÃO O operador do Direito tem como função primordial influenciar a sociedade na constante busca pela equidade, liberdade e democracia. Nesse diapasão, o linguajar jurídico é o instrumento utilizado para “dizer o Direito”, ou seja, o liame entre o ordenamento e sua aplicação realiza-se com a comunicação, escrita ou falada. A Constituição Federal de 1988 estabelece em seu artigo 133 que o advogado é indispensável na administração da justiça. Portanto, com o domínio técnico da linguagem, os juristas realizam a interação entre a sociedade e todas as áreas do Direito, alcançando a finalidade da profissão, qual seja, a de resolver os conflitos de interesses. O estudo buscou analisar a importância da linguagem para o bom desempenho das atividades exercidas pelo profissional do Direito e a sua necessidade para obter-se excelência nas carreiras jurídicas. E, especificamente, objetivou-se apresentar o desenvolvimento do linguajar jurídico no decorrer da história; refletir sobre a essencialidade da linguagem para o mundo jurídico; e identificar a necessidade de ensinar a linguagem jurídica para os acadêmicos de Direito. Como metodologia, empregou-se a técnica de pesquisa bibliográfica com o uso de fontes primárias e secundárias, sob o âmbito das ciências jurídicas, com enfoque específico na linguagem, utilizando-se como método a abordagem dedutiva. A compilação do assunto se deu através da leitura de livros, artigos científicos, apostilas, trabalhos, documentos, bem como demais materiais acessíveis já publicados. A referida leitura construiu a gnose adequada para segregar aquilo que foi interessante ao tema e, subsequentemente, permitiu a edificação deste artigo por meio de uma análise qualitativa, respeitando-se as devidas normas técnicas, em consonância com as obras de Severino (2002), e Marconi e Lakatos (2003). Para atingir os escopos apresentados, partiu-se da premissa relacionada ao conceito de linguagem, seguindo a obra de Chauí (2010) e, posteriormente, abordou-se a temática dentro da esfera jurídica e a sua história, de acordo com os autores Warat (1994), Brait (1996), Damião e Henriques (2010), Medeiros e Tomasi (2010), Moreira et al. (2010), Paiva (2010), Pereira (2012), Mello (2013), dentre outros. Na sequência discorreu-se a respeito da essencialidade do domínio do linguajar para o operador jurídico, baseando-se nas obras doutrinárias de Lôbo Netto (2011), Chalita (2012), Sabbag (2016); e por fim, explanou-se a respeito da utilidade de ensinar a linguagem aos 123 Org. Soc., Iturama (MG), v. 6, n. 5, p. 121-132, jan./jun. 2017 estudantes de Direito, sob o enfoque de Camillo (2000), Cruz (2003), Ataliba (2007), Gonçalves e Carneiro (2008). Ademais, recorreu-se a legislações, a trabalhos científicos publicados na Internet, e outros materiais impressos, tendo como critério de seleção aqueles que abordassem a linha de pesquisa em questão, na língua portuguesa, em sites específicos do ramo jurídico e que trouxessem enriquecimento ao conteúdo proposto, podendo servir de referência para futuros estudos. 2 LINGUAGEM JURÍDICA Antes de adentrar ao mote, é preciso conhecer o conceito de linguagem, sendo esta a capacidade humana para compreender e aplicar um sistema complexo e dinâmico de símbolos convencionados, usado em modalidades diversas para comunicar e pensar. É uma capacidade natural que não carece de justificação, o que torna, pois, impossível imaginar a vida sem ela, uma vez que constitui um instrumento essencial para aceder aos pensamentos e conhecimentos. 1. A linguagem é um sistema, isto é, uma totalidade estruturada, com princípios e leis próprios, sistema esse que pode ser conhecido; 2. A linguagem é um sistema de sinais ou de signos, isto é, os elementos que formam a totalidade linguística são um tipo especial de objetos, os signos, ou objetos que indicam outros, designam outros ou representam outros. Por exemplo, a fumaça é um signo ou sinal de fogo, a cicatriz é signo ou sinal de uma ferida, manchas na pele de um determinado formato, tamanho e cor são signos de sarampo ou de catapora, etc. No caso da linguagem, os signos são palavras e os componentes das palavras (sons ou letras); 3. A linguagem indica coisas, isto é, os signos linguísticos (as palavras) possuem uma função indicativa ou denotativa, pois como que apontam para as coisas que significam; 4. A linguagem tem uma função comunicativa, isto é, por meio das palavras entramos em relação com os outros, dialogamos, argumentamos, persuadimos, relatamos,discutimos, amamos e odiamos, ensinamos e aprendemos, etc.; 5. A linguagem exprime pensamentos, sentimentos e valores, isto é, possui uma função de conhecimento e de expressão, sendo neste caso conotativa, ou seja, uma mesma palavra pode exprimir sentidos ou significados diferentes, dependendo do sujeito que a emprega, do sujeito que a ouve e lê, das condições ou circunstâncias em que foi empregada ou do contexto em que é usada. (CHAUÍ, 2010, p. 166). Por sua vez, Warat (1994, p. 37) observa que “a linguagem possibilita o intercâmbio de informações e conhecimentos, funcionando, ainda, como meio de controle desses conhecimentos”. Por meio da linguagem, tanto escrita como falada, há a transmissão de mensagens, de conteúdos, que permitem a socialização dos indivíduos e, por conseguinte, viabiliza a convivência ordenada entre eles. 124 Org. Soc., Iturama (MG), v. 6, n. 5, p. 121-132, jan./jun. 2017 Segundo Brait (1996, p. 96): Por meio da linguagem, o homem não só veicula informações, mas também mostra a sua visão sobre o mundo. É a linguagem que permite aos sujeitos se representarem a si mesmo aos outros e ao mundo. Trata-se, portanto, de um meio de interação social por excelência. Juridicamente falando, “linguagem é um sistema de signos utilizados para estabelecer uma comunicação” (MEDEIROS; TOMASI, 2010, p. 5). Assim, Linguagem Jurídica é o sistema de signos e sinais, oral ou escrito, que permite a comunicabilidade dos operadores do Direito. É também pertinente o pensamento descrito por Mello (2013, p.137) de que, sem linguagem, “as palavras seriam meros ruídos sem qualquer conteúdo. Não seriam signos, é dizer, significantes, e a comunicação humana tornar-se-ia impossível”. Nesse mesmo sentido, explicam Damião e Henriques (2010, p. 18-19) sobre algumas maneiras de se expressar, citando exemplos: O homem pode se comunicar pela forma verbal e/ou não verbal. Para a forma verbal a linguagem oral torna-se ponto crucial; a forma não verbal pode ocorrer de várias formas, como por exemplo, a linguagem corporal (exemplos: o testemunho de surdos-mudos pela mímica; a falsidade de um depoimento pode revelar-se até mesmo pela transpiração, pela palidez ou simples movimento palpebral) e a linguagem do vestuário (exemplo: a toga é uma informação que indica a função exercida pelo juiz e a cor negra sinaliza seriedade e compostura que devem caracterizá-lo). Todas as formas de comunicação, verbal, não verbal ou mista, devem ser criteriosamente consideradas, posto que qualquer delas pode ocorrer no desempenho das diversas profissões ligadas ao Direito. Mas para melhor interpretar o tema alvidrado, faz-se importante não apenas conceituá-lo, como também tecer breves ponderações sobre a sua história. 2.1 Linguagem Jurídica no Decorrer da História Observa-se que, quando se inicia o curso de bacharelado em Direito, um dos primeiros contatos com a linguagem jurídica são os brocardos (expressões latinas), procedentes do Direito Romano, que ainda são muito utilizados nas atuações do dia a dia do profissional dessa área. Os brocardos, além de ser um exemplo do linguajar próprio utilizado pelos juristas romanos, são também considerados como cultura que perdura até os dias atuais. Assim, em harmonia com Moreira et al. (2010, p. 140), “o Direito tornou-se uma ciência jurídica no final do século XI e início do século XII, dando-se início a formação de 125 Org. Soc., Iturama (MG), v. 6, n. 5, p. 121-132, jan./jun. 2017 juristas letrados”. Importa constatar, também, da aludida referência que, nessa época, as pessoas “[...] sem formação acadêmica eram tidas como rústicas, ou seja, ingênuas, incapazes de malícia, desprovidas de capacidade de avaliação exata das coisas, suscetíveis de serem enganadas” (MOREIRA et al., 2010, p. 140). Daí adveio a indispensabilidade de uma comunicação mais adequada, principalmente aos profissionais do Direito da mencionada era. Até meados do século XIX, quanto mais rebuscado fosse o linguajar jurídico, maior era sua eficácia; hodiernamente, com o advento da Modernidade, o acúmulo de tarefas e, automaticamente, a falta de tempo, essa realidade mudou, ou seja, quanto mais simples e direta for a linguagem, melhor será sua efetividade. Assim, “ontem o estilo tendia ao rebuscamento, aos rodeios ou aos circunlóquios; hoje, a vida moderna obriga a uma redação mais objetiva e concisa” (PAIVA, 2010, p. 10). Entretanto, esse truísmo não sugere menos necessidade, pelo contrário, a linguagem é, e sempre será, o meio pelo qual o Direito se propaga. Por isso, é inevitável analisar se as faculdades estão dando a devida importância ao ensino da língua portuguesa e jurídica para o acadêmico, bem como se os profissionais que já atuam nessa área têm buscado o aprimoramento do vernáculo (DAMIÃO; HENRIQUES, 2010). É significativo ressaltar que, de acordo com Pereira (2012, p. 1), “a linguagem como forma de comunicação é imperiosa para o Direito, que acabou por especializá-la, dentro dos seus moldes, criando uma linguagem jurídica”. Tal a relevância do “dialeto forense”, que céleres pensadores como São Thomaz de Aquino, citado por Moreira et al. (2010, p. 140), descreveu que este é “[...] a arte de pensar em ordem e sem erros.” A particular forma de se comunicar, sem dúvida, fez parte de diversos ramos ligados ao Direito no decorrer da história, marcando assim a dimensão do “idioma próprio” do profissional jurista. Uma linguagem que antes tendia ao floreamento e hoje busca uma característica objetiva e direta, porém, sem descartar suas raízes, como exemplo, expressões em latim, que ainda são comumente utilizadas nos tempos modernos, o que enriquece este vocabulário linguístico intrínseco. Destarte, esses foram alguns dos aspectos mais relevantes que marcaram a história do linguajar jurídico. Levando-se em consideração os objetivos do estudo, passa-se, então, adiante, a discorrer sobre a essencialidade da linguagem para todas as vertentes do Direito. 126 Org. Soc., Iturama (MG), v. 6, n. 5, p. 121-132, jan./jun. 2017 3 A ESSENCIALIDADE DA LINGUAGEM PARA O MUNDO JURÍDICO Quão importante é a linguagem para o mundo jurídico que a Constituição Federal de 1988 deixa claro no caput do seu artigo 13, que “a língua portuguesa é o idioma oficial da República Federativa do Brasil”, e determina também, no seu artigo 133, que “o advogado é indispensável na administração da justiça, [...]” (BRASIL, 1988, on-line). Diante disso, nesta seção, discorre-se sobre a essencialidade, ou seja, a específica forma de utilizar a palavra, escrita ou falada, como instrumento de trabalho dos operadores do Direito. A Lei nº 8.906, de 04 de julho de 1994 (Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil), em seu artigo 2º, também fixa essa condição de indispensabilidade do advogado à administração da justiça, reafirmando em caráter regulamentar a disposição que já se acha inscrita no próprio texto constitucional. Sobre a linguagem, o Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil (aprovado pela Resolução nº 02/2015), estabelece em seu artigo 28, a seguinte assertiva: “consideram-se imperativos de uma correta atuação profissional o emprego de linguagem escorreita e polida, bem como a observância da boa técnica jurídica” (BRASIL, 2015, on-line). Nessa acepção, bem descreve Chalita (2012, p. 13), “o orador deve ter asseio quanto à postura, gestos, dicção e aparência, recomendando a representação dramática de papéis para a ênfase da elocução”. Assim, a linguagem jurídica, que é constituída pela comunicação verbal, não verbal, e/ou mista, deve obedecer a critérios e comportamentosapropriados em todas essas questões. De acordo com Lôbo Netto (2011, p. 27), a profissão jurídica trata-se de “atividade concebida como um conjunto de atos teologicamente orientados, em um quadro de continuidade, permanência e integração”. Vale lembrar que o advogado é habilitado a atuar em defesa de direitos porque obtém apuro técnico (bacharelato), mais aprovação no exame de ordem, para esse mister. A importância do advogado é evidente no processo, sendo que a parte, por si só, não tem condições de figurar no litígio judicial, sem que conte com o apoio técnico do operador jurídico, que conhece a lei e as implicações legais pertinentes a cada ato processual. O papel do advogado é, pois, fundamental na interpretação das normas e, em consequência, na aplicação efetiva da justiça. Todavia, o interesse primordial deste artigo, qual seja, a relevância da linguagem jurídica, não se limita ao ofício do advogado, e sim, expande-se a todas as profissões relativas 127 Org. Soc., Iturama (MG), v. 6, n. 5, p. 121-132, jan./jun. 2017 ao Direito. Entende-se, portanto, que o linguajar particular das atividades ligadas à justiça, além de uma utilização sociocultural, é também uma imposição inerente aos que trabalham direta e indiretamente nessa esfera, devendo esses, utilizá-lo de maneira precisa e técnica. O Direito é a profissão da palavra, e o operador do Direito, mais do que qualquer outro profissional, precisa saber usá-la com conhecimento, tática e habilidade. Deve- se prestar muita atenção à principal ferramenta de trabalho, que é a palavra escrita e falada, procurando transmitir melhor o pensamento com elegância, brevidade e clareza. (SABBAG, 2016, p. 18). Há que se deixar claro que a língua portuguesa é bastante complexa, repleta de normas gramaticais e de sinônimos, o que pode desencadear diversas interpretações de um mesmo texto. A falta de habilidade e domínio da linguagem, especificamente o português jurídico, que se refere às regras gramaticais usuais no discurso, pode acarretar ao profissional, a falta de capacitação, podendo até mesmo prejudicar a efetividade da justiça na resolução de lides. Não obstante, deve existir clareza na comunicabilidade dentro do mundo jurídico, e para melhor entender essa magnitude, descreve-se o trecho da obra de Paiva (2010, p. 13): “a compreensão deve ser imediata. É importante usar vocabulário acessível, redigir orações na ordem direta, utilizar períodos curtos e eliminar o emprego excessivo de adjetivos. Deve-se excluir da escrita ambiguidade, obscuridade ou rebuscamento”. Para completar esse entendimento, explica Sabbag (2016, p. 96) que “um erro em petição, sentença ou acórdão tem o condão de retirar-lhe a pujança e a autoridade, além de espelhar a incapacidade do anunciante”. Em razão disso, a compreensão e sapiência da linguagem jurídica subordina-se ao domínio da língua portuguesa, idioma oficial do Brasil, conforme já mencionado. A eficiente comunicação dentro das atividades relacionadas ao Direito, seja para realizar um discurso congruente ou sustentar uma posição propícia, requer do profissional uma bagagem de conhecimentos de ambos os vocabulários, os quais se interagem. 4 A NECESSIDADE DE ENSINAR A LINGUAGEM JURÍDICA PARA OS ACADÊMICOS DE DIREITO A linguagem jurídica para acadêmicos de Direito é ministrada, normalmente, no primeiro e segundo semestre do curso de bacharelado por meio da disciplina “Português jurídico”. Porém, nota-se que essa matéria é de extrema necessidade ao bacharel, sendo, portanto, imprescindível sua extensão e interação com todas as outras disciplinas do curso, 128 Org. Soc., Iturama (MG), v. 6, n. 5, p. 121-132, jan./jun. 2017 visto que por meio da interpretação técnica se torna possível sanar vícios e erros de linguagem. Ataliba (2007, p. 187) expõe seu posicionamento ao explicitar em sua obra de Direito Tributário, que “a tarefa mais significativa do bacharel em Direito é: a interpretação das normas jurídicas”. Para isso, deve-se ter um cuidado especial no tocante ao ensino e aprimoramento da língua portuguesa, por ter influência direta na compreensão e domínio do linguajar jurídico ideal. Nesse sentido, verifica-se a obrigatoriedade de atentar-se à deficiência educacional a qual o país atravessa, o que intensifica a preocupação com a carência da linguagem jurídica durante o curso de Direito, bem como no exercício das carreiras profissionais. Disso decorre que estudantes e operadores do Direito deparam-se constantemente com as dificuldades de interpretar leis, produzir textos ou petições, expressarem seus discursos e posições doutrinárias, justamente devido a essa lacuna no aprendizado, seja em nível básico, seja em nível superior. Tal problema deve ser resolvido com bastante dedicação, enfatizando os estudos nesta área, pois a prática forense e o desempenho eficaz dos discentes de Direito exigem a habilidade e o domínio da língua portuguesa na busca da concretização da justiça. Importante observar que, nas sociedades modernas, as instituições de educação superior vêm sendo consideradas como uma das responsáveis pela proposição de ideários e conteúdos marcados pelo processo capitalista-urbanizador. Nesse contexto, acredita-se que o professor universitário também possa ser visto como um agente a serviço da transferência de saberes, crenças, valores e atitudes que contribuem para a formação dos alunos, orientando seus modos de vida e suas práticas profissionais futuras. A respeito do equilíbrio que os juristas devem ter entre o conhecimento específico do Direito e a linguagem jurídica, Cruz (2003, p. 207) explana: Linguagem e Direito são, portanto, como “a panela e a tampa”, e o Direito nada seria sem a linguagem. Logo, o Direito não é e não pode ser uma linguagem estritamente técnica nem especificamente vulgar, bem como o acadêmico ou operador jurídico não deve se ater apenas ao Direito instrumental, “esquecendo-se” do Direito material, devendo haver um equilíbrio entre ambos para obter um bom desempenho jurídico e social, traduzindo os termos jurídicos e esclarecendo as pessoas em geral. E no mesmo entendimento, Chalita (2012, p. 15) complementa: [...] o Direito é uma ciência humana e, por isso, não pode ser entendido e aplicado como se fosse meramente uma técnica, um conhecimento exato. Dominar o Direito não se resume ao conhecimento das normas, dos ordenamentos jurídicos. Aplicar o direito não depende apenas da observância das leis e do estudo das evidências. 129 Org. Soc., Iturama (MG), v. 6, n. 5, p. 121-132, jan./jun. 2017 Embora sustentado firmemente sobre um saber estabelecido, o Direito deve ir além, para promover a justiça. Portanto, não restam dúvidas quanto à relevância da linguagem, essencial ao operador jurídico como ferramenta da comunicação, nas formas oral ou escrita, utilizada na atividade forense para apresentação do pedido de tutela jurisdicional, de sua contraposição, para a coleta de depoimentos e testemunhos, para a prolação de sentença, dentre outros atos jurídicos inerentes à profissão. Como exemplo disso, Chalita (2012, p. 28) esclarece: A argumentação nos discursos precisa utilizar elementos de sedução, já que objetiva-se convencer um público e não buscar a verdade absoluta. A retórica apresenta-se com grande importância, pois transpõe os fatos em imagens, com a finalidade de convencer seus receptores, objetivo este visado no tribunal do júri. Segundo Camillo (2000, p. 14), não seria possível atingir uma interpretação adequada dos princípios, normas e leis do ordenamento brasileiro senão pelo correto domínio da língua portuguesa, concernenteàs ciências jurídicas: A linguagem jurídica é científica, pois instrumentaliza e potencializa os mais diversos institutos da Ciência Dogmática do Direito, permitindo ao operador do Direito, além do seu mais perfeito manuseio, alcançar o verdadeiro sentido e alcance das normas jurídicas. Trata-se de uma linguagem revestida de formalidade, e o operador do Direito deve ter pleno discernimento desta para que possa atuar em qualquer demanda com profissionalismo exigido à carreira. Assim, é relevante a observação feita por Gonçalves e Carneiro (2008, p. 7): O domínio da escrita da Língua Portuguesa é crucial para o Bacharel em Direito na segunda fase do exame da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). Tal prova cobra do candidato à confecção de uma Peça Profissional e de quatro questões discursivas sobre estudos de caso da área jurídica escolhida pelo futuro advogado. Muitos, após o exame, percebem que até conheciam a natureza jurídica que envolvia a petição e as questões, no entanto, a ferramenta do bem escrever constitui papel relevante para a conquista da nota mínima que garanta a desejada carteira da OAB, que habilita à advocacia. Ocorre com frequência, nas disciplinas destinadas à prática jurídica, no decorrer do curso de Direito, o aproveitamento de peças prontas, modelos de petições, que muitas vezes até acompanham as obras destinadas a essas matérias; em contrapartida, o aluno não aprende a confeccionar as peças no linguajar apropriado, tendo dificuldade no momento de prestar o exame da Ordem. E não é só por esse motivo, mas durante toda a vida profissional o jurista precisará pautar-se pela linguagem culta, adequada à atividade forense, para que seja capaz de interpretar a lei e aplicá-la ao caso concreto. 130 Org. Soc., Iturama (MG), v. 6, n. 5, p. 121-132, jan./jun. 2017 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao longo da construção do conhecimento, o estudante do curso de Direito, bem como as universidades, não têm se preocupado com o aprendizado da linguagem na mesma proporção com que se empenham com o ensino sui generis, posto que são notórias as dificuldades encontradas pelos acadêmicos no que tange à adequada utilização dessa. Esse fato é percebido devido ao alto índice de reprovação nos exames da Ordem, nas frágeis petições de alguns profissionais da área, na grade curricular defasada de cursos universitários, e até mesmo na utilização de material bibliográfico inadequado, inclusive encontrado na Internet. Isso leva à formação de um profissional inábil, pois em face de um problema terá dificuldades de interpretar ou aplicar a norma ao caso concreto, em decorrência da falha do tirocínio. Vale lembrar que, outrora, o linguajar dos juristas tendia ao rebuscamento, aos rodeios, aos circunlóquios, contudo, hodiernamente, essencial se faz um vocábulo prático e conciso. Entretanto, essa premissa não sugere menor valor, pelo contrário, a linguagem é, e sempre será, o meio pelo qual o Direito se propaga; o Direito é a profissão da palavra escrita ou falada, logo, o Direito não existe sem a linguagem. Deliberado assunto possui tamanha importância que até mesmo o Código de Ética e Disciplina da classe traz a necessidade de se utilizar uma linguagem escorreita e polida, ou seja, técnica, objetiva e eficiente, capaz de identificar e analisar leis com primazia. É preciso, à vista disso, reforçar a docência da língua portuguesa, e consequentemente, do português jurídico, nas instituições de ensino, a fim de formar profissionais aptos a exercerem seus ofícios. Tal problema deve ser resolvido com bastante dedicação, enfatizando os estudos nesse âmbito, já que a palavra é o principal instrumento de trabalho dos operadores do Direito. É indispensável ao jurista um vocabulário enriquecido, mas que, simultaneamente, saiba praticar uma comunicação global que se estenda a todos, indistintamente, pois, ao mesmo tempo em que litiga com outros juristas, atende aos seus clientes e ao público, que podem ser pessoas leigas. Esse cuidado permite aplicar o ordenamento jurídico sob o aspecto social e atual, e se obter o resultado almejado nas demandas. O operador do Direito precisa encontrar o equilíbrio entre o conhecimento específico e a linguagem jurídica para desempenhar seu fundamental objetivo perante a sociedade, qual seja, o de servir de ferramenta à realização da prestação jurisdicional, cumprindo sua 131 Org. Soc., Iturama (MG), v. 6, n. 5, p. 121-132, jan./jun. 2017 responsabilidade na interpretação efetiva das normas. Somente desse modo é possível obter excelência na aludida carreira. Finalizado o artigo, é importante salientar que não houve a intenção de se esgotar o conteúdo, pois certamente há outras possibilidades de se abordar demais ângulos sobre o tema apresentado, por ser indispensável à formação dos acadêmicos e à atuação dos juristas, visto que essa profissão é substancial como mecanismo garantidor da cidadania. REFERÊNCIAS ATALIBA, Geraldo. Elementos de Direito Tributário. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. BRAIT, Beth Bakhtin. 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