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Universidade de Brasília Instituições de Direito Público e Privado Resenha Crítica 2 - Acórdão Ministro Barroso Jaiane Assunção 16/009197 O presente acórdão trata-se de habeas corpus, com pedido de concessão de medida cautelar. Foram presos em flagrantes pessoas que mantinham clínica de aborto, por estarem supostamente praticando crimes descritos nos arts. 126, que qualifica o aborto, e o arts 288, formação de quadrilha, os mesmos estavam provocando aborto na gestante/denunciada com o consentimento da mesma. O juizado da 4ª Vara Criminal da Comarca de Duque de Caxias/RJ concedeu a liberdade provisória aos pacientes, considerando que as infrações imputadas são de médio potencial ofensivo. Entretanto, a 4ª Câmara Criminal entrou com recurso no Ministério Público do Rio de Janeiro, ao qual decretava a prisão preventiva dos pacientes, alegando que assim a ordem pública seja mantida e a asseguração da aplicabilidade da lei penal. Os impetrantes argumentam que não estão satisfeitos todos os requisitos necessários para decretação da prisão preventiva. No Habeas Corpus, sustenta que os pacientes são réus primários, sem antecedentes, não houve tentativa de fuga e que eventual condenação poderá ser cumprida em regime aberto. Em dezembro de 2014, o Ministro Marco Aurélio, deferiu a medida cautelar vigente em favor de dos acusados Edilson dos Santos e Rosemere Aparecida e seis meses depois estendeu o benefício aos demais corréus. A solução do caso consistiu nos seguintes argumentos: Primeiro, descabimento de Habeas Corpus substitutivo, por inadequação da via processual. Segundo, não havendo os requisitos do art. 312 do CPP, não se viu motivos para manterem os acusados presos, tendo em vista que os mesmos não oferece risco ao processo, tendo os mesmos comparecido a todas às últimas audiências de instrução de julgamento ocorridas em agosto de 2015, quando já estavam soltos. Nos arts. 124 a 126 do Código Penal, que tratam do crime de aborto, está exposto punições para o aborto provocado tanto pela gestante quanto para terceiros que o faz com o consentimento da mesma. Entra em discussão o fato de que a criminalização do aborto até o primeiro semestre acaba por violar diversos direitos fundamentais da mulher, não atendo-se para o princípio de proporcionalidade, ou seja, as proporções que tais imposições podem tomar. O aborto é uma prática ilegal no Brasil, deve-se evitar devido às inúmeras complexidades que podem surgir a partir desse procedimento, tanto psíquicas quanto moral. O acordo expõe que é papel do Estado e da sociedade atuar na conscientização do aborto, por meio da educação sexual, onde já foram sugeridas diversas formas de implementação nas escolas públicas, porém foi extremamente crítica alegando que seria uma forma de induzir as crianças e adolescentes na vida sexual precocemente, distribuindo meios contraceptivos, como é feito nas unidades básicas de saúde, e, por fim, amparando a mulher que deseja ter o filho mas não tem amparo para isso. Com isso, no habeas corpus o intuito não é tornar incompatível a criminalização do aborto, e muito menos a disseminação do procedimento. Pelo contrário, alega que tais práticas deveria ser feita de forma segura e rara e sob determinadas condições. Baseado nos direitos fundamentais, toda pessoa deve ser tratada como fim em si mesma não como extensão de outro. Eventualmente esses direitos acabam por entrarem em colisão entre si e com princípios constitucionais ou estatais. Para uma melhor solução das situações de forma concreta deverá ser levado em conta o princípio da razoabilidade ou proporcionalidade, este segundo vem para assegurar o custo-benefício entre o que se ganha e o que se perde com decisões para que sejam as mais justas possíveis. Nos dias atuais, em uma sociedade altamente desenvolvida e democrática, é dominante a percepção de que a criminalização do aborto atinge gravemente inúmeros direitos das mulheres, tendo reflexos inevitáveis sobre o que vem a ser a dignidade do ser humano. Ninguém sabe ao certo os motivos que levam a mulher tomar tais decisões, partindo do pressuposto de que ninguém fará isso por puro prazer, e a última coisa que o Estado deveria fazer e tornar sua vida ainda mais difícil fazendo-a uma criminosa. Ao se analisar a conduta da mulher, e concluir de que as mesmas são legítimas não se tem motivos para incriminá-la e muito menos incriminar o profissional de saúde que torna essa possibilidade possível, já que o Estado não a ampara com políticas de saúde pública que dêem suporte a sua decisão. O discurso que mais se houve falar quando o assunto é aborto, é que o Brasil é um país a favor da vida e que por tanto isso é uma prática inaceitável. O que se vê na sociedade brasileira é que se tem ainda muito enraizada os costumes e morais religiosas que acabam por se sobressair aos direitos fundamentais da pessoa, além de um sistema judiciário composto por pessoas, a maioria homens, que se sentem no direito de tomar uma decisão que deveria ser feita pela mulher. Durante a fase inicial da gestação, até o terceiro mês, não se pode afirmar que há vida em seu sentido pleno. Não se tem uma solução jurídica para as inúmeras controversas de quando realmente começa a vida. Essa decisão será sempre amparada pela ótica da filosofia ou da religião, sendo que ambas têm concepções diferentes a respeito da vida. Como o embrião dependerá do corpo da mãe durante toda sua formação, pois não é capaz de subsistir fora dele, acaba por violar a autonomia da mulher, em relação a liberdade individual, viola o direito de escolhas básicas, ou seja, tomar suas decisões morais que dizem respeito ao rumo de sua vida. Os desejos, valores e interesses também são violados ao incriminar a mulher que não quer levar adiante sua gravidez. Claramente, o Estado e muito menos a sociedade deveria intervir nesses direitos que é assegurado a todos os indivíduos, entretanto, os das mulheres são negligenciados quando o assunto é aborto. A mulher deveria ter autonomia sobre seu próprio corpo. A partir do momento que isso é tirado dela entra a quebra também da igualdade de gênero. Por anos as mulheres ficaram em posição de submissão aos homens, fato esse que institucionalizou a desigualdade socioeconômica, promovendo uma visão distinta de seu papel na sociedade. Em meio a tudo exposto, o ministro traz que a criminalização do aborto acaba por não ser compatível com a constituição. O Código Penal brasileiro de 1940, passou por inúmeras atualizações ao longo dos anos, entretanto, em relação aos crimes de aborto, arts. 124 a 128, não houve nenhuma alteração da redação, fato essa que categoriza uma enorme descompasso da legislação em relação a sociedade que evolui constantemente e por consequência, deveria ter uma redação que atendesse a realidade ao qual os acusados vive. A interrupção da gravidez só aceita em caso de fetos anencefálicos, no que diz a questãodo aborto até o terceiro mês têm-se a necessidade de uma atualização à luz dos novos valores trazidos na Constituição de 1988, no que tange às mudanças de costumes e de uma perspectiva mais atualizada. De acordo com pesquisas, a criminalização não tem impacto significante sobre o número de abortos que são feitos. A taxa permanece semelhante às taxas em países em que é legalizado. No fim a única coisa em que a criminalização afeta é a quantidade de abortos seguros e consequentemente no número de mulheres que morrem ou têm complicação de saúde devido ao procedimento. Claramente este impasse trata-se de um problema de saúde pública seríssimo. Portanto, a criminalização, que tem o intuito de proteger a vida do feto, acaba por ser ineficaz, constituindo apenas uma reprovação simbólica da conduta da mulher. O texto traz que é perfeitamente aceitável que grupos religiosos, ou quem quer que seja, reprove moralmente o aborto, pois, todos têm o direito de se expressar e defender seus dogmas, valores e convicções. Porém, não se pode que o posicionamento de um dos lados criminalize o outro. O que deveria acontecer no Brasil, mas não acontece, é o Estado trabalhar em conjunto com a mãe e não tratar a mulher que deseja abortar como uma criminosa. Em outros países, como a Alemanha, tais medidas são colocadas em práticas e tem sido positivas. Em inúmeros países (como França, Uruguai, Alemanha e outros),a interrupção da gravidez não é mais considerada um crime, pelo menos, durante o primeiro trimestre de gestação. Praticamente, nenhum país democrático no mundo trata a interrupção em sua fase inicial como um crime, portanto, o fato do Brasil ainda não ter atualizado suas normas jurídicas é um indicador de que as premissas pelos quais foram redigidas a redação que trata do aborto ainda está enraizada no sistema judiciário. O caso em questão, o habeas corpus para afastar da prisão os pacientes e corréus foi concedido, devido às lacunas existentes no sistema jurídico e também porque há dúvida s fundadas sobre se houve crime ou não em face da Constituição Federal de 1988, mais atual que o código Penal-1940. Conclui-se, que este é um assunto que envolve muita discussão para se chegar a um posicionamento que agrade os dois lados da história. Mas como o estado tem que ser imparcial, ou seja, não pode escolher um lado, acaba por não tomar medidas que de certa forma ajudaria a mulher, pelo contrário, acaba por arrumar maneiras de incriminá-las. Ao fazer uma análise do exposto, é notável que o Estado já escolheu um lado, e não foi o da mulher. Um exemplo disso, é que as leis que regulam o aborto não passou por redefinição desde 1940. Fazem exatamente 78 anos, a sociedade evoluiu bastante sobre diversas questões polêmicas, entretanto, nunca deram atenção para um assunto que mata e incrimina inúmeras mulheres no país. Isso é questão de saúde pública, e nada está sendo feita para amparar essas mulheres que, ao não encontrar o apoio do Estado, acaba por recorrer a procedimentos que coloquem sua vida e saúde em risco.
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