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Documentacao Pedagogica Teoria e Pratica

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Suely Amaral Mello 
Maria Carmen Silveira Barbosa 
Ana Lúcia Goulart de Faria
organizadoras
Suely Amaral Mello 
Maria Carmen Silveira Barbosa 
Ana Lúcia Goulart de Faria 
(Organizadoras)
Documentação pedagógica: 
teoria e prática
ídrojoâo
Copyright © das autoras e dos autores
Todos os direitos garantidos. Qualquer parte desta obra pode ser 
reproduzida, transmitida ou arquivada desde que levados em conta 
os direitos dos autores e das autoras
Suely Amaral Mello; Maria Carmen Silveira Barbosa; Ana Lúcia 
Goulart de Faria (Orgs.)
Documentação pedagógica: teoria e prática. São Carlos: 
Pedro & João Editores, 2 017 .131p.
ISBN. 978-85-7993-438-4
1. Documentação pedagógica. 2. Olhares sobre a infância. 3. A 
escuta. 4. Crianças, professor/a e produção de conhecimentos.
5. Autores. I. Título.
C D D -3 7 0
Capa: Hélio Márcio Pajeú (CCO Creative Commons (pixabay.com)) 
Editores: Pedro Amaro de Moura Brito & João Rodrigo de Moura 
Brito
Conselho Científico da Pedro & João Editores:
Augusto Ponzio (Bari/Itália); João Wanderley Geraldi 
(Unicamp/Brasil); Nair F. Gurgel do Amaral (UNIR/Brasil); Maria 
Isabel de Moura (UFSCar/Brasil); Maria da Piedade Resende da 
Costa (UFSCar/Brasil); Valdemir Miotello (UFSCar/Brasil)
Pedro & João Editores
www.pedroejoaoeditores.com.br 
13568-878 - São Carlos - SP 
2017
SUMÁRIO
DOCUMENTAÇÃO PEDAGÓGICA: outro 7
modo de escutar as crianças e a prática 
pedagógica refletindo sobre a formação 
continuada de professores e professoras - Suely 
Amaral Mello; Maria Carmen Silveira Barbosa;
Ana Lúcia Goulart de Faria
PARTE I - Documentar a vida das crianças na 25 
escola da infância
Documentar Processos, recolher sinais - Mara 27 
Davoli
Afinando os olhos para captar momentos - 43
Mariano Dolci
Escutar para documentar - David Altimir 57
A arte do pintor de paisagens. Algumas 77 
reflexões sobre a documentação - Meritxell 
Bonàs
Parte II - Documentar: aguçar os olhos para captar 85 
momentos
Dar visibilidade aos acontecimentos e aos 87 
itinerários das experiências das crianças nas 
instituições para a pequena infância - Anna Lia 
Galardini e Sonia Iozzelli
Documentação como argumentação e narração: 99
dar visibilidade e forma aos processos na vida 
quotidiana - Mara Davoli
A documentação como instrumento para dar 111 
valor às relações entre as crianças 
pequenininhas nas experiências quotidianas 
compartilhadas na creche - Gloria Tognetti
Notas sobre os/as autores/as 129
DOCUMENTAÇÃO PEDAGÓGICA:
outro modo de escutar as crianças e a prática 
pedagógica refletindo sobre a formação 
continuada de professores e professoras
Suely Amaral Mello 
Maria Carmen Silveira Barbosa 
Ana Lúcia Goulart de Faria
I.
Desde o início do século XX, quando Maria 
Montessori criou em Roma as Casas dei Bambini (Casas 
das Crianças), a Itália vem contribuindo com a 
constituição de olhares sobre a infância e a escola das 
crianças pequenas. São muitos os autores e as autoras 
que dialogam e confrontam suas idéias na busca de 
uma educação de qualidade para a pequena infância.
Após a segunda grande guerra, no momento de 
reconstrução da sociedade italiana, um grupo de 
pessoas interessadas na formação das novas gerações, 
perguntava-se sobre como seria uma escola capaz de 
formar as crianças e os jovens para garantir que 
Auschwitz não se repetisse. Para eles, não bastava 
apenas as crianças frequentarem uma escola, era 
preciso, seguindo/ em consonância com as palavras de 
Theodor Adorno, uma escola comprometida com a
7
infância e a constituição de uma educação que não 
admitisse a repetição do terror e da barbárie.
Foi na busca da resposta para este desafio que 
Loris Malaguzzi e seus colaboradores constituíram um 
tipo de escola e de gestão educacional que hoje é 
denominado abordagem de Reggio Emília: uma 
experiência de educação de crianças a ser vivida na 
escola com adultos envolvidos em oferecer uma 
instituição com gestão participativa e que se assume 
responsável pela proposta educativa juntamente com 
as famílias, no contexto de uma vida comunitária.
Portanto, na Itália, a pedagogia para a pequena 
infância tem sido tomada como algo muito sério. Uma 
atitude pedagógica vinculada às experiências políticas 
de vida coletiva e individual, isto é, a um projeto de 
vida e formação pessoal vinculado a um projeto de 
sociedade. Nesta pedagogia, constituída após os anos 
50, e especialmente dirigida às creches e as pré-escolas 
vamos encontrar várias cidades envolvidas com o 
desafio de acolher as crianças, de fazer vibrar suas 
cem linguagens, de oferecer uma educação com 
qualidade, plural, aberta ao mundo e criando, nas 
comunidades e nas famílias, uma concepção de 
criança potente e de escola da infância como lugar de 
encontro e de vida em comum. A creche na Itália foi 
proposta pelas feministas e pelos partidos de 
esquerda, na contramão da política dominante que 
apenas queria "abrigar" as crianças enquanto as mães 
trabalhavam, revolucionando a educação das crianças 
pequenininhas que até então conviviam apenas na 
esfera privada
8
Em sua carreira como professor e gestor, Loris 
Malaguzzi criou muitas estratégias políticas e 
pedagógicas; uma delas tem sido imprescindível para 
o sucesso de sua abordagem. Ela se chama 
Documentação Pedagógica. No livro "Loris 
Malaguzzi: biografia pedagógica" (2004, p. 64), 
Alfredo Hoyuelos conta que quando Loris fazia seu 
trabalho de consultor pedagógico na cidade de 
Modena, já exercendo o cargo de gestor em Reggio 
Emilia, sugeriu para as professoras que elaborassem 
um diário numa caderneta, onde deveríam, com todo 
o cuidado, anotar e refletir sobre tudo aquilo que 
acontecia em sala e que "recolhesse a essência da vida 
na escola". O objetivo era conversar, discutir sobre 
estes escritos com ele e outros colegas no momento de 
formação. Este pequeno caderno diário foi a gênese da 
documentação pedagógica que, pouco a pouco, foi 
expandindo as suas três funções.
A primeira é sua função política, de criar um 
diálogo entre a escola e seus professores e as famílias e 
a comunidade. Para que uma sociedade compreenda a 
importância de uma escola de educação infantil, a 
complexidade do seu funcionamento, as suas 
especificidades curriculares, didáticas, ambientais é 
preciso que ela seja conhecida por todos. Assim, a 
Documentação Pedagógica, com suas diferentes 
estratégias metodológicas como cartazes, filmes, 
fotografias, festas, exposições de produções infantis 
em vários espaços da cidade, visitas, convites aos 
cidadãos para frequentarem eventos escolares foi 
apresentando para a comunidade os seus fazeres, suas
9
propostas, seu dia a dia, e com isso conquistou a 
adesão da população que compreendeu seu valor 
como espaço educativo público para crianças, 
inclusive os bebês.
A segunda função diz respeito ao modo como a 
Documentação Pedagógica apoia e sistematiza o 
acompanhamento da vida das crianças na escola, suas 
produções, imagens de suas ações e interações, 
palavras ditas em contextos de interações sociais e/ou 
de investigações científicas ou em textos ditados para 
o professor, criando memórias da vida individual de 
cada criança e também da vida do grupo. E deste 
modo podendo compartilhar com as famílias muitos 
dos momentos vividos pelas crianças na escola e 
oferecer a ela um tesouro de sua infância em registros.
Por fim, a terceira função, é a de constituir 
material pedagógico para a reflexão sobre o processo 
educativo. Os documentos (registros) criados pelos 
professores e professoras, e também pelas crianças, 
podem se constituir em matéria prima a ser 
compartilhada com os/as colegas, base para a 
discussão, ressignificação e avaliação de práticas.
A documentação, assim proposta, expõe com 
transparência o que acontece entre ascrianças, entre as 
crianças e as professoras/es, entre as professoras/es e a 
gestão, e entre esses/as atores/as com as famílias e a 
comunidade. A documentação transparente convida 
as famílias para participarem diferentemente da 
educação dos/as filhos/as. Assim temos um tripé que 
sustenta a política educativa para a pequena infância: 
família, professoras/es e crianças. Com o
10
protagonismo das crianças, um projeto com foco nas 
meninas e nos meninos.
II.
Neste volume, temos a satisfação de apresentar a 
tradução de dois pequenos livros sobre o tema da 
Documentação Pedagógica que foram publicados em 
Barcelona, pela Associação de Professores Rosa Sensat 
(Associació de Maestros Rosa Sensat). Eles nos contam 
uma história de formação, auto-formação e formação em 
rede de professores e professoras. A Associação Rosa 
Sensat é uma entidade da sociedade dvil, formada por 
professores e professoras, que organiza todos os anos 
propostas de formação também para os seus associados. 
Algumas das atividades são definidas pela diretoria, em 
seu plano de trabalho anual, contando com a 
colaboração dos associados/as que sugerem temas, 
pessoas a serem convidadas, etc., sendo abertas para 
todos/as que quiserem participar. Outras atividades são 
propostas pelos grupos de professores/as associados/as 
que se organizam em Redes, ou Xarxas, como se 
denomina em Catalão, e propõem grupos de estudo, 
projetos de pesquisa e trabalho coletivos, etc.
A partir da definição do grupo é estabelecido um 
programa de estudos que, muitas vezes, acaba se 
materializando em uma experiência pedagógica 
compartilhada. Em 2006, a Xarxa Territorial d'Educació 
Infantil de Catalunya (Rede de Educação Infantil da 
Catalunha1) decidiu trabalhar com a temática da
1 Nome do grupo de professores/as associados/as ao Rosa Sensat.
11
documentação pedagógica nas creches e pré-escolas. 
Eles já conheciam um pouco o trabalho de Reggio 
Emilia e também, há muitos anos, de uma maneira ou 
outra, já faziam atividades de recolher, organizar e 
registrar o cotidiano da escola, seja com fotos, com as 
produções das crianças, cartazes e escritos reflexivos 
dos professores entre outros2. Como afirmam os 
professores da Xarxa (2009, p. 14)
"Documentar como aprendem as crianças é uma das 
questões fundamentais da escola ativa, da escola que 
valoriza, respeita e confia na criança da qual 
desconhecem os limites do seu potencial"
Assim, apesar da formação acadêmica inicial 
dos/as professores/as não haver propiciado o estudo 
em profundidade da Documentação Pedagógica essas 
professoras acreditaram que a formação continuada, 
em Rede, podería dar conta desta lacuna e 
convidaram interlocutores/as, com maior experiência, 
para dar o passo inicial ao processo formativo com 
palestras e debates. As atividades prosseguiram com 
encontros, discussões, acompanhamentos das 
documentações dos/as colegas, análises dos materiais 
produzidos pois a documentação é um ato criativo 
que exige múltiplos olhares e múltiplas interpretações.
2 No Jardim Caetano de Campos, a Prof. Alice já fazia nas décadas 
de 1920 um certo exercício de documentação pedagógica. Vale a 
pena conferir: http://www.labrimp.fe.usp.br/Arquivos/Galeria/ 
Arquivos/14/20.pdf
12
O livro que vocês têm em mãos faz parte dessa 
história de formação de professores, ele está dividido em 
duas partes. A primeira delas, Parte I, é chamada de 
Documentar a vida das crianças na escola da infância (2008) e 
mostra o início do processo formativo do grupo de 
professores/as da Associação. A segunda parte, 
denominada de Documentar: aguçar os olhos para captar 
momentos (2009) é formada a partir de conferências 
ministradas na Escola de Verão da Associação de 
Professores Rosa Sensat para um grupo ampliado de 
professores/as.
Na primeira parte do livro, vamos encontrar dois 
textos de importantes colaboradores de Loris 
Malaguzzi em Reggio Emília, Mara Davoli e Mariano 
Dolci, que foram convidados pelos/as professores/as 
do grupo de estudos para desencadear seus estudos 
sobre a Documentação Pedagógica. Juntamente com 
estes textos inaugurais, estão publicados artigos de 
dois professores da rede pública catalã que escrevem a 
partir da sua experiência de uso da documentação. A 
escuta destes/as autores/as em suas conferências, os 
debates que deram andamento as reflexões realizadas 
a partir do evento, a transcrição e produção do livro, 
levaram à promoção momentos de estudos e de 
práticas compartilhadas por 30 profissionais da Xarxa 
Territorial de Educado Infantil a Catalunya (Rede de 
Educação Infantil da Catalunha)3.
3 O processo formativo e o trabalho com as crianças estão descritos 
num livro denominado Documentar, um novo olhar (2009), que 
não foi traduzido para o português, até o presente momento.
13
No prólogo do livro Documentar a vida das crianças 
na escola vamos encontrar uma bela justificativa para a 
formação continuada de professores e professoras em 
Rede, formado pelas três conferências, temos o 
seguinte prólogo.
Em suas mãos, você tem um livro que foi preparado no 
movimento da Rede Territorial de Educação Infantil da 
Catalunha. A Rede é uma fantástica aventura pedagógica 
que começou no ano de 2004 e da qual a coleção "Temas de 
Infância" editou um primeiro trabalho com o título "A 
educação de 0 a 6 anos hoje", em 2009. Agora, publica-se o 
segundo trabalho da Rede, que consiste em dois volumes 
sobre o tema Documentar a vida de meninos e meninas na 
escola d e 0 a 3 e d e 0 a 6 anos. Este é o primeiro volume, 
inseparável de um segundo que se editará dentro da mesma 
coleção, e que apresenta o trabalho realizado pelos 
professores e pelas professoras durante dois períodos, com 
foco na documentação de crianças ou nas grandes 
descobertas que ocorrem diariamente na escola.
O fato de documentar o que faz uma menina ou um 
menino, ou um grupo de meninos e meninas, não é nada 
novo. São muitos os professores e professoras que há 
décadas elaboram documentos a fim de lembrar, para poder 
mostrar, para poder informar e para fazer uma reunião 
entre companheiros e companheiras ou com as famílias ...
No início dos trabalhos da Rede, nos primeiros materiais 
compartilhados, podia-se observar que predominavam dois 
tipos de documentação: as cadernetas diárias sobre os 
meninos e as meninas e as imagens de festa ou fatos 
extraordinários.
O fato de poder compartilhar essa documentação já foi 
positivo. Das imagens não havia nada a dizer, falavam por
14
si mesmas e se denunciavam por si mesmas, pela 
homogeneidade da mensagem e conteúdo pedagógico 
pobre: quase sempre mostravam grandes grupos de 
meninos e meninas, quietos, olhando para a câmera ... 
imagens que reproduziam festas tradicionais, como 
carnaval e o dia do livro, imagens de situações em que 
apenas os adultos pareciam se divertir.
As cadernetas, diversas, e de ampla tradição 
especialmente na escola de 0 a 3, foram discutidas a partir 
de duas vertentes: podem ser consideradas documentação? 
E se considerarmos que sim, qualquer tipo de caderneta é 
documentação? O debate permanece aberto, e é possível 
que seja um aspecto da documentação que se tenha que 
recuperar, tanto para refletir sobre ele como para poder 
responder às questões suscitadas.
São estas duas - cadernetas e imagens - as únicas 
maneiras de documentar, ou há outras? Durante os 
períodos de tempo entre reuniões gerais da Rede, e com o 
trabalho em grupo pequeno e a reflexão de cada um sobre 
sua tarefa diária com meninos e meninas, pouco a pouco 
foram aparecendo dúvidas, incertezas e novos interesses 
para continuar trabalhando e para continuar a levantar 
questões.
Em uma sessão de trabalho em grande grupo da Rede, 
colocaram-se duas novas questões que fazem avançar o 
debate: Por que se deseja documentar? Como se documentao que se quer documentar?
Como tantas outras vezes, mais que uma resposta às 
perguntas, o que se pretendia era encontrar uma maneira de 
enfrentar a situação - de certo modo inquietante - a que 
havia conduzido o fato de levantar questões que, alguns 
mais outros menos, pensávamos conhecer, saber e dominar.
E como tantas outras vezes, também passamos de um 
extremo a outro e concordamos em captar pequenos
15
detalhes e fazer pequenas sequências. Os resultados não 
foram sempre os esperados: tínhamos registrado centenas 
de pés, mãos, olhos ... que mostravam uma grande 
diversidade de gestos e olhares, mas raramente 
compunham uma sequência. Desta vez, longe de 
desanimar, se introduz na Rede uma nova dinâmica: a de 
voltar a expor o que se queria explicar e começar a entender 
a dimensão pública da documentação, de sua narrativa.
O mais relevante naquele momento do trabalho da Rede 
foi a mudança de atitude, o novo olhar do dia a dia na 
escola que permitia descobrir o extraordinário no cotidiano, 
porque cada dia é uma festa, e um menino ou uma menina 
descobrem alguma coisa.
Sem que estivéssemos plenamente conscientes, a 
mudança já estava acontecendo, pois, esse olhar, essa escuta 
do que é importante no dia a dia, é algo que contagia.
Muitas vezes nos perguntamos o que aconteceu. E tão 
poderoso o fato de documentar? Sim e não, porque o fato de 
documentar, além de observar para ver e ouvir aos meninos 
e às meninas, envolve também uma outra maneira de 
trabalhar entre os adultos. Requer uma decisão coletiva: não 
é possível documentar sozinho, porque sobre o 
documentado é necessário um diálogo, é necessário que o 
outro ou a outra possam compreender, é necessário estar 
disposto a despir-se e a aceitar a crítica. Por isso, na 
documentação, vemos uma disposição ética do trabalho do 
professor e da professora.
Entra-se no fundamental para poder aprender, por 
curiosidade, por interesse, para se tomar consciência do que 
se sabe e, portanto, com a vontade de saber mais. E neste 
ponto que entram em ação as quatro conferências que 
compõem este livro. Os pontos de vista dos dois professores 
e duas professoras experientes na questão da 
documentação.____________________________________
16
Dois são jovens, como a maior parte da Rede, mas sobre 
a questão da documentação têm mais experiência do que 
muitos dos mais velhos. Dois berçaristas que há tempo 
experimentam formas de como e o que documentar para 
explicar e explicar-se e conhecer o que fazem os meninos e 
as meninas. Duas formas de pensar a documentação, e de 
explica-la, que ajudaram a tomá-lo mais próxima, a 
entender que todo professor e toda professora que o deseje 
pode fazê-lo, porque seu contexto de trabalho é o mesmo 
que o nosso.
A partir da Rede também pudemos ouvir e trabalhar 
com um professor e uma professora de Reggio Emilia, com 
uma longa trajetória profissional, que contribuíram com o 
seu trabalho para fazer das escolas infantis municipais na 
sua cidade uma referência pedagógica mundial. Um 
trabalho feito com uma pedagogia rigorosa, criativa e 
comprometida, e, portanto, muito exigente com o trabalho 
dos professores e das professoras, para mostrar ao mundo a 
imagem de uma infância potente desde seu nascimento e 
capaz de expressar-se por múltiplas linguagens.
A documentação tem sido sua ferramenta fundamental 
para dar a conhecer meninos e meninas, assim como um 
elemento chave para construir sua pedagogia. Portanto, 
poder escutá-los e refletir sobre suas contribuições tem 
permitido compreender as dimensões, a complexidade e a 
necessidade dessa forma de trabalhar na qual a 
documentação é uma peça-chave e exige uma ética coletiva, 
que também é necessário aprender.
Por isso, temos que colocar este livro, que por si mesmo 
já é importante, no contexto do trabalho da rede, porque, 
assim, adquire uma outra dimensão: a do compromisso 
político e ético das centenas de professores e professoras 
que contribuem de forma anônima para a melhoria da 
educação infantil na Catalunha._______________________
17
Pode-se dizer que, para muitos professores e professoras 
que trabalham na Rede Territorial de Educação Infantil da 
Catalunha, estes têm sido anos particularmente difíceis. As 
políticas educacionais para as crianças pequenas têm sido 
adversas tanto para os meninos e meninas de 0 a 3 anos 
como para os de 3 a 6 anos. Durante esse período, criaram- 
se mais escolas infantis do que nunca e também foram 
abertos mais "arremedos" de escolas infantis do que nunca, 
tanto umas como outras com condições indignas para 
meninos e meninas, famílias e profissionais. O 3 a 6 se 
tomou secundário no que se refere a horários e presença de 
especialistas, com horas "letivas" e "não letivas" e com os 
tempos e as atividades importantes cobertos cada vez mais 
por profissionais malformados, ou não formados 
pedagogicamente, e mal pagos.
Essa realidade adversa não conseguiu reduzir o 
entusiasmo por trabalhar em conjunto com os 
companheiros e as companheiras da escola, da cidade ou da 
região, muitas vezes em horários exaustivos, para poder 
compartilhar o trabalho sobre a documentação, e assim 
continuar a compartilhar e a discutir o que se faz, nas 
assembléias gerais aos sábados pela manhã. Longe de 
diminuir, o entusiasmo cresce e cresce, e com ele, a 
delicadeza no trabalhar com meninos e meninas, que é, na 
verdade, o propósito real e a força verdadeira da Rede.
Portanto, o livro que você tem em mãos é muito mais 
que um livro: é uma maneira de entender o trabalho do 
professor, de um professor ou uma professora que se sabe 
sempre aprendendo com e dos meninos e meninas, e com e 
dos companheiros e companheiras.
18
III.
Na segunda parte do livro, denominada 
Documentar: aguçar os olhos para captar momentos, estão 
reunidas três conferências de educadoras italianas. 
Todas elas são, ou foram, professoras, gestoras e/ou 
pesquisadoras da infância e da pedagogia: Anna Lia 
Galardini e Sonia Iozzelli, da cidade de Pistoia, Mara 
Davoli, de Reggio Emilia, e Gloria Tognetti, de San 
Miniatto. Cada uma delas trabalha em um município 
diferente e em seus textos compartilham a sua 
experiência com os professores e professoras que 
querem conhecer e compreender a Documentação 
Pedagógica. A apresentação original do livro explica a 
sua trajetória de elaboração.
Julho é um mês especial para os professores e 
professoras que tem a vontade de melhorar a sua prática, o 
seu trabalho de todo o dia com as crianças, os companheiros 
e as famílias. Começa a ser tradição que, em plena Escola de 
Verão (Escola d'Estiu), durante um período da semana, os 
mestres de Educação Infantil se encontrem para 
compartilhar projetos, para imaginar novas possibilidades, 
para sonhar juntos contextos melhores para a infância. A 
jornada de 2009 vai ser um convite para aguçar os olhos 
para captar momentos da vida quotidiana, que estão 
reunidos no livro que você tem nas mãos.
As melhores épocas da nossa pedagogia contam com 
uma importante inspiração na realidade italiana, desde a 
influência de Montessori até as irmãs Agazzi, passando pela 
experiência de Barbiana e pelo impacto da pedagogia de 
Reggio Emilia, com Malaguzzi e todos os seus 
companheiros e colaboradores, que dialogaram com a nossa
19
realidade sempre disposta a aprender com aquela tradição 
educativa.
Portanto, era lógico que para aprofundar sobre a 
documentação pedagógica, temática de estudo dos últimos 
anos entre nós, as experiências educativas de três cidades 
italianas, que têm verdadeiros laboratórios de pedagogia, 
preenchessem o encontro de conteúdo; da mítica Reggio à 
rica e constante Pistoia, passando pela pequena e delicada 
San Miniato. Três mulheres com uma longa trajetória de 
construção de teorias sobre a educação de crianças 
pequenas mostram, de maneiraharmônica, sua sólida 
experiência, e, com ela, novos desafios em uma dialética 
contínua entre teoria e prática.
Os textos publicados nesse livro são como uma faísca 
que nos convida a seguir trabalhando cada vez com mais 
certeza de que, em educação, as grandes coisas não são as 
coisas grandes, as excepcionais, as extraordinárias; as 
grandes coisas são as pequenas coisas e os pequenos 
detalhes de cada dia, uma faísca que pode trazer luz e foco, 
e que, com uma outra pedagogia, pode afastar o cinzento 
do dia a dia.
IV.
Temos, portanto, neste livro, uma polifonia de 
vozes que não apenas são investigativas em seus 
modos de compreender as crianças, a pedagogia e a 
escola, como também são muito propositivas. Este é 
um livro com caráter de iniciação a um mundo da 
pedagogia que muito nos orgulha, pois trata, com 
muito respeito, da escolha profissional que fizemos e 
nos convida a seguir trabalhando, investigando nossa 
atividade profissional, uma profissão ainda nova e 
pouco valorizada no mundo da educação.
20
O texto fala de uma pedagogia do dia a dia, que se 
constrói a partir das ações e das práticas cotidianas4, 
do seu registro, da análise e da reflexão que se faz a 
partir deste cotidiano que transborda vitalidade, 
alegria e memória. Uma outra pedagogia, uma 
pedagogia que cria vida, onde teoria e prática não se 
separam, assim como o saber e a experiência, o pensar 
e o fazer, o viver e o narrar. Esperamos que gostem 
tanto dele quanto nós e que suas indicações possam 
contribuir para a constituição de pedagogias 
democráticas, participativas e contextualizadas.
Além disto, cremos que o livro também toca em 
duas importantes temáticas educativas, uma delas é 
da formação continuada dos professores e professoras. 
E certo que na formação inicial de professores/as 
sempre ficam lacunas, aprender junto aos colegas, 
organizar grupos de estudos, fazer pesquisa na escola 
é o modo mais adequado de construir novas 
pedagogias. As universidades, centros de pesquisa, 
secretarias de educação são pontos de apoio, mas sem 
professores/as desejosos/as de aprender, de investigar, 
de criar novas abordagens educativas não há como 
transformar hábitos de pensamento e ação, tão 
arraigados na escola, que incidem na exclusão das 
crianças (dentro ou fora da escola) ou na sua 
medicalização e na transformação da docência numa 
profissão da repetição, da cópia, do fazer sempre o 
mesmo e não da invenção e da criação.
4 Ver: http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/relat_seb_praticas. 
cotidianas.pdf
21
E a segunda questão é a da abordagem da 
didática. O século vinte construiu uma didática 
sequencial, linear, onde cada um dos elementos tem 
seu lugar na estrutura da organização do trabalho 
pedagógico. Começamos qualquer trabalho 
pedagógico com o planejamento estabelecendo 
objetivos, definindo os conteúdos, estratégias, 
avaliando o produto final, na década de 70, foi 
introduzido o feedback para mostrar certo movimento 
de retorno. Retomamos para começar na mesma 
ordem. Há uma sequência e independência entre os 
elementos que compõe a didática assim como o poder 
do planejamento e da decisão está centrada, 
especificamente, no/a docente.
A documentação pedagógica cumpre o papel de 
uma outra forma de organização do trabalho 
pedagógico. Menos formal, não linear, mais interativa. 
A Documentação Pedagógica não é apenas uma 
"novidade" na pedagogia. Ela pode ser incluída no 
longo percurso histórico das pedagogias progressistas 
constituindo uma ruptura no modo como se realiza a 
didática hegemônica. A documentação pedagógica é 
um processo que inclui:
• Vários atores e não apenas o/a professor/a no 
processo de reflexão, planejamento e decisão 
sobre os rumos educativo, portanto incita a 
mudança em algumas regras relativas aos lugares 
do poder ao propor o diálogo com as famílias e a 
comunidade;
22
• Inclui a permanente escuta, observação, registro e 
compartilhamento do acontecido exigindo, 
permanente, a reflexão participativa;
• O valor dado aos processos é tão grande quanto 
aquele destinado ao produto final. Se é que o 
produto final será, efetivamente, avaliado como 
tal;
• O processo a ser realizado é continuamente 
planejado, executado e replanejado de acordo 
com sua significância. As trajetórias podem 
mudar e a singularidade de cada um tem lugar 
num processo coletivo;
• O sentido das ações realizadas na escola é 
fundamental; todas as aprendizagens precisam 
ser contextualizadas e significativas;
• Há um compromisso social, histórico e singular 
com a seleção do trabalho pedagógico, o tempo 
das crianças e dos/as professores/as tem muito 
valor.
• Os processos pedagógicos formam as crianças 
como sujeitos e estudantes bem como os 
professores e as professoras como sujeitos e 
profissionais;
• A experiência educacional constrói história 
pessoal e social, memória e possibilita a escolha 
de percursos de vida individual e em comum. 
Constituir no campo da didática uma virada, que
desloque o eixo por onde se constitui toda a 
pedagogia escolar parece ser um grande desafio para 
o qual nos aponta a Documentação Pedagógica. Um 
convite. Um convite para repensar aprendizagem,
23
pratica docente, função social da escola e muitos 
outros temas que fazem parte de nosso dia a dia 
educacional.
Referências
ADORNO, Theodor. Educação e Emancipação. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 2010
HOYELOS, Alfredo. Loris Malaguzzi: biografia 
pedagógica. Edizioni Junior, 2004 
XARXA TERRITORIAL D'EDUCACIÓ INFANTIL A 
CATALUNYA. Documentar, uma mirada nova.
Barcelona. Coleçio Temes dTnfància, n.60, 2009.
2 4
PARTE I
Documentar a vida das crianças na 
escola da infância
Documentar processos, recolher sinais
Mara Davoli
As professoras são como exploradores que utilizam 
compassos e mapas. E, como os navegadores, sabem 
onde está a meta (os objetivos, o currículo). Sabem 
quais são as metas, mas sabem também que as metas 
mudam a cada ano porque o terreno, o clima, as 
estações, as meninas e os meninos são diferentes. Os 
destinos, os objetivos, são importantes e não podemos 
perdê-los de vista, mas o mais importante é saber como 
e por que atingir esses objetivos. É importante para as 
crianças e adultos voltar a percorrer seus próprios 
passos, seus processos de conhecimento por meio de 
uma atitude que é possível graças à observação, à 
documentação e à interpretação (Loris Malaguzzi).
Nas escolas infantis d e 0 a 3 e d e 3 a 6 anos de 
Reggio, a documentação é tanto argumentação como 
narração e explicação de processos, situações e 
experiências. Observar, documentar e interpretar têm 
nos ajudado a repensar a didática: uma didática 
compartilhada e da qual participam os adultos e as 
crianças ao mesmo tempo. Porque a documentação, 
independentemente do meio utilizado, acontece 
durante o processo e não no fim da experiência. Esse 
processo de deixar e recolher rastros reúne, em
2 7
primeiro lugar, os adultos, mas também os pequenos. 
Obviamente, de formas diferentes, mas todas elas com 
rastros e instrumentos que nos ajudam a percorrer de 
novo a experiência vivida. Não são apenas memória 
de algo que já aconteceu, são também processos que 
nos permitem compreender como fizemos o que 
fizemos.
Observar, interpretar, documentar, construir 
O bserv ar é um ato de conhecim ento
"Observar" significa acima de tudo "conhecer". 
Mas não se trata de um conhecimento abstrato, trata- 
se de uma emoção do conhecimento que contém toda 
a nossa subjetividade, expectativas, aquilo que 
esperamos que aconteça, nossas hipóteses e nossas 
teorias de referência, nas quais nós também estamos 
refletidos. Toda observação que fazemos, precisamos 
estar cientes, não é a verdade do que aconteceu: toda 
observação é parcial porque o que sabemos ver, 
capturar,fotografar, etc. depende do nosso ponto de 
vista subjetivo, do que nós esperamos dos meninos e 
das meninas, de se esperamos muito ou pouco. 
Depende também das perguntas que nos fazemos 
frente a cada situação. Quando nos dispomos a fazer 
algo, não vamos "despidos", mas temos algumas 
perguntas que nos levam a refletir sobre nossos 
imaginários. Questões que não são uma jaula, mas um 
terreno fértil que nos ajuda a captar o inesperado.
28
Tal como acontece na investigação científica, 
quanto mais hipóteses tenhamos sobre una 
determinada situação, mais capacitados estaremos 
para compreendê-la. Quantas vezes, em determinadas 
experiências científicas, chegou-se a resultados 
distintos dos previstos. Portanto, «observar» é um 
verbo ativo, um ato criativo que requer nossa 
interpretação. Por este motivo, observar implica 
repensar, pensar sem pré-conceitos.
D o cum en tar p ara narrar, descrever, in terp reta r e 
con stru ir
Quando documentamos uma experiência, 
recolhemos um grande volume de materiais, notas, 
fotografias, gravações ... "quilos" de material. O que 
fazemos com tudo isso? O risco maior é que esses 
documentos permaneçam silenciosos devido a sua 
grande quantidade. Quando finalmente temos 
compilado todo o material, devemos dedicar tempo 
para interligá-los (linguagem oral, as fotografias, as 
produções das crianças...). Em seguida, temos que 
buscar interpretá-los, relacionar a teoria com a prática, 
construir conhecimentos novos, etc. Sobre o que 
interpretamos, podemos ir além e tentar um avanço 
teórico, fazer uma descoberta, por exemplo, sobre a 
aprendizagem e o desenvolvimento da linguagem 
falada, ou da linguagem escrita, que se refira tanto a 
um grupo específico de crianças, como à teoria da 
aprendizagem e à construção do conhecimento.
29
Quanto aos projetos, por exemplo, muitas vezes se 
pode explicar como histórias dentro da própria 
narração da experiência. Esta narração contém 
significados teóricos tais como a forma como 
planejamos, como foi a relação com os pequenos, etc.; 
mas também poderiamos tomar esses mesmos 
materiais, juntamente com o material de base, ou seja, 
o material que serviu de base para essas narrações 
(gravações, fotografias ...) para estudá-los e 
aprofundar além da experiência concreta. Por 
exemplo, qual é hoje o conceito de transformação e 
variação para os meninos e meninas de cinco anos? 
Conseguem conceituar? Como o fazem? Que 
significados dão à palavra "transformar"? Havia uma 
frase de uma criança que expressava claramente o que 
ela entendia por "transformar". Para ela, "transformar" 
era "não fazer totalmente diferente, mas manter um 
pouco de igual e sobre aquele igual por um pouco de 
diferente". Isso é uma teoria, um pensamento 
concreto. Mas, como professora, posso estar 
interessada em ver como conceitos como
transformação e variação são vividos por crianças em 
diferentes contextos e com linguagens diversas. Posso 
pensar em atividades nas quais a variação (por 
exemplo, da linguagem musical, da cor, da palavra ...) 
seja a base para construir a experiência. Música, 
palavra e cor são diferentes, mas o conceito de 
variação pode dar forma a atividades semelhantes 
com linguagens diferentes. O que eu quero dizer 
resumidamente, é: que tipo de processo ativa em 
crianças e adultos esta forma de trabalhar? Que tipo
30
de processo ativa processos que podem ajudar a lidar 
com situações desconhecidas? Pois, se eu experimentei 
a variação com a cor, por exemplo, o que eu aprendi 
me ajuda a entender a variação na linguagem musical. 
Esta forma de trabalhar com meninos e meninas deve 
nos ajudar a construir com eles uma maneira de 
pensar que os ajude a aprender a aprender: não se 
trata de enfatizar os conceitos, mas os processos de 
aprendizagem. Os nossos meninos e meninas vivem 
em um mundo em que as mudanças da sociedade, da 
cultura e da tecnologia estão ficando mais rápidas. 
Portanto, devemos ter uma mente flexível para nos 
ajudar a aprender a aprender coisas novas.
Observação, documentação e interpretação 
constituem três partes inseparáveis de um mesmo 
processo. Os documentos que produzimos nos ajudam 
a continuar a aprender todos os dias a nossa profissão, 
porque todos a cada dia temos que reaprender. Servir- 
nos da observação, da documentação e da 
interpretação nos ajuda, e chega mesmo a ser 
indispensável. Esses documentos que procuramos 
produzir convertem-se em documentos úteis tanto 
para valorar as experiências como para nos 
autovalorar. Também são instrumentos que nos dão 
apoio no processo de nos tomarmos profissionais 
individuais e de grupo. Outra coisa fundamental que 
diz respeito às crianças e aos adultos sem distinção é 
viver, fazer, experimentar - que, apesar de ser 
importante, não é suficiente. O ativismo é um risco 
que corremos com as crianças (fazer muitas 
produções, fazer muitas coisas ...). Fazer é importante,
31
mas não suficiente. Devemos permitir aos meninos e 
às meninas, e a nós mesmos, tempo para refletir sobre 
o que se faz e como se faz. São os processos de 
metalinguagem e metaconhecimento que nos 
permitem construir conhecimento. Quanto mais 
situações são criadas para refletir em grupo, mais rico 
será esse processo, pois mais pontos de vista se 
manifestam. Em um grupo há sempre que ter alguém 
que questiona o que a maioria opina ou que leva todo 
o grupo a pensar o porquê das coisas.
Decisões prévias ao processo de documentação
O que, como e para que documentar?
Para documentar, a primeira coisa que, em minha 
opinião, devemos perguntar é: Que tipo de
documentação queremos? Por que? E para quem? 
Estas são questões que temos que nos fazer antes de 
começar, pois o que decidimos observar está ligado à 
utilidade que queremos extrair de uma documentação 
concreta e também ao como o faremos (qual será o 
instrumento ou instrumentos mais adequados).
A outra coisa de que temos de nos convencer 
rapidamente é que temos de ser capazes de escolher. 
Escolher é muito difícil, porque, trabalhando com 
crianças pequenas, tudo nos parece igualmente 
importante, e é; no entanto, se queremos avançar em 
nossos pensamentos e em nossa maneira de ensinar, 
temos que "de limitar", destacar algumas coisas.
32
Escolher não significa perder de vista o contexto, mas 
focar algumas coisas específicas.
Uma vez concentrada nossa atenção, tendo 
escolhido o que nos interessa, devemos decidir como 
documentaremos o que vai acontecendo. Desde como 
abordar o aspecto principal até que ferramentas e 
suportes usaremos para documentá-lo. Por exemplo, 
algumas vezes é mais útil usar papel e lápis; outras, 
um gravador (a linguagem verbal é muito importante) 
e, muitas vezes, a câmera digital é de grande utilidade 
para reter imagens de um processo. No entanto, é 
preciso lembrar que a facilidade de uso dos novos 
meios implica no risco de utilizarmos apenas esses 
sistemas. Por outro lado, fotografar também é 
interpretar e escolher e, para isso, devemos estar 
cientes de que o que registramos não é a verdadeira 
realidade, ou, pelo menos, não toda a realidade.
Que instrumentos?
No que diz respeito à forma dos instrumentos 
para observar e registrar, não há um melhor do que o 
resto. O que é claro é que deve ser útil. Por exemplo, 
como tenho facilidade de fazer esboços, o que eu 
registrava em um grupo de crianças eram alguns 
passos fundamentais, de acordo com minha 
experiência, que as crianças seguiam para fazer uma 
determinada produção, as trocas de conhecimento que 
se produziam entre elas. Para dar um exemplo: 
geralmente, na Escola, a cópia é malvista, mas quando, 
digamos, estou fazendo uma figura e não consigo que
33
esta fique como eu gostaria e vejo que meu amigo 
encontrou uma solução para isso, se eu estiver 
preparada para captar o processo, posso aplicar a 
cópiaà minha situação. E o que Vygotsky chama 
"zona de desenvolvimento próximo". No entanto, se 
eu não estou preparada, nem sequer vejo a solução ou 
sou capaz de usá-la. Esta forma de observar e registrar 
o processo de cada criança nos permite ver essas 
coisas e estar perto de cada uma delas. Assim, ao final 
de cada atividade, eu tenho vinte e seis produções 
diferentes, e sei como cada um dos meninos e das 
meninas conseguiu dar forma a seus pensamentos 
com as mãos. Estas compilações individuais não ficam 
apenas nas histórias pessoais de cada criança, mas se 
tomam um patrimônio coletivo, são como blocos que 
constroem a experiência conjunta da escola.
Refletir sobre como foram feitas algumas coisas é 
necessário tanto para os meninos e meninas como 
para os adultos. Dessa forma, podemos aprender com 
eles para fazer o nosso trabalho, e eles aprendem a 
aprender conosco.
Outra questão é decidir que tipo de instrumentos 
escolhemos para documentar cada situação com um 
grupo concreto de meninos e meninas em nossa 
escola: a cotidianidade, a subjetividade, os projetos ... 
pois, será o conjunto de instrumentos de 
documentação que dará uma perspectiva do conjunto 
de toda a experiência de meninos e meninas na escola; 
não devemos tentar coloca-la toda em um só 
instrumento.
34
Que recursos?
Em relação aos suportes da documentação, as 
paredes das escolas de educação infantil declaram 
quem são õs protagonistas da experiência. Nossa 
tarefa se realiza tanto por meio de episódios simples 
como por projetos que se estendem ao longo do 
tempo. Assim, temos as folhas onde registramos as 
observações subjetivas relativas a cada criança e que 
comporão depois seus dossiês individuais, as 
transcrições, a documentação da parede ou as 
documentações projetadas em páginas que se 
sucedem como em um livro; isto é, o material bruto. 
Nestas últimas, cada página recebe, como se fosse o 
capítulo de um livro, um título que funciona como 
síntese ou resumo do que encontramos nas linhas que 
se seguem.
No entanto, para funcionar bem, são necessários 
espaços onde se possa reunir, onde ter os 
instrumentos e onde, de vez em quando, se possa 
fechar a porta e escrever, pensar sozinho ou com 
companheiros onde ter os arquivos de fotos, de 
material digital e em papel.
Os suportes (murais, expositores, prateleiras, 
dossiês ...) existentes na escola também são 
importantes. Às vezes, os grandes painéis de madeira 
da escola se transformam em lousas em que, à medida 
que o projeto ou a experiência cresce, vamos anotando 
os fatos que vão acontecendo. Isso nos ajuda a tomar 
visível esta primeira síntese, envolvendo também
35
crianças e famílias que vão enriquecendo a experiência 
ao longo do processo.
No entanto, nossa vida com os meninos e meninas 
não é feita apenas de projetos longos, mas também de 
cotidianidade. Uma cotidianidade rica, feita de 
situações de grande potencial educativo. De toda essa 
riqueza da vida cotidiana, o que conseguimos ver da 
rede complexa de relações e de coisas que acontecem? 
O que podería nos ajudar a vê-la melhor? E cada 
experiência requer uma maneira diferente de ser 
tratada, coletada e documentada.
A documentação, instrumento de estudo e de 
comunicação
Outro aspecto da documentação é a comunicação. 
Uma pergunta fundamental que deve ser feita antes 
de decidir o instrumento que usaremos, ou o suporte 
mais adequado capaz de captar o processo, é: a quem 
eu quero comunicar? Suponhamos que o assunto 
escolhido seja o momento da refeição e como o 
vivemos. Quero mostrar às famílias, porque interessa 
falar sobre como se come em casa e como se come na 
comunidade. Se este for o objetivo, o que opto por 
observar implica um determinado meio. Se, por outro 
lado, se trata de um pequeno grupo de trabalho 
formado por professores, será útil um vídeo de estudo 
que pode ser gravado em tempo real durante a 
duração da experiência de alimentação. No entanto, 
mesmo com uma gravação, se não se esclarece 
anteriormente o que se quer ver, em que se está
36
interessado, o debate será limitado e disperso. Se 
queremos que um vídeo seja útil para fazer uma 
análise e interpretação de um momento específico 
dentro do grupo -nesse caso, o momento da comida -, 
temos que decidir com antecedência que aspectos 
queremos investigar.
Devemos considerar que o vídeo é uma 
linguagem que tem que falar de forma autônoma 
como um filme ou um anúncio e que, portanto, sua 
montagem se toma um tipo de escrita que dá sentido 
ao que vemos. Ainda que ninguém de nós seja técnico 
no assunto, somos especialistas em crianças e não em 
vídeos, temos de estar cientes de que o tempo de 
duração de um vídeo é parte importante desta 
linguagem.
Dito isto, voltemos ao exemplo da hora da 
refeição. A comida é uma rotina, comemos todos os 
dias. A própria decisão de querer entender mais 
plenamente o significado de um momento rotineiro é 
importante porque permite sair da "jaula" das 
atividades repetitivas de todos os dias. Decidir que 
queremos documentar a hora da refeição quer dizer 
tudo e não diz nada. Esse momento não é uma linha 
reta e horizontal, mas é composto de muitas coisas que 
acontecem simultaneamente e se as narramos todas 
iguais, as mantemos todas no mesmo plano. Aqui 
haveria uma primeira eleição, e é difícil escolher; 
também a respeito do que se quer dizer. Na verdade, 
eu me lembro que meus colegas mais jovens me 
diziam: "Como tudo é igualmente importante, quase 
não consigo ver nada".
3 7
Uma vez definido o contexto amplo do estudo, 
possivelmente por meio da discussão em grupo, 
podemos escolher um aspecto significativo ou um 
momento concreto sobre o qual queiramos nos 
aprofundar, sem perder de vista o contexto.
A comunicação com as famílias é um dos aspectos 
da documentação que vai além dos projetos e da 
cotidianidade. Se dedicarmos todo o tempo para gerir 
essa comunicação com foco na elaboração de alguns 
instrumentos (cadernetas diárias, álbuns ...), nos 
faltará tempo para aprofundar nos significados e 
aprender a fazer melhor o nosso trabalho. O problema 
é pretender dar muitas coisas às famílias sem priorizar 
a qualidade sobre a quantidade. Depois de um tempo, 
as famílias preferirão menos materiais, mas melhor 
organizados em lugar de muitos materiais desconexos.
Tanto as escolas de 0 a 3 como as de 3 a 6 têm, 
como as pessoas, identidade própria. Por isso, a 
entrada é o lugar que proclama a identidade de cada 
escola e, portanto, é um espaço que deve dar 
visibilidade a todas as pessoas que aí convivem, desde 
os menores (por meio da síntese de algum projeto do 
ano anterior) até a equipe da escola. Em minha escola, 
um calendário mensal informa a todos o que se espera 
fazer durante o mês, também há painéis e espaços 
dedicados às famílias e à participação. É uma entrada 
que procura refletir, por meio da documentação, os 
traços globais do que é a escola.
Cada turma, por exemplo, tem sua própria 
entrada, na qual se pendura a agenda diária, uma 
documentação que é arquivada e que as professoras
38
fazem todos os dias. Trata-se, sem dúvida, de que 
cada um aponte o como e o porquê dos instrumentos 
que prioriza. Por exemplo, no que diz respeito à 
agenda diária, para além da forma, que tipo de 
estrutura podemos pensar para este instrumento tão 
presente na vida cotidiana? Podemos pensar na 
agenda diária como um instrumento que fazemos 
sempre da mesma forma, independentemente da 
idade dos pequenos? Todos os meninos e meninas tem 
que aparecer todos os dias? Podemos pensar em fazer 
a agenda na semana e ir todos os dias marcando um 
acontecimento, uma história em que só aparecem 
alguns dos pequenos? A agenda ou caderno de cada 
grupo, além de ser um instrumento de comunicação 
diária com famílias, também pode ser entendida como 
uma forma de escrevera história de um grupo de 
crianças ou como um instrumento de escrita diária do 
processo vivido diária do processo vivido. Na minha 
escola, a agenda ou diário do grupo se tomaram uma 
espécie de fio condutor que perpassa o primeiro, 
segundo e terceiro ano dos meninos e meninas. A 
agenda fica na escola e as crianças levam para a casa 
durante o ano, ora uma criança, ora outra. Assim, 
podemos olhar para trás no tempo, para episódios 
passados. Também é útil para as professoras 
responsáveis por um grupo de meninos e meninas de 
três anos reler o que suas companheiras professoras 
fizeram no ano anterior com crianças da mesma idade.
Outra coisa interessante é manter um registro ou 
notas das reuniões com as famílias com nossas 
contribuições, e também com as contribuições das
39
famílias. Esse instrumento se utiliza também durante 
os três anos em que os meninos e meninas estão na 
escola.
Documentar para dar visibilidade aos processos
Em Reggio, não temos fichas de avaliação 
subjetiva, mas temos muitos instrumentos de 
documentação para fazer um retrato de cada criança, 
mesmo que seja parcial e relativo, uma vez que o 
retrato que podemos fazer sempre será relativo às 
experiências da criança em um contexto humano e 
material específico, neste caso, a escola.
E o que acontece com as produções dos meninos e 
das meninas? Vão para casa sempre imediatamente? 
Pode ser um material que nos ajude no processo de 
reflexão? Que equilíbrio temos que construir entre os 
instrumentos, dossiês e registros subjetivos e 
individuais e os de grupo? De qualquer forma, cada 
um sempre mantém, como pano de fundo, a presença 
do grupo. Algumas produções vão para casa uma vez 
por ano (às vezes são presentes para momentos 
específicos) e outras são mantidas na escola durante os 
três anos, sempre disponíveis nas prateleiras para 
crianças e famílias. Meninos e meninas gostam muito 
de ver o que faziam quando eram menores, o que, 
além do prazer de se verem mais velhos, pode dar 
origem à reflexão.
Por exemplo, eu me lembro que minhas 
companheiras e eu, olhando alguns materiais 
recolhidos, havíamos tentado fazer algumas perguntas
40
sobre as garatujas (como é que as crianças fazem 
tantas garatujas? Por que apoiamos isso? O que a 
criança tenta capturar com a garatuja?). Depois, 
fizemos as mesmas perguntas aos maiores, de cinco 
anos: Por que vocês passaram tanto tempo fazendo 
garatujas aos três anos? Para que serviram? Querem 
tentar fazer algumas garatujas agora e dizer como se 
sentem?
Aqui estão algumas de suas respostas à questão 
"O que são as garatujas":
• "E o primeiro desenho que você pode aprender"
• "A garatuja são as primeiras palavras do 
desenho" (Quer dizer que se há palavras, há uma 
história e um pensamento).
• "E um anel"
• "A primeira coisa é aprender a fazer círculos."
• "A garatuja é ar em círculo."
• "Dentro da garatuja pode acontecer erros, dentro 
dos erros pode ter coisas bonitas "
• "Dentro das garatujas pode haver muitas 
histórias."
Certamente, os meninos e meninas, tanto na 
escola de 0 a 3 como na escola de 3 a 6, contam o 
mundo inteiro dentro de um desenho. E realmente, o 
mundo está nesses desenhos.
Em suma, não há uma única forma de 
documentar, não há receitas. Para avançar, é 
necessário que seja a própria pessoa que organize a 
maneira de comunicar a própria experiência, é 
necessário fazer uma síntese e declarar: "Isso é o que 
eu entendí, coletei, interpretei e escolhi". Por isso, a
41
mesma situação, comunicada por quatro pessoas 
diferentes, serão quatro experiências diferentes. 
Sintetizar e comunicar nos ajuda a aprender o nosso 
trabalho. Pessoalmente, tenho tido a sorte de ter ao 
meu lado alguém tão "implacável", como Loris 
Malaguzzi, que, quando lhe mostrávamos uma 
documentação, dizia-nos que tendíamos a nos 
embebedar de palavras e nos desafiava a buscar 
respostas sobre os possíveis significados de cada coisa.
42
Afinando os olhos para captar momentos
Mariano Dolci
A importância da documentação é enorme porque 
sem ela nenhum processo pedagógico se consolida. 
Serve para a reflexão e para a construção pedagógicas 
e, se bem feita, toma-se uma verdadeira "mina" de 
recursos que, mesmo depois de cem anos, continua a 
ser uma fonte de informação produtiva. É, como dizia, 
uma "mina": não se sabe o que tem dentro, porque as 
perguntas certas, nunca supérfluas, podem chegar 
depois de anos e anos de investigação. De qualquer 
modo, a documentação apresenta sempre novos 
desafios. Quem se preocupa com documentar pode 
cair na tentação de documentar tudo, mas é 
impossível, e, por isso, não é útil. Isso me faz lembrar 
de uma história de Borges sobre uns geógrafos da 
China que estavam interessados em construir um 
mapa em escala 1:1. É mais ou menos, o que disse 
Bruner sobre a biografia "se dissesse tudo sobre uma 
pessoa, levaria uma vida de oitenta anos para lê-la".
A escolha do foco: o que queremos documentar
E necessário fazer uma escolha. Aqui começam as 
dificuldades. Mas também a discussão sobre o que
43
escolher faz parte da documentação e, como tal, deve 
constar dela. A documentação serve em dois sentidos: 
extemamente, serve para dar visibilidade ao trabalho 
e identidade à escola e, intemamente, é útil aos 
indivíduos e grupos a fim de estudar os processos 
vividos. Portanto, começa-se com uma escolha que 
lembra a decisão dos artistas "da realidade, o que 
escolho para destacar e transmitir a mensagem?". 
Além disso, para documentar é necessário um 
método.
Penso que o importante e indispensável é que a 
documentação seja feita pelos educadores. Muitos 
pensam que para documentar é preciso confiar em 
pessoas externas (fotógrafos, jornalistas ...), mas isso 
não é possível.
É claro que devemos chamar especialistas quando 
eles são úteis, mas apenas os educadores podem se 
encarregar da documentação de experiências e 
processos relacionados à educação de meninos e 
meninas, pois é um material que tem que servir para 
eles. O fotógrafo municipal de Reggio Emilia, que era 
muito conhecido e tinha feito várias exposições, me 
acompanhou em meu trabalho pois, em Reggio, 
queriam fazer uma publicação sobre o meu trabalho. 
Fui ver suas fotos e quase não tinha uma utilizável, 
ainda que, do ponto de vista técnico, elas fossem 
muito boas. Em troca, as das professoras eram 
bastante ruins do ponto de vista técnico, mas tinham 
conseguido captar o olhar das crianças e as relações 
que havia entre elas. O fotógrafo não tinha olhos para 
ver aquele tipo de coisas. Busque um fotógrafo
4 4
somente se tiver a certeza de que podemos dirigi-lo e 
dar indicações relevantes e pertinentes para poder 
trabalhar, especialmente se já estiver envolvido e tiver 
entendido o verdadeiro problema, a situação e as 
necessidades que essa atividade comporta.
Em primeiro lugar, como já dissemos, a 
documentação é um aspecto fundamental do trabalho 
do professor. Como disse Bruner, falando de uma 
pessoa ou uma identidade: "não tem vida quem não a 
explica." Se nós não explicitamos, se não narramos 
nossas histórias, não nos fazemos conscientes do que 
fizemos na vida. Da mesma forma, para um grupo, 
para um coletivo, penso que acontece exatamente o 
mesmo. Isto significa que uma das finalidades da 
documentação é manter a memória do caminho 
percorrido e do qual, frequentemente, nos 
esquecemos. Isso nos dá uma ideia da nossa evolução. 
Não percebemos nossas mudanças ao longo do tempo, 
mas ver o que fazíamos cinco anos antes nos permite 
perceber a direção que seguimos e, possivelmente, ter 
uma ideia sobre onde chegaremos no futuro.
Outra coisa muito importante sobre a 
documentação é que representa um relatório, ou, pelo 
menos, um primeiro passo para um relatório porque 
em relação aos princípios sagrados da pedagogiatodos nós, de um modo geral, concordamos, mas 
quando se trata de discutir frente a um slide ou uma 
série de fotos, as opiniões podem ser diferentes, e 
quanto mais discussão se gera, melhor.
Por sua vez, a documentação também serve para 
tomar visível a escola ao exterior, tanto aos pais como
4 5
aos professores, companheiros de outras escolas que 
vem para partilhar as suas experiências. A 
documentação oferece a oportunidade de falar sobre 
algo concreto, por isso é um exercício muito útil para o 
desenvolvimento de empatia (eu faço isso, mas o que 
acontece na base disso que eu faço?"). Ouvir opiniões 
dos demais sobre o que fazemos, é um ato necessário. 
Quando se toma um costume, uma prática constante, 
servirá também para ver as diferenças entre as pessoas 
e para ver como uma determinada pessoa evolui de 
forma diferente em relação aos problemas. Além 
disso, nos permite ver que tanto opiniões como 
evoluções são diferentes e enriquecem nosso processo.
Meta-conhecimento: saber o que se sabe
Se a documentação é bem feita e dela participam 
os meninos e as meninas, aparecem elementos 
importantes sobre a vida do pequenos que nos levam 
a entrar no campo do meta-conhecimento, isto é, a ser 
conscientes do que estão fazendo, de sua evolução, do 
que tem feito nos últimos meses.
As crianças podem fazer desenhos maravilhosos, 
mas os esquecem pouco depois. A documentação das 
atividades permite melhorar a memória e continuar 
com o projeto. Muitos amigos nossos de diferentes 
partes do mundo, quando vinham a Reggio Emília, 
ficavam maravilhados com a beleza de algumas 
produções das crianças, especialmente algumas 
coletivas e diziam "nós somos mais ricos que vocês e 
damos às crianças mais materiais, como é que elas não
4 6
fazem coisas tão bonitas?". Então me lembrava como 
em muitos lugares em Itália, se fazia as crianças 
desenharem enquanto esperavam a hora de sair. Meia 
hora antes de ir embora, entregavam-lhes a folha. 
Quando a criança mostrava o desenho para sua mãe 
na saída da escola, ela se limitava a dizer "Que bonito" 
e, no dia seguinte, "Que lindo", com o que a 
mensagem clara que a criança recebia era: "O que você 
faz não me importa...como todas as coisas das 
crianças". E quase como uma punição, como aos 
adversários do Czar, que durante quinze dias eram 
obrigados a cavar um buraco e por mais quinze dias se 
dedicavam a enchê-lo de terra. Ou seja, faziam um 
trabalho inútil e que lhes destruía a moral. Devemos 
ter em mente que os pequenos têm "antenas" e, por 
isso, na terceira vez em que ouvem "que bonito, que 
lindo..." sem que se dê importância, sabem que a 
aquilo não se dá valor algum.
Lembro-me de uma atividade sobre faisões que se 
fez em uma escola em Reggio Emilia. Antes de 
qualquer atividade, perguntaram às crianças o que 
sabiam sobre faisões. Elas fizeram desenhos de uma 
banalidade extraordinária: um círculo, patinhas, etc. 
Eu não quero contar todo o processo aqui porque seria 
muito longo, mas digo que durante quatro ou cinco 
meses, elas trabalharam sobre faisões, observando até 
mesmo como abriam os ovos numa fazenda, 
queimando penas de perceber seu cheiro... O tema 
tinha que manter o interesse dos meninos e meninas. 
Quando, mais tarde, três ou quatro crianças de cinco 
anos fizeram um enorme mural coletivo, de grande
4 7
beleza, nossos colegas pensaram que tinham recebido 
ajuda: "aqui está a mão de um adulto", disseram.
Daí vem também o equívoco de que, em Reggio 
Emilia, fazemos pequenos artistas, e não é assim. Se 
aos mesmos meninos e meninas que haviam feito esta 
coisa maravilhosa, pedíssemos para desenhar um 
coelho, mais uma vez fariam um desenho pobre e 
banal. Não é que eles tenham aprendido a desenhar, 
eles aprenderam a expressar o que eles têm dentro; se 
não tem nada dentro, não expressam nada. Trata-se de 
expressar-se em termos de informações, mas 
especialmente de emoções.... Se tiverem acumulado 
muitas emoções sobre uma coisa em particular, 
aparecerão produções muito ricas. No entanto, isso só 
é possível se o interesse das crianças se mantém 
durante um tempo, e se manifesta também na 
documentação parcial sobre as atividades ("fomos 
visitar uma granja", "vimos como os ovos se abriam", 
etc.). Se meninos e meninas participam e conhecem 
essas coisas, então eles sedimentam suas emoções, 
memórias ... e fazem desenhos mais elaborados e 
complexos. A documentação serve, portanto, à criança 
e à professora.
Diferentes formas e tipos de documentação
Falta o aspecto técnico: como se documenta e que 
técnica devemos utilizar?
E muito importante ter em conta o receptor dessa 
documentação. Há pais que quase não vem à escola e 
que passam distraidamente para buscar seu filho ou
4 8
filha. A documentação, nesse caso, deve basear-se em 
imagens grandes, com poucos comentários escritos e 
poucas considerações metodológicas. Pode ser útil, 
além disso, fornecer um documento ou uma fotocópia 
da atividade realizada.
Ou pode acontecer que atraia os pais e os faça 
interessar-se. Nesse caso, evitaria também colocar 
detalhes metodológicos de como se chegou a fazer a 
atividade. Se, no entanto, a documentação deve servir 
aos professores para manter a memória do que tem 
sido feito, então os detalhes metodológicos são muito 
importantes e convém acrescentar observações escritas 
mais ou menos extensas. Sem esquecer que na 
documentação também podem participar meninos e 
meninas, mesmo os menores. Pode-se convidá-los a 
fazer as coisas para que fique uma amostra.
A participação de meninas e meninos na 
documentação tem que ser, em primeiro lugar, 
organizada por educadores que coletam/recolhem os 
desenhos e demais materiais. Depois se pode captar a 
atenção da criança, a fim de retomar o fio da atividade 
realizada e pedir para intervir perguntando-lhe sobre 
o que fez ou pensou antes ou depois, isto é, mostrar 
interesse sobre como foi procedendo em sua atividade. 
E claro que, num primeiro momento, a professora 
deve estar presente e que a criança não poderá de 
separar dela imediatamente. Porém, temos de criar as 
condições adequadas para que meninos e meninas 
façam, descubram, manipulem à vontade enquanto 
adultos se dedicam a sedimentar os resultados. Se 
alguma coisa extraordinária que a criança faz não é
49
valorizada, se esquece. Quando meninos e meninas 
espontaneamente fazem algo que, para nós, pode ser 
um embrião de documentação, precisamos fazê-los 
perceber isso e envolver os outros. E preciso dar valor 
ao que fazem meninas e meninos.
A documentação pode ser útil para a criança. Se 
ela percebe que o que faz, ou o que fez há, digamos, 
um mês mudou um pouco e se lembra de forma 
consciente, começa a entender que a documentação é 
importante.
Naturalmente, perceber que a documentação é 
importante, é, num primeiro momento, um processo 
inconsciente na criança. Cabe aos educadores fazer 
com que esse processo se tome consciente. Da mesma 
forma, tem que ser assim nas demais atividades que 
fazem na escola: não se trata de ensinar nossas 
convenções, nossas regras; trata-se de tomar meninas 
e meninos conscientes de suas próprias convenções. 
Trata-se de saber descobrir e valorizar os progressos 
que fazem dia a dia.
Vamos falar agora sobre os diferentes níveis de 
documentação de acordo com a utilidade esperada: 
costumo ouvir dizer que em Reggio separavam a 
documentação denotativa da conotativa. Eu utilizaria 
palavras mais simples. Penso que há três níveis de 
documentação. O primeiro, a simples sequência 
temporal do que aconteceu (os diferentes 
acontecimentos de uma saída com os meninos e 
meninas, por exemplo), o exemplo típico da 
documentação que chamam "denotativa". Exemplo:
50
"Fizemos uma saída fora da escola". Com fotos do 
início ao fim da excursão.
"Os meninos e meninas fizeramdesenhos". Um 
desenho coletivo e muitos desenhos individuais.
"Fizemos um texto escrito contemplando as 
declarações das crianças com as idéias expressas por 
cada um". Um texto, uma recopilação de textos, etc.
Neste caso, o fio narrativo é cronológico e 
funciona para as ações sucessivas ao longo do tempo. 
É uma síntese, uma lista dos diferentes momentos 
vividos. Por isso, é apenas preciso ter clara a sequência 
programada das ações didáticas, ter uma câmera 
fotográfica e reunir os materiais produzidos pelos 
meninos e meninas. Esse tipo de documentação 
descritiva, usado por muitos educadores, é adequado 
para documentar um item, mas não para documentar 
um processo, o que não significa em absoluto que seja 
inútil, apenas não é suficiente para satisfazer outras 
necessidades distintas.
O segundo nível é aquele em que as teorias, 
hipóteses e pensamentos das crianças aparecem na 
documentação de maneira implícita. Enquanto que o 
primeiro nível um fotógrafo competente pode realizar, 
este segundo nível só é acessível para os educadores.
Finalmente, o terceiro nível é aquele no qual não 
apenas aparecem os pensamentos e teorias das 
crianças, mas também as teorias e os pensamentos da 
escola. Se a documentação estiver bem feita, 
transmitirá implicitamente informações importantes, 
tais como "por que fazemos essa atividade?", "que 
sentido tem para nós?", "que conceito temos da
51
relação adulto-criança?", "como tentamos ser 
coerentes com as nossas declarações?".
E claro que, quando anteriormente me referi ao 
primeiro, segundo e terceiro nível, eu não os coloquei 
em nível de importância, porque cada um desses 
níveis pode ser útil em alguns campos e, acima de 
tudo, porque eles podem juntar-se e complementar-se 
a fim de ajudar a ter uma visão mais ampla dos 
processos.
Será interessante dizer duas palavras sobre a 
escolha do foco: o que pretendo documentar. Penso 
que é muito útil fazer o que em Reggio é chamado de 
"declaração de intenções" (Eu quero refletir sobre isso, 
eu quero ter uma primeira ideia sobre aquilo...). Isso 
não significa que, uma vez iniciada a atividade, não se 
volte atrás, se necessário, por exemplo, quando a 
direção adotada não é produtiva, ou simplesmente 
para lembrar os passos que seguimos ou os erros e os 
equívocos cometidos ... e também é positivo. Os 
projetos devem gozar de certa elasticidade que nos 
permita, inclusive, inverter sua direção se as crianças 
impõem outra.
Na epistemologia valoriza-se um conceito original 
denominado em inglês serendipity (serendipidade) 
que se refere ao que se acaba encontrando em um 
determinado processo de investigação, coisas com 
extraordinário interesse que emergem e que, na 
verdade, não são aquelas que estávamos procurando. 
Quer dizer que, muitas vezes, a mesma investigação 
nos leva a fazer descobertas inesperadas e 
surpreendentes que não tem possivelmente nada a ver
52
com as nossas intenções originais. Eu penso que este é 
um conceito importante para nós: buscamos certas 
coisas, mas inevitavelmente encontramos outras que 
não teríamos encontrado se não tivéssemos começado 
a procurar.
Novamente refiro-me à "mina" de informação que 
a documentação contém: trata-se de histórias pessoais. 
Como a sedimentação da informação, pode servir 
mesmo depois de anos.
Lembro-me que queríamos documentar a 
primeira vez que uma marionete entrava em uma sala 
da escola de 0 a 3: as câmeras fotográficas estavam 
prontas, mas eu estava tão emocionado que eu fui 
incapaz de puxar os fios e entrar em relação com as 
crianças. Por sua vez, as professoras estavam muito 
preocupadas com a possibilidade das crianças se 
assustarem e das fotografias saírem mal. Ou seja, cada 
um pensava em seu trabalho. Depois da experiência 
compartilhamos as fotos feitas durante a sessão e 
começamos a discutir o que as crianças pensavam. 
Depois de alguns meses de atividade com marionetes 
apareceu a pergunta correta: "Quando a marionete 
entrou na sala, o que as crianças olharam?" Ninguém 
se lembrava isso porque cada um havia estado tão 
absorvido em seu trabalho e não havíamos prestado 
atenção naquele momento.
No entanto, as imagens eram muito claras: os 
olhos das crianças se separaram da marionete para 
olhar primeiro o professor e, em seguida, a uma 
criança mais velha, porque "se ela não tem medo, 
significa que ninguém tem que ter medo..."
53
Tudo isso não teria surgido se não tivesse havido 
uma boa documentação. Naquele tempo nós 
desconhecíamos que podería servir também para isso, 
durante a experiência nos foi possível percebê-lo. E é 
assim que, como diz a ciência, não se trata de 
encontrar respostas, mas sim de apresentar as 
perguntas certas. Termino com uma outra história, 
extraída de Jorge Luis Borges. Em O Aleph, a 
recopilação de contos, Borges imagina que o grande 
filósofo árabe-espanhol Averroes recebe a 
incumbência de traduzir todo o trabalho de 
Aristóteles para o árabe. Apesar de fazer o seu 
trabalho muito bem, ele estava confuso frente a duas 
palavras: "comédia" e "tragédia" porque na sociedade 
em que vivia não existia teatro.
Até aqui a história é real: é verdade que traduziu 
Aristóteles de maneira muito competente, mas 
também é verdade que traduziu de maneira muito 
confusa essas duas palavras, pois Averroes não tinha 
ideia do que era o teatro, os atores ... De acordo com 
Borges, cansado pelo esforço e preocupado porque 
não entendia esses termos, Averroes se aproximou da 
janela e viu umas crianças que brincavam e diziam: 
"Eu subo em cima de você e brincamos de minaretel e 
muezim2". Outra criança se põe na frente da primeira 
e diz: "Eu serei o fiel que reza". Averroes fechou a 
janela e passou a trabalhar novamente, sem ter visto
1 Nas mesquitas, torre alta e esbelta de onde o muezim convoca os 
muçulmanos às 5 orações diárias [nota da tradutora]
2 Aquele que do alto do minarete conclama os fiéis às orações [nota 
da tradutora]
54
que as crianças lhe haviam apresentado a solução para 
o seu problema. Ele não teve olhos para ver.
Esta é a diferença entre o fotógrafo e nós, 
professores e professoras, temos que aguçar pouco a 
pouco os olhos para capturar esses momentos que só 
nós podemos capturar graças à nossa própria história. 
Ninguém pode nos ensinar a fazê-lo.
5 5
Escutar para documentar
David Altimir
Acreditar em uma imagem de menino ou de 
menina capaz, potente, protagonista de suas 
aprendizagens, demanda, isto é, exige criar contextos 
onde sejam possíveis espaços de observação para 
compreender como os pequenos constroem 
conhecimentos. Os elementos que se recolhem da 
observação se leem e se ordenam para facilitar sua 
leitura: se interpretam. Deste exercício nasce uma 
documentação que, tanto no momento de fazer-se 
como no de ler-se, terá enviado uma imagem de 
criança que demanda, e reivindica com força, ser 
escutada para ser melhor compreendida.
Imagem da criança e da pedagogia da escuta
Poderiamos definir a "escuta" como a capacidade e 
a necessidade de escutar, de coletar, de organizar e de 
compreender o que a inteligência das crianças e dos 
adultos produz no contexto da escola, i Não se trata 
simplesmente de ouvir o que eles dizem, mas de criar 
um clima receptivo no qual todos os protagonistas da 
escola se encontrem, sejam crianças, pais ou 
professores. A escuta é uma atitude receptiva que
5 7
pressupõe uma mentalidade aberta, uma 
disponibilidade de interpretar as atitudes e as 
mensagens lançadas pelos outros e, ao mesmo tempo, 
a capacidade de recolhê-los e legitimá-los. Uma 
atitude que é necessária adotar se se acredita em um 
modelo educacional que considera crianças, meninos e 
meninas, como portadores de cultura, como 
indivíduos capazes de criar e construir significados 
mediante processos sutis e complexos.
Deste clima,dessa atitude, nasce um estilo na 
relação que o adulto e a criança estabelecem na escola. 
É o que poderiamos chamar de "pedagogia da escuta." 
Esta visão da pedagogia considera que as crianças e os 
adultos têm que estar em relação com os demais para 
aprender, já que não é possível que a aprendizagem 
aconteça sem o diálogo entre as diferentes idéias dos 
pequenos em relação aos fenômenos, informações, 
acontecimentos.... Considera-se, portanto, que o 
trabalho de ensinar está intimamente ligado aos 
fatores que tornam possível a aprendizagem, aos quais 
se encontram submetidas as crianças e também os 
adultos que convivem na escola. Daí nasce a noção de 
escuta como necessidade de ser coerente com as bases 
ideológicas (psicologia, filosofia, sociologia, etc.) que 
definem o mesmo projeto educativo, a mesma imagem 
de criança.
Assim, desde o princípio, os conceitos de "escuta" 
e de "pedagogia da escuta", estão inevitavelmente, 
ligados às palavras "atitude" e "coerência". Por esta 
razão, não falamos da atitude de escuta como apenas 
dos adultos ou como um elemento isolado da ação
58
dentro da escola. Pretender limitar no tempo e no 
espaço esta disponibilidade para escutar, para receber, 
seria um absurdo. Se isso fosse feito, não seria uma 
opção transformadora porque não daria valor real 
nem à criança, nem aos seus companheiros, nem a sua 
cultura. Além disso, quando falamos de escutar como 
atitude, temos que compreender que esta precisa ser 
permanente. Definitivamente, escutar é parte de uma 
dinâmica que prevê outros aspectos, não apenas mais 
interessantes, mas essenciais para garantir toda a 
complexidade do processo que supõe trabalhar com as 
concepções que estamos expondo.
O trajeto escuta-observação-interpretação-documentação
A escuta coloca o adulto na condição de 
observador, mas não um observador neutro e objetivo, 
e sim na condição de um elemento subjetivo que 
forma parte da realidade que está observando e que 
não somente a descreve, mas a constrói.
Interpretação Documentação
Observação Escuta
5 9
A dinâmica circular é a que melhor se ajusta a 
essa força que se retroalimenta.
Observação
Observar não se limita à ação de tomar notas ou 
de fotografar, que é uma ação que coloca os adultos 
em relação com aquilo que está sendo observado. Por 
isso, o observador é um personagem que interpreta e 
que intervém no processo que está observando. Não é 
possível pensar, porém, que essa observação seja o 
resultado de uma atitude improvisada, se 
concordamos que a observação implica numa certa 
forma de "escolha", é evidente que o adulto tem que 
definir o que quer observar. Definindo os objetivos, se 
define o âmbito da observação. Assim, o adulto, 
quando se encontra nesta condição de observador- 
interprete (e, consequentemente, co-criador) da 
realidade, tem que saber observar e utilizar os meios 
coerentes que sejam necessários.
Documentação
A documentação é toda a coleção de imagens, 
histórias, desenhos, palavras, idéias e produções de 
crianças e adultos, surgidos a partir da vida da escola, 
que são organizados para poder dar uma mensagem a 
um leitor. Evidentemente, os leitores das 
documentações que saem da escola são:
60
• As próprias crianças.
• As famílias dos meninos e das meninas da 
escola.
• A equipe de adultos da escola.
• Os visitantes que podem entrar na escola e 
quer precisam de informação e declarações sobre o 
Projeto Educativo de Escola (estagiários, substitutos, 
visitantes...).
A mensagem que esta documentação oferece 
refere-se ao papel que cada um desses protagonistas 
tem no interior desta escola.
Documentar é, portanto, uma oportunidade para 
dar visibilidade à imagem da criança, de adulto e de 
educação que se constrói em uma determinada 
realidade. Esta não é uma tarefa fácil, nem estéril. E 
uma prestação de contas. Não é um papel confortável 
e simples, mas coloca os adultos ao lado das crianças 
como reais co-protagonistas desta cena.
Tentemos agora descobrir o que se esconde, ou 
melhor, em que consiste a tarefa de documentar.
A CRIANÇA
A primeira mensagem
Em primeiro lugar está a primeira mensagem: a 
mais clara, a mais fundamental de todas. Uma 
mensagem implícita que passa pelo fato de que há um 
adulto que se interessa pelo que faz uma criança ou 
um grupo de crianças, e que faz o esforço de recolher 
os elementos, as informações necessárias para decifrar
61
a complexidade do que vê. Por exemplo, uma criança 
que vê que há um adulto que toma nota do que ela 
diz, que fotografa o que ela faz, que pergunta: "o que 
aconteceu com você?" Ou ainda, "o que pensas 
disto?". Esta é a primeira mensagem e, como dissemos 
anteriormente, a mais fundamental. Fundamental 
porque a própria imagem que as crianças constroem 
de si mesmos e da escola, deriva do olhar dos adultos 
que trabalham ali.
Certa vez, um professor estava com um grupo de 
crianças mantendo uma conversação sobre um tema 
aleatório, como costuma acontecer na escola, enquanto 
tomava notas sobre o que lhe parecia mais importante 
e significativo, reformulava perguntas, retomava 
temas, etc. De repente, uma menina, vendo que ele 
escrevia absolutamente tudo o que estavam dizendo, 
perguntou:
- Professor, você escreveu o que eu disse antes?
Na verdade, ele não havia anotado e se sentiu 
muito mal, então ele mentiu para a menina dizendo 
que havia escrito. Mais tarde escreveu em segredo 
aquela ideia que havia deixado passar, porque o que 
era realmente significativo não era apenas o que 
diziam os pequenos. O que fazia aquele professor ao 
tomar notas em seu caderno das palavras das crianças 
era, para ele, a mensagem fundamental. Mas, para as 
crianças, a mensagem fundamental é que para 
aprender é necessário:
• Que aquilo que se faz tenha sentido.
• Sentir-se reconhecidas, respeitadas, compreendidas
e ajudadas.
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• Saber que confiam nelas.
• Saber que têm direito a estar erradas.
• Ter uma boa imagem de si.
Saber que alguém dá importância ao que elas 
fazem.
Oportunidade para voltar a ver-se
Organizar todo o conjunto de elementos exige que 
os adultos se comportem como se fossem uma espécie 
de detetives que recolhem todas as provas e indícios 
para compreender o que aconteceu. Depois de 
recolher todos esses indícios, precisam classificá-los, 
ordená-los e colocar uns ao lado dos outros para 
poder construir, assim, uma história, uma ideia (este é 
o exercício de interpretação ao qual se faz referência 
acima). Finalmente, organizá-los e apresentá-los para 
que os protagonistas façam, eles mesmo, uma leitura.
Os painéis dispostos nos espaços comuns da 
escola, os espaços de documentação da turma, os 
arquivos individuais que se organiza na escola para 
levar para casa.... Estas e outras oportunidades são as 
que a escola tem que oferecer para que as crianças 
tenham a oportunidade de voltar a ver-se, a ouvir-se e 
a reler-se. Os painéis são colocados nos espaços 
previstos para a documentação na hora do desenho 
nas classes, nas áreas comuns. É evidente, que 
devemos levar em conta a especificidade do leitor no 
momento de organizar formalmente este material. Na 
documentação destinada às crianças de três a seis 
anos, fica claro que poderemos privilegiar as imagens
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já organizadas com algum -pequeno escrito comentando os 
eventos ali registrados.
Painéis, mas também cadernetas ou cadernos, 
podem ser lidos em diferentes situações no espaço da 
escola e até mesmo em casa com as famílias.
Metacognição
Neste exercício de releitura do que tem sido feito, 
se produz um fenômeno muito importante que 
contribuirá para fundamentar as descobertas e as 
novas aprendizagens: a metacognição, ou seja, a 
consciência do conhecimento.
Digamos que não é suficiente que as crianças 
saibam coisas novas ou que tenham novas

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