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Oralidade e Letramento

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Revista Brasileira de Educação 
Print version ISSN 1413-2478 
Rev. Bras. Educ. vol.15 no.43 Rio de Janeiro Jan./Apr. 2010
ROJO, Roxane. Letramentos múltiplos, escola e inclusão social. São Paulo: 
Parábola Editorial, 2009, 128 p. 
A autora chama a atenção para o conceito de alfabetismo com foco no 
conhecimento, nas capacidades envolvidas na leitura e na escrita, observando 
que esse conceito muda constantemente, pois tem a ver com as mudanças 
sociais. Por exemplo, no começo do século passado, alfabetizado era aquele 
que conseguia escrever o próprio nome; em 1958 a UNESCO define 
alfabetizado como a pessoa que pode ler e escrever com entendimento um 
enunciado curto sobre a vida cotidiana. Já na atualidade essa capacidade 
seria tida como um nível baixo de alfabetismo, porque a UNESCO adotou o 
conceito de analfabeto funcional, um indivíduo que lê e escreve, mas 
não possui habilidades suficientes para atender as demandas do seu 
cotidiano e progredir pessoal e profissionalmente. 
Rojo discorre sobre o funcionamento da escrita alfabética, da importância de 
se perceber as relações bastante complexas que há entre os sons da fala 
(fonemas) e as letras da escrita (grafemas), que requerem uma consciência 
fonológica de linguagem. Afirma que não há uma relação tão simples quanto 
as cartilhas apresentam, normalmente construídas por convenção. 
O leitor pode refletir mais detalhadamente sobre as diferenças entre 
alfabetização e alfabetismo no quinto capítulo, "Alfabetismo(s) – 
Desenvolvimento de competências de leitura e escrita", no qual a autora 
chama a atenção para os diversos procedimentos e capacidades (perceptuais 
motoras, cognitivas, afetivas, sociais, discursivas, linguísticas) que a leitura 
envolve, todas dependentes da situação e finalidade de leitura. 
Ela aborda a questão de que, no início do século XX, a leitura era vista 
apenas como um processo perceptual de decodificação de grafemas 
em fonemas, para se atingir o significado do texto. A leitura era 
relacionada à alfabetização. Mas, nos últimos 50 anos, muitas 
capacidades foram desveladas: capacidade de at ivação, 
reconhecimento e resgate de conhecimento armazenado na memória, 
capacidades lógicas, capacidades de interação social etc. A leitura 
começa a ser encarada como um ato de cognição, de compreensão, 
que engloba conhecimentos de mundo, conhecimentos de práticas 
sociais e conhecimentos linguísticos, algo além dos fonemas e 
grafemas, que vai proporcionar uma interação leitor e autor. Apesar 
dos avanços nessa área, somente poucas e as mais básicas 
capac idades têm s ido ens inadas . As demais são quase 
desconsideradas, como mostram os resultados dos exames ENEM, 
SAEB e PISA. 
A questão da globalização passou a exigir novos letramentos 
relacionados aos meios de comunicação e à circulação da informação. A 
ampliação do acesso às tecnologias digitais da comunicação e informação 
(computadores, celulares, tocadores de MP3, televisão digital, entre outras) 
resulta em quatro mudanças de importância na reflexão sobre os letramentos: 
intensificação e diversificação da circulação da informação, diminuição das 
distâncias espaciais, diminuição das distâncias temporais ou a contração do 
tempo e a multissemiose ou a multiplicidade de modos de significar. 
A autora incentiva maneiras de incrementar, tanto na escola como fora dela, os 
letramentos críticos, capazes de lidar com os textos e discursos naturalizados, 
neutralizados, de forma que se perceba seus valores, suas intenções, suas 
estratégias, seus efeitos de sentido. O texto já não pode mais ser visto fora da 
abrangência dos discursos, das ideologias e das significações, como a escola e 
as teorias se acostumaram a fazer. 
Trab. Ling. Aplic., Campinas, 49(2): 455-479, Jul./Dez. 2010 
LETRAMENTO METAMIDIÁTICO: TRANSFORMANDO SIGNIFICADOS E MÍDIAS* 
JAY L. LEMKE** 
Letramentos são legiões. Cada um deles consiste em um conjunto de práticas sociais 
interdependentes que interligam pessoas, objetos midiáticos e estratégias de construção de 
significado (LEMKE, 1989a; GEE, 1990; BEACH, LUNDELL, 1998). Cada um deles é parte 
integral de uma cultura e de suas subculturas. Cada um tem um papel em manter e transformar a 
sociedade, porque os letramentos produzem ligações essenciais entre significados e fazeres. 
A noção de ‘letramento’ assim colocada parece-me muito ampla para ser utilizável. Não acho que 
possamos defini-la de forma mais precisa do que um conjunto de competências culturais para 
construir significados sociais reconhecíveis através do uso de tecnologias materiais 
particulares. Uma definição como esta dificilmente distingue o letramento de uma competência 
para cozinhar ou escolher o que vestir, exceto pelos recursos semióticos particulares usados para 
construir significados (o sistema linguístico vs. o sistema culinário ou de moda) e os artefatos 
materiais particulares que mediam esse processo (sons vocais ou sinais escritos vs. comidas, 
roupas). 
Além disso, todo letramento é letramento multimidiático: você nunca pode construir significado 
com a língua de forma isolada. É preciso que haja sempre uma realização visual ou vocal de signos 
linguísticos que também carrega significado não-linguístico (por ex.: tom da voz ou estilo da 
ortografia). Para funcionarem como signos, os signos devem ter alguma realidade material, mas 
toda forma material carrega, potencialmente, significados definidos por mais de um código. Toda 
semiótica é semiótica multimídia e todo letramento é letramento multimidiático. 
3. LETRAMENTOS INFORMÁTICOS 
Os letramentos da Era da Informação não são apenas sobre fazer e usar a multimídia. Eles também 
incluem ‘letramentos informáticos’: as habilidades do usuário de biblioteca e do usuário de texto. 
Habilidades para categorizar e localizar informações e objetos e apresentações multimidiáticos. O 
ciberespaço será muitas coisas: o último dos shopping centers, o parque de diversões mais sedutor, a 
universidade da universidade e principalmente, do ponto de vista do letramento, a biblioteca das 
bibliotecas. Estratégias de pesquisa e devolução de livros serão substituídas pela arte da exploração 
e da navegação; vamos substituir uma metáfora através da qual os textos chegam até nós (por 
exemplo, descarregando-os através de servidores remotos) para uma em que nós chegamos até eles 
(navegando através de mundos virtuais 3D que representam os servidores e seus conteúdos). 
O paradigma da aprendizagem interativa domina instituições como as bibliotecas e os centros de 
pesquisa. Assume-se que as pessoas determinam o que elas precisam saber baseando-se em suas 
participações em atividades em que essas necessidades surgem e em consulta a especialistas 
conhecedores; que eles aprendem na ordem que lhes cabe, em um ritmo confortável e em tempo 
para usarem o que aprenderam. Este é o paradigma da aprendizagem das pessoas que criaram a 
internet e o ciberespaço. É o paradigma mais do acesso à informação do que da imposição à 
aprendizagem. É o paradigma de como pessoas com poder e recursos escolhem aprender. Seu 
resultado final é geralmente satisfatório para o aprendiz e frequentemente útil para os 
negócios ou para a academia. 
LETRAMENTO/ORALIDADE/TECNOLOGIA
Luiz Antônio Marcuschi (UFPE) Antônio Carlos Xavier (UFPE) (Orgs.)
2005
HIPERTEXTO E GÊNEROS DIGITAIS Novas formas de construção de sentido
2.a edição
Na esteira da discussão sobre gêneros textuais, Júlio César Araújo investiga o estatuto do bate-papo 
digital como gênero eletrônico que transmuta para a WEB a conversação cotidiana. Sua hipótese de 
trabalho afirma ser possível flagrar as marcas da transmutação do diálogo cotidiano para o chat, a 
partir da análise das mesclas de semioses como som-imagem-escrita superpostas natela do 
computador, quando interlocutores interagem em programas de bate-papo pela Internet. As análises 
realizadas autorizam o pesquisador a considerar o bate-papo como um gênero hipertextual e de 
natureza híbrida, já que mistura oralidade e escrita em um mesmo evento e suporte comunicativo.
Já nos acostumamos a expressões como “e-mail”, “bate-papo virtual” (chat), “aula-chat”, “listas de 
discussão”, “blog” e outras expressões da denominada “e-comunicação”. Qual a originalidade 
desses gêneros em relação ao que existe? De onde vem o fascínio que exercem? Qual a função de 
um bate-papo pelo computador, por exemplo? Passar o tempo, propiciar divertimento, veicular 
informação, permitir participações interativas, criar novas amizades? Pode-se dizer que parte do 
sucesso da nova tecnologia deve-se ao fato de reunir num só meio várias formas de expressão, tais 
como, texto, som e imagem, o que lhe dá maleabilidade para a incorporação simultânea de múltiplas 
semioses, interferindo na natureza dos recursos lingüísticos utilizados.
A relação fala/escrita em dados produzidos em contexto digital 
(KOMESU E TENANI) 2009.
a relação fala/escrita em enunciados digitais ainda focalizam questões como “interferência da fala 
na escrita, marcas de retextualização do falado no escrito, hibridismo da língua (falada/escrita) e 
necessidade de definição da escrita na internet como diálogo oral ou escrito.” (VIEIRA, 2005, p. 
26-29) 
Crystal (2005), por exemplo, cunha o termo netspeak para fazer referência a formas de expressão 
escrita consideradas inéditas, com inclusão de símbolos audiovisuais – emoticons – e de hiperlinks. 
Para o autor, a “fala da rede” é consequência dos avanços tecnológicos e da competência 
cognitiva de seus usuários, relacionados a uma economia própria da língua. Em sua avaliação, 
“uso exagerado de ortografia, pontuação, letras maiúsculas, espaçamento e símbolos especiais para 
ênfase” são “esforços” na tentativa de “substituir o tom de voz na tela” quando da atividade do 
escrevente (CRYSTAL, 2005, p. 85). De nosso ponto de vista, interessa destacar que a discussão 
sobre linguagem da/na internet, para Crystal (2005), está circunscrita a uma distinção entre fala, 
considerada a informalidade da conversação face a face, e escrita tradicional, considerados traços 
como elaboração e planejamento 
Também de uma perspectiva que distingue fala e escrita, Martin (2007) propõe que a 
linguagem na internet seja concebida como “estrutura híbrida” constituída de suporte escrito 
para expressão de mensagem e de expressões da modalidade falada. Para Martin, a escrita na 
internet é a “exteriorização do código oral”, dadas as particularidades dessa nova linguagem 
digital, marcada por “grafias fonetizadas”, apócopes e aféreses típicas desse “falar rápido” na 
rede. 
Práticas de Letramento e eventos de escrita 
Aspecto relevante na observação e sistematização da relação fala-escrita é o que diz respeito às 
formas de inserção da fala e da escrita nos usos da vida diária. Quanto a isto, concordamos com 
Street (1995:115) ao constatar, num estudo sobre a classe média de uma cidade dos Estados Unidos, 
que no ambiente doméstico, fala e escrita se davam numa integração muito grande formando uma 
mescla ou um contínuo. A mãe lê o livro em voz alta e o comenta oralmente; recebe uma carta e lê 
para os outros; lê o jornal em voz alta e comenta e assim por diante. Já a escola separa fala e escrita 
e dá a cada uma o seu lugar. Ali surge a “grande divisão”, como fruto de um processo de 
“pedagogização da escrita”. A escola põe a escrita no quadro, fixa-a em normas, distingue-a da fala 
e torna-a autônoma, objetivizada, naturalizada. O texto escrito se torna não-problemático e deve ser 
entendido objetivamente. A ênfase se volta para a natureza da linguagem em detrimento do seu uso 
(v. Street 1995:116). Esta observação de Street é para nós importante porque permite distinguir 
entre as noções de letramento e escrita, bem como entre oralidade e fala. Além disso, sugere que se 
distinga entre eventos e práticas. 
Com isto podemos afirmar que a escrita acha-se bastante envolvida, na sua forma mais frequente de 
surgimento, com contextos altamente institucionalizados. 
Vejam-se os exemplos da aula e da conferência, trazidos por Street (1995:133), que enquanto 
eventos envolvem letramento: a audiência fica ouvindo e lendo no quadro (ou na projeção do 
power- point!), tomando notas e memorizando; o conferencista fala, lê notas, projeta textos e 
escreve. Esse evento é uma espécie de “mix” ou de mescla de oralidade e escrita, não se 
classificando tipicamente como uma ou outra. Por outro lado, um Tratado de Filosofia é uma 
prática típica de letramento e também um evento de letramento acentuadamente marcado pela 
escrita. Quando eu calculo ou lido com o dinheiro, procuro uma rua pelo nome ou peço uma 
informação sobre um estabelecimento comercial, estou praticando atividades mistas de 
letramento e oralidade que não podem ser distinguidas com rigor: são práticas de letramento, 
mas não eventos de escrita. 
Seguramente, alguém objetará, com razão: então não podemos mais distinguir entra fala e escrita? 
Certamente podemos distinguir, mas aí estamos num outro terreno, o das formas. E não podemos 
ficar restritos a ele. Aqui iniciam outros aspectos importantes, tais como a natureza dos textos 
produzidos empiricamente, ou seja, a questão dos gêneros textuais. Alguns deles serão tipicamente 
escritos e outros tipicamente falados, mas todos deverão cumprir determinados requisitos de 
organização além de seguirem o mesmo sistema linguístico. E se observarmos a fala e a escrita no 
contexto da prática dos gêneros comunicativos em sociedade veremos que as diferenças entre as 
duas modalidades vão se diluindo ou pelo menos graduando num conjunto de relações relativizadas. 
Morrison lembra que “papiros dos séculos V, IV e III a.C. mostram que os textos eram escritos de 
maneira contínua, sem parágrafos, capítulos ou divisão entre as palavras e frases” (p.149). Não 
havia uma normatização da escrita, seja no plano ortográfico ou na disposição gráfica dos sinais. 
Diante disso, argumenta Morrison que “o desenvolvimento e a difusão do parágrafo como meio de 
se marcar as etapas de uma argumentação podem ser tomados como exemplo da evolução 
cultural” (p.145). Pois esta noção inexiste na oralidade e deve ser inventada na escrita. Separar 
palavras, fazer parágrafos, numerar páginas, pontuar, fazer linhas, separar temas com títulos etc. são 
estratégias que surgem com a estabilização do sistema textual que não se fazia presente na 
oralidade. 
HISTÓRIA E ORALIDADE
Observando a origem da escrita e sua função social e cultural no panorama grego, Havelock 
(1986:8) defende que a escrita inicialmente era feita no gênero poético, com Homero e Hesíodo 
encabeçando todo o conhecimento (na medida em que puseram na escrita a oralidade. Em seguida, 
Platão substituiu o gênero poético pelo diálogo, transformado em método “dialético”. Se por um 
lado a forma poética favorecia o aspecto mnemônico da oralidade, por outro, o diálogo era a forma 
mais genuína da manifestação oral no dia-a-dia. Era uma maneira profundamente prosaica de 
transmitir o pensamento, mas natural. Outros sábios usavam os aforismas. Aristóteles já se serviu da 
exposição em tratados. Contudo, ainda hoje vigora a tradição oral através dos mitos, dos contos, das 
fábulas e assim por diante. Mas a ciência perdeu essa noção da oralidade e confinou-se ao ensaismo, 
desde que a Academia Inglesa o definiu no século XVII. 
LETRAMENTOS MÚLTIPLOS: UMA NOVA PERSPECTIVA SOBRE AS PRÁTICAS 
SOCIAIS DE LEITURA E DE ESCRITA 
Josieli Almeida de Oliveira Leite1 Laura Silveira Botelho2 
2011 
As práticas sociais de leitura e de escritaestão presentes na vida cotidiana de 
praticamente toda a sociedade. Ler um livro para a escola; pegar o ônibus 
correto para casa ou para ir a um determinado lugar; orientar-se pelas placas 
quando está dirigindo; ler a bula de um remédio; fazer de conta que lê uma 
história, mesmo que ainda não seja alfabetizado; compor uma música com os 
amigos; ler o resumo das novelas na revista; fazer uma lista de compras etc. 
Todas essas atividades constituem formas de utilização social da leitura e da 
escrita, sendo assim práticas de letramento. 
Percebemos como o conceito de letramento é bastante abrangente. E podemos 
afirmar que, devido às mudanças sociais ocorridas em nossa sociedade e as 
novas exigências sobre os conhecimentos da leitura e da escrita, esse termo 
vem sofrendo ressignificações. Assim, este estudo tem como objetivo explicitar 
esses novos significados, embasado, principalmente, nos trabalhos de Rojo 
(2009) e Street (2007), que enfatizam os letramentos múltiplos, pois, 
mediante a diversidade de práticas culturais e sociais de leitura e escrita que 
se fazem presentes na sociedade atual, mais do que letramento ou 
letramentos, o termo que abarca melhor essa complexidade é letramentos 
múltiplos. 
Quando a escrita requeria caneta e papel ou máquina de datilografia, e a leitura requeria apenas o 
livro (e talvez um par de óculos) era simples manter essas distinções. Hoje, no entanto, se você 
desejar ler um hipertexto (ver BOLTER, 1998) ou escrevê-lo, precisará praticamente das mesmas 
tecnologias de hardware e software, e precisará tanto de habilidades de autoria novas quanto de 
novas habilidades de interpretação para usá-las. 

De acordo com Frade (2005), nos últimos anos vive-se um momento de 
grandes alterações nos conceitos dos processos que envolvem a leitura e a 
escrita: não basta apenas codificar e decodificar, fazer relações entre os sons e 
as letras. Para a autora, é preciso beneficiar-se da cultura escrita como um 
todo. Assim, entende-se que existem múltiplas possibilidades para utilização 
dessa cultura escrita. 
No dizer de Soares (2001, p. 47), a alfabetização é definida como “ação de 
ensinar a ler e a escrever”, já o termo letramento é caracterizado como o 
“estado ou condição de quem não apenas sabe ler e escrever, mas cultiva e 
exerce práticas sociais que usam a escrita.” Para Carvalho (2008), a 
alfabetização é caracterizada como ato de ensinar o código alfabético; e letrar, 
para a autora, é familiarizar o aprendiz com os diversos usos sociais da leitura 
e da escrita. 
Percebe-se, então, que a alfabetização e o letramento são processos 
diferentes, mas relacionados entre si. Soares (2003) afirma que a 
alfabetização e o letramento são processos indissociáveis, mas diferentes em 
termos de processos cognitivos. De acordo com a autora, aprende-se a técnica 
(codificar e decodificar), mas também, a utilizar tais saberes nas mais variadas 
práticas sociais. Assim, um não está antes do outro, pelo contrário, devem 
ocorrer de forma simultânea. 
Com a ampliação progressiva da alfabetização, surgiu o termo letramento. 
Contudo, cumpre verificar o que diz Soares (2003a), ressaltando que a 
alfabetização como parte constituinte da prática de leitura e escrita não pode 
ter sua especificidade desprezada, ou seja, não deve ficar diluída no processo 
de letramento. Assim, realizar um trabalho pedagógico que busque a formação 
de indivíduos letrados não significa descuidar do trabalho específico com a 
alfabetização. 
De acordo com Frade (2005), a apropriação do sistema de escrita envolve 
vários aspectos e capacidades, como a compreensão das diferenças entre a 
escrita alfabética e outras formas gráficas, como o desenho. Envolve domínio 
das convenções gráficas, ou seja, saber que a escrita é feita de cima para 
baixo, da esquerda para a direita. Também envolve o reconhecimento das 
unidades fonológicas, do alfabeto e da correspondência entre som e letra. 
Anais do SIELP. Volume 2, Número 1. Uberlândia: EDUFU, 2012. ISSN 
2237-8758 
1 
Lília Brito da Silva 
Universidade Federal do Piauí-UFPI brito_lilia@hotmail.com 
LETRAMENTO E ORALIDADE: UMA ABORDAGEM ETNOGRÁFICA DESSAS 
PRÁTICAS SOCIAIS EM TERESINA-PI 
A variedade culta em nossa sociedade é erroneamente utilizada como modelo 
para os usos que fazemos da língua falada, como é, inclusive, ensinado na 
escola no ensino de língua materna. “É fato incontestável que a escola institui 
a variedade padrão (culta) da língua como a única legítima e como alternativa 
de unificação linguística, em detrimento das demais variedades para ela, 
distantes dos critérios de correção” (LOPES, 2006:28). Desse modo a norma 
culta é ensinada como a única variação linguística aceitável da língua 
portuguesa. 
Nem sempre durante o ensino de língua materna essa noção de oralidade e 
letramento como um contínuo é respeitada. Segundo Marcuschi (2003), por 
muito tempo a relação oralidade/letramento foi tratada como uma relação 
dicotômica, onde a escrita era considera superior à fala. Hoje, “predomina a 
posição de que se pode conceber oralidade e letramento como atividades 
interativas e complementares no contexto das práticas sociais e 
culturais” (MARCUSCHI, 2003, p16), o que contribuí para a melhora no ensino 
de língua materna. 
Essa visão dicotômica da relação oralidade/letramento está relacionada à ideia 
de que a escrita é superior à fala. Esta foi por muito tempo o meio principal de 
comunicação entre os homens, mas seu prestígio foi aos poucos substituído 
pelo desenvolvimento da escrita. “A reputação e o uso da palavra escrita 
passaram a submeter à oralidade, de maneira a fazer daquela o mecanismo 
por excelência da oficialidade e do exercício do poder” (MEIHY& HOLANDA, 
2007, p.99). Com isso, a escrita passou a deter prestígio maior em relação à 
oralidade. 
Os usos que fazemos da oralidade são aprendidos antes mesmo do inicio da 
vida escolar. Em casa, com os familiares, com amigos e com os vizinhos, 
começamos a utilizar a língua falada. “Uma criança de 7 anos que entra na 
escola para se alfabetizar já é capaz de entender e falar a língua portuguesa 
com desembaraço e precisão, nas mais diversas circunstâncias de sua 
vida” ( CAGLIARI, 1989,p.16). 
A escola precisa está preparada para lhe dar com as habilidades orais que o 
aluno adquiriu no meio social em que vive, para que a variação linguística do 
aluno não seja estigmatizada. Pois como afirma Fávero (2005), a língua falada 
e a língua escrita possuem diferenças características de seu modo de 
aquisição, por isso a oralidade não pode se limitar aos usos que fazemos da 
escrita. 
Uma gramática visual 
José David Campos Fernandes
 Danielle Almeida
UFPB 
É difícil, nos dias de hoje, imaginar nossas leituras sem uma outra parte da linguagem: as 
representações visuais, tais como a fotografia, o desenho, mapas, entre outras. Cada vez mais 
presentes no cotidiano – tanto nas mídias impressas quanto nas digitais – as imagens mostram 
grande eficácia no plano da expressão. Deixaram de ser apenas suportes de informação mediados 
pelo texto escrito para se tornarem a própria informação. Ocupam hoje outro lugar. Elas não mais 
apenas coexistem com o texto escrito, elas constituem um outro texto. 
Kress e van Leeuwen (2000) 
Para se compreender os efeitos de sentido resultantes do texto visual, é preciso saber identificar os 
elementos utilizados para interagir com observador e construir para ele uma posição interpretativa. 
Essa não é uma tarefa corriqueira, pois, diferente do que ocorre com a escrita, a imagem permanece 
ainda um campo pouco explorado. 
A Gramática do Design Visual, proposta por Kress e van Leeuwen, ao se utilizar dos princípios da 
gramática sistêmico funcional de Halliday, como uma possibilidade de análise de objetos visuais 
(mesmo considerando que cada veículo tem suaspróprias regras e estruturas) dá destaque à análise 
de imagens e à necessidade de um maior letramento visual por parte do observador, o que corrobora 
com Dondis (1976, p. 169) que afirma que: “la comprensión visual es um médio natural que no 
necessita aprenderse sino solo refinarse mediante la alfabetidad visual” 8. 
O caminho que eles sugerem passa pela descrição e análise semiótica: perceber o nexo da ordem 
das coisas, compreender seus padrões e estruturas para produção de sentido. Analisando “o que é” 
pode se compreender “o que pode ser”. Enfim, Kress e van Leeuwen nos fornecem um aparato 
teórico que nos possibilita analisar e produzir estruturas visuais. Por isso suas propostas de uma 
gramática do design visual surge como uma importante ferramenta para a análise de imagens, que 
pode ser útil tanto para a construção destes textos, quanto para a sua análise crítica. 
TEXTO DE MARCUSCHI
O autor e pesquisador Luiz Antônio Marcuschi, em seu texto “Oralidade e Letramento”, do 
livro “Da Fala Para a Escrita: Atividades de Retextualização”, diz ser impossível fazer 
relações entre fala e escrita e investigar oralidade e letramento sem considerar seus usos 
nos vários contextos da vida cotidiana. Mais do que uma simples mudança de 
perspectiva, o autor defende uma nova concepção de língua e de texto, vistos agora, 
como um conjunto de práticas sociais.
Adotando a posição de que lidamos hoje com práticas diferentes de letramento e 
oralidade, Marcuschi reforça que as variações e manifestações linguísticas correntes são 
determinadas pelos usos que fazemos da língua e que, a partir dessa premissa, o objeto 
central de suas investigações será o que fazemos com a linguagem, ou seja, analisará as 
formas a serviço dos usos.
A escrita tornou-se um bem social indispensável, símbolo de educação, desenvolvimento 
e poder, alcançando um valor social superior à oralidade e servindo muitas vezes como 
forma de discriminação. A fala é adquirida naturalmente em contextos informais, no dia-a-
dia, enquanto a escrita é adquirida formalmente, através da escola, e, talvez esse, reflete 
o autor, seja o caráter gerador de seu prestígio. 
A fim de desfazer o mito da escrita como representação de raciocínio lógico e 
desenvolvimento e a sua supervalorização adquirida, o autor diz que a alfabetização 
evidentemente é fundamental, mas é necessário que se entenda que ambas, fala e 
escrita, são imprescindíveis para a sociedade, e que não se deve confundir os papeis e 
nem discriminar seus usuários. Interessante, diz ainda, seria se refletir melhor sobre a 
importância e o lugar da oralidade hoje, já que redescobrimos que somos seres orais.
O autor sugere a distinção das dimensões de relações entre língua falada e língua escrita. 
Apontando conceitos breves de oralidade e fala, letramento e escrita, ele aborda as várias 
tendências de estudos que se ocupam dessas relações, apontando seus problemas que, 
ao entender, de maneira geral, é a desvalorização da oralidade em relação à escrita.
A primeira tendência analisada é a de maior tradição entre os linguistas. As chamadas 
dicotomias estritas se dedicam a análise das relações entre escrita e fala e 
originaram a norma lingüística, tida como “norma culta”, e às gramáticas 
pedagógicas. Considerando a fala como lugar de erro e caos o autor sugere que 
essa perspectiva seja rejeitada.
Após, o autor nos apresenta a chamada visão culturalista, desenvolvida no intuito de 
identificar as mudanças nas sociedades que possuem a escrita. Na opinião de Marcuschi, 
essa visão engrandece ainda a escrita e apresenta outros problemas assim resumidos: 
etnocentrismo (parte do pressuposto que a introdução da escrita significa a alfabetização 
da sociedade inteira o que não procede.); supervalorização da escrita (alega a 
supremacia das sociedades que possuem a escrita sem levar em conta a desigualdade 
existente e separa as culturas em civilizadas e primitivas.); forma globalizante (desatenta 
para o fato de que não existem “sociedades letradas”, e sim grupos letrados.).
Seguindo, o autor nos descreve a perspectiva variacionista apontada como intermediária, 
que leva em conta as variações linguísticas percebendo que todas as variedades seguem 
algum tipo de norma; e a perspectiva sociointeracionista que percebe a língua como um 
fenômeno interativo e dinâmico, mas padece de um baixo potencial explicativo dos 
fenômenos da língua.
Concluindo tais apresentações, Marcuschi esclarece que a língua, em boa medida, reflete 
a organização da sociedade e que a tradição filosófica de atribuir à cultura tudo o que não 
se dá naturalmente, está cada vez mais difícil de ser mantida, já que o que torna o ser 
humano especial são as suas diferenças. A fala jamais desaparecerá ou será substituída 
por uma tecnologia, reflete ainda o autor, pois faz parte da identidade humana e as 
variações devem ser estudadas, percebidas e analisadas dentro de um contexto de usos 
e não como teorias sistemáticas.

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