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COMITÊ BRASILEIRO DE BARRAGENS XXX SEMINÁRIO NACIONAL DE GRANDES BARRAGENS FOZ DO IGUAÇU - PR, 12 A 14 DE MAIO DE 2015 T 113 – A XXX Seminário Nacional de Grandes Barragens 1 AVALIAÇÃO DE MÉTODOS DE ANÁLISE DE RISCOS APLICADOS A BARRAGENS Alexandre Vaz de MELO Engenheiro Civil, M.Sc. – Cemig Geração e Transmissão S.A. Teresa Cristina FUSARO Engenheira Civil, M.Sc.– Fusaro Engenharia e Consultoria Ltda. RESUMO Há um movimento crescente na comunidade técnica de engenharia pela utilização de métodos de análise de risco no âmbito da gestão dos riscos associados a barragens. Embora esses métodos já venham sendo utilizados há muitos anos por diversas empresas e órgãos regulamentadores internacionais, o uso dessa ferramenta no Brasil ainda é incipiente. Existem vários métodos com potencial de aplicação em barragens, podendo ser categorizados de acordo com sua natureza, seja qualitativa ou quantitativa; indutiva ou dedutiva, ou pela aplicabilidade em portfólio ou não. O objetivo deste trabalho é apresentar um panorama dos métodos existentes, discutindo, comparativamente, a efetividade e limitações de cada um deles e, em um contexto mais amplo, contribuir para disseminação dessa ferramenta no processo de avaliação de riscos de barragens. ABSTRACT There is a crescent movement in the technical engineering community towards the employment of risk analysis methods in the management of risks associated with dams. Although these methods have already been used for many years by international companies and regulatory agencies, their use in Brazil is still incipient. There are several methods potentially applicable to dams, that can be classified according to their type, qualitative or quantitative, inductive or deductive, or concerning their applicability to a portfolio of dams or not. The objective of this paper is to present a panorama of the existing methods, discussing, comparatively, their effectiveness and limitations and, in a broader context, contribute to the dissemination of these tools, that can be applied to the process of risk analysis of dams. XXX Seminário Nacional de Grandes Barragens 2 1. INTRODUÇÃO De forma geral, a segurança das barragens no mundo tem sido controlada por uma abordagem tradicional de engenharia baseada em normas de segurança, constituindo um meio efetivo de “gestão de risco”, comprovado pelo histórico de projetos e empreendimentos com bons registros de desempenho [1]. Neste tipo de abordagem (centrada na segurança), a incerteza é levada em consideração na adoção de valores extremos de carregamento, valores conservadores para as variáveis de resistência e na aplicação de fatores de segurança. Esta abordagem é compreensível, pois, como aponta Rettemeier et al. apud Melo [2], tradicionalmente a sociedade percebia as barragens como estruturas seguras, por terem sido construídas de acordo com elevados padrões técnicos de qualidade. Entretanto, a sociedade tem se tornado cada vez mais consciente que sempre existirá um risco residual associado a barragens e que a segurança, como um valor absoluto, é inatingível. Estas duas perspectivas (segurança e risco) são ilustradas na FIGURA 1. FIGURA 1 - Perspectivas de sociedades orientadas para a segurança e o risco [2] Por outro lado, o meio técnico também reconhece as diversas fontes de incertezas associadas a barragens. Segundo Kreuzer [3], as incertezas na avaliação estrutural de uma barragem provêm de três fontes: variabilidade física, variabilidade estatística e incertezas do próprio modelo adotado. A variabilidade física se deve à heterogeneidade natural dos materiais de fundação e de construção, acrescidas daquelas provenientes dos métodos de construção, como por exemplo, a contaminação de zonas durante a construção e diferentes graus de compactação, podendo, inclusive, ocorrer compactação excessiva pelo tráfego de equipamentos durante a construção. A variabilidade estatística decorre dos próprios métodos de amostragem e dos processos de investigação e dos ensaios dos materiais, cujos resultados são aceitáveis dentro de padrões estatísticos. A incerteza do modelo é devida às simplificações da realidade impostas pelas análises numéricas, que se baseiam na suposição que a barragem pode ser representada pelas leis da física expressas por equações. Em todos os casos existem muitas variáveis desconhecidas e diversas considerações precisam ser feitas na modelagem do sistema. Existe a variabilidade estatística dos parâmetros geotécnicos e existem incertezas como a não-linearidade das propriedades dos materiais. Há incertezas quanto a subpressões, desconhecimento de imperfeições nas fundações como juntas e fissuras e detalhes geológicos que não podem ser parametrizados com exatidão, tornando o modelo apenas como uma aproximação da realidade formal. Além disso, existe uma limitação real na XXX Seminário Nacional de Grandes Barragens 3 precisão dada pela dificuldade em se modelar as propriedades dos materiais onde fenômenos inelásticos e fissuração ocorrem. A discretização e forma dos elementos dos modelos de elementos finitos também são complicadores na análise dos resultados. Considerando, pois, a percepção destas incertezas tanto pela sociedade quanto pelo meio técnico, associada a uma pressão crescente por transparência e responsabilidade nas tomadas de decisões, as técnicas de análise de risco, largamente difundidas em outras áreas de conhecimento, passam a ser consideradas ferramentas adicionais na gestão de segurança de barragens. ICOLD [1] ressalta que os conceitos atuais estão ainda em fase de desenvolvimento na esfera da segurança de barragens, e que essa nova abordagem se insere como melhoria e complementação da prática tradicional, e não como sua substituição. Neste trabalho, serão apresentados os principais métodos de análises de riscos que têm sido aplicados a barragens, discutindo suas vantagens e limitações, visando contribuir para o avanço do tema no meio técnico nacional. 2. GESTÃO DE RISCOS APLICADA A BARRAGENS A gestão de risco consiste na aplicação sistemática, coordenada e integrada de políticas de gestão, procedimentos e práticas para as tarefas de identificação, análise, avaliação, mitigação e controle do risco. As atividades fundamentais de gestão de riscos podem ser subdivididas conforme proposto pela ISO 31.000 [4] e apresentado na FIGURA 2. FIGURA 2 - Atividades de gestão de riscos segundo a ABNT NBR ISO 31.000:2009. Segundo esta norma, o processo de avaliação de riscos é composto por três etapas: Identificação de riscos (Risk identification): processo de busca, reconhecimento e descrição de riscos, que envolve a identificação das fontes de risco, eventos, suas causas e suas consequências potenciais, podendo fazer uso de dados históricos, análises teóricas, opiniões de pessoas informadas e especialistas, e as necessidades das partes interessadas; Análise de riscos (Risk analysis): processo de compreender a natureza do risco e determinar o nível de risco, ou seja, a magnitude de um risco expressa em termos da combinação das consequências e de suas probabilidades; e Avaliação de riscos (Risk evaluation): processo de comparar os resultados da análise de riscos com os critérios de riscos para determinar se o risco e/ou sua magnitude é aceitável ou tolerável. XXX Seminário Nacional de Grandes Barragens 4 Existem variações na nomenclatura utilizada para as etapas de gestão de riscos no Brasil. Por exemplo, a etapa de avaliação de riscos é, algumas vezes, denominada apreciação de riscos (comparação da estimativa do risco com critérios de aceitabilidade e tolerabilidade). No presente trabalho será empregada a nomenclatura da ABNT, de forma a utilizaruma linguagem comum com outras áreas de conhecimento e facilitar a interlocução entre as áreas técnicas e outras, como a financeira e a jurídica. Dentre as atividades fundamentais, estão as análises de risco, que podem ser de natureza qualitativa ou quantitativa. Os métodos de caráter qualitativo se apoiam em formas descritivas ou escalas de ordenação numérica para descrever as grandezas de probabilidade e consequência, enquanto que os quantitativos explicitam as incertezas, baseando-se, portanto, em valores numéricos da probabilidade e consequência. Existem várias metodologias para análise de risco disponíveis na literatura, entre elas os Índices de Risco, Diagramas de Localização, Causa e Indicadores de Falhas (LCI), Análise dos Modos de Falha e seus Efeitos (FMEA), Análise por Árvore de Eventos (ETA) e Análise por Árvore de Falhas (FTA). Métodos como Índice de Risco, FMEA e LCI são essencialmente qualitativos, enquanto que as árvores de eventos (ETA) e de falhas (FTA) podem ser utilizadas tanto qualitativamente como quantitativamente. Basicamente, todos os métodos têm em comum a análise de eventos indesejáveis, considerando suas respectivas causas, efeitos e consequências. Nesse sentido, verifica-se que vários dos métodos são potencialmente aplicáveis a barragens, apesar do caráter singular destas estruturas, cujo comportamento é condicionado por vários subsistemas e componentes com interdependências complexas. A evolução da aplicação dos conceitos de risco no âmbito da segurança de barragens tem sido gradual e crescente, impondo avanços no entendimento aprofundado dos modos de falha de barragens. Um breve histórico do desenvolvimento das práticas de gestão de riscos em barragens é apresentado na FIGURA 3. Mais recentemente, cabe destacar a aplicação de métodos de análise de risco por órgãos governamentais, como em Portugal, Austrália, Estados Unidos (USBR, USACE e FERC), e até mesmo o Brasil, com a classificação de barragens introduzida pela lei 12.334/2010, informalmente denominada “Lei de Segurança de Barragens”. FIGURA 3 - Histórico do desenvolvimento das práticas de gestão de riscos em barragens, segundo Hartford [5]. XXX Seminário Nacional de Grandes Barragens 5 A natureza multidisciplinar das atividades de análise de riscos de barragens, que vão muito além das áreas técnico-científicas (áreas de conhecimento da geologia, geotecnia, estruturas, hidrologia, hidráulica, eletromecânica), aumenta sua complexidade e, de certa forma, impõe um ritmo mais lento no desenvolvimento e aplicação de metodologias específicas aplicáveis a estas estruturas. Além disso, em especial as atividades de avaliação de riscos e os processos de decisão e de comunicação, também agregam outras áreas como a política, a social e econômico-financeira, como assinala Pimenta [6]. As análises de risco aplicadas a barragens constituem-se, em quase sua totalidade, dos métodos formais já reconhecidos em outros campos de conhecimento, sendo adaptados para aplicação em barragens. Exigem o levantamento de informação particularizada, considerando dados relativos ao projeto, construção e operação das estruturas em diversos graus de profundidade, dependendo do método a ser utilizado. De forma geral, todos os métodos tendem a tratar sistematicamente os perigos (eventos iniciadores), modos de falha, respostas do sistema, resultados, fatores de exposição e consequências associadas. Têm como vantagem, além da inerente estimativa do risco, propiciar a melhoria no conhecimento da barragem e seu desempenho, abordando os aspectos específicos da obra e do local. 3. MÉTODOS DE ANÁLISE QUALITATIVA DE RISCOS As análises qualitativas se utilizam de uma forma descritiva ou escalas de ordenação numérica para apresentar a magnitude de consequências potenciais e sua probabilidade da ocorrência. Dentre os vários métodos de análise essencialmente qualitativa destacam- se os seguintes, que serão descritos mais detalhadamente nos itens subsequentes: Métodos de análise preliminar de risco em portfólio de barragens baseados em índices: Índice Global de Risco; Índice de Lafitte; Metodologia de Classificação de barragens Sabesp; Potencial de Risco; Metodologia de Classificação de barragens Cemig e Matrizes de Classificação do CNRH; Análise dos Modos de Falha e seus Efeitos (FMEA e FMECA); e Diagramas de Localização, Causa e Indicadores de Falhas (LCI). 3.1 MÉTODOS DE ANÁLISE PRELIMINAR DE RISCOS BASEADOS EM ÍNDICES As análises preliminares de risco em portfólio são as formas mais simples de análises qualitativas existentes. São usualmente desenvolvidas “sob medida” e calibradas para um portfólio específico de barragens e utilizadas como parte integrante do programa de segurança de barragens de uma empresa, tendo como objetivos básicos: classificação de barragens, definição de programas de monitoramento e priorização de estudos mais detalhados e de obras de melhorias. Com relação à metodologia geral de implantação de uma análise preliminar em portfólio (índices de risco), Cadeira [7] descreve as seguintes etapas: Seleção de um conjunto de descritores, geralmente, agrupados por classes, que levem em consideração aspectos relacionados às condições externas, características da barragem e as consequências. Atribuição de uma classificação para cada descritor; Definição de pesos (iguais ou diferentes) para cada descritor, de acordo com sua respectiva importância relativa; XXX Seminário Nacional de Grandes Barragens 6 Definição da regra de agregação, a ser utilizada em cada classe, para o cálculo de índices parciais e de uma expressão de cálculo do índice de risco com base nos índices parciais de cada classe. Este tipo de análise, ainda que na maioria das vezes simplificada e menos detalhada, facilita a comparação dos riscos de diferentes empreendimentos, possibilitando, de modo global, o estabelecimento de prioridades relativas à sua redução quando se considera um montante limitado de recursos por parte dos proprietários de barragens. Destaca-se, portanto, que tais técnicas devem ser estritamente utilizadas para uma avaliação preliminar e sempre seguidas por uma segunda fase de avaliação mais detalhada para as barragens pontuadas com altas deficiências. No presente trabalho, do universo de métodos de análise preliminar existentes, dá-se atenção àqueles baseados em índices de riscos associados a matrizes de classificação, com destaque para o desenvolvimento da experiência brasileira. 3.1.1 Índice Global de Risco Este método de análise qualitativa de riscos aplicável a um portfólio de barragens foi proposto pelo ICOLD [8] de forma precursora, tendo como objetivo inicial auxiliar na definição de sistemas de monitoramento e no estabelecimento do nível (rigor) de monitoramento desejável de acordo com as condições de risco impostas pela barragem. Os fatores de risco considerados no método são agrupados em três classes: Fatores externos ou ambientais (Fator E): traduzem as fontes de perigo, empregando descritores como sismicidade, escorregamento de taludes no reservatório, cheias superiores às de projeto, tipo de operação do reservatório e ações ambientais agressivas; Condição da barragem/Confiabilidade (Fator F): considera a adequação do dimensionamento estrutural, das fundações, dos órgãos de descarga, e a manutenção da barragem; e Danos humanos e econômicos potenciais (Fator R): relacionado aos potenciais danos decorrentes da eventual ruptura da barragem, considerando o volume do reservatório e a existência de instalações a jusante. Todos os descritores são classificados por meio de uma escala qualitativa e o índice de risco (g) é o produto dos índices parciais das três classes. A adoção do índice global de riscoocorreu originalmente em Portugal, sendo um requisito da regulamentação de segurança de barragens desse país. Salienta-se que houve a necessidade de ajustes no método proposto originalmente, para que melhor se ajustasse ao portfólio de barragens portuguesas. 3.1.2 Índice de Lafitte Inspirado no índice global de risco, Lafitte apud Pimenta [6] desenvolveu um índice para classificação de barragens com o objetivo de definir prioridades de intervenção, monitoramento e alerta de populações a jusante. O método de Lafitte, de forma muito similar à metodologia anterior, também agrupa os XXX Seminário Nacional de Grandes Barragens 7 descritores em três classes: condicionantes locais (sismicidade, hidrologia, aporte de sedimentos, clima, geologia, estabilidade dos taludes do reservatório), confiabilidade da obra (qualidade do corpo da barragem, qualidade das fundações, variação do nível de água no reservatório, órgãos de descarga, descarregador de fundo, monitoramento, operação e manutenção) e impactos socioeconômicos no vale a jusante (consequências na população a jusante, consequências no meio ambiente, estruturas e infraestruturas, importância da infraestrutura em estudo e sistemas de aviso e alerta). O Índice de Risco (IG) é uma composição dos índices parciais das três classes. 3.1.3 Metodologia para Tomada de Decisões: Sistema de Classificação de Barragens Sabesp Em 1992, Kuperman et al desenvolveram para a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo – SABESP, em caráter pioneiro no Brasil, uma metodologia de classificação de barragens, visando permitir a comparação da segurança das 24 barragens de abastecimento de água desta empresa e orientação das ações de investigação e manutenção. O método foi revisado em 2001 [9], com base na experiência decorrente da sua aplicação. Consolidou-se assim uma metodologia para tomada de decisões, com o objetivo de auxiliar na deliberação de forma técnica e economicamente consistente sobre as condições das barragens sob sua responsabilidade. A classificação das barragens é avaliada pelos parâmetros de periculosidade potencial e estado real. O primeiro fator pontua características de projeto (dimensão, volume, vazão de projeto, tipo de barragem e órgão vertente), refletindo o potencial existente para a ocorrência de danos materiais, ambientais, perdas de vidas humanas ou a importância de uma eventual interrupção operativa da unidade. O segundo fator, relativo ao estado da barragem, é fruto da análise das condições reais observadas (percolação, deformações, deterioração de taludes, erosões a jusante e órgãos descarregadores), incluindo também aspectos sobre a disponibilidade de informações de projeto e frequência do monitoramento. O índice de comportamento é uma conjugação dos dois fatores descritos. 3.1.4 Metodologia de Classificação de Barragens Cemig Em 1996, com o intuito de definir o nível de monitoramento necessário para garantia da segurança de barragens, a Cemig desenvolveu e implantou uma metodologia de classificação de barragens (Fusaro [10]). Esta metodologia foi revisada em 2003 [11], incorporando alguns conceitos de análises de risco, na época já empregados internacionalmente. A metodologia tornou-se uma ferramenta importante no gerenciamento do portfólio de barragens operadas e mantidas pela Cemig GT. A classificação das barragens pelo método é determinada, qualitativamente, a partir de um índice de risco, constituído por três fatores: Potencial de risco (P): composto por descritores relativos características técnicas do projeto (tipo de barragem, tipo de fundação, idade); Vulnerabilidade (V): composto por descritores associados ao atendimento a critérios de projeto atuais e ao estado atual da barragem; e Consequência (C): com descritores relacionados à consequência de uma eventual ruptura da barragem (volume do reservatório, potência gerada, danos a jusante). XXX Seminário Nacional de Grandes Barragens 8 O índice R, produto dos fatores de probabilidade pela consequência (ou seja, (P + V) x C), é utilizado na priorização das atividades de segurança de barragens e na alocação de recursos de manutenção civil. 3.1.5 Potencial de Risco A metodologia de avaliação do potencial de risco desenvolvida por Menescal et al. [12] teve como objetivo principal a classificação de barragens destinadas a usos múltiplos sob responsabilidade da Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos do Ceará – COGERH. Essa metodologia assume uma importância no contexto brasileiro de métodos de análise preliminar, por ter sido incorporada na publicação oficial do Ministério da Integração Nacional, intitulada Manual de Segurança e Inspeção de Barragens que, por sua vez, viria a influenciar o texto da lei 12.334/2010. Assim como nos métodos anteriores, o potencial de risco (PR) também é constituído de três fatores: Periculosidade (P): composto por descritores relativos a parâmetros intrínsecos da barragem ou características técnicas do projeto; Vulnerabilidade (V): composto por descritores associados ao estado atual da barragem; Importância (I): com descritores relacionados à consequência de uma eventual ruptura da barragem. 3.1.6 Matrizes de Classificação definidas pelo CNRH em aderência à Lei 12.334/2010 A lei 12.334/2010 (“Lei de Segurança de Barragens”) instituiu, como primeiro de seus instrumentos, um sistema de classificação de barragens por categoria de risco e dano potencial associado, a ser regulamentado pelo Conselho Nacional de Recursos Hídricos, CNRH. A adoção de um sistema de classificação na lei ratifica a relevância dos métodos, ainda que de uso preliminar, para a análise de risco em portfólio de barragens. Constitui a base para análise de segurança das barragens abrangidas pela lei, fixando níveis de monitoramento, inspeção e planos de segurança. O Conselho Nacional de Recursos Hídricos – CNRH divulgou as regras gerais de classificação de barragens por categoria de risco, dano potencial associado e pelo volume do reservatório, por meio da Resolução n° 143, de julho de 2012. Salienta-se que compete aos órgãos fiscalizadores a regulamentação de alguns dispositivos da lei, diferindo em função do uso que é dado ao barramento. A classificação proposta pelo CNRH utiliza três matrizes de classificação para determinar a categoria de risco: Características técnicas: avaliando altura, comprimento, tipo de barragem, fundação, idade e vazão de projeto; Estado de conservação do empreendimento: considerando aspectos de percolação, deformações, deterioração dos taludes, confiabilidade das estruturas de adução e extravasoras e eclusas; e Atendimento ao plano de segurança da barragem. XXX Seminário Nacional de Grandes Barragens 9 As consequências são dadas pela categoria de dano potencial, em função do potencial de perdas de vidas humanas e dos impactos ambientais e sócio-econômicos decorrentes da ruptura da barragem, além do volume do reservatório. O risco, propriamente dito como probabilidade de falha e consequência, não é explicitado. No entanto, a grandeza do risco pode ser inferida partindo do pressuposto que os dois fatores (categoria de risco e dano potencial associado), de certa forma, traduzem o par de valores probabilidade e consequência. 3.2 ANÁLISE DO MODO E EFEITO DE FALHA – FMEA E ANÁLISE DOS MODOS DE FALHA, EFEITOS E CRITICIDADE – FMECA Diferentemente dos métodos de análise preliminar, os métodos Análise do modo e efeito de falha (FMEA) e Análise dos modos de falha, efeitos e criticidade (FMECA) tratam o estudo dos modos de falhas, causas e efeitos dos sistemas e componentes de uma barragem de forma sistematizada. A análise do modo e efeito de falha, ou simplesmente FMEA, é consideradauma das primeiras técnicas sistemáticas para a análise de falhas. O método teve sua origem em 1949, na norma Military Standard Mil-STD-1629 – Procedures for performing a Failure Mode, Effect and Criticality Analyses, desenvolvida pelo exército norte-americano. Quando a análise de criticidade (ocorrência e severidade) é também considerada, o método, uma extensão do FMEA, é usualmente denominado FMECA (Análise dos modos de falha, efeitos e criticalidade). Há algumas décadas o FMEA tem sido uma ferramenta reconhecidamente empregada em diversas indústrias como a nuclear, aeroespacial, química, petrolífera, automobilística e, mais recentemente, na engenharia de barragens. No caso da engenharia de barragens brasileira, a aplicação do FMEA/FMECA em barragens de contenção de rejeitos já conta com alguns anos de experiência, mas no setor elétrico ainda não é prática corrente. As metodologias FMEA e FMECA são usualmente qualitativas e indutivas, e tem como objetivo identificar a severidade de modos de falha potenciais e prover as bases para a definição das medidas de mitigação eventualmente necessárias para redução do risco. A análise é sempre realizada por um grupo de pessoas qualificadas e com base na documentação de projeto, operação e manutenção das estruturas sob estudo. Este trabalho em equipe estimula o “pensar” e assegura a expertise necessária ao processo. Salienta-se que o método pode incluir uma estimativa da probabilidade de ocorrência dos modos de falha, utilizando julgamento de engenharia. Com relação à implementação do FMEA, não existe uma padronização na subdivisão dos sistemas, nem mesmo na formatação das tabelas de análise. No mínimo, deverão ser detalhados os seguintes itens: Identificação do sistema e subsistemas; Identificação dos componentes (ou elementos) e suas funções; Identificação dos modos de falha e causas associadas; Efeitos e medidas de controle. A aplicação do FMEA é precedida de uma decomposição hierárquica do sistema em seus elementos mais básicos. A análise então começa com os elementos inferiores. O efeito do modo de falha de um elemento inferior se torna a causa de falha de um modo de falha de XXX Seminário Nacional de Grandes Barragens 10 um item no próximo nível mais alto. A análise continua de baixo para cima até que o efeito no sistema é identificado [13]. De acordo com a norma européia CEI/IEC 60812:2006, é importante determinar o nível de corte do sistema que será utilizado para a análise. Por exemplo, sistemas podem ser divididos por função ou em subsistemas, unidades substituíveis ou componentes individuais. As regras básicas para selecionar os níveis de corte do sistema para análise dependem dos resultados desejados e da disponibilidade de informações de projeto. As seguintes diretrizes são úteis: O nível mais alto do sistema é selecionado do conceito do projeto e requisitos de saída especificados. O nível mais baixo dentro do sistema no qual a análise é efetiva é o nível para o qual informação está disponível para definição e descrição das suas funções. Uma análise menos detalhada pode ser justificada para um sistema baseado em um projeto maduro, com grande confiabilidade, mantenabilidade e registros de segurança. Por outro lado, mais detalhes e sistema dividido em níveis mais baixos são indicados projetos novos ou com histórico de confiabilidade desconhecido. O nível de manutenção especificado ou desejado e o nível de reparo podem ser um guia valioso na determinação dos níveis inferiores do sistema. Já o FMECA incorpora a criticalidade, representada pelos índices de ocorrência e severidade. Além disso, existem outras métricas do FMECA, como o índice de detecção e o número de prioridade de risco (NPR), todos descritos a seguir: Índice de ocorrência (O) = probabilidade da falha ocorrer; Índice de severidade (S) = impacto ou gravidade dos efeitos da falha; Índice de detecção (D) = eficiência (ou probabilidade) dos controles de detecção da falha; e Número de prioridade de risco (NPR ou RPN – Risk Priority Number) = produto da ocorrência, severidade e detecção. A FIGURA 4 exemplifica um formulário para aplicação da metodologia FMEA/FMECA, contendo os itens mencionados. FIGURA 4 - Planilha FMEA/FMECA, extraído de Petronilho apud Melo[2] XXX Seminário Nacional de Grandes Barragens 11 As avaliações dos índices por classes e escalas numéricas são feitas de acordo com critérios previamente definidos. A priorização ou ordenação dos modos de falha pode ser realizada por duas formas: por um índice de criticidade (expresso pelo produto da ocorrência e severidade) ou pelo RPN. No primeiro caso é mais usual a representação por matrizes bidimensionais, gerando a matriz de risco ou criticidade, ilustrada na FIGURA 5. A quantidade de classes e suas denominações variam de acordo com o autor. Cada modo de falha, por meio da sua identificação, deve ser plotado nas células da matriz de risco. FIGURA 5 - Matriz de risco FMEA/FMECA, segundo Portes [15] A representação gráfica do risco tem como vantagem a visualização dos modos de falha com base nas componentes do risco: probabilidade e consequência. Dessa forma é possível distinguir um modo de falha de ocorrência improvável, mas consequência elevada, de outro com alta ocorrência e baixa consequência. A priorização pelo RPN não permite essa distinção, mas por outro lado leva em consideração o fator relativo à facilidade de detecção. 3.3 DIAGRAMAS DE LOCALIZAÇÃO, CAUSA E INDICADORES DE FALHAS (LCI - LOCATION, CAUSE, INDICATOR) O LCI é um método para aplicação específica em barragens, desenvolvido no Reino Unido por Hughes et al. [14] e é considerado uma variante do FMECA. Busca padronizar e simplificar esta metodologia, por meio do uso de diagramas de localização, causa e indicadores de falhas. A aplicação do método é realizada em três estágios fundamentais: 1- Avaliação do impacto: Pode ser realizada de uma forma simplificada proposta pelo método ou utilizando estudos de dam-break e mapas de inundação para a barragem em análise. A previsão dos impactos é avaliada tanto para o vale a jusante próximo da barragem (< 5km) como para o vale afastado (entre 5 e 30km). 2- Definição dos estudos subsequentes, de acordo com a avaliação do impacto: Trata somente da definição dos estudos subsequentes, de acordo com os resultados obtidos em uma avaliação do impacto (índice global de impacto). No caso de um impacto baixo, a componente do risco associada à obra nem chega XXX Seminário Nacional de Grandes Barragens 12 a ser avaliada, demonstrando no método a importância que é dada ao aspecto relativo à consequência. 3- Avaliação FMECA (diagramas LCI): Este estágio final, condicionado à etapa precedente, refere-se à aplicação propriamente dita do diagrama LCI específico para determinada barragem. Baseado em registros históricos e análise de um banco de dados de incidentes em barragens do Reino Unido, Hughes et al. (2000) identificaram tendências e desenvolveram diversos diagramas LCI, estratificados por três critérios: tipo, altura e idade da barragem. Barragens de um mesmo tipo possuem diagramas similares, mas as orientações para a pontuação são diferentes de acordo com os critérios de altura e idade. Quanto à estrutura dos diagramas, eles consideram os componentes da barragem e como podem contribuir para uma possível falha da barragem. As falhas descritas por diferentes causas e indicadores também são consideradas. Um exemplo de diagrama LCI, para barragens de terra, é ilustrado na FIGURA 6, mostrando que os indicadores são pontuados sob três atributos: Consequência (ou efeito): relacionado à quão diretamente a falha do elemento está relacionada à completa(ou parcial) falha da barragem Probabilidade: relacionado à probabilidade de falha do elemento Grau de confiança: relacionado à confiança nas estimativas da consequência e probabilidade. Reflete as incertezas no conhecimento da barragem. LOCALIZAÇÃO CAUSA INDICADOR FIGURA 6 - Exemplo de parte de um diagrama LCI [16] XXX Seminário Nacional de Grandes Barragens 13 Concluída a classificação dos atributos, podem ser calculados quatro índices para cada conjunto localização/causa/indicador: Índice de Ordenação: Ind ord = Consequência x Probabilidade Índice de Confiança: Ind conf = Grau de Confiança Índice de Criticalidade: Ind crit = Consequência x Probabilidade x Grau de Confiança Índice de Risco: Ind risco = Ind crit x IGI(índice Global de Risco) Embora o método venha sendo sabidamente aplicado nas barragens do Reino Unido, Hughes et al. [19] apresentam somente seis estudos de caso, visando auxiliar no desenvolvimento e calibração da metodologia. 3.4 OUTROS MÉTODOS DE ANÁLISE QUALITATIVA DE RISCO Além das metodologias destacadas nos itens anteriores, existem outros métodos passíveis de utilização com o propósito de análise de risco qualitativa de barragens, descritos na literatura. Harrald et al. [15] discorre sobre algumas metodologias utilizadas na avaliação e análise de risco relativas a operação e manutenção de barragens: RBPS (Risk Based Profiling System), TPR (Technical Priority Rating), CI (Condition Indexing Methods), PRA (Porfolio Risk Assessment Methodology), RAM-D (Risk Assessment Methodology for Dams) e EPRI (Electric Power Research Institute’s tool). 4. MÉTODOS DE ANÁLISE QUANTITATIVA DE RISCOS As análises de risco quantitativas são usualmente caracterizadas por tratar incertezas dos modelos e parâmetros de forma explícita, propagando-as através do sistema e expressando-as como distribuições de probabilidade. Constituem-se, em quase sua totalidade, dos métodos formais já reconhecidos em outros campos de conhecimento, sendo adaptados para aplicação em barragens. São métodos mais elaborados e consistentes, apoiados em informações objetivas. De forma geral, tendem a tratar sistematicamente os perigos (eventos iniciadores), modos de falha, respostas do sistema, resultados, fatores de exposição e consequências associadas. 4.1 ÁRVORE DE Eventos (ETA - EVENT TREE ANALYSIS) A Análise de árvore de eventos, ou simplesmente ETA (Event Tree Analisys), é um método lógico, indutivo e que pode ser tratado sob todas as formas de análise (qualitativa, semiquantitativa ou quantitativa), embora usualmente esteja associada à natureza quantitativa. Segundo Hartford e Baecher [16], a origem do método não é conhecida, mas sua aplicação em sistemas tecnológicos tornou-se comum a partir da década de 70. A construção da ETA obriga o entendimento das etapas de desenvolvimento dos diversos modos de falha. Uma ferramenta fundamental para facilitar tal entendimento são os diagramas de influência. São representações gráficas, como exemplificado na FIGURA 7, que ilustram as relações entre os eventos iniciadores (perigos), os estados da natureza, as componentes, as condições do sistema e os respectivos efeitos ou consequências, tendo em conta as incertezas. XXX Seminário Nacional de Grandes Barragens 14 FIGURA 7 - Exemplo de diagrama de influência, extraído de Pimenta [5] As árvores de eventos são construções gráficas representativas de sistemas físicos, dispostas em ordem cronológica (da esquerda para direita). A análise se inicia a partir de um perigo, ou evento iniciador, passando sucessivamente para a sequência lógica de ocorrência do evento e podendo culminar no efeito final. Cada ramo da árvore estratifica- se, binariamente, em dois ramos, representando uma situação de sucesso e outra de falha. O nó representa uma transição de estado do sistema. Quando utilizada na forma quantitativa são explicitadas as probabilidades de ocorrência de cada sequência. O único requisito para o resultado das probabilidades dos eventos é que estes sejam mutuamente exclusivos e coletivamente exaustivos. A quantificação das probabilidades de ocorrência dos eventos em cada nó é uma questão primordial e bastante discutida na aplicação do método. Esta estimativa poderá ser efetuada, de acordo com o modo de falha em análise e informações disponíveis, pelos métodos abaixo, empregados de forma isolada ou em conjunto: Baseada em análise de estabilidade probabilística; Utilizando-se árvores de falhas e respectivas tabelas de fatores de influência propostas por autores como Fell et al.[17]; e Empregando julgamento de engenharia e descritores verbais, no caso da ausência de referenciais técnicos adequados para o caso em estudo, ou quando estes referenciais também apresentam descritores verbais para as probabilidades. As incertezas advindas da quantificação das probabilidades poderão ser consideradas, adotando-se uma curva de distribuição da probabilidade de ocorrência de cada evento, ou seja, para cada nó da árvore de eventos. Um exemplo dos conceitos essenciais empregados na árvore de eventos é ilustrado na FIGURA 8. XXX Seminário Nacional de Grandes Barragens 15 FIGURA 8 - Características essenciais de uma árvore de eventos [19] 4.2 ÁRVORE DE FALHAS (FTA - FAULT TREE ANALYSIS) O método de análise por árvore de falhas, ou FTA, foi desenvolvido em 1961 por H.A. Watson dos Laboratórios Bell Telephone e expandido para várias áreas de conhecimento a partir da década de 70. O FTA é um método dedutivo, pois, diferentemente do ETA, parte do evento final (evento de topo) para os eventos iniciadores. Assim, a partir da consideração de determinada falha, busca-se identificar todos os eventos que possam materializar sua ocorrência. Por esse motivo, é um método muito utilizado para análise pós-acidente. O método também é representado graficamente e tem como estrutura básica o desdobramento dos eventos em vários níveis hierárquicos. O primeiro nível se relaciona com o evento de topo, o segundo com o terceiro, e assim por diante. Vários níveis podem ser representados, dependendo da complexidade do sistema. Dois grupos de símbolos são utilizados para caracterizar a relação entre os elementos: as portas lógicas (“E” e “OU”) e os eventos. No domínio das barragens, a FIGURA 9 mostra um exemplo de aplicação do método. No caso em questão, o evento de topo ilustrado é o galgamento. XXX Seminário Nacional de Grandes Barragens 16 FIGURA 9 - Exemplo de aplicação de uma árvore de falha [18]. Em outras áreas, o método constitui-se uma técnica bem desenvolvida e reconhecida para a avaliação da confiabilidade de sistemas. Relacionando-se a barragens, Caldeira [8] aponta que esse tipo de método é particularmente adequado para a representação de sistemas eletromecânicos, como comportas de extravasores. Também é utilizado em complementação ao ETA, para o cálculo de probabilidades nos nós. A quantificação das probabilidades fica condicionada ao entendimento detalhado dos fatores influência em cada nó e pode ser exemplificada pela aplicação de Lima [19] para eventos de natureza hidráulica e hidrológica. 5. VANTAGENS E LIMITAÇÕES DOS MÉTODOS EXISTENTES Os métodos baseados em índices de riscos e matrizes de classificação tendem a uma análise realizada de forma mais global, com os descritores bem generalistas. Por mais que devam ser utilizadas apenas em uma avaliação preliminar, tais técnicas são bastante úteis para classificação de barragens e devem constituir-se parte integrante de qualquer programa de gestão de segurança de barragens. Os métodos de índices geralmente são de fácil entendimento e de aplicação simples e rápida. Entretanto, os critérios a seremadotados na análise devem ser calibrados para um determinado portfólio, de forma que o resultado se torne eficaz para o ranqueamento das barragens quanto ao risco. Em que pesem a grande variedade e, principalmente, a subjetividade (na concepção e aplicação) dos métodos, de modo geral, eles tendem a retratar as fontes de perigo, vulnerabilidades/confiabilidade da obra e consequências. Também não requerem a disponibilização de informações muito detalhadas sobre as estruturas [2]. Com relação aos demais métodos de análises qualitativas de risco apresentadas, o FMEA tem como vantagens permitir: (1) avaliar os efeitos e sequência de acontecimentos decorrentes de cada modo de falha; (2) determinar a importância de cada modo de falha; (3) avaliar o impacto sobre a confiabilidade e segurança do sistema considerado e, por fim; (4) classificar os modos de falhas estudados. Quando considerado muitos subsistemas e componentes, a extensão das tabelas e a consequente morosidade de aplicação pode-se mostrar um fator dificultador. Apesar da aparente falta de padronização, os princípios básicos do FMEA são comuns a vários padrões nacionais e internacionais, sendo um método altamente reconhecido e aceito no campo de análise de risco. XXX Seminário Nacional de Grandes Barragens 17 O LCI, desenvolvido especificamente para aplicação em barragens, tem como grande vantagem o fato de estar baseado em resultados de inspeções visuais, estabelecendo uma conexão com as atividades de campo de monitoramento. Sua desvantagem principal reside na forma como os sistemas (localização) são tratados, de modo bastante global, sem detalhar os subsistemas e componentes. Embora seja inspirado na metodologia FMEA/FMECA, a metodologia original mostra-se superior ao LCI pelo seu caráter mais sistemático e lógico, conectando de forma mais clara os locais, modos de falha, efeitos, causas e controles Destaca-se que também é possível a utilização do LCI em portfólio, com o uso dos diagramas padrões e comparações dos índices globais de risco. Ambos os métodos (FMEA e LCI), ainda que qualitativos, são mais elaborados e consistentes que os métodos de índices, apoiados em informações objetivas, que, todavia, exigem o levantamento de informação detalhada, considerando dados relativos ao projeto, construção e operação das estruturas. Salienta-se que, mesmo que estes métodos sejam considerados mais sofisticados e menos subjetivos que os métodos de portfólio, a atribuição de notas do LCI e FMEA ainda se trata, em última instância, de um julgamento de engenharia, o que realça a necessidade de que as pontuações sejam adequadamente justificadas com embasamento técnico. Sobre os métodos quantitativos, estes são mais rigorosos e adequados cientificamente para se tratar de risco. Com relação à árvore de eventos, Hartford e Baecher [16] ressaltam que a falta de base teórica pode significar que as construções (das árvores) sejam difíceis para alguns modos de falha, se não impossíveis de serem desenvolvidas corretamente no tempo presente. Isso se deve à complexidade de mecanismos de falhas em barragens de terra e enrocamento e a dificuldade de quantificação das probabilidades de falha em bases científicas. Todavia, isso não quer dizer que a ETA não seja útil para avaliação de risco em barragens, mesmo porque fornecem uma estrutura altamente intuitiva, além de que os demais métodos anteriormente citados também estão sujeitos, e se não mais, à falta de uma base teórica rigorosa. É possível que a ETA seja a abordagem para análise de risco formal em barragens mais utilizada atualmente. Quanto ao FTA, a análise das sucessões de eventos que conduzem à falha e da importância relativa dos vários eventos já é um grande benefício do método, porém, como as barragens são sistemas altamente complexos, o método FTA pode se tornar bastante extenso, dificultando sua aplicação. O ideal é aplicá-lo em eventos de topo considerados críticos para a segurança da barragem ou para a estimativa de riscos em nós de árvores de eventos. Tanto para o ETA como para o FTA, suas utilizações diretas para uma análise global do risco de um sistema barragem são inviáveis, já que haveria de se considerar inúmeras árvores associadas. Conclui-se que, a combinação das três abordagens, cada uma utilizada onde adequada ou possível, deve se constituir em uma compreensão valiosa na análise do risco. 6. ARMADILHAS DOS PROCESSOS DE ANÁLISES DE RISCOS A maior vantagem das análises de riscos provém da sistematização do processo de identificação de riscos antes da sua materialização em campo e acompanhamento das ações de reposta. Paradoxalmente, o maior risco é considerar a situação de risco sob controle apenas pelo fato de ter sido avaliada utilizando uma ferramenta formal de análise. Deve-se sempre ter em mente que a estimativa do risco não é uma propriedade XXX Seminário Nacional de Grandes Barragens 18 física da barragem, e sim uma representação matemática do seu estado de conhecimento e confiança no futuro desempenho. Nos métodos qualitativos de análise de risco, o entendimento dos fenômenos físicos é substituído por descrições qualitativas de processos de falha baseados em julgamento de engenharia. A existência de diretrizes para pontuação dos descritores auxilia na homogeneização do julgamento que pode ser afetado pela experiência e conhecimento do técnico avaliador. Em todos os casos de aplicação é importante que as classificações dos descritores sejam bem justificadas e documentadas, permitindo posterior rastreabilidade e entendimento dos valores obtidos. O julgamento de engenharia (qualitativo), apesar de muitas vezes ser considerado frágil por refletir o conhecimento de que se dispõe sobre os aspectos avaliados, é um método formalmente reconhecido para estimativa das probabilidades de falha nas análises de risco. O risco, nesse caso, é definido sem caracterizar a incerteza em uma forma matemática. Os métodos quantitativos são certamente mais consistentes. Entretanto, a credibilidade de uma árvore de eventos depende muito da estimativa dos valores numéricos de probabilidade. Esta estimativa pode ser baseada em dados históricos ou probabilísticos (ex: análises de confiabilidade). O uso de registros históricos é limitado pelo conhecimento rudimentar geralmente associado aos fenômenos envolvidos nos (poucos) casos de ruptura divulgados, além do aspecto de singularidade de cada barragem. Quando as probabilidades são calculadas de forma analítica, o risco é muitas vezes inquantificável de um modo científico devido às incertezas existentes e ao conhecimento incompleto de alguns dos mecanismos de falha. Além disso, em particular na engenharia geotécnica, é comum não se dispor de uma base de dados probabilísticos que permita tal análise, dada a complexidade dos sistemas, variabilidade dos parâmetros e singularidades locais e construtivas de cada obra. Em resumo, o valor numérico obtido para um risco deve ser sempre usado com precaução, face às incertezas existentes e limitações os métodos de análise. Qualquer que seja o método adotado, as probabilidades de ruptura de barragem são geralmente baixas (10-4 - 10-5/ano), conduzindo valores finais de risco também baixos, apesar das consequências de uma ruptura poderem ser catastróficas. Este fato merece atenção, pois pode induzir a decisões de “aceitação do risco” em situações indesejáveis. Por isso, as análises de risco quantitativas devem estar associadas a critérios de aceitabilidade ou tolerabilidade que considerem a número de pessoas impactadas por uma eventual ruptura da barragem, além das consequências econômicas e ambientais. 7. CONCLUSÕES Os conceitos de gestão de risco se alinham com demandas atuais da sociedade, na busca por responsabilidade e transparência nas tomadas de decisõese, por isso, devem ser utilizadas no âmbito das barragens. As análises de risco são ferramentas valiosas nesse contexto, representando um processo estruturado que visa estimar tanto a probabilidade de falha de uma barragem como a extensão da sua consequência. Considerando os métodos descritos, com suas vantagens e limitações associadas, pode- se concluir que não existe um método único aplicável a qualquer estudo de riscos em barragens. XXX Seminário Nacional de Grandes Barragens 19 As análises de risco qualitativas para portfólio de barragens por meio de índices de risco e matrizes de classificação, embora simples e subjetivas, permitem uma classificação expedita das estruturas com base no risco. Entende-se que a classificação proposta pelo CNRH em regulamentação à Lei 12.334, por se constituir em uma evolução natural dos métodos de índices predecessores (com adequadas classes de avaliação e número de descritores) e pela abrangência com que será utilizada no país, é uma ferramenta adequada no intuito de identificar e comparar as barragens com base no risco de forma preliminar. As análises qualitativas baseadas na metodologia FMEA permitem um incremento importante no conhecimento estruturado do sistema e desempenho da barragem em análise e fornecem informações para evitar que problemas passados ocorram novamente. Já as análises quantitativas (ETA e FTA), certamente são os métodos cientificamente mais consistentes, explicitando as incertezas e baseando-se em valores numéricos da probabilidade e consequência. As construções das árvores por si só constituem-se uma importante ferramenta de conhecimento para inferência da performance de um sistema. Desse modo, julga-se interessante a adoção e utilização de métodos de análises de riscos por parte dos empreendedores de barragens. Uma metodologia integrada de avaliação, partindo de métodos mais expeditos para os mais estruturados, pode ser bastante útil, considerando o tempo necessário e os custos envolvidos no desenvolvimento de análises de riscos mais complexas. As análises de risco, inseridas no processo mais amplo de gestão de riscos, podem ser consideradas um grande avanço, em especial nas fases de operação e manutenção, consistindo nas bases de um programa estruturado de monitoramento e priorização das atividades de reparo e reabilitação de barragens. Destaca-se, ainda, que permitem tomadas de decisão considerando bases teóricas mais sólidas e a avaliação de diferentes possibilidades de redução do risco. 8. PALAVRAS-CHAVE Segurança de barragens, análise de riscos, FMEA, Árvores de evento, Árvores de Falha 9. 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