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Construindo a igualdade na diversidade: gênero e sexualidade na escola Nanci Luz et al

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Copyright (©)
Qualquer parte desta publicação pode ser reproduzida, desde que citada a 
fonte.
Projeto gráfico (capa e diagramação): Ana Claudia França
Impressão: Ajir Artes Gráficas e Editora
Construindo a igualdade na diversidade : gênero e sexualidade na escola / or-
ganização : Nanci Stancki da Luz, Marília Gomes de Carvalho, Lindamir Salete 
Casagrande.— Curitiba : UTFPR, 2009.
286 p. : Il. color. ; 21 cm
Vários autores
Inclui bibliografias
ISBN : 978-85-7014-055-5
1. Sexo – Diferenças (Educação). 2. Papel sexual. 3. Feminismo e educação. 
4. Relações de gênero. 5. Feminismo. 6. Papel sexual. I. Luz, Nanci Stancki da 
(org.). II. Carvalho, Marília Gomes de. III. Casagrande, Lindamir Salete. II. 
Título. 
 
CDD (22. ed.) 306.43
306.7
C758
Printed in Brazil/ Publicado no Brasil
Dezembro de 2009
Curitiba
2009
Editora UTFPR
Sumário
APRESENTAÇÃO
Nanci Stancki da Luz 
Marília Gomes de Carvalho 
Lindamir Salete Casagrande
GÊNERO: CONSIDERAÇÕES SOBRE O CONCEITO
Marília Gomes de Carvalho e Cíntia de Souza Batista Tortato
SEXUALIDADE E GÊNERO NA ESCOLA
Beatriz L. Ferreira e Nanci Stancki da Luz
VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER: UM DESAFIO À 
CONCRETIZAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS
Nanci Stancki da Luz
QUESTÕES DE GÊNERO E DIVERSIDADE SEXUAL: AS 
POSSIBILIDADES DA LITERATURA INFANTIL
Cíntia de Souza Batista Tortato 
GÊNERO, EDUCAÇÃO E ARTEFATOS TECNOLÓGICOS: 
OS DIFERENTES MEIOS PARA ENSINAR
Solange Ferreira dos Santos e Benedito Guilherme Falcão Farias
UM OLHAR CRÍTICO PARA OS LIVROS DIDÁTICOS: 
UMA ANÁLISE SOB A PERSPECTIVA DE GÊNERO
Lindamir Salete Casagrande e Marília Gomes de Carvalho
CIÊNCIA E TECNOLOGIA SOB A ÓTICA DE GÊNERO
Maria Aparecida Fleury Costa Spanger, Tânia Rosa F. Cascaes e 
Marília Gomes de Carvalho
11
21
47
73
91
109
1
2
4
3
5
6
7 133
33
151
171
193
209
DIVISÃO SEXUAL DO TRABALHO E PROFISSÕES 
CIENTÍFICAS E TECNOLÓGICAS NO BRASIL
Nanci Stancki da Luz
REPRESENTAÇÕES DE GÊNERO NA CIÊNCIA, TECNOLOGIA 
E SOCIEDADE, MEDIADAS PELA PUBLICIDADE 
Maristela Mitsuko Ono, Luciana Martha Silveira e 
Ronaldo de Oliveira Corrêa
DESAFIOS E AVANÇOS NAS POLÍTICAS 
PÚBLICAS DE GÊNERO
Nanci Stancki da Luz
DIREITOS SEXUAIS E REPRODUTIVOS: A 
REPRODUÇÃO, A SEXUALIDADE E AS POLÍTICAS
Marlene Tamanini 
HOMOFOBIA E A ESCOLA
Toni Reis 
“O OLHAR NÃO É MAIS O MESMO”: UMA ANÁLISE 
SOBRE OS RESULTADOS DE UM CURSO SOBRE 
GÊNERO E SEXUALIDADE NA ESCOLA
Lindamir Salete Casagrande, Marília Gomes de Carvalho e 
Nanci Stancki da Luz
SOBRE AS AUTORAS E AUTORES
8
9
10
11
12
13
247
261
283
11
nanci stancki da luz, marília gomes de carvalho e lindamir salete casagrande
APRESENTAÇÃO
Nanci Stancki da Luz 
Marília Gomes de Carvalho 
Lindamir Salete Casagrande
Este livro é resultado do Projeto “Construindo a igualdade na escola: re-
pensando conceitos e preconceitos de gênero”, realizado durante o ano 
de 2008, na Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), por inter-
médio do Grupo de Estudos de Relações de Gênero e Tecnologia (GeTec) do 
Programa de Pós-graduação em Tecnologia (PPGTE) em parceria com a Secre-
taria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do Ministério da 
Educação (Secad/MEC). 
O objetivo do projeto era contribuir para a formação de pro�ssionais 
de educação de Curitiba e região metropolitana na temática “gênero, sexu-
alidade e diversidade sexual na escola”. Nesse sentido, foram desenvolvidas 
várias ações, entre as quais a oferta de cursos de formação continuada, com 
duração de 60 horas cada, visando sensibilizar pro�ssionais da educação – 
professores e professoras do Ensino Fundamental e Médio, pessoal técnico-
administrativo, inspetoras(es), merendeiras(os), pedagogos, entre outros 
– preparando-os(as) para perceber e trabalhar com questões de gênero e 
diversidade sexual no ambiente escolar. 
O projeto tinha como meta inicial a capacitação de 160 pro�ssionais, 
no entanto, devido à enorme demanda, além das 4 turmas previstas inicial-
mente, foram abertas mais vagas e turmas, possibilitando que 328 pro�ssio-
nais da educação participassem desse processo de formação que procurou: 
•	 Oportunizar	o	acesso	a	um	referencial	teórico	que	discuta	con-
ceitos como igualdade de gênero, homofobia, sexismo e diversi-
dade sexual.
12
apresentação
•	 Provocar	reflexões	críticas	entre	os	profissionais	da	educação	
a respeito da construção dicotômica de gênero em nossa socie-
dade e suas conseqüências quanto à discriminação e preconcei-
tos.
•	 Sensibilizar	profissionais	da	educação	das	escolas-alvo	do	pro-
jeto para a modi�cação de estereótipos de gênero que geram 
comportamentos discriminatórios.
•	 Auxiliar	docentes	na	utilização	crítica	do	material	didático	em	
sala de aula quanto aos conteúdos de gênero que provocam a 
invisibilidade histórica das mulheres na construção da socieda-
de brasileira, da ciência e da tecnologia; a reprodução dos pa-
drões tradicionais, conservadores e discriminatórios de gênero 
que	refletem	na		linguagem	escrita	e	visual.
•	 Problematizar	 questões	 como	 a	 violência	 de	 gênero,	 enfati-
zando a violência contra as mulheres, a violência doméstica e 
violência contra homossexuais.
•	 Discutir	juntamente	com	profissionais	da	educação	a	definição	
de pro�ssões “masculinas” ou “femininas” e o conseqüente dire-
cionamento e/ou enquadramento dos alunos em determinadas 
pro�ssões (geralmente de conteúdos técnicos) e das alunas em 
pro�ssões de conteúdos voltados às ciências humanas e às ar-
tes.
•	 Problematizar	 juntamente	 com	 profissionais	 da	 educação	
comportamentos homofóbicos na sociedade em geral e na es-
cola em particular e suas conseqüências na exclusão de pessoas 
que não seguem os padrões hegemônicos de gênero.
•	 Repensar	em	parceria	 com	profissionais	da	educação	 formas	
de inclusão no processo de escolarização daqueles(as) que eva-
dem ou nem ingressam nas escolas por fatores de discriminação 
de gênero. 
•	 Contribuir	 para	 a	 reflexão	 da	 importância	 da	 promoção	 da	
eqüidade	de	gênero	e	para	a	reflexão	sobre	os	direitos	sexuais	e	
reprodutivos de jovens e adolescentes.
13
nanci stancki da luz, marília gomes de carvalho e lindamir salete casagrande
	O	curso	propunha-se	a	refletir	sobre	a	realidade	escolar	e	sobre	
questões que inviabilizam a construção da igualdade na escola, sendo 
composto por quatro módulos que abordaram os seguintes temas: 
•	 Módulo	1–	Gênero:	construção	social	do	masculino	e	do	femini-
no; sexualidade: problematização da heterossexualidade norma-
tiva e diversidade sexual; violência de gênero. 
•	 Módulo	2	–	Gênero	e	diversidade	sexual	no	ambiente	escolar:	
livros didáticos; espaço escolar, intervalos e datas comemorativas; 
currículo	explícito	e	oculto.	
•	 Módulo	3	–	Gênero,	ciência	e	tecnologia:	gênero	e	escolha	de	
uma pro�ssão; as disciplinas escolares; acesso, produção e uso de 
tecnologias;	gênero	e	mídia	–	cinema,	imprensa	escrita,	músicas,	
Internet, teatro, publicidade, entre outros. 
•	 Módulo	4	–	Eqüidade	de	gênero	e	enfrentamento	ao	sexismo	
e	homofobia:	direitos	 sexuais	e	 reprodutivos;	políticas	públicas,	
particularmente as educacionais, voltadas para a promoção da 
eqüidade de gênero; ações e propostas para o combate do sexis-
mo e homofobia, promoção da eqüidade de gênero e dos direitos 
produtivos e reprodutivos. 
Além desses quatro módulos, o grupo de participantes desen-
volveu	um	trabalho	final	com	questões	que	visavam	a	 refletir	 sobre	a	
própria realidade e diagnosticar a presença de estereótipos e violências 
de gênero. Valendo-se dessa análise preliminar do ambiente escolar, 
foi proposto ao grupo que apresentasseações no sentido de contribuir 
para a promoção da eqüidade de gênero e dos direitos sexuais e repro-
dutivos de jovens e adolescentes.
Buscou-se explorar a experiência vivida pelos(as) participantes, 
trabalhando os temas com base na realidade de cada pessoa. A des-
construção de padrões estereotipados de gênero e da heteronormati-
vidade	e	a	reflexão	sobre	as	suas	conseqüências	–	preconceito,	discrimi-
nação e outras formas de violência – foi o passo inicial para a discussão 
da promoção de uma educação democrática e inclusiva, bem como o 
enfrentamento do sexismo, machismo, misoginia, homofobia, lesbofo-
bia e transfobia no ambiente escolar. 
14
apresentação
Gênero, enquanto construção social do feminino e do masculi-
no, foi assumido como um elemento das relações sociais e, portanto, 
presente em todas as nossas instituições, particularmente, na escola 
– ambiente que contribui para a produção/reprodução de padrões e 
identidades de gênero e de sexualidade. Nesse sentido, os educadores 
foram	considerados	profissionais	de	extrema	relevância	para	a	cons-
trução da igualdade de gênero. Assim, caberia aos educadores e edu-
cadoras	refletir	sobre	as	práticas	educacionais,	buscando	não	reforçar	
preconceitos, discriminações e violências de gênero, assumindo para 
si como um dos objetivos da educação o enfrentamento das inúmeras 
formas de violência, a promoção da eqüidade de gênero e o respeito 
à diversidade. 
Dessa forma, as práticas escolares devem ser repensadas, elimi-
nando-se do ambiente escolar conteúdos discriminatórios, bem como 
ações	que	configurem	qualquer	tipo	de	violência,	seja	física,	moral	ou	
psicológica. É preciso desnaturalizar o determinismo biológico pre-
sente nos padrões dicotômicos de gênero que aprisionam homens e 
mulheres em comportamentos e atributos considerados, respectiva-
mente, naturalmente masculinos e femininos. A escola deve se pro-
por a contribuir com o desenvolvimento humano pleno, o que pres-
supõe assumir o desenvolvimento social e, nesse sentido, fazendo-se 
necessário respeitar diferenças, mas, sobretudo, construir cidadania e 
contribuir para a concretização dos direitos fundamentais de todo ser 
humano. Sendo assim, não há espaço na instituição escolar para de-
sigualdades sociais, de gênero ou de caráter étnico-racial, ou, ainda, 
para hierarquias de conhecimentos e pro�ssões. 
É importante destacar que o espaço escolar pode ser um espaço 
de inúmeras contradições, pois pode contribuir para a construção das 
desigualdades de gênero, mas também pode se constituir num espaço 
de	transformação	social	e	de	construção	da	igualdade.	Políticas	edu-
cacionais,	 projeto	 político-pedagógico,	 currículo	 escolar,	 planos	 de	
ensino, planos de aula, cotidiano escolar e práticas escolares podem 
contribuir para a transformação das relações de gênero e para a con-
solidação da justiça social. Certamente esse não é um processo rápi-
do, tampouco simples, entretanto, viável, desde que haja disposição e 
participação da comunidade escolar em um projeto de emancipação, 
autonomia e desenvolvimento de todos e todas. 
15
nanci stancki da luz, marília gomes de carvalho e lindamir salete casagrande
Este	 livro,	 construído	de	 acordo	 com	os	pressupostos	 expostos	
anteriormente é composto por quatro unidades. A primeira discute, en-
tre outras questões, gênero, sexualidade e violência. O artigo “Gênero: 
considerações	sobre	o	conceito”,	de	Marília		Gomes	de	Carvalho	e	Cíntia	
de Souza Batista Tortato, traz uma discussão acerca das diferentes con-
cepções e abordagens do conceito de gênero, enfatizando aquele que 
norteará	o	conteúdo	deste	livro.	Para	as	autoras,	não	existem	caracterís-
ticas femininas ou masculinas imutáveis, assim como não há como con-
siderar habilidades ou di�culdades próprias de mulheres ou de homens, 
pois a construção social do masculino ou do feminino não está marcada 
pela natureza, devendo sempre ser entendida no contexto em que se 
inserem. 
O artigo “Sexualidade e gênero na escola”, de Beatriz L. Ferreira e 
Nanci Stancki da Luz, revela o quanto o tema sexualidade é polêmico 
e enfrenta resistências no ambiente escolar. A sexualidade quando vista 
de forma restrita desconsidera a relação com o corpo, o prazer e o de-
sejo. As autoras defendem que é necessário desconstruir a amálgama 
entre sexo (ato sexual) e sexualidade, para que se possa considerar a 
sexualidade em uma dimensão ampla, contemplando seus diversos as-
pectos nos processos educacionais. 
“Violência contra a mulher: um desa�o à concretização dos direi-
tos humanos”, de Nanci Stancki da Luz, encerra a primeira parte e discu-
te a violência contra a mulher, apontando elementos que contribuem 
para a sua construção e reprodução social. Destaca as resistências e con-
quistas da luta feminista na desconstrução da naturalização da violência 
contra a mulher e no combate à sua impunidade, contribuindo de forma 
signi�cativa para a efetivação dos direitos humanos das mulheres. 
A segunda parte desta obra tem como objetivo discutir as rela-
ções de gênero e diversidade no universo escolar e é composta de três 
artigos. No primeiro deles – “Questões de gênero e diversidade sexual: 
as	possibilidades	da	literatura	infantil”	–	Cíntia	de	Souza	Batista	Tortato	
apresenta debates sobre questões de gênero e diversidade sexual, usan-
do a literatura infantil como elemento disparador dessas discussões e 
contemplando as mais diversas situações que acontecem em uma esco-
la e que podem proporcionar momentos preciosos para a abordagem 
das questões de gênero ou de diversidade sexual com as crianças ou 
jovens. 
16
apresentação
Solange Ferreira dos Santos e Benedito Guilherme Falcão Farias, 
em seu artigo “Gênero, educação e artefatos tecnológicos: os diferentes 
meios para ensinar”, destacam que as diferentes formas de ensinar e o 
uso	dos	artefatos	tecnológicos	disponíveis	para	isso	podem	contribuir	
para a disseminação, problematização e construção de um novo conhe-
cimento, especialmente, nas questões de gênero e educação. 
Lindamir	Salete	Casagrande	e	Marília	Gomes	de	Carvalho	encer-
ram	essa	unidade	com	o	artigo	“Um	olhar	crítico	para	os	 livros	didáti-
cos: uma análise sob a perspectiva de gênero”. As autoras apresentam 
reflexões	sobre	as	representações	de	gênero	encontradas	em	livros	di-
dáticos de Matemática, Geogra�a, Ciências e Português para o Ensino 
Fundamental, sendo as ilustrações e os textos dos livros didáticos o foco 
das atenções nessa análise. As autoras consideram que ao questionar as 
representações estereotipadas nos livros didáticos não estão negando 
a	sua	qualidade	e	a	 importância	que	eles,	os	 livros,	assumem	no	coti-
diano escolar, mas objetivam, sobretudo, alertar para a necessidade de 
se	manter	um	olhar	crítico	sobre	representações	que	podem	transmitir	
preconceitos e gerar discriminações. 
A	terceira	unidade	traz	artigos	que	visam	contribuir	com	a	refle-
xão	crítica	sobre	a	ciência,	tecnologia	e	gênero.	Nesse	sentido,	o	primei-
ro deles, “Ciência e tecnologia sob a ótica de gênero”, das autoras Maria 
Aparecida	Fleury	Costa	Spanger,	Tânia	Rosa	F.	Cascaes	e					Marília	Gomes	
de Carvalho, traz uma revisão teórica sobre a temática ciência, tecnolo-
gia e gênero, destacando e assumindo a construção social da ciência e 
da tecnologia que, historicamente, ocorreu com base nas referências do 
mundo masculino, contribuindo assim para a invisibilidade da mulher 
nessas áreas. 
No segundo artigo, “Divisão sexual do trabalho e pro�ssões cien-
tíficas	e	tecnológicas	no	Brasil”,	Nanci	Stancki	da	Luz,	valendo-se	de	uma	
discussão teórica sobre a divisão sexual do trabalho, apresenta uma dis-
cussão sobre pro�ssões que historicamente tiveram uma composição 
majoritariamente	masculina:	as	carreiras	científicas	e	tecnológicas,	entre	
as	quais,	destaca	o	Magistério	Superior,	a	Matemática,	a	Física,	a	Quími-ca,	a	Estatística	e	a	Engenharia/Arquitetura.		
Encerrando essa unidade, Maristela Mitsuko Ono, Luciana Martha 
Silveira e Ronaldo de Oliveira Corrêa no artigo “As representações do 
feminino e masculino na ciência, tecnologia e sociedade, via meios de 
17
nanci stancki da luz, marília gomes de carvalho e lindamir salete casagrande
comunicação”, abarcam discussões sobre representações do feminino 
e do masculino na ciência, tecnologia e sociedade, via mensagens pu-
blicitárias veiculadas pelos meios de comunicação impressos [revistas 
semanais, gibis, entre outros]. 
A	última	unidade	tem	como	objetivo	trazer	reflexões	sobre	eqüi-
dade de gênero, enfrentamento ao sexismo e à homofobia e a promoção 
dos direitos sexuais e reprodutivos. Visa ainda apresentar os resultados 
parciais dos trabalhos desenvolvidos pelos(as) cursistas. Nessa perspec-
tiva, quatro artigos compõe essa unidade, sendo o primeiro deles o arti-
go	de	Nanci	Stancki	da	Luz	–	“Desafios	e	avanços	nas	políticas	públicas	
de	gênero”		–	no	qual	a	autora	analisa	os	conceitos	de	política	pública,	
destacando	a	relevância	das	políticas	de	gênero	para	a	construção	de	
um	mundo	justo	e	igualitário.	Tais	políticas	são	consideradas	importan-
tes aliadas no processo de desconstrução de estereótipos de gênero e 
eliminação das discriminações negativas. Por outro lado, contribuem 
para que mulheres tenham acesso aos direitos fundamentais e se con-
solide a igualdade e a justiça social. 
O artigo “Direitos sexuais e reprodutivos: a reprodução, a sexua-
lidade	e	as	políticas”,	de	Marlene	Tamanini,	discute	a	temática	direitos	
sexuais e reprodutivos com base na perspectiva dos direitos humanos. 
A autora traz uma discussão sobre as desigualdades de gênero e como 
elas contribuem para a não concretização dos direitos reprodutivos e 
sexuais, enquanto liberdade, direito à assistência, atendimento e infor-
mação, autonomia e escolha. 
“Homofobia e a escola”, de Toni Reis, considera que a escola é um 
lugar privilegiado para promover a cultura do respeito às diferenças, à 
diversidade e da inclusão social, rumo a uma verdadeira democracia em 
que todos os cidadãos e cidadãs possam conviver com igualdade e sem 
discriminação. Para o autor, no entanto, quando se trata de homosse-
xualidade, o tema ainda é cercado de preconceitos, presentes também 
no ambiente escolar, e que podem se transformar em discriminação e 
marginalização das pessoas. 
Finalizando	 essa	 unidade,	 Lindamir	 Salete	 Casagrande,	 Marília	
Gomes de Carvalho e Nanci Stancki da Luz, no artigo “O olhar não é mais 
o mesmo: uma análise sobre os resultados de um curso sobre gênero e 
sexualidade na escola”, apresentam uma análise das respostas dos pro-
�ssionais de educação sobre questões que buscavam identi�car as pos-
18
apresentação
síveis	transformações	que,	por	ventura,	tivessem	ocorrido	nos	olha-
res dos(as) participantes após o curso. “O olhar não é mais o mesmo” 
– frase retirada da fala de uma dupla de professores (um homem e 
uma mulher), sobre as transformações em suas formas de enxergar e 
perceber as questões de gênero no ambiente escolar e na sociedade 
em geral, após a realização do curso, representa simbolicamente o 
resultado do trabalho desenvolvido por todas as pessoas que se en-
volveram neste projeto.
Vale destacar que o projeto que originou este material foi pen-
sado e coordenado pelas professoras Dra. Nanci Stancki da Luz, Dra. 
Marília	Gomes	de	Carvalho	e	Ms.	Lindamir	Salete	Casagrande,	mas	só	
foi	possível	 a	 sua	 concretização	devido	à	 consolidação	de	diversos	
apoios e parcerias, aos quais agradecemos imensamente por contri-
buírem	na	construção	de	uma	educação	com	eqüidade	de	gênero	e	
respeito à diversidade. Nesse sentido, agradecemos: 
À Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversi-
dade do Ministério da Educação (Secad/MEC), por apoiar propostas 
que contribuem para a construção da eqüidade de gênero no am-
biente escolar.
À Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) que, 
em seus cem anos de existência, sempre contou com pessoas dispos-
tas	a	contribuir	para	a	educação	do	país	e,	nesse	momento	particular,	
de	implementação	do	projeto,	disponibilizou	seu	espaço	físico,	para	
a	realização	do	curso,	e	pessoas,	que	contribuíram	para	o	bom	desen-
volvimento das atividades. 
Ao Programa de Pós-graduação em Tecnologia (PPGTE), por 
entender	a	importância	dos	estudos	de	gênero	e	colaborar	para	que	
essas discussões sejam difundidas na sociedade. 
Ao Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Relações de Gênero 
e Tecnologia (GeTec), vinculado ao PPGTE, por se consolidar como 
um espaço para estudos, desenvolvimento de pesquisas e de proje-
tos de extensão à comunidade, o que possibilitou discutir, elaborar e 
executar o projeto “Construindo a igualdade na escola: repensando 
conceitos	e	preconceitos	de	gênero”,	no	âmbito	desse	grupo	de	pes-
quisas. 
Às autoras e aos autores deste livro, aos docentes do curso e 
demais colaboradores e colaboradores(as) do projeto. 
19
nanci stancki da luz, marília gomes de carvalho e lindamir salete casagrande
Às pessoas que participaram do curso, pelo enriquecimento dos 
debates, pela partilha de suas experiências e conhecimentos e pela de-
monstração de vontade e potencial de transformação da realidade edu-
cacional brasileira. 
A todos e todas que algum dia virão a ler este material, pela opor-
tunidade	de	podermos	apresentar	reflexões	sobre	a	realidade	escolar	e	
discutir propostas de uma escola sem preconceitos e discriminações. 
Desejamos que os ideais que incorporam este material sejam as-
sumidos a cada dia por mais educadores e educadoras, para que a esco-
la	possa	contribuir	para	a	concretização	do	princípio	da	igualdade	e	para	
a construção de um mundo com justiça social. 
21
marília gomes de carvalho e cíntia de souza batista tortato
1
GÊNERO: CONSIDERAÇÕES SOBRE O CONCEITO 
Marília Gomes de Carvalho 
Cintia Souza Batista Tortato 
 Introdução
Gênero é uma palavra que necessariamente pede uma explicação a res-
peito de seu signi�cado. Serve para classi�car fenômenos os mais di-
versos tais como gêneros de literatura, de cinema, de música, dos seres 
vivos na escala biológica, en�m é um termo classi�catório.
No	contexto	deste	capítulo	gênero	será	utilizado	como	uma	pala-
vra que serve para classi�car as pessoas na sociedade, de acordo com o 
sexo que possuem, ou seja, se são do sexo feminino e/ou do sexo mas-
culino. No entanto, a construção social do gênero é muito mais comple-
xa do que simplesmente uma classi�cação das pessoas em mulheres ou 
homens. No campo das Ciências Sociais a complexidade é ainda maior 
porque depende das diferentes correntes teóricas que interpretam o 
gênero (mulher/homem) de formas diversas, ora considerando-o dire-
tamente relacionado ao sexo, ou seja sexo feminino = gênero feminino 
e sexo masculino = gênero masculino, ora desvinculando o gênero do 
sexo, sem que haja uma relação direta entre estes dois fenômenos. Para 
outras correntes há dois sexos, porém múltiplos gêneros 
O termo gênero possui portanto muitos signi�cados, de acordo 
com as diferentes abordagens que existem sobre o fenômeno da cons-
trução social do masculino e do feminino pela sociedade e pela cultura. 
O conceito de gênero apresenta, diferentes concepções, diferentes fo-
22
gênero: considerações sobre o conceito
cos de análise conforme as bases teóricas que lhe servem de susten-
tação.	Por	esta	 razão,	o	principal	objetivo	deste	capítulo	é	 trazer	uma	
discussão sobre estas diversas abordagens, enfatizando o conceito que 
norteia o conteúdo do livro que trata de várias dimensões da vida social, 
todas elas perpassadas pelo gênero. 
Nem sempre este foi um termo utilizado pelos cientistas da socie-
dade que até recentemente (anos 60) não se preocupavam com a cons-
truçãosocial de mulheres e homens. Na verdade, no mundo acadêmico, 
o termo gênero surgiu no momento em que pesquisadoras feministas 
buscavam, através dos chamados estudos sobre mulheres, desnaturali-
zar a condição da mulher na sociedade (SIMIÃO, 2005). 
Foram os estudos feministas os que inicialmente tinham a inten-
ção de desnaturalizar as condições das mulheres na sociedade, descons-
truir a idéia de que tudo aquilo que se refere à mulher está na sua na-
tureza feminina, ou seja, estes estudos problematizaram a idéia de que 
determinadas	características	são	da	essência	 feminina	e	outras	são	da	
essência masculina. Nessa linha de pensamento �ca entendido como 
natural e da sua essência que a mulher seja mãe, natural e da sua essên-
cia	que	seja	delicada,	sensível,	obediente,	amorosa,	afetiva,	etc,	como	
se	 tais	 características	estivessem	na	carga	genética,	na	biologia.	 Estas	
características	eram	desvalorizadas	pela	sociedade	ocidental	de	merca-
do,	onde	a	competitividade	e	agressividade	(características	vistas	como	
naturais e essencialmente masculinas) eram mais valorizadas. Assim, 
as desigualdades entre homens e mulheres foram interpretadas como 
naturais. Era interpretado como algo que não poderia ser modi�cado. 
Estava na carga genética dos homens, e na sua essência, serem seres 
superiores e, por outro lado, estava na carga genética das mulheres, por-
tanto na sua essência, serem inferiores.
Segundo Silva (2007, p. 253):
No	século	XIX	surgiram,	particularmente	no	campo	da	antropologia	física,	
teorias que explicaram a inferioridade feminina com base na biologia. Este 
campo explicativo tomou muita força na sociedade moderna pois teria o 
“aval” da ciência. Contrapondo-se a esta perspectiva, o movimento femi-
nista problematizou e reconstruiu argumentos em torno da determinação 
biológica das hierarquias entre homens e mulheres, colocando em xeque 
as concepções relativas ao feminino e masculino na sociedade ocidental.
23
marília gomes de carvalho e cíntia de souza batista tortato
Para Pedro (2005, p. 78):
O uso da palavra “gênero”, como já dissemos, tem uma história que é tribu-
tária de movimentos sociais de mulheres, feministas, gays e lésbicas. Tem 
uma trajetória que acompanha a luta por direitos civis, direitos humanos, 
en�m, igualdade e respeito.
A	 naturalização	 das	 características	 femininas	 e	masculinas	 des-
considera que tanto mulheres como homens as adquirem e aprendem 
na vida social, (em nossa sociedade, hoje ainda antes do nascimento) 
através das expectativas criadas pelos pais e por todo o meio social, tão 
logo sabem o sexo do bebê que está para nascer. Essas expectativas, 
para a maioria das pessoas, traduzidas nas cores e brinquedos dos en-
xovais, na decoração dos quartos, na escolha dos acessórios e até na 
forma como a mãe se comunica com o bebê em seu ventre, já carregam 
as formas de entender o que é ser homem e o que é ser mulher e conse-
qüentemente o que será ensinado ao novo ser. 
Para Louro (1997, p. 21):
O argumento de que homens e mulheres são biologicamente distintos e 
que a relação entre ambos decorre dessa distinção, que é complementar e 
na qual cada um deve desempenhar um papel determinado secularmente, 
acaba	por	ter	o	caráter	de	argumento	final,	irrecorrível.	Seja	no	âmbito	do	
senso	comum,	seja	revestido	por	uma	linguagem	“científica”,	a	distinção	se-
xual serve para compreender - e justi�car – a desigualdade social.
 A relação direta entre as desigualdades sociais e a biologia, ex-
plicando as diferenças como uma contingência da natureza, ainda é 
freqüente nas falas e atitudes das pessoas. Nos dias de hoje, ainda são 
comuns matérias de jornais ou revistas, enfocando as diferenças biológi-
cas entre homens e mulheres, tamanho ou peso do cérebro, número de 
neurônios, capacidade intelectual para números ou habilidade natural 
para determinadas aprendizagens, como tentativas de “provar cienti�-
camente o porquê das desigualdades entre o masculino e o feminino” 
(AUAD, 2006, p. 14). 
 Citeli (2001, p. 132) complementa:
...desnaturalizar hierarquias de poder baseadas em diferenças de sexo tem 
sido um dos eixos centrais dos estudos de gênero. Estabelecer a distinção 
entre os componentes — natural/biológico em relação a sexo e social/
24
gênero: considerações sobre o conceito
cultural em relação a gênero — foi, e continua sendo,um recurso utilizado 
pelos estudos de gênero para destacar essencialismos de toda ordem que 
há séculos sustentam argumentos biologizantes para desquali�car as mu-
lheres, corporal, intelectual e moralmente.
Esta postura leva à posição de que é preciso distinguir sexo de gê-
nero, pois não são a mesma coisa e devem ser vistos como fenômenos 
que nem sempre têm uma relação direta e determinista.
Distinção entre sexo e gênero
“Sexo” é um dado biológico e “gênero”, uma construção cultural. É pre-
ciso descolar o sexo do gênero para entender as questões culturais que 
envolvem	os	comportamentos	e	características	femininas	e	masculinas	
nas mais diferentes sociedades e culturas. Considerar o gênero como 
uma contingência do sexo biológico é uma postura reducionista, pois 
torna limitado o desenvolvimento total das pessoas, direcionando-as 
aos ditames da natureza, levando a interpretações universais que não 
cabem nos fatos próprios da cultura. Para Diniz; Vasconcelos e Miranda 
(2004, p. 27): “Diferentemente do sexo, o gênero é uma produção social, 
aprendido, representado, institucionalizado e transmitido ao longo de 
gerações.”
Utilizando-nos da referência de Costa, 1994, que faz uma revisão 
de literatura sobre as formas com que o conceito de gênero foi enten-
dido nos meios acadêmicos, podemos dizer que, diante da di�culdade 
de categorizar as questões de gênero com base nas diferenças sexuais, a 
autora explica que o meio acadêmico foi trilhando outros caminhos para 
construção do conceito de gênero. Buscando outras interpretações, tais 
como: “... papéis dicotomizados, gênero como uma variável psicológi-
ca, como sistemas culturais e como relacional” (COSTA, 1994, p. 147), 
foi	possível	compreender	que	gênero	e	sexo	não	possuem	uma	relação	
unívoca,	mas	que	a	complexidade	do	fenômeno	é	bem	maior.
Gênero e as características binárias
O gênero visto como a construção e a prática de papéis dicotomizados 
considera que as representações de masculino e feminino são aprendi-
das através do desempenho de papéis determinados socialmente para 
homens	e	para,	com	características	contrárias	e	opostas.	Esta	visão	di-
25
marília gomes de carvalho e cíntia de souza batista tortato
cotômica e binária da questão de gênero deixa de fora da análise as re-
lações de gênero e poder, criando estereótipos de papéis de homem e 
de mulher. Essa visão também não explica como os papéis são de�nidos 
e quem os determina, ocultando a hierarquização e desigualdade en-
tre papéis masculinos e femininos que existe na sociedade. De maneira 
geral	as	dicotomias	entre	o	masculino	e	 feminino	seguem	um	raciocí-
nio baseado em construções sociais de uma sociedade historicamente 
comandada e organizada sob a ótica masculina, onde “(...) a sociedade 
impõe certos papéis para os homens e outros para as mulheres e que 
vão determinar a forma como homens e mulheres se vêem e como se 
relacionam uns com os outros” (SIMIÃO, 2005, p.10)
Gênero, então, pode referir-se à apreensão da diferença entre os 
sexos, apresentada de forma categórica, ou seja, a sociedade cria cate-
gorias de homens e de mulheres para as diferenças de sexo. Essa cate-
gorização acontece tanto para diferenças tidas como inatas como para 
aquelas	tidas	como	construídas	socialmente.	
Algumas	das	características	baseadas	em	estereótipos	atribuídos	
ao masculino e ao feminino estão representadas sinteticamente pela ta-
bela abaixo:
MASCULINO FEMININO
Objetividade Senso Comum
Universalidade LocalidadeRacionalidade Sensibilidade
Neutralidade Emoção
Dominação Passividade
Cérebro Coração
Controle Descontrole
Conhecimento Natureza
Civilizado Primitivo
Público Privado
A	dualidade,	além	de	limitar	as	características	de	cada	gênero	em	
seu	próprio	universo,	torna	invisível	a	 interdependência	entre	o	par.	É	
26
gênero: considerações sobre o conceito
como se, a partir do nascimento, de acordo com o sexo biológico, mu-
lheres	 e	homens	estivessem	engessados	em	um	 rol	de	 características	
destinadas, de�nitivas e previstas para cada sexo. 
Os estudos de gênero trazem à discussão o fato de que as carac-
terísticas	masculinas	 e	 femininas	 são	 entendidas	 como	 resultado	de	
aprendizagem. Homens e mulheres aprendem a assumir determina-
dos	comportamentos,	atitudes,	características	e	sentimentos,	de	acor-
do suas experiências de vida e com o contexto onde vivem. A dicoto-
mia	e	a	oposição	entre	as	características	de	homens	e	de	mulheres	é,	
portanto	inadequada,	pois	é	perfeitamente	possível	que	as	mulheres	
assumam	 características	 de	 objetividade	 e	 racionalidade	 em	 certas	
situações da vida, que assim o exigem, e, em outras situações sejam 
amorosas e afetivas. Por outro lado, homens podem ser emotivos, sen-
síveis	e	afetivos	sem	que	com	isto,	sejam	considerados	mulheres.	Essa	
aprendizagem dá aos seres humanos a possibilidade de transitarem 
entre	as	características	mais	comuns	de	cada	gênero,	sem	que	se	confi-
gure em um problema ou uma inadequação, do ponto de vista social. 
Gênero como uma variável psicológica
Considerar o gênero como uma variável psicológica foi a opção de 
alguns pesquisadores ligados à área da psicologia que “optaram por 
conceituar gênero como uma orientação ou força da personalidade” 
(COSTA, 1994, p. 150). Com base em padrões de comportamento, ou 
“jeitos de ser” essa visão acaba por reforçar as diferenças entre o que é 
considerado feminino ou masculino e assim mantém as diferenças que 
seriam problematizadas (SIMIÃO, 2005, p. 11).
Esta percepção do gênero mantém a visão binária, pois existem 
comportamentos que são considerados mais próprios de mulheres e 
outros, geralmente o seu oposto, para os homens. Não altera, portan-
do a dicotomia.
Gênero como Tradução de Sistemas Culturais 
Essa perspectiva entende o gênero como dois sistemas culturais distin-
tos.	De	acordo	com	a	perspectiva	dicotômica	já	na	infância,	meninos	e	
meninas são educados para agir e se comunicar de forma diferencia-
da. A eles são ensinados direitos e deveres diferentes, criando assim 
27
marília gomes de carvalho e cíntia de souza batista tortato
as subculturas de gênero que se caracterizam por crenças, padrões de 
sociabilidade e maneiras de pensar opostas e divergentes e, quando 
tentam se comunicar entre si, geralmente são mal sucedidos (COSTA, 
1994).
Essa perspectiva vê as subculturas de gênero como sendo ho-
mogêneas, como se todas as mulheres fossem iguais entre si, assim 
como todos os homens possuem as mesmas maneiras de ser, não le-
vando em consideração diferenças de classe, raça, etnia, idade etc
Gênero como Relacional 
Para Costa (1994) o ponto de partida para a compreensão das ques-
tões	 de	 gênero	 numa	 visão	 relacional	“não	 é	 o	 indivíduo,	 nem	 seus	
papéis, mas o sistema social de relacionamentos dentro dos quais os 
interlocutores se situam” (COSTA, 1994, p.158). A forma relacional de 
entender as questões de gênero, como o nome sugere, leva em consi-
deração uma série de relações que circundam a questão, abandonan-
do a visão dicotômica de gênero e da divisão de papéis, onde não se 
reconhece “uma essência masculina ou feminina, de caráter abstrato e 
universal (...)” (MORAES, 1998, p.100). Na visão relacional, o masculino 
e	o	feminino	não	são	dois	mundos	à	parte,	as	características	podem	va-
riar, é a concepção de múltiplas masculinidades e feminilidades onde 
se privilegia a pluralidade.
Segundo Louro (1997, p.22):
O conceito passa a ser usado, então, com um forte apelo relacional – já 
que	é	no	âmbito	das	relações	sociais	que	se	constroem	os	gêneros.	Deste	
modo, ainda que os estudos continuem priorizando as análises sobre as 
mulheres,	eles	estarão	agora,	de	forma	muito	mais	explícita,	referindo-se	
também aos homens.
A visão relacional de gênero representa um avanço, pois leva em 
conta	o	contexto	em	que	os	indivíduos	estão	inseridos,	as	relações	de	
poder, as crenças, as etnias, “o conceito passa a exigir que se pense de 
modo plural (...)” (LOURO, 1997, p. 23). Desta forma chama-se atenção 
para o fato de que não importa negar as diferenças, interessa a�rmar 
que as diferenças podem ser enfatizadas, negadas, interpretadas, es-
tudadas,	diminuídas	ou	atribuídas	a	diferentes	fatores	de	acordo	com	
as	circunstâncias.
28
gênero: considerações sobre o conceito
Considera-se, neste trabalho, o gênero como um sistema de sig-
nificados	atribuídos	ao	masculino	e	ao	feminino	e	quando	se	fala	em	
significados	 se	 fala	 em	cultura	no	 sentido	 antropológico.	Daí	 a	 con-
sideração de que muito do que diz respeito a gênero e suas constru-
ções sociais vêm da cultura e não da biologia. É a partir da cultura que 
determinados signi�cados são imputados aos objetos, às atitudes, às 
crenças, aos costumes e aos comportamentos, é também a partir da 
cultura	que	são	construídos	os	significados	atribuídos	ao	masculino	e	
ao feminino.
 Para Mariano (2008, p. 355):
Gênero,	como	categoria	analítica	elaborada	nos	estudos	feministas,	tem	a	
função de colocar luz sobre as diferentes posições ocupadas por homens 
e mulheres nos diversos espaços sociais, dando destaque ao modo como 
as	diferenças	construídas	socialmente	resultam	em	critérios	de	distribui-
ção de poder, portanto, em como se constroem as relações de subordi-
nação.
Assim, o gênero também é considerado como constitutivo da 
vida social, está presente em todos os aspectos da vida social e assume 
conteúdos	específicos	em	contextos	particulares.	Scott,	uma	das	prin-
cipais	pesquisadoras	da	questão	em	nível	internacional,	afirma	que	“o	
gênero é um elemento constitutivo de relações sociais baseadas nas 
diferenças percebidas entre os sexos” e “uma forma primária de dar 
signi�cado às relações de poder” (SCOTT, 1995, p.86). Em determina-
das culturas, por exemplo, pode ser observado como uma prática mais 
comum determinados tipos de trabalho serem executados por mulhe-
res enquanto em outras , trabalhos semelhantes podem ser realizados 
por homens. São questões que podem mudar de sociedade para so-
ciedade, con�rmando que os papéis de gênero desempenhados por 
homens e mulheres são construções sociais inseridas em certa cultura 
e seus signi�cados resultam dessa relação. 
A questão a ser destacada não é o fato de existirem trabalhos 
ou ações realizados mais comumente por homens ou por mulheres. O 
que se questiona é a hierarquização dessas ações e desses trabalhos, 
colocando os homens e as mulheres que os realizam em posições so-
ciais desiguais, de dominação e subordinação.
29
marília gomes de carvalho e cíntia de souza batista tortato
Conseqüências do uso da noção de gênero 
Ao abordar a questão de gênero como construção social passa-se a 
descon�ar dos dualismos universais, dualismos que colocam as carac-
terísticas	de	homens	e	mulheres	como	fixas,	diferentes	e	muitas	vezes	
opostas,	e	ainda	pretendem	universalizar	essas	características	como	se	
as mulheres fossem todas iguais em toda parte do mundo ou até den-
tro uma mesma sociedade, criando essencialismos universais tanto para 
elas, como para os homens.
 A partir da noção de gênero assumida neste trabalho, as dife-
renças não são tomadas como inquestionáveis, não há uma predispo-
sição	para	esse	ou	aquele	comportamento	ou	características	com	base	
no	sexo	das	pessoas.	Não	há	características	restritas	ao	feminino	ou	ao	
masculino, não há como considerar habilidadesou di�culdades pró-
prias	de	mulheres	ou	de	homens,	as	características	são	construídas	ao	
longo da experiência vivida, independente do sexo. As diferenças tidas 
como inatas ou essenciais também passam a ser questionadas a partir 
desta noção de gênero, uma vez que a questão da construção social não 
embasa a idéia de que as diferenças estejam demarcadas pela natureza. 
Nesse sentido a célebre frase de Simone de Beauvior que diz que nin-
guém nasce mulher, mas torna-se mulher ilustra adequadamente essa 
idéia.
Toda e qualquer diferença deve ser entendida contextualmente. 
Assim, as diferenças intra-gêneros, aquelas que se referem ao um mes-
mo gênero e as diferenças inter-gêneros, referindo-se a diferentes gêne-
ros precisam ser consideradas e entendidas em seus próprios contextos, 
de modo a não cair em outros determinismos e outras desigualdades. 
Perpassando a questão de gênero é preciso considerar também as ques-
tões de etnia, classe social e outras diferenças sociais.
 Ao limitar a conceituação de gênero nas diferenças sexuais es-
tamos deixando à margem todo o contexto sócio-histórico-cultural em 
que	os	indivíduos	estão	inseridos.
Na	educação	das	crianças,	o	esforço	em	acalmar	os	ímpetos	das	
meninas, comumente percebido nas escolas desde a educação infantil, 
onde a menina é educada para conter-se, controlar-se, sentar direito, fa-
lar baixo, ser delicada, e comportar-se como uma menina. Na educação 
dos meninos já se observa o contrário, eles são incentivados desde cedo 
30
gênero: considerações sobre o conceito
a terem iniciativa, serem mais agressivos, colocarem suas opiniões e se 
expandirem muito mais. Mesmo na escola, faz parte das expectativas 
das professoras desde as séries iniciais, que os meninos sejam mais ati-
vos e descontrolados em termos de comportamento do que as meninas. 
Quando acontece o inesperado é que surgem os problemas mais sérios, 
decorrentes das visões estereotipadas e preconceituosas de gênero. 
Na	 família,	 desde	 que	 a	 criança	 nasce	 essa	 forma	 de	 ensinar	 o	
controle	do	comportamento	da	menina	e	uma	maior	tolerância	ou	até	
incentivo quanto à falta de controle do comportamento dos meninos é 
uma observação muito comum em nossa sociedade. O que mais tarde 
vai	ser	evidenciado	na	escola	já	vem	desde	a	vida	em	família,	nas	formas	
diferenciadas de educar meninos e meninas.
1 Inúmeras autoras que interpretaram o gênero sob diferentes óticas podem ser citadas. 
Dentre elas: Rosaldo e Lamphere (1979);, Chodorow (1979); Butler (2003); Nicholson (2000); 
Strathern (2006); Scott (1995); dentre as brasileiras Heilborn (1992); Grossi (2006); Corrêa 
(2001); Piscitelli (1997); Louro (1997); Bruschini (1994); Costa (1994); Citeli (2001); dentre ou-
tras.
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TABAK, Fanny. O laboratório de Pandora: estudos sobre a ciência no feminino. 
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33
beatriz l. ferreira e nanci stancki da luz
2
SEXUALIDADE E GÊNERO NA ESCOLA 
Beatriz Maria Megias Ligmanovski Ferreria 
Nanci Stancki da Luz
Introdução
A sexualidade envolve inúmeros aspectos pessoais – histórias de 
vida, crenças, valores, diversidade, pluralidade e sentimentos – e 
também	 sociais,	 políticos,	 culturais	 e	 econômicos.	 Tratar	 o	 tema	
nem sempre é fácil, enfrenta resistências, particularmente quando 
se	refere	à	sua	inclusão	no	currículo	escolar.	A	escola,	que	cotidia-
namente produz e reproduz modelos de sexualidade, nem sempre 
consegue explorar toda sua potencialidade e dimensão. 
A partir da década de 1980 a escola passa a apresentar preo-
cupações	com	a	AIDS	(Síndrome	da	Imunodeficiência	Adquirida).	A	
falta de informações a respeito dessa doença, o crescimento no nú-
mero de contaminações e a associação com práticas sexuais revelou 
a necessidade de discutir a sexualidade, quebrando resistências. A 
inserção do tema, entretanto, ocorreu de forma bastante limitada e 
com	ênfase	na	prevenção	de	doenças	sexualmente	transmissíveis.		
O tema sexualidade revela-se polêmico, envolvendo tabus, 
medos, questões religiosas, morais e éticas – o que dificulta a busca 
de consensos de como a educação formal deveria abordá-lo. Essa 
dificuldade muito se deve ao fato de que a sexualidade é vista de 
forma restrita, associada ao ato sexual, desconsiderando a relação 
com o corpo, o prazer e o desejo. Sexualidade não é sinônimo de 
sexo, é muito mais que isso: é energia que possibilita encontros, 
trocas e experiências; influencia pensamentos, sentimentos, açõese	interações	e,	portanto,	tem	a	ver	com	a	saúde	física	e	mental	do	
ser humano. 
34
sexualidade e gênero na escola
De forma geral, fala-se muito em sexo e pouco em sexualidade. 
O sexo chega a ser banalizado em produções culturais – programas 
de TV e rádio, músicas, revistas – que constantemente apresentam 
o corpo como objeto de consumo. O erotismo, a nudez e cenas de 
sexo são utilizadas cotidianamente para vender produtos ou ganhar 
pontos numa verdadeira guerra de audiência e disputa de leitores e 
leitoras. 
 Para Abreu (1996) a sexualidade – massivamente presente 
em nossa cultura – quase sempre se sujeita a limitações. Formas de 
humor,	representações	da	mulher,	roupas,	intenções	eróticas	explí-
citas na publicidade apontam obsessivamente em direção a práticas 
sexuais num contexto em que o modelo de mercado/consumo ab-
sorve uma “nova moral”, e a representação transgressiva da sexuali-
dade ganha formatos e padrões que a transforma em mercadoria. 
Se por um lado, o sexo é transformado em “mercadoria” que 
necessariamente deve ser massificada e “consumida” sem qualquer 
critério ético e moral, por outro, assistimos a um processo de re-
sistência conservadora na qual se reforça a idéia de algo sujo, feio, 
proibido ou pecaminoso, e cuja “purificação” ocorreria por meio de 
relações “estáveis” e heterossexuais. 
É necessário desconstruir a amálgama entre sexo (ato sexu-
al) e sexualidade, para que se possa considerar a sexualidade em 
uma dimensão ampla, contemplando seus diversos aspectos, e que, 
por	 sua	 relevância,	 receba	 atenção	 necessária	 nos	 processos	 edu-
cacionais. A liberação sexual total e irrestrita ou a repressão geral 
parecem ser modelos que não contribuem para que as pessoas se 
cuidem, respeitem a si próprias, mantenham sua auto-estima e vi-
vam sua sexualidade como um direito que, para se efetivar, também 
exige responsabilidade. 
Este texto apresenta parte das reflexões sobre gênero e sexua-
lidade do Módulo I – Gênero e Sexualidade – do curso “Construindo 
a igualdade na escola: repensando conceitos e preconceitos de gê-
nero”,	no	qual	participaram	328	pessoas	distribuídas	em	06	turmas.	
Dessa forma, consiste num trabalho coletivo, pensado inicialmente 
pelas docentes do módulo – Nanci Stancki da Luz e Beatriz Maria 
Megias Ligmanovski Ferreria – mas que teve colaboração valiosa de 
todas as pessoas que participaram do curso. 
35
beatriz l. ferreira e nanci stancki da luz
Sexualidade e gênero: conceitos em interação
Abramovay (2004) de�ne sexualidade como uma das dimensões do ser 
humano que envolve gênero, identidade sexual, orientação sexual, ero-
tismo, envolvimento emocional, amor e reprodução. É experimentada 
ou expressa em pensamentos, fantasias, desejos, crenças, atitudes, va-
lores, atividades, práticas, papéis e relacionamentos. Os componentes 
socioculturais,	dessa	forma,	revelam-se	críticos	para	essa	conceituação,	
que se refere tanto às capacidades reprodutivas quanto à questão do 
prazer. 
A sexualidade é algo complexo e não pode ser separada dos as-
pectos	social,	político,	cultural	e	econômico,	tampouco	associada	ape-
nas a determinadas fases da vida humana. Ela está presente desde a 
concepção até a morte. Quando ainda bebês, a sexualidade pode ser 
percebida no ato da amamentação, nos brinquedos, nas brincadeiras, 
nas roupas, no toque, no conhecimento do próprio corpo, no contato 
físico	com	a	mãe	ou	pai,	gerando	sensação	de	bem-estar.	
Na puberdade ou na adolescência, as sensações de prazer são, em 
grande medida, voltadas para a região genital, por conta de uma maior 
produção	de	hormônios.	É	uma	época	de	grandes	transformações	–	fí-
sicas, emocionais, culturais e sociais. As roupas, os relacionamentos e a 
masturbação	são	formas	de	manifestação	da	sexualidade	desse	perío-
do. Na fase adulta, a sexualidade se expressa nas relações afetivas, nos 
relacionamentos sexuais, no casamento, no amor, na opção ou não de 
procriar. E, na terceira idade – não impeditiva para a vivência da sexu-
alidade – ela também se expressa nas relações afetivas e sexuais e na 
relação com o próprio corpo. 
Vale	destacar	que	não	existe	padrão	ou	uma	 relação	biunívoca	
entre faixa etária e forma de vivência da sexualidade, pois ela difere de 
pessoa para pessoa. Entretanto algo é constante: sexualidade está sem-
pre presente, pois, é a própria vida. 
Diversas áreas – Medicina, Psicologia, Psiquiatria, Biologia, Filoso-
�a, Sociologia – buscaram explicar, com base em suas perspectivas, a 
sexualidade humana. Autores (Aries, 1981; Duarte, 1996; Giddens, 1992) 
apontam que, no �nal do século XIX, o conceito de sexualidade foi focado 
na individualidade e como parte de um projeto de sociedade capitalista. 
Dumont (1993) apud Heilborn (1999) argumenta que a individualidade, 
36
sexualidade e gênero na escola
por	um	lado,	possibilitou	a	construção	de	um	sujeito	político,	livre,	por-
tador de direitos de cidadania e, por outro, erigiu a subjetividade como 
tema	central	para	a	constituição	da	identidade.	Nesse	período	a	sexu-
alidade desperta diferentes formas de saber e buscam problematizar 
um “novo individuo”, dando espaço para o surgimento de movimentos 
como o do médico-higienista, no qual o corpo é um objeto de estudo e 
intervenção. Nesta última perspectiva, diferentes áreas do saber busca-
ram explicar o corpo, particularmente o das mulheres. Estudos de Freud 
se destacaram ao relacionar comportamentos à subjetividade, possibili-
tando a organização e o controle dos corpos (FOUCAULT, 1984). 
Alguns eventos impulsionaram estudos a respeito da sexualida-
de, entre os quais destacamos: 
•	 o	 desenvolvimento	 de	 métodos	 contraceptivos,	 rompendo	 a	
associação	entre	o	exercício	da	sexualidade	e	a	reprodução	da	es-
pécie;
•	 o	surgimento	de	novas	reflexões	derivadas	dos	movimentos	so-
ciais organizados e de estudos advindos da academia.
A ação dos movimentos sociais, com destaque para o feminista e 
o de gays e lésbicas, contribui para o avanço signi�cativo dos estudos 
nessa área. A emergência dos estudos de gênero deu visibilidade à com-
plexidade	da	sexualidade,	explicitando	as	dimensões	sociais	e	políticas	
de um tema tratado mais no campo biológico. A relação entre sexuali-
dade, gênero, saúde e cidadania possibilitou o surgimento de discus-
sões sobre os direitos reprodutivos e direitos sexuais, contribuindo para 
a construção dos direitos individuais e coletivos. 
A forma como a sexualidade é percebida e vivida sofre interfe-
rência de uma conjunção de fatores, destacando as relações de poder e, 
particularmente, as de gênero. Essas, tradicionalmente, trazem em seu 
âmago	construções	de	masculino	e	de	feminino	nas	quais	a	sexualidade	
é vista, ensinada e controlada de formas distintas quando se trata de 
homens e mulheres. 
Gênero é uma categoria que ajuda a entender o processo de 
construção social do masculino e do feminino, recolocando o debate no 
campo social: 
37
beatriz l. ferreira e nanci stancki da luz
 [...] pois é nele que se constroem e se reproduzem as relações (desiguais) 
entre os sujeitos. As justi�cativas para as desigualdades precisariam ser 
buscadas não nas diferenças biológicas (se é que mesmo essas podem ser 
compreendidas fora de sua constituição social), mas sim nos arranjos so-
ciais, na história, nas condições de acesso aos recursos da sociedade, nas 
formas de representação (LOURO, 1997:22). 
Adotar essa perspectiva de análise para gênero e sexualidade 
permite entender que a sexualidade, assim como o que é percebi-
do como masculino e feminino, está associada a contextos históri-
cos,	culturais,	sociais	e	econômicos	específicos	que	participam	dessa	
construção. 
Nesse sentido, o espaço escolar é um espaço relevante e que 
produz, reproduz, rea�rma, desconstrói e legitima imagens e repre-
sentações de gênero e sexualidade. Esse espaçoé, no entanto, con-
traditório, pois, assim como pode reproduzir, pode também transfor-
mar. 
Para Freire (2003) educar é construir, libertar homens e mulhe-
res do determinismo, passando a reconhecer o seu papel na história, 
considerando a sua identidade cultural na sua dimensão individual e 
coletiva. Sem respeitar essa identidade, sem autonomia ou sem levar 
em conta as experiências vividas, o processo educativo será inoperan-
te e constituirá somente um conjunto de meras palavras, despidas de 
signi�cação real. 
A escola, dessa forma, pode reproduzir papéis de gênero e 
modelos de sexualidade que oprimem, mas que também podem 
construir relações que libertem e nas quais a dignidade humana e a 
igualdade	de	direitos	poderão	 ser	princípios	norteadores.	A	 legisla-
ção brasileira traz essa perspectiva, prevê a igualdade de direitos e 
deveres entre homens e mulheres e estabelece entre os objetivos da 
República Federativa a promoção do bem de todas as pessoas, sem 
preconceitos ou qualquer outra forma de discriminação. A concreti-
zação	desse	objetivo	depende	de	reflexões	sobre	gênero	e	sexualida-
de, para que essas categorias deixem de ser utilizadas para classi�car, 
discriminar e excluir e contribuam para a criação de novas formas de 
abordagem que desconstrua preconceitos e discriminações – ativida-
des que pode ser assumida pela escola. 
38
sexualidade e gênero na escola
Sexualidade e gênero na escola
A instituição escolar pode e deve contribuir para uma educação cida-
dã e libertadora que contemple a dimensão sexual, a diversidade, os 
direitos humanos e a multiculturalidade. Todavia, para que isso ocorra 
é necessário a implementação de novas praticas pedagógicas. 
A sexualidade e o gênero – em constante construção – fazem 
parte das pessoas que compõe a comunidade escolar. Mesmo que a 
educação não assuma formalmente esse debate, ele está permeando 
as relações entre docentes e discentes. Para Louro (2007), a sexuali-
dade	não	é	apenas	uma	questão	pessoal,	mas	social	e	política,	sendo	
construída	ao	longo	de	toda	uma	vida,	de	muitos	modos,	por	todos	os	
sujeitos, particularmente, os envolvidos no processo educacional. 
Se é papel da escola tratar da sexualidade, como essa deve ser 
abordada? Docentes se sentem preparados para isso? Quais as di�cul-
dades e obstáculos que estariam impedindo a inserção da temática 
“gênero e sexualidade” na escola? 
Relatos dos participantes do curso “Gênero e Sexualidade” con-
�rmam a di�culdade em se trabalhar a temática sexualidade e gêne-
ro: 
Existe di�culdade para se trabalhar o assunto sexualidade em sala de 
aula, por conta do preconceito, por falta de preparo e informação dos 
professores, questões religiosas, construção social. Não existe prepara-
ção, cursos na academia sobre o tema. A sociedade é formada por insti-
tuições	que	têm	seus	princípios	construídos	historicamente,	que	tendem	
a transformar a sexualidade em tabu. (PARTICIPANTE 1)
Os participantes do curso apontaram dois fatores relevantes e 
que di�cultam o debate do tema: 
a) resistência familiar – pais e mães rejeitam a idéia de que seus 
�lhos e �lhas tenham informações a respeito, temendo que a 
sexualidade seja estimulada; 
b) professores não se sentem preparados, tanto para enfrentar 
as resistências ao tema quanto para abordá-lo, que acaba restri-
to a docentes da área Biológica e, por conseqüência, também 
focado em aspectos biológicos.
39
beatriz l. ferreira e nanci stancki da luz
No	que	se	refere	à	tolerância	com	a	diversidade,	a	fala	da	Partici-
pante 2 expressa um sentimento comum: 
Não [a escola não é tolerante]. É preciso enfrentar o sexismo, o machismo, a 
homofobia e racismo nas escolas, a partir da aquisição de conhecimentos, 
mudanças	de	posturas	e	da	 luta	por	políticas	publicas	educacionais	que	
apóiem o trabalho pedagógico. (PARTICIPANTE 2)
Para reverter a ausência de discussão sistematizada a respeito da 
sexualidade, bem como o tratamento preconceituoso que é dado ao 
tema, o protagonista dessa mudança – a professora ou professor – pre-
cisa	ter	domínio	sobre	o	assunto,	refletir	e	problematizar	essa	questão,	
assumindo	 a	 importância	 desse	 debate	 para	 a	 formação	de	 gerações	
futuras,	bem	como	a	relevância	de	uma	educação	calcada	em	valores	
humanos e no respeito aos direitos individuais e coletivos, eliminando 
qualquer tipo de discriminação do ambiente escolar. 
Para Whitaker (1989), o fato de educadores e educadoras não do-
minarem a problemática de gênero contribui para a continuidade de 
velhas crenças impregnadas de ideologias desvalorizadoras do papel da 
mulher	na	“história”,	o	que	se	encontra	nos	currículos	ou	na	forma	como	
esses são apresentados, trazendo uma visão masculina do universo.
Mais	do	que	rever	currículo	escolares,	há	que	se	repensar	na	for-
mação docente e enfrentar o preconceito e as violências de gênero que, 
muitas vezes, os próprios professores enfrentam no dia-a-dia de traba-
lho. Urgente também repensar o masculino e o feminino frente a uma 
realidade social que não comporta mais modelos duais e discriminató-
rios. A realidade tem exigido posturas educacionais abertas e que per-
mitam o pleno desenvolvimento humano. Conforme artigo da UNICEF 
(1999),	se	a	educação	das	meninas	e	adolescentes	tiver	como	parâmetro	
apenas a maternidade e o casamento, di�cilmente, na fase adulta, elas 
emitirão suas opiniões na sociedade ou mesmo concorrerão a um cargo 
político,	pois,	tenderão	a	assimilar,	por	meio	da	socialização,	que	essas	
são ações para os homens.
Estereótipos e preconceitos marcam a educação. A escola repro-
duz muito do que a sociedade tem esperado de comportamentos mas-
culinos e femininos. A delicadeza, a fragilidade, a discrição, a passividade, 
o pudor e a emoção são ensinados para as meninas. Em contrapartida, 
dos	meninos,	espera-se	competitividade,	agressividade,	força	física	e	ra-
40
sexualidade e gênero na escola
cionalidade,	 sob	 a	 alegação	 de	 que	 são	 características	masculinas.	
De ambos os sexos, espera-se relações heterossexuais, consideradas 
como forma “única” e “correta” de vivência da sexualidade. Constro-
em-se	dois	mundos	–	o	 real	e	o	 imaginário	–	 tão	díspares	que	não	
ajudam a construir relações igualitárias numa realidade na qual ho-
mens e mulheres vivem juntos e que nem sempre (ou quase nunca) 
se enquadram nesses padrões. Qual é o espaço das pessoas que não 
se enquadram nesses modelos? A escola pode desconsiderar que a 
realidade não comporta um modelo único? 
A sociedade tem imposto padrões de gênero e modelos de se-
xualidade que impedem o desenvolvimento individual, social e po-
lítico	de	muitas	pessoas	–	particularmente	daqueles	indivíduos	que	
não se “encaixam” no modelo hegemônico. A imposição de padrões 
fixos	e	a	 intolerância	com	a	diversidade	 têm	gerado	discriminação,	
ódio, preconceito e violência – questões que não contribuem nem 
para o desenvolvimento humano, tampouco para o social de uma 
nação. 
As instituições educacionais em geral não têm apresentado 
preocupações	com	a	diversidade,	ocultando	dos	currículos:	
(...) a multiplicidade das diferenças culturais (em especial a dos gêneros 
e das sexualidades), bem como o não-reconhecimento pedagógico do 
caráter	construído	e	político	das	 identidades	(hegemônicas	e	subordi-
nadas) e de seus sujeitos. Além desses temas estarem esquecidos, são 
freqüentemente mal trabalhados, tanto pedagogicamente quanto nas 
relações	sociais	que	se	estabelecem	na	escola,	a	despeito	das	políticas	
educacionais que atualmente contemplam tanto a questão de gênero 
quanto à da sexualidade (FURLANI, 2005, p. 225-226). 
Furlani (2005) complementa que a escola é espaços estratégi-
cos para a reflexão, para que sejam conferidos novos significados aos 
sujeitos e às práticas subordinadas. A educação deve romper com os 
padrões de identidade ditos como normaisem detrimento de outros, 
pois, como e quem tem poder para definir o que é normal ou não? 
Parece claro que as práticas sociais devem sofrer limitações, 
uma vez que a convivência humana depende de relações de respeito 
aos direitos de outras pessoas. O silêncio e os padrões pré-estabele-
cidos de gênero e sexualidade presentes na escola, no entanto, não 
41
beatriz l. ferreira e nanci stancki da luz
têm	contribuído	para	que	as	pessoas	percebam	tais	limites.	A	pedofi-
lia, a violência sexual, a violência doméstica, a homofobia, o sexismo, 
o racismo, entre outras questões revelam que o silêncio sobre o tema 
não representa possibilidades de se viver em uma sociedade que res-
peite as diferenças. O que tem imperado é individualismo, a indife-
rença,	o	egoísmo,	contribuindo	para	gerar	relações	que,	em	muitos	
casos, podem ser classificadas como patológicas e criminosas, como 
nos casos de abuso e de violência sexual e de gênero. 
Furlani (2005) contribui nessa discussão mostrando que a 
questão da identidade, da diferença e do outro é um problema pe-
dagógico e curricular, especialmente, se o outro é o outro gênero, é 
a cor diferente, é a outra sexualidade, é a outra etnia, é a outra nacio-
nalidade, é o corpo diferente. Problema maior ainda quando o outro 
não é aceito pela própria escola. 
Silva	(2000)	complementa,	alertando	que	é	imprescindível	que	
o	âmbito	escolar	mostre	que	o	“outro”	pode	ser	“eu’,	ser	“você”,	en-
fim, que o “outro” e o “eu” são as mesmas pessoas.
Gênero e sexualidade: é possível iniciar o debate na escola?
O conhecimento da realidade na qual a escola está inserida é con-
dição preliminar de qualquer atividade docente envolvendo as te-
máticas de gênero e sexualidade. Um bom diagnóstico indicará as 
demandas, sendo sempre necessário que se tenha cuidado com pro-
postas prontas e milagrosas que possam afrontar diretamente a cul-
tura local e gerar resistências, afastando qualquer possibilidade de 
atuação na área. 
Na	sala	de	aula,	notícias	em	revistas	e	jornais	podem	exemplifi-
car violências contra mulheres, crianças, homossexuais, negros e po-
bres. A consideração de que essas pessoas não são “outros”, mas que 
a violação de seus direitos é a violação do direito de todos, pode ser 
uma questão óbvia, mas que nem sempre é entendida. Uma socie-
dade sem violência – desejo coletivo – exige que esse tipo de mani-
festação	não	seja	tolerado,	independente	da	vítima.	A	reflexão	sobre	
tais questões apontará caminhos, mostrando aos educandos, sejam 
esses meninos ou meninas, que violência, preconceito, sexismo, ho-
mofobia,	misoginia	ou	racismo	não	são	naturais,	sendo	possível	des-
construí-los,	contribuindo	para	a	 realização	de	uma	sociedade	com	
42
sexualidade e gênero na escola
novos	parâmetros,	entre	os	quais	esteja	a	justiça	social	e	o	respeito	
à diversidade. 
O docente é o protagonista central da educação – uma vez que 
planeja, avalia, implementa propostas, educa, interfere sobre a realida-
de –, o que sempre exigiu de sua postura pro�ssional profundos conhe-
cimentos. Dessa forma, coloca-se a sua frente um novo desa�o: ensinar 
sobre conteúdos e temas que, numa perspectiva tradicional, não fazem 
parte	da	 sua	área	de	 formação.	Sabemos	 ser	 impossível	ensinar	aqui-
lo que não conhecemos, por isso, a viabilidade do desenvolvimento de 
trabalho	com	as	temáticas	aqui	abordadas	só	será	possível	com	investi-
mentos na formação de educadores. 
Destaca-se	 a	 importância	 dessa	 formação,	 pois,	 mudanças	 nas	
concepções e práticas escolares dependem, sobretudo, de preparação, 
de sensibilização docente. A inclusão de temas como gênero e sexua-
lidade nos cursos regulares e de educação continuada oferecerá base 
teórica e metodológica para que o docente tenha segurança para apre-
sentar	e	debater	questões	que,	por	sua	relevância,	não	podem	ser	trata-
das de qualquer maneira. Esse tipo de ação também possibilitará que os 
educadores enfrentem situações que aparecem no seu cotidiano e que 
exigem respostas educacionais: discriminações de gênero, homofobia, 
sexismo,	gravidez	na	adolescência,	doenças	sexualmente	transmissíveis,	
aborto, etc. 
A formação continuada deve ter como ponto de partida a reali-
dade do trabalho docente. Pretender formar docentes, sem ouvir de-
mandas ou conhecer a realidade educacional, é iniciar um trabalho com 
menores possibilidades de suprir expectativas e correr o risco de não 
atingir os reais objetivos de uma capacitação: preparar o professor e a 
professora para a intervenção pedagógica. 
Essa formação é desa�adora, abrindo possibilidades para que os 
docentes revejam suas práticas, suas formas de ensinar e aprender, inte-
ragir e signi�car o conhecimento em todas as suas dimensões, integrar 
os conteúdos e associá-los à vida real. Isso contribuirá para o desenvolvi-
mento de um trabalho amplo, não voltado apenas para o cumprimento 
de metas e conteúdos, mas para o desenvolvimento pessoal de cada 
discente	e	para	o	desenvolvimento	social	do	país.		
Os temas se renovam a cada dia, exempli�camos alguns que po-
dem ser trabalhados na escola: aborto; fetos anencefálicos; direito à vida 
43
beatriz l. ferreira e nanci stancki da luz
(do feto; da mãe); autonomia sobre o corpo; controle de natalidade; mé-
todos	contraceptivos;	saúde	materna;	mortalidade	materna;	câncer	de	
útero, mama ou próstata; planejamento familiar; contracepção; concep-
ção;	adoção;	início	da	vida;	pesquisas	com	células-tronco;	direitos	sexu-
ais e reprodutivos; violência de gênero, doméstica e contra a mulher; 
pedo�lia; parto natural; cesárea; barriga de aluguel; fertilização in vitro; 
bebê	de	proveta;	 	 início	da	vida	sexual	de	homens	e	mulheres;	desco-
berta do corpo; cuidados com o corpo; união homoafetiva; mudança de 
sexo; maternidade responsável; paternidade responsável, etc.
 Para a educação não há “receitas prontas”, a realidade desvela-
rá questões latentes e caberá aos docentes a de�nição do método que 
melhor se adapta ao assunto e à realidade de seu trabalho. Temas como 
gênero e sexualidade não pretendem e tampouco devem substituir os 
conteúdos	“tradicionais”	das	disciplinas	que	compõe	o	currículo	escolar.	
Uma das possibilidades consiste no tratamento como tema transversal, 
forma que possibilita a inserção dessas questões sociais presentes no 
dia-a-dia do estudante e em debate na sociedade, sem deixar “de lado” 
outros assuntos tão importantes quanto. Muitas dessas questões reve-
lam	preocupações	da	sociedade,	exigem	análise	crítica	e	posicionamen-
to do grupo discente, mas podem ser trabalhadas de forma articulada 
com outros temas já tratados nas disciplinas escolares. 
 Se é primordial saber trabalhar gênero e sexualidade, pois, de-
mandas	sobre	a	temática	surgirão,	não	sendo	possível	abster-se	diante	
delas,	também	é	necessário	refletir	a	respeito	do	conhecimento	que	está	
sendo	reproduzido	e	construído	pela	escola.	O	rompimento	com	qual-
quer determinismo e com padrões e modelos hegemônicos, abrindo 
para a aceitação da diversidade é condição sine qua non para a conso-
lidação de propostas pedagógicas que visem à interação das próprias 
dimensões humanas, dos sujeitos e a construção de uma sociedade hu-
mana e justa. 
 Considerações Finais
A escola pode ser um espaço gerador de transformação de comporta-
mentos e valores. Como parte do contexto social, essa instituição não 
�ca imune à reprodução de valores presentes na sociedade, sendo 
comum a propagação de discriminações e preconceitos, o que ocorre 
quando repassa uma visão androcêntrica de mundo e ensina às mulhe-
44
sexualidade e gênero na escola
res a aceitarem uma suposta inferioridade pelo fato de serem mulheres. 
Os meninos, ao aprenderem e não questionarem tal visão, aceitam uma 
suposta superioridade pelo fato de serem homens. Assim, a escola vai 
consolidando a desigualdade e, sem problematizartais questões, conti-
nua com suas práticas rotineiras, rea�rmando e reforçando valores dis-
criminatórios.
 A inclusão das temáticas de gênero e sexualidade em cursos de 
formação docente contribuiria para essa problematização e para uma 
análise	crítica	do	que	é	reproduzido	pela	instituição	escolar.	A	formação	
cidadã não pode deixar de considerar que se vive numa sociedade desi-
gual, e que tais questões são fatores que contribuem para a construção 
das desigualdades sociais. Esse reconhecimento é essencial para a inter-
venção e a promoção de mudanças sociais. 
Nessa perspectiva, não há lugar para escolas que reproduzem o 
machismo, a homofobia e a inferioridade feminina. Vale lembrar que a 
categoria	docente,	em	nosso	país,	é	formada	majoritariamente	por	mu-
lheres, que precisam da valorização social da sua pro�ssão para que pos-
sam contribuir para a valorização e desenvolvimento humano. Em espa-
ço algum faz sentido o machismo, a discriminação e a violência contra a 
mulher, mas, menos ainda, numa pro�ssão composta majoritariamente 
por mulheres. 
A valorização do trabalho docente e o reconhecimento de que 
a escola pode interferir sobre a realidade, construindo a autonomia de 
seus alunos e alunas e seu desenvolvimento integral, contribuirá para 
a construção de uma sociedade que respeite as diferenças e que diga 
não às desigualdades. Educandos devem aprender a respeitar o ser hu-
mano em sua diversidade, aprender a conviver com diferenças e ajudar 
a pensar um mundo sem preconceito, racismo, sexismo, homofobia ou 
qualquer outro tipo de violência. 
Referências
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ABREU, Nuno Cesar. O olhar pornô: a representação do obsceno no cinema e no 
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beatriz l. ferreira e nanci stancki da luz
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ou três comentários sobre o texto de Michael Apple. In: COSTA, M. V. (Org.) Escola 
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WHITAKER, Dulce. Mulher e homem: o mito da desigualdade. São Paulo: Moder-
na, 
47
nanci stancki da luz
3
VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER: UM DESAFIO À 
CONCRETIZAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS 
Nanci Stancki da Luz
 Introdução
A violência contra a mulher ganhou visibilidade graças à luta e organiza-
ção	feminista	que	retirou	o	tema	do	âmbito	privado,	politizou	a	discus-
são e questionou as relações de poder que reproduziam e naturalizavam 
esse grave problema social. 
A violência doméstica, uma das inúmeras formas de expressão 
dessa violência, por longo tempo foi tratada como algo da esfera fami-
liar, o que afastava a intervenção do poder público e permitia que, na 
ausência de relações de afeto e proteção, imperasse a lei do mais “forte” 
em grande medida personi�cada em uma �gura masculina que, no uso 
arbitrário	de	sua	 força	 física,	considerava-se	com	direitos	de	subjugar,	
humilhar ou mesmo agredir outros familiares. 
Relações de poder desiguais entre homens e mulheres e a inércia 
do Estado e da sociedade frente a essa realidade di�cultaram a efetiva-
ção	dos	direitos	fundamentais	das	mulheres	vítimas	de	violência,	entre	
os	quais	o	direito	à	vida,	à	 integridade	física,	emocional	e	psicológica,	
à liberdade de pensamento e de escolha, à saúde, à segurança, entre 
outros.
A violência atinge homens e mulheres, entretanto, as suas formas 
de manifestação, em geral, distinguem-se quando se trata de um ou de 
outro gênero. Enquanto a violência contra os homens pode ser asso-
48
violência contra a mulher: um desafio à concretização dos direitos humanos
ciada majoritariamente ao espaço público, grande parte da violência 
contra a mulher tem ocorrido no próprio lar e tem, em grande parte dos 
casos, como agressor o marido, companheiro ou namorado, ou ainda 
esses mesmos, mas na condição de ex-parceiros. 
Este texto discute a violência contra a mulher, apontando alguns 
elementos que contribuem para a sua construção e permanência social. 
Destaca as resistências frente a esse processo, bem como as conquistas 
da luta feminista na desconstrução da naturalização da violência contra 
a mulher e no combate à sua impunidade, contribuindo, dessa forma, 
para a efetivação dos direitos humanos que, sem as mulheres não se 
concretizam, pois metade da parcela que compõe a humanidade �ca 
excluída.			
A violência
A violência é um fenômeno amplo e que inclui não apenas comporta-
mentos	entre	 indivíduos,	mas	 também	se	 refere	a	questões	como	de-
sigualdades (sejam elas sociais, étnicas, de gênero ou classe), pobreza, 
desemprego, intensi�cação e precarização do trabalho, desvalorização 
pro�ssional e salarial, discriminação, falta de atendimento aos direitos 
básicos, abandono, etc. 
Para	Ristum	e	Bastos	(2004),	é	difícil	abarcar	a	violência	como	um	
todo, devido a sua complexidade. O próprio conceito pode sofrer inter-
ferência do julgamento social, di�cultando uma formulação consensual 
e ocultando formas de agressão. Embora a violência possa assumir di-
versas formas, devido a uma visão reducionista, muitas vezes, �ca rela-
cionada apenas com a criminalidade, deixando de incluir a dominação 
política,	econômica	e	de	gênero	e	todas	as	implicações	dela	decorren-
tes. 
Herkenho� (2004) destaca a necessidade de se distinguir agressi-
vidade de violência. A agressividade, cujo oposto é a passividade, tem 
aspectos construtivos e signi�ca dinamismo e energia vital. A violência, 
ao	contrário,	tem	sempre	 implícita	a	destrutividade.	Essa	destrutivida-
de, todavia, também pode ser libertadora quando, não havendo outra 
alternativa, é utilizada como forma de defesa e de a�rmação humana. 
No entanto, num sentido restrito, o termo violência explicita o conjunto 
de ocorrências que põem em perigo bens da vida e a integridade das 
pessoas.
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nanci stancki da luz
Diante da complexidade e extensão do tema, algumas de�nições 
e delimitações revelam-se necessárias. Consideramos a violência como 
uma construção histórica e social da qual faz parte as desigualdades de 
gênero. 
O fenômeno da violência, de acordo com Herkenho� (2004), pode 
se	manifestar	a	partir	de	três	níveis	que	mantém	nítida	conexão:	
1) Violência institucionalizada, decorrente da estrutura socioeco-
nômica vigente; 
2)	Violência	privada,	de	 indivíduos	ou	grupos,	que	se	manifesta	
por meio de comportamentos considerados criminosos pelo sis-
tema legal; 
3) Violência o�cial, representada pela repressão policial e por 
aquela exercida pelo aparelho judiciário e prisional. 
Este	texto	considera	a	 inter-relação	entre	esses	três	níveis,	no	entanto	
destaca	a	violência	entre	indivíduos	e	particularmente

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