Buscar

Crimes contra a dignidade sexual resumão

Prévia do material em texto

O título VI do Código Penal teve nova redação dada pela lei nº 12.015 de 7 de agosto de 2009. A mudança no título VI já começa pelo nome do título, o qual passou de “Crimes contra os costumes” para “Crimes contra a dignidade sexual”. A expressão “crimes contra costumes” já não traduzia mais a realidade dos bens juridicamente protegidos pelos tipos penais que se encontravam no título VI. O foco da proteção não era mais a forma como as pessoas deveriam se comportar sexualmente perante a sociedade do sec. XXI, mas a tutela de sua dignidade sexual. Faz-se importante ressaltar que a dignidade sexual é uma das espécies do gênero “dignidade da pessoa humana”. O nome dado à um título ou mesmo à um capítulo do CP tem o poder de influenciar na análise de cada figura típica contida nele, mediante a interpretação sistêmica ou até mesmo de uma interpretação teleológica, em que se busca a finalidade da proteção legal. 
1 – ESTUPRO
1.1 – Considerações Iniciais
A lei 12.015/09 unificou, no art. 213 do CP, as figuras de estupro e atentado violento ao pudor, visando evitar as inúmeras controvérsias relativas à esses tipos penais, como por exemplo no que tange à continuidade delitiva. 
	Analisando a nova redação dada ao caput do art. 213, podemos destacar os seguintes elementos: 
O constrangimento é levado a efeito mediante violência ou grave ameaça.
O constrangimento pode ser dirigido à vítima ou a terceiro, como forma de coação. 
A vítima pode ser de qualquer sexo.
Pode haver conjunção carnal. Por conjunção carnal entende-se o ajuntamento do órgão genial do homem com o da mulher, a intromissão do pênis na cavidade vaginal. A conjunção carnal também é considerada um ato libidinoso. 
Pode ser também que o agente faça com que a vítima pratique ou permita que com ela se pratique qualquer ato libidinoso. Na expressão “outro ato libidinoso” estão contidos todos os atos de natureza sexual que não conjunção carnal, que também tenham a finalidade de satisfazer a libido do agente. 
O núcleo do tipo é o verbo “constranger”, utilizado no sentido de obrigar, forçar, subjugar a vítima ao ato sexual. É uma modalidade especial de constrangimento ilegal, praticado com o fim de fazer com que o agente tenha sucesso no congresso carnal ou na prática de outros atos libidinosos. 
No que tange ao emprego de violência, se esta resulta em lesões de natureza leve, estas são absorvidas pelo delito de estupro, visto que fazem parte da violência empregada pelo agente. Se da conduta praticada resultar lesão de natureza grave ou morte da vítima, o estupro será qualificado, nos termos dos parágrafos 1º e 2º do art. 213 do CP. 
Sobre a grave ameaça, esta pode ser direta, indireta, implícita ou explícita. Vale ressaltar que o mal prometido pelo agente não deve ser, necessariamente, injusto. 
O princípio da proporcionalidade deve ser levado em consideração quando se trata da verificação da tipicidade do crime previsto no art. 213, ou seja, o agente deve ser punido de forma proporcional ao seu comportamento. Deve-se levar em consideração, também, as figuras do constrangimento ilegal (art. 146 do CP), ou mesmo a contravenção penal de importunação ofensiva ao pudor (art. 61 da LCP).
1.2 – Classificação Doutrinária
Conjunção carnal: O crime será de mão própria no que diz respeito ao sujeito ativo, seja ele um homem ou mesmo uma mulher, pois exige a atuação pessoal do agente. O crime será próprio no que tange ao sujeito passivo, uma vez que a conjunção carnal pressupõe uma relação heterossexual. 
Ato Libidinoso: É crime comum, tanto com relação ao sujeito ativo, quanto com relação ao sujeito passivo; doloso; comissivo (podendo ser praticado via omissão imprópria na hipótese de o agente ser garantidor); material; de dano; instantâneo; de forma vinculada, quando a conduta for dirigida à prática da conjunção carnal, e de forma livre, quando o comportamento disser respeito ao cometimento de outros atos libidinosos; monossubjetivo; plurissubsistente; não transeunte (dependendo da forma como é praticado, o crime poderá deixar vestígios, a exemplo do coito vagínico ou do sexo anal; caso contrário, será difícil sua constatação por meio de perícia, oportunidade em que deverá ser considerado um delito transeunte).
1.3 – Objeto material e bem juridicamente protegido
	A lei tutela o direito de liberdade que qualquer pessoa tem de dispor sobre o próprio corpo, no que diz respeito aos atos sexuais. Rogério Greco também aponta o desenvolvimento sexual como outro bem jurídico a ser protegido pelo tipo penal em estudo, com base na proposta legislativa do nome do título, a qual era “Dos crimes contra a liberdade e o desenvolvimento sexual”. Em suma, pode-se assinalar como bens juridicamente protegidos: a dignidade, a liberdade e o desenvolvimento sexual. 
	O objeto material do delito pode ser de qualquer sexo, sendo caracterizado, de forma geral, como pessoa contra a qual é dirigida a conduta praticada pelo agente. 
1.4 – Sujeito ativo e sujeito passivo
	Sujeito ativo no estupro: se a finalidade for conjunção carnal, poderá ser tanto homem quanto mulher; se a finalidade for a prática de qualquer outro ato libidinoso, qualquer pessoa pode ser sujeito ativo.
	Sujeito passivo no estupro: se a finalidade é conjunção carnal deverá ser, obrigatoriamente, do sexo oposto ao agente, pois a conjunção carnal presume uma relação heterossexual; se a finalidade for a prática de qualquer outro ato libidinoso, qualquer pessoa pode ser sujeito passivo.
1.5 – Consumação e tentativa
Consumação do estupro quando a finalidade é conjunção carnal: consuma-se com a penetração, total ou parcial, do pênis do homem na cavidade vaginal da mulher. Não há necessidade de ejaculação. 
Consumação do estupro quando a finalidade é prática de qualquer outro ato libidinoso: Consuma-se no momento em que o agente, após a prática do constrangimento levado a efeito mediante violência ou grave ameaça, obriga avítima a praticar ou permitir que com ela se pratique outro ato ato libidinoso diverso da conjunção carnal. 
De acordo com Rogério Greco, trata-se de um crime plurissubsistente, o que torna possível a tentativa. A análise em questão consiste na avaliação de acordo com o caso concreto, de se os atos que antecederam ao início da penetração vagínica não consumada são ou não considerados normais à prática do ato final, ou seja, se os atos praticados são necessários à excitação do agente para que este possa consumar o crime, caso afirmativo tem-se o chamado prelúdio do coito. Em caso de verificação de prelúdio do coito, os atos libidinosos praticados deverão ser considerados como antecedentes naturais ao delito de estupro. Se o agente é interrompido, por circunstâncias alheias à sua vontade, enquanto no prelúdio do coito, deverá este responder por tentativa de estupro, visto que uma vez considerados atos necessários à efetiva consumação, tem-se que o agente não chegou a consumar o delito em questão. Deve-se considerar também o princípio da proporcionalidade no que tange a possibilidade de tentativa, visto que punir a prática do prelúdio do coito da mesma forma como se pune o delito consumado violaria tal princípio. 
Rogério Greco ainda afirma que a tentativa também será possível a partir do momento em que o agente vier a praticar o constrangimento sem que consiga, nas situações de efetividade e passividade da vítima, determinar a prática do ato libidinoso. 
Entretanto, doutrinadores como Maximiliano Roberto Ernesto Fuhrer e Maximilianus Cláudio Américo Fuhrer, defendem a impossibilidade de tentativa, sob a justificativa de que a nova redação dada pela lei 12.015/09 afasta as tradicionais dúvidas no que tange aos atos preparatórios da conjunção carnal, ou preliminares, pois se tratam de atos libidinosos e sua simples prática, mesmo necessária à excitação do agente, já configuraria estupro consumado, nos termos da segunda parte do art. 213. 
1.6 – Elemento subjetivo
	Elemento Subjetivo: Dolo. Diz respeito a constranger a vítima com a finalidade de, em ela, ter conjunção carnal, praticarou permitir que com ela se pratique outro ato libidinoso, não importando a motivação. 
	Não há necessidade de que o agente atue com especial fim de saciar sua lascívia, de satisfazer sua libido. 
	Não se admite a modalidade culposa por ausência de disposição legal expressa nesse título. 
1.7 – Modalidades Comissiva e Omissiva
	O núcleo constranger pressupõe um comportamento positivo por parte do agente, tratando-se, pois, como regra, de crime comissivo. 
	O delito também pode ser praticado via omissão imprópria, na hipótese de o agente gozar do status de garantidor, nos termos do §2º do art. 13 do CP. 
1.8 – Modalidades qualificadas
	A lei 12.015 criou duas modalidades qualificadas no crime de estupro: a) se da conduta resulta lesão corporal grave ou se a vítima for menor de 18 e maior de 14 anos. Pena: reclusão, de 8 a 12 anos; b) se da conduta resulta morte. Pena: reclusão, de 12 a 30 anos. 
	Por lesão corporal grave entende-se o previsto nos parágrafos 1º e 2º do art. 129 do CP. 
	A lesão corporal de natureza grave e a morte da vítima devem ser consequência da conduta do agente, ou seja, do comportamento que era dirigido no sentido de praticar o estupro. Também é importante ressaltar que esses resultados que qualificam a infração penal só podem ser imputadas ao agente a título de culpa. São crimes preterdolosos. 
	Há discussão doutrinária no que tange à essa natureza preterdolosa. Os autores Maximiliano Fuhrer e Maximilianus Fuhrer defendem que tais resultados mais graves podem derivar tanto de dolo quanto de culpa, mas devem necessariamente se relacionar com o contexto de crime sexual, cabendo o juiz aplicar a pena conforme se verifique o dolo ou a culpa em relação ao resultado mais grave. 
	Já Bitencourt afirma que as previsões desses parágrafos não deveriam ser aplicadas em casos de dolo direto e dolo eventual, e que a adequação da conduta por dolo levaria ao concurso material de crimes. Contudo, se houvesse esse concurso de crimes dolosos, a soma das penas poderá resultar menor do que a das figuras qualificadas, desrespeitando assim o princípio da proporcionalidade, algo decorrente da desarmonia do sistema criada pelas reformas penais ad hoc. Portanto, a fim de evitar paradoxos, o autor sugere que as qualificadoras dos parágrafos 1º e 2º sejam aplicadas, mesmo que o resultado mais grave decorra do dolo do agente.
	Greco critica Bitecourt no sentido de que somente quando a conduta do agente produzir uma lesão corporal de natureza grave é que a pena mínima, se somada àquela prevista para o crime de estupro, ficaria com um déficit de um ano. Em todas as demais hipóteses, a soma das penas serão maiores ou, pelo menos, iguais àquelas previstas para o estupro qualificado. 
	Ainda de acordo com Greco, se o resultado qualificador for decorrente de caso fortuito ou força maior, o agente não poderá ser responsabilizado pelas modalidades qualificadas, conforme preconiza o art. 19 do CP. 
Outra discussão em pauta no que tange às qualificadoras: o delito sexual é tentato, mas a conduta descrita na qualificadora é consumada. 
Considerando o crime qualificado como preterdoloso, tem-se que não cabe tentativa, uma vez que o resultado que o agrava só pode ser atribuído à título de culpa, sendo, portanto, impossível a tentativa de estupro qualificado. Em caso de lesão corporal grave ou morte da vítima sem que o delito sexual seja consumado, o agente responderá apenas pelos atos consumados, ou seja, por lesão corporal grave culposa ou por homicídio culposo. 
Para aqueles que consideram, entretanto, que o estupro já se consuma com a violência ou grave ameaça, a ocorrência de lesões graves ou morte, mesmo sem a prática de conjunção carnal ou ato libidinoso, já levaria a consumação do estupro qualificado. Além disso, as qualificadoras fazem uso da expressão "se da conduta resulta" ou seja, não é necessária a consumação do ato libidinoso ou da conjunção carnal se da conduta do agente na execução do crime resultar morte ou lesão corporal grave. Para essa corrente, se a tentativa fosse reconhecida, a pena seria menor do que a prevista pelo crime de lesão corporal seguida de morte. 
Neste ponto, Greco ressalta que isso acontece, realmente, quando se leva em consideração a pena máxima cominada em ambos os delitos, embora a lei 12.015 tenha aumentado para 30 anos e, no que tange a pena mínima, esta seria a mesma. entretanto, para o autor, embora o CP apresente sim falhas, não se pode permitir que estas falhas interfiram no raciocínio dentro d Estado Democrático de Direito, um Estado Social, e dentro desta lógica não é possível considerar como consumado um delito que, a toda prova, permaneceu na fase da tentativa, ofendendo assim o inciso II do art. 14 do CP. O autor filia-se a uma terceira teoria, a qual afirma que seria admissível a tentativa de estupro qualificado, desconsiderando a característica preterdolosa do delito em prol da adequação da punição ao Estado Democrático de Direito, assim a pena aplicada seria condizente com a reprovabilidade da conduta do agente. 
1.9 - Causas de aumento de pena
Sobre as causas de aumento de pena, tem-se o previsto no art. 226 e no art. 234-A do Código Penal. 
No que tange ao inciso I do art 226, tem-se a previsão de aumento de quarta parte da pena se o crime for cometido em concurso de pessoas. A presença de duas ou mais pessoas é motivo de maior facilidade no cometimento do delito, diminuindo, ou mesmo anulando a possibilidade de resistência da vítima, havendo, assim, maior reprovabilidade da conduta. 
A segunda hipótese prevê o aumento de metade da pena, conforme determina o inciso II do art. 226 do Cp. Diz respeito ao fato de o agente ter autoridade sob a vítima devido a laços familiares. O aumento de pena também está relacionado à maior reprovabilidade da conduta, visto que se espera dessas pessoas atitudes protetivas. 
O inciso III do art. 234-A determina que a pena será aumentada de metade se o crime resultar em gravidez. É importante lembrar que o art. 128, II do CP permite o aborto quando a gestação é resultado de estupro. Como é possível perceber, a conduta do estuprador, além de causar mal a mulher, ainda pode levar ao ceifar da vida de um feto. 
A pena ainda pode ser aumentada de um sexto até metade, nos termos do inciso IV do art. 234-A, se o agente transmite à vítima doença sexualmente transmissível de que sabe ou deveria saber ser portador. Para tanto a vítima deverá ser submetida a exame pericial a fim de comprovar que a doença realmente foi transmitida na execução do estupro. Cabe lembrar que a expressão "sabe ou deveria saber" faz referência a dolo direto ou dolo eventual, mas não culpa, sob a possibilidade de incorrer em responsabilidade objetiva. 
Caso a transmissão seja de HIV e o estupro seja efetuado com a finalidade de transmitir a doença, a responsabilidade será por concurso formal impróprio pelo delito de estupro e por tentativa de homicídio. Se a vítima falecer o agente responde por homicídio consumado. 
1.10 - Ação penal e segredo de justiça
De acordo com o art. 225 do CP, os crimes dos Capítulos I e II do Título VI (dos crimes contra a dignidade sexual) serão de iniciativa pública condicionadas a representação. A ação pública será incondicionada, entretanto, se a vítima for menor de 18 anos ou vulnerável. 
Sobre a súmula 608 do STF, há divergência doutrinária acerca de sua aplicação. Greco filia-se a corrente que a considera aplicável, colocando que quando o crime de estupro for praticado com o uso de violência, a ação pública é incondicionada, sendo condicionada apenas em caso de grave ameaça. Parte da doutrina afirma que esta súmula deve ser afastada, pois viola o disposto no art. 225 do CP, o qual exige a representação do ofendido como explanado acima. 
1.11 - Consentimento do ofendido
De acordo com o dispositivo legal do 213, a vítima deve ser constrangida, ou seja, não há o consentimento desta. Vale ressaltar se o ato começar com o consentimento e durante sua execução uma das partes muda de ideia, retirando o consentimento,tentando interromper o ato e se vê forçada a concluí-lo, há a caracterização de estupro. Também é estupro consumado se o ato se inicia sem o consenso da vítima, mas durante o ato há o consentimento. Neste caso cabe lembrar que a ação é condicionada a representação e cabe a vítima decidir se irá representar ou não. 
O cônjuge pode ser sujeito ativo de estupro de seu parceiro. A ideia de que a mulher possui um debito conjugal a ser quitado foi afastada principalmente a partir da interpretação constitucional do instituto, por meio do princípio da igualdade, da liberdade sexual e da dignidade da pessoa humana. 
1.12 - Mulher como autora de conjunção carnal
A possibilidade de uma mulher ser autora de crime de estupro cuja finalidade é conjunção carnal se dá para aqueles que adotam a teoria do domínio do fato, dessa forma a mulher poderia ser autora do crime de estupro cuja finalidade é conjunção carnal, enquanto o homem poderia ser participe, coautor ou até mesmo inocentado, se for considerado mero instrumento para a prática do crime, sendo coagido para a prática de tal. 
Para aqueles que afirmam que autor é o que pratica o núcleo do tipo, no caso de estupro com finalidade de conjunção carnal, a mulher não poderia ser autora, mas ainda poderia ser responsabilizada como participe, se tivesse participado da prática, de qualquer forma. Tal responsabilidade seria avaliada diante do caso concreto e refletida na dosimetria da pena, podendo a pena da mulher participe ser maior do que a do homem autor. 
1.13 - Estupro de transexuais
A nova redação do art. 213 protege os transexuais ao considerar a prática de ato libidinoso como estupro. 
1.14 - Desistência voluntária
Ao analisar a desistência voluntária, deve-se lembrar que o crime de estupro não consiste apenas na conjunção carnal, mas também na prática de atos libidinosos, portanto, se houve a prática de atos libidinosos, não considerados prelúdio do coito, considera-se consumado o crime de estupro, mesmo sem conjunção carnal. Se o agente é interrompido por circunstâncias alheias a sua vontade na prática de prelúdio do coito, tem-se tentativa de estupro. Mas se o agente interrompe suas ações voluntariamente, afasta-se a tentativa por meio da desistência voluntária, respondendo o agente pelos atos até então praticados. 
1.15 - Síndrome da mulher de Potífar
 O julgador deverá ter a sensibilidade necessária para apurar se os fatos relatados pela vítima são verdadeiros. A falta de credibilidade da vítima poderá contribuir à absolvição do acusado.
1.16 - Conjunção carnal e prática conjunta de outros atos libidinosos
Antes da lei 12.015/09 os crimes de estupro e atentado violento ao pudor encontravam-se em dispositivos separados, sendo o agente acusado em concurso material de crimes. A jurisprudência encontrava-se pacificada no que tange à continuidade delitiva, no sentido de que estupro e atentado violento ao pudor não eram crimes de mesma espécie por estarem localizados em dispositivos legais diferentes e, portanto, a prática de atos libidinosos e conjunção carnal não configurava crime continuado. 
Com a lei 12.015/09 foi possível a aplicação de continuidade delitiva, visto que os crimes de estupro e atentado violento ao pudor foram reunidos em um único tipo penal, este entendimento foi proferido pelo STF. Quando na entrada em vigor da lei vários processos com este tema foram revistos devido a redução da pena que a continuidade delitiva permitia. 
Hoje a discussão sobre o tema gira em torno da possibilidade do tipo penal previsto no art. 213 ser cumulativo ou alternativo, com interferência direta na dosimetria da pena. 
Tipos penais de conteúdo variado e alternativo são aqueles nos quais há fungibilidade de condutas, o que tem como consequência a irrelevância do cometimento dessa ou daquela conduta descrita no tipo penal; realizada uma ou mais de uma, o crime ainda é único. 
Já nos tipos penais de conteúdo variado e cumulativo não há a fungibilidade entre as condutas delitivas, ou seja, é possível a multiplicidade de crimes de acordo com as condutas consumadas do tipo penal. Permite-se também a cumulação de penas ou a continuidade delitiva, a depender ou não dos requisitos autorizantes dessa causa minorante. 
Ao afirmar que o crime de estupro é tipo misto alternativo, afirma-se, consequentemente, que aquele que cometer, afora a conjunção carnal, outros atos libidinosos, incidiria em apenas uma conduta de estupro, devendo ser responsabilizado por um único crime e consequentemente a aplicação de uma pena. 
Entretanto, afirmar que o crime de estupro é tipo misto cumulativo significa dizer que se o agente perpetrar mais de uma conduta descrita no tipo penal incidiria em dupla punição, ou seja, duas penas. 
O STJ não possui um entendimento consolidado. 
A quinta turma do STJ se posiciona no sentido de que se trata de um tipo misto cumulativo, pois mesmo com a junção dos tipos penais previstos antes da reforma de 2009 nos arts. 213 e 214, ainda há a separação do ato conjunção carnal dos demais atos libidinosos, colocando, dessa forma, que a punição desses atos deve se dar de forma cumulativa.
Já a sexta turma do STJ entende que o crime de estupro se trata de um tipo misto alternativo, visto que há um núcleo do tipo comum, que seria "constranger" e, portanto, a prática ou do ato libidinoso ou da conjunção carnal caracterizaria crime único em continuidade delitiva. A sexta turma também ressalta a impossibilidade a cumulação de tipicidades onde a lei assim não determina. 
O STF também não possui um entendimento consolidado. 
A segunda turma do STF se posicionou no sentido de ser o crime de estupro um crime único permitindo assim a continuidade delitiva, entretanto nos seguintes termos: a) as condutas devem ser praticadas num mesmo contexto fático e nas mesmas circunstâncias e b) devem ser dirigidas contra a mesma vítima.
1.17 - Beijo lascivo 
Ainda se discute o verdadeiro sentido da expressão, se seria aquele beijo que choca a moral média de quem o assiste ou se seria aquele que causa "inveja" a quem o assiste. 
Parte da doutrina, com representantes como Damásio, afirmam que o beijo lascivo pode ser considerado estupro quando praticado mediante violência ou grave ameaça, Luiz Regis Prado afirma que o beijo lascivo ou lingual obtido contra a vontade da vítima, mediante violência tem inferior magnitude penal se comparado, por exemplo, ao coito anal. Mas não deixa de ser estupro. 
Outra parte da doutrina, defendida por Rogério Greco, coloca que em respeito a reprovabilidade da conduta e ao princípio da proporcionalidade, o beijo lascivo não deve ser considerado estupro, visto que não alcança a gravidade dos atos os quais buscam ser evitados pelo art. 213. O agente poderia ser responsabilizado pelo delito de constrangimento ilegal, previsto pelo art. 246 do Código Penal, ou mesmo pela contravenção penal de importunação ofensiva ao pudor, prevista no art. 61 da LCP. 
1.18 - Estupro praticado contra mulher no âmbito doméstico e familiar
Será aplicada a lei 11.340, de 7 de agosto de 2006, cujo inciso III do art. 7º diz que se se trata de violência doméstica e familiar contra a mulher. 
2 - VIOLAÇÃO SEXUAL MEDIANTE FRAUDE
De acordo com a redação dada pela lei 12.015 de 2009 pode-se destacar os seguintes elementos: 
a) Conduta de ter conjunção carnal
b) Conduta de praticar outro ato libidinoso com alguém
c) A conduta pode ser praticada mediante fraude
d) A conduta pode também ser praticada mediante outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima. 
2.1 - Classificação doutrinária
Trata-se de um crime de mão-própria no que diz respeito ao sujeito ativo da conjunção carnal e próprio no que diz respeito ao sujeito passivo. 
Se a conduta for dirigida a prática de atos libidinosos o crime é comum, tanto no que diz respeito ao sujeito ativo, quanto no que diz respeito ao sujeito passivo. 
É criem doloso, material, de dano, comissivo (podendo ser praticado por omissão imprópria caso o agente goze do status de garantidor),instantâneo.
2.2 - Objeto material e bem juridicamente protegido
A liberdade sexual é o bem jurídico protegido. O objeto material do delito poderá ser tanto o homem quanto a mulher, ressaltando que diante de uma conjunção carnal a relação deve ser heterosexual. 
2.3 - Sujeito ativo e sujeito passivo
Conjunção carnal: Tanto homem quanto mulher poder sujeitos ativos, mas como é necessária uma relação heterossexual, a vítima deve ser do sexo oposto ao agente.
Ato libidinoso: qualquer pessoa pode ser sujeito ativo ou passivo no que tange a execução do ato libidinoso, desde que maior de idade e não vulnerável. 
2.4 - Consumação e tentativa
Conjunção carnal: a consumação se dá coma penetração total ou parcial do pênis na cavidade vaginal.
Ato libidinoso: quando o sujeito ativo pratica qualquer ato libidinoso com o sujeito passivo. 
Admite tentativa nas mesmas condições expostas no estupro, ou seja, em caso de o agente ser interrompido por circunstâncias alheias à sua vontade na prática de prelúdio do coito. 
2.5 - Elemento subjetivo
Este crime só pode ser praticado dolosamente. A conduta do agente deve ser dirigida finalisticamente para a prática de conjunção carnal ou ato libidinoso com a vítima. 
2.6 - Modalidade comissiva e omissiva
Os núcleos do tipo "ter" ou "praticar" pressupõe um comportamento comissivo por parte do agente. Entretanto é possível a prática do crime por omissão imprópria quando o agente goza do status de garantidor, conforme o disposto no § 2º do art. 13 do CP. 
2.7 - Finalidade de obtenção de vantagem econômica
O parágrafo único do art. 215 do Código Penal, com a redação dada pela lei 12.015/09 determina que se o crime for cometido com a finalidade de obtenção de vantagem econômica, deve-se também aplicar multa. A aplicação desta será regulada pelo art. 49 do CP. 
2.8 - Causas de aumento de pena 
As causas de aumento de pena são as mesmas citadas no caso de estupro, presentes nos arts. 226 e 234-A do CP. 
No que tange ao inciso I do art 226, tem-se a previsão de aumento de quarta parte da pena se o crime for cometido em concurso de pessoas. A presença de duas ou mais pessoas é motivo de maior facilidade no cometimento do delito, diminuindo, ou mesmo anulando a possibilidade de resistência da vítima, havendo, assim, maior reprovabilidade da conduta. 
A segunda hipótese prevê o aumento de metade da pena, conforme determina o inciso II do art. 226 do CP. Diz respeito ao fato de o agente ter autoridade sob a vítima devido a laços familiares. O aumento de pena também está relacionado à maior reprovabilidade da conduta, visto que se espera dessas pessoas atitudes protetivas. 
O inciso III do art. 234-A determina que a pena será aumentada de metade se o crime resultar em gravidez. 
A pena ainda pode ser aumentada de um sexto até metade, nos termos do inciso IV do art. 234-A, se o agente transmite à vítima doença sexualmente transmissível de que sabe ou deveria saber ser portador. Para tanto a vítima deverá ser submetida a exame pericial a fim de comprovar que a doença realmente foi transmitida na execução do crime. Cabe lembrar que a expressão "sabe ou deveria saber" faz referência a dolo direto ou dolo eventual, mas não culpa, sob a possibilidade de incorrer em responsabilidade objetiva. 
2.9 - Pena, Ação penal e segredo de justiça
O preceito secundário do art. 215 é de pena de reclusão, de 2 a 6 anos. lembrando da possibilidade de aplicação de multa caso haja finalidade de obtenção de vantagem financeira. 
De acordo com o art. 225 é crime de ação penal pública condicionada a representação.
Nos termos do art. 234-B do CP, os crimes do Título VI correrão em segredo d e justiça. 
2.10 - Fraude grosseira
Se a fraude deve impedir ou dificultar a livre manifestação da vontade da vítima. se assim não fizer há a configuração de crime impossível. A fraude deve ser analisada de acordo com o caso concreto. 
2.11 - Prostituta que tem relações sexuais com alguém que a prometeu pagamento após o ato
Caracteriza sim violação sexual mediante fraude, visto que a prostituta só se entregou sexualmente ao agente mediante a promessa de pagamento, o qual não foi efetuado. Lembrando que o agente deve prometer pagamento dolosa e enganosamente. 
2.12 - Prática de conjunção carnal e outro ato libidinoso com a mesma vítima
Também como no estupro tem-se a discussão sobre se tratar de um tipo misto cumulativo ou um tipo misto alternativo. 
Tipos penais de conteúdo variado e alternativo são aqueles nos quais há fungibilidade de condutas, o que tem como consequência a irrelevância do cometimento dessa ou daquela conduta descrita no tipo penal; realizada uma ou mais de uma, o crime ainda é único. 
Já nos tipos penais de conteúdo variado e cumulativo não há a fungibilidade entre as condutas delitivas, ou seja, é possível a multiplicidade de crimes de acordo com as condutas consumadas do tipo penal. Permite-se também a cumulação de penas ou a continuidade delitiva, a depender ou não dos requisitos autorizantes dessa causa minorante. 
3 - ASSÉDIO SEXUAL
Trata-se da conduta prevista no art. 216-A com redação dada pela lei 12.015/09. De acordo com esta redação é possível identificar os seguintes elementos: 
a) A conduta de constranger alguém
b) A finalidade de obter vantagem ou favorecimento sexual
c) O agente deve possuir condição hierárquica superior a da vítima, inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função. 
3.1 - Classificação doutrinária
Crime próprio tanto com relação ao sujeito ativo quanto com relaçaõ ao sujeito passivo, devido a qualidade hierarquizante proveniente de exercício de cargo, emprego ou função. É doloso, formal, comissivo (podendo ser omissivo impróprio quando o agente gozar de status de garantidor), instantâneo, monossubjetivo. 
3.2 - Objeto material e bem juridicamente protegido
O bem protegido é a liberdade sexual e em seu sentido mais amplo a dignidade sexual. 
O objeto material do delito é a pessoa contra a qual é dirigida a conduta praticada pelo agente. 
3.3 - Sujeito ativo e sujeito passivo
Sujeito ativo: É um crime próprio, o sujeito ativo deve se encontrar em condição hierárquica superior a da vítima ou com ela tenha ascendência inerente ao exercício de emprego, cargo ou função. Pode ser tanto do sexo feminino quanto do masculino. 
Sujeito passivo: aquele que estiver ocupando o polo passivo da relação hierárquica ou aquele sobre o qual tenha ascendência o sujeito ativo, não importando seu sexo. 
3.4 - Consumação e tentativa
O crime de assédio sexual possui natureza formal e sua consumação se dá no momento em que ocorrem os atos que importem em constrangimento para a vítima, não havendo necessidade de que esta venha, efetivamente, a praticar atos que impliquem em vantagem ou favorecimento sexual, exigidos pelo agente que, se vierem a ocorrer serão considerados como mero exaurimento do crime. 
No que tange à tentativa, esta é possível haja vista a possibilidade do fracionamento do inter criminis, entretanto, no caso concreto, é difícil de ser determinada.
3.5 - Elemento subjetivo
Este crime só pode ser praticado dolosamente, não havendo previsão para a modalidade culposa. Para que se reconheça a ocorrência do delito, entretanto, o dolo deverá abranger todos os elementos que integram a figura típica.
3.6 - Modalidades comissiva e omissiva
Crime comissivo o qual pode ser praticado via omissão imprópria se o agente gozar do status de garantidor. 
3.7 - Causa de aumento de pena
O § 2º do art. 216-A coloca que a pena é aumentada em até 1/3 se a vítima é menor de 18 anos. O agente deve conhecer da idade da vítima, caso contrário pode ser alegado erro de tipo. O art. não especifica o aumento mínimo, então, para que se mantenha a coerência com os demais arts. que preveem majorantes, este deverá ser de 1/6. 
3.8 - Ação penal e competência para julgamento
Trata-se de ação penal pública condicionada a representação. Se a vítima for vulnerável ou menor de 18 a ação não está sujeita a representação, se torna incondicionada. A competênciapara processo e julgamento do crime é do juizado especial. Poderá ser levada a efeito a proposta de suspensão condicional do processo desde que a vítima ão seja menor de 18 anos.

Continue navegando