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Maurício Lanzini – 6ª fase Medicina UFFS Chapecó GASTROENTEROLOGIA AULA 1 – DOENÇA ULCEROSA PÉPTICA ANATOMIA E FISIOLOGIA DO ESTÔMAGO O estômago apresenta uma capacidade volumétrica de 1,5-2L. Sua histologia divide-se entre: Camada mucosa: apresenta a chamada camada muscular da mucosa, que confere sustentação a mesma, além de possuir glândulas com funções específicas Camada submucosa: possui função estrutural (colágeno e elastina) Camada muscular: tripla (oblíqua interna, circunferencial e longitudinal) Camada serosa: continuação do peritônio visceral Glândulas Região cárdica: células secretoras de muco Corpo e fundo: células oxínticas secretam ácido, fator intrínseco e enzimas Piloro: glândulas mucosas e endócrinas (inclusive células G produtoras de gastrina), encontradas principalmente no ântro Glândula gástrica oxíntica Apresenta 4 segmentos: 1) Células mucosas do colo: produzem muco 2) Células parietais (principais na digestão): secretam ácido clorídrico e o fator intrínseco 3) Células principais: produtoras de peosinogênio 4) Células argentafins: produtoras de gastrina OBS: o predomínio de determinado segmento da glândula varia conforme a região do estômago. Fases da secreção gástrica prandial 1) Cefálica: ativação parassimpática nervo vago e acetilcolina (ver e pensar no alimento) 2) Gástrica: liberação de acetilcolina pelo nervo vago e liberação de gastrina por células G (aumento do ph) Maurício Lanzini – 6ª fase Medicina UFFS Chapecó 3) Intestinal: ocorre após a passagem do alimento pelo piloro, ocorrendo distensão intestinal e liberação de hormônios Mediadores gástricos Gastrina: maior regulador endócrino, aumenta a produção de ácido pelas células parietais e também a liberação de histamina Somatostatina: inibe a secreção gástrica por inibição da liberação de histamina Acetilcolina: estimula a produção de gastrina pelas células G Prostaglandinas: inibem a produção de ácido estomacal DOENÇA ULCEROSA PÉPTICA Caracterizada como uma erosão que atinge até a camada muscular da mucosa. É subdividida em: Úlcera duodenal (UD): mais frequente, prevalente em população mais jovem Úlcera gástrica (UG): mais comum em idosos, sendo prevalente no sexo masculino Etiologia Existem dois fatores de risco principais: 1) Presença de Helicobacter pylori: sua transmissão é oral-oral/fecal- oral, sendo mais incidente em países pobres e possuindo uma baixa taxa de reinfecção (uma vez tratada, não causa mais problemas) 2) Uso de AINEs: podem levar à perfuração e obstrução pilórica diante dos seguintes fatores de risco história prévia de doença ulcerosa por AINEs, idade maior que 75 anos, uso de outras drogas associadas (corticoide, AAS, etc) e comorbidades cardiovasculares Fisiopatologia Ocorre um desequilíbrio entre os fatores agressores e os fatores protetores. Fatores agressores: ácido clorídrico, pepsina, AINEs, tabagismo, álcool e H. pylori Fatores protetores: muco, bicarbonato de sódio, revestimento epitelial, irrigação sanguínea, proliferação celular e reconstituição epitelial O papel da H. pylori É uma bactéria gram negativa, estando presente em 60 a 95% das úlceras gástricas Libera ureases amônia alteração de ph Fatores relacionados a sua patogenicidade: aumento da secreção ácida, metaplasia gástrica no duodeno, resposta imune do hospedeiro e diminuição dos mecanismos de defesa da mucosa AINEs: inibem a síntese de prostaglandinas que atuam como um fator protetor da mucosa através da irrigação sanguínea e da liberação de bicarbonato. Outras causas de úlcera: CMV, herpes vírus, quimioterapia, clopidogrel, crack e cocaína, glicocorticoides (combinados com AINEs), doenças infiltrativas, radioterapia e Doença de Crohn. Maurício Lanzini – 6ª fase Medicina UFFS Chapecó Classificação de Johnson para úlceras (1965) Tipo 1: presente na pequena curvatura (mais comum) Tipo 2: presente na pequena curvatura e no duodeno Tipo 3: presente no piloro Tipo 4: presente na cárdia/fundo (atípica) Manifestações clínicas 1) Predomina a dor epigástrica com azia a. UD: dura 90 minutos, manifestando-se até 3 horas após a refeição (epigastralgia noturna) b. UG: dor durante a alimentação 2) Náusea e perda de peso (especialmente na UG) 3) Atentar a sinais de complicação (dor em outras regiões, melena, etc.) Exame físico Pouco sugestivo na úlcera sem complicação Na presença de complicações: Maurício Lanzini – 6ª fase Medicina UFFS Chapecó o Taquicardia e hipotensão postural (devido ao sangramento) o Abdome em tábua, sensível, sugerindo perfuração o Ruído à sucussão (método semiológico que consiste em sacudir o corpo ou parte do corpo para detectar a presença de líquido em determinada região) indica líquido retido no estômago (obstrução) Diagnóstico Endoscopia digestiva alta (+ biópsia para H. pylori feita na própria endoscopia) Exame de uréase e estudo baritado (bário + RX) menos usados Pesquisa por H. pylori Uréase rápida (material do estômago), histologia ou cultura Métodos não invasivos: sorologia (exame de sangue), respiratório com ureia e anticorpos locais em fezes Tratamento A maioria dos pacientes responde bem ao tratamento clínico Deve-se suspender fatores irritantes Utiliza-se medicações que inibem a hipersecreção gástrica Método cirúrgico é mais utilizado para complicações como hemorragia (quando não se obtém controle por endoscopia) Medicações 1) Antiácidos: ajudam a tornar o meio mais básicos e são coadjuvantes no tratamento a. Hidróxido de alumínio b. Hidróxido de magnésio 2) Antagonistas dos receptores H2 de histamina: bloqueiam a secreção gástrica por bloqueio histamínico (indicados quando os IBPs não podem ser usados) a. Ranitidina b. Cimetidina 3) Inibidores da bomba de prótons: impedem a formação de HCl, promovendo uma cicatrização rápida e sendo drogas de 1ª escolha 4) Sulcrato: sal de sacarose que forma uma película no estômago e no duodeno, sendo coadjuvante no tratamento Tratamento da H. pylori IBP + antibiótico o 1ª linha: amoxicilina + claritromicina + omeprazol o 2ª linha: amoxicilina + levofloxacina + omeprazol Tratamento cirúrgico Gastrectomia distal com reconstrução à Billroth I e II Antrectomia + bagotomia São mais comuns as cirurgias que retiram apenas uma pequena porção do estômago e que realizam uma vagotomia mais seletiva Complicações secundárias a úlceras 1) Sangramento intestinal a. Complicação mais comum Maurício Lanzini – 6ª fase Medicina UFFS Chapecó b. 20% dos paciente sangram sem quaisquer sinais e sintomas precedentes (sangra aos poucos melena discreta) 2) Perfuração a. Mais comum em idosos com uso de AINE b. UD penetra no pâncreas e UG penetra no lobo hepático esquerdo 3) Obstrução pilórica a. Menos comum, sendo relacionada ao processo inflamatório e ao edema b. Sinais e sintomas: saciedade precoce, náuseas e vômitos, dor abdominal pós-prandial e perda de peso AULA 2 – DOENÇAS INFLAMATÓRIAS INTESTINAIS (DIIs) Definição: grupo de afecções intestinais crônicas inflamatórias idiopáticas, sendo as duas principais categorias a Doença de Crohn (DC) e a retocolite ulcerativa (RU). Fisiopatologia: anormalidade da resposta imune celular, ocorrendo desregulação imunitária de aspecto multifatorial (fatores infecciosos, psicológicos e ambientais).Doença de Crohn Inflamação crônica do trato gastrointestinal, podendo ocorrer desde a boca até a região retal. Ocorre um processo transmural (afeta todas as camadas histológicas), na presença de lesões salteadas (áreas preservadas/áreas acometidas). Apresenta granulomas não caseosos e fístulas. Epidemiologia Acometimento semelhante em ambos os sexos Distribuição bimodal (2 faixas etárias mais acometidas – adolescência e final da vida adulta/idosos) Mais comum em países europeus e América Amento da incidência na América do Sul Patologia Inflamação transmural de padrão descontínuo. Acomete principalmente região de íleo terminal e de cólon. Fase inicial espessamento globoso, com edema e hiperemia da mucosa intestinal, com início das ulcerações Fase crônica úlceras, fissuras, fístulas e abcessos Envolvimento focal e assimétrico Lesão histológica primária: úlcera aftosa (surgem erosões recobrindo agregados linfoides) Presença de abcessos crípticos (nas criptas intestinais), havendo infiltrados inflamatórios nas regiões adjacentes ao epitélio normal Granuloma não caseoso não é obrigatório Clínica Depende de uma série de fatores: sítio da inflamação, extensão e severidade das complicações. Mais comum: cólicas abdominais e dor pós-prandial Sintomas sistêmicos: febre, sudorese noturna e perda de peso Náusea e vômitos podem estar associais à obstrução intestinal Maurício Lanzini – 6ª fase Medicina UFFS Chapecó Crianças e adolescentes: manifestação insidiosa, com perda de peso, falha no crescimento, artrite e febre de origem indeterminada Raramente acomete trato gástrico superior, mas podem mimetizar doença de refluxo gastroesofágico e úlcera péptica Mais comum no íleo terminal DC: quase nunca acomete o reto (ao contrário da RU) Manifestações extraintestinais o Oftalmológicas uveíte, irite e episclerite o Pele eritema nodoso e pioderma gangrenoso o Articulações artrite de grandes articulações (manifestação extraintestinal mais comum) o Vias biliares colelitíase e colangite esclerosante primária o Renal amiloidose secundária Exame físico Emagrecimento, palidez cutânea, desidratação Distensão e sons anormais intestinais diante de obstrução intestinal parcial Existência de áreas de hipersensibilidade abdominal e massas inflamatórias são comuns Importante examinar a região perianal e o reto em busca de abcessos, fístulas ou estreitamentos anais Exames laboratoriais Hemograma o Anemia falta de absorção o Leucocitose: severidade da inflamação ou complicações supurativas o Trombocitose: comum e relacionada à inflamação e deficiência de ferro Marcadores inflamatórios o Presença de níveis elevados da VHS e PCR Albumina sérica o Geralmente reduzida pela desnutrição Exame de fezes o Leucócitos fecais (diarreia de origem inflamatória) Marcadores sorológicos o ASCA (anticorpo específico autoanticorpo) Maurício Lanzini – 6ª fase Medicina UFFS Chapecó Exames de imagem Radiografia de abdome contrastada o Edema, ulcerações aftosas e lineares, estreitamentos/estenoses, fístula, separação das alças por espessamento da parede intestinal e do mesentério o Aspecto de “calçamento de pedregulhos” TC e RNM o Abscessos e espessamento da mucosa Colonoscopia o Achados: preservação do reto, alterações de cólon terminal e íleo inicial Tratamento: medidas de suporte e tratamento medicamentoso (no momento de ativação da doença) a doença é insidiosa. Recomendar repouso, suporte nutricional com terapia enteral e parenteral, além de suporte emocional. 1) Corticoides a. Especialmente para acometimento de intestino delgado b. Prednisona c. Efeitos colaterais de uso prolongado: HAS, DM, osteoporose e Síndrome de Cushing d. Não são ideais para manutenção, e o uso em surtos agudos pode ser intravenoso 2) Sulfassalazina a. Benéfica para colite de Crohn b. Efeitos colateriais diminuem com 5-ASA de forma nativa c. Necessária a reposição de folato 3) Antibioticoterapia a. Metronidazol: não recomendado > 4 meses b. Ciprofloxacino: 6 semanas a 1 ano para uso 4) Imunossupressores a. Azatioprima: 4 meses (vários efeitos colaterais acompanhar com hemograma) b. Ciclosporina: alternativa à azatioprima na fase aguda c. Inibidor de TNF alfa (infliximabe ou adalimumabe): formas graves, de custo elevado Indicações cirúrgicas Complicações incontroláveis do tratamento medicamentos (fístulas, obstrução intestinal, doença perianal extensa) Retardo de crescimento e manifestação extraintestinal (piodema gangrenoso) Difícil controle de efeitos colaterais dos medicamentos Displasia de alto grau confirmada/displasia associada à lesão ou massa (DALM) ou CA Suspeita de estenose maligna RETROCOLITE ULCERATIVA Inflamação mais superficial e difusa junto à mucosa do cólon, indo do reto ao cólon. Prevalência estável ao longo dos anos, havendo distribuição bimodal (15-25 anos e 60-70 anos). Fisiopatologia Processo inflamatório limitado à mucosa e à submucosa Ocorre atrofia da mucosa e seu espessamento muscular Lesão características: microabscessos de cripta e pseudopólipos Maurício Lanzini – 6ª fase Medicina UFFS Chapecó Considerada doenças pré-malignas (CA) Classificação Depende da extensão e do acometimento das lesões. 1) Proctite: limitada ao reto 2) Proctossigmoidite ou colite do lado esquerdo (reto e cólon esquerdo) 3) Pancolite: mais grava (cólon transverso/ascendente) OBS: lesão de back wash: a inflamação chega ao íleo (porém a origem da lesão não é nele) Clínica: depende da extensão, mas sempre acomete o reto: Tenesmo, mucorreia purulenta, diarreia de longa duração e dor abdominal Acometimento cólon: mais diarreia com sangue, muco e pus são mais pronunciada Pancolite: febre, anorexia, taquicardia, hipertensão Manifestação mais grave: megacólon tóxico o Inflamação mucosa, submucosa e muscular o Colón fica friável (paredes finas) o Risco de perfuração (cirurgia) o Febre, prostração, cólicas e distensão abdominal abdome agudo Exame físico Maioria dos casos: normal Região retal: hiperemiada, inflamada Ânus: sem alterações (mais em Crohn) Manifestações extraintestinais podem estar presentes Exames laboratoriais Hemograma: leucocitose e anemia Marcadores inflamatórios: VHS e PCR elevados Exame de fezes: leucócitos Marcador sorológico: ANCA (anticorpo contra o citoplasma do neutrófilo) não é patognomônico Exames de imagem Radiografia de abdome contrastada o Ausência de haustrações o Mucosa de aspecto granuloso o Cólon tubulizado (“em cano de chumbo”) o Estenoses Colonoscopia o Exame de escolha o Detecta se a mucosa está acometida continuadamente o Identifica pseudopólipos o Determina extensão da doença Diagnósticos diferenciais: Doença de Crohn, colite isquêmica, colagenosa e infecciosa, diverticulite, amiloidose e processos neoplásicos. Tratamento Fase aguda: ATB o Aminogliolíseo + metronidazol + ciprofloxacino o Corticoides: prednisona ou hidrocortisona Maurício Lanzini – 6ª fase Medicina UFFS Chapecó o Tratamento cirúrgico (mais “tranquila” que Crohn) Instabilidade por medidas clínicas Suspeita de neoplasia Retardo do crescimento Megacólon tóxico: urgência Fase crônica o Sulfassalazina oImunossupressores (azatioprina, ciclosporina)
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