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extração da cafeína DE PRETTO, C.a, SCHULZE, L. S.a, MONZILLO, B. M.a a Unisul, Santa Catarina Resumo A cafeína é um alcaloide muito utilizado como estimulante. O café, além de outras plantas, possui cafeína. A cafeína pode ser extraída das plantas para ser utilizada para fins comerciais, como por exemplo, na composição de medicamentos. Este trabalho teve como objetivo extrair a cafeína do pó de café torrado e moído, utilizando-se para isso, extração sólido-líquido com água quente, seguido de extração líquido-líquido com cloreto de metileno e, finalmente, à recristalização com acetona e heptano. As porcentagens de cafeína obtida após as duas extrações e após a recristalização foram respectivamente de 0,73% e 0,32%. Durante a recristalização, todo solvente evaporou, desta forma, não houve retirada de compostos indesejados durante a recristalização, assim, a perda de massa deveu-se provavelmente a perdas durante o processo. Desta forma, para análise do ponto de fusão, uma amostra muito impura foi utilizada. Não foi possível observar o ponto de fusão porque a amostra se degradou antes. Pôde-se observar a sublimação, que variou mais de 10 ºC, indicando realmente um composto muito impuro. Desta forma, as extrações sólido-líquido e líquido-líquido se mostraram eficientes para o processo de extração da cafeína, porém a etapa de recristalização com as condições utilizadas não se mostrou útil neste caso. Palavras-chave: cafeína, extração líquido-líquido, extração sólido-líquido, recristalização, café. 1. Introdução A cafeína é um alcaloide, identificado como 1,3,7-trimetilxantina, cuja estrutura contém um esqueleto de purina (Figura 1). Este alcaloide é encontrado em grande quantidade nas sementes de café (Coffee sp.) [1] e nas folhas de chá verde (Camilla sinensis) [2]. Também pode ser achado em outros produtos vegetais, particularmente no cacau (Theobroma cocoa) [3], no guaraná (Paullinia cupana) e na erva-mate (Ilex paraguayensis) [2]. Embora uma parcela pequena da população consuma cafeína na forma de fármacos, como por exemplo, antigripais, grande parte deste alcaloide é ingerida na forma de bebidas. Uma xícara de café pode conter em média cerca de 80 mg de cafeína, enquanto uma lata de Coca-Cola em torno de 34-41 mg [4]. A cafeína pertence a um grupo de compostos naturais chamados de xantinas. Em graus variados, as xantinas estimulam o sistema nervoso central e os músculos esqueléticos, o que resulta num estado de alerta que evita o sono e aumenta a concentração. Nesse sentido, a cafeína é a mais poderosa entre as xantinas. [6]. Figura 1. Estrutura química da cafeína e de outras metilxantinas A extração pode ser definida como um processo de separação de um composto, ou a transferência do soluto de um solvente, para outro. Para que ocorra a transferência é necessária que o composto seja mais solúvel no segundo solvente. A extração é muito empregada na química orgânica, principalmente em compostos de origem natural, emprega-se o uso da extração com o objetivo de isolar compostos que são facilmente encontrados entre diversos produtos de consumo. Para preparar o processo de extração de compostos orgânicos, é necessário uso de solventes com características apropriadas. Os solventes devem ser imiscíveis, ou seja, devem ser formadas no mínimo duas fases, sendo que não se deve reagir com o soluto. São utilizados solventes como: Éter dietílico, hexano, cloreto de metileno (diclorometano), entre outros solventes [5]. A extração líquido-líquido é uma maneira simples, rápida e conveniente de se separar um soluto de outros componentes indesejados [7]. Os solventes mais utilizados na extração são o clorofórmio, a acetona, o dissulfeto de carbono, os álcoois e a água, todos em sua maioria sendo razoável ou muito polares. Normalmente, as propriedades que caracterizam estes solventes são a imiscibilidade e formação de duas fases com o soluto, não reagem quimicamente com o soluto, a substância orgânica a ser extraída deve ser mais solúvel no segundo solvente [8, 9]. Classicamente, as melhores tentativas para extrair a cafeína resultam em baixa eficiência e alto consumo de solventes orgânicos nocivos ao ambiente e/ou uso de grande quantidade de energia. Novas abordagens na extração de cafeína proveniente da biomassa incluem a extração melhorada e seletiva com o uso de soluções aquosas de líquidos iônicos (classe de solventes orgânicos feita de íons, líquida à temperatura ambiente). Rendimentos de até 9% (m/m) de cafeína por peso seco de guaraná foram reportados nas extrações utilizando este método [10]. O presente experimento teve como objetivo realizar a extração e purificação da cafeína a partir do pó de café torrado por meio de extração sólido-líquido usando-se como solvente líquido a água quente, seguido de extração líquido-líquido utilizando-se como solvente orgânico o diclorometano e a purificação por recristalização com os solventes acetona e heptano. 2. Método A extração da cafeína do pó de café torrado e moído (marca Seleto, tipo tradicional) foi feita adicionando-se, em um frasco de Erlenmeyer de 250 mL, 15,01 g de pó de café e 7,00 g de carbonato de cálcio a 150 mL de água destilada. A mistura foi fervida por 20 minutos com agitação magnética em uma chapa aquecedora. Decorrido o tempo, a mistura foi filtrada a quente e à vácuo em um funil de Büchner. Depois, o filtrado foi resfriado em um congelador por 10 minutos. O filtrado foi, então, transferido para um funil de separação onde a cafeína foi extraída da fase aquosa para uma fase orgânica de cloreto de metileno. Para tanto, foram utilizadas quatro porções de 20 mL de cloreto de metileno e cada extração foi feita com agitação suave. A fase aquosa foi descartada e a fase orgânica foi seca com sulfato de sódio anidro e, posteriormente filtrada por gravidade usando-se papel de filtro qualitativo pregueado. O filtrado foi coletado em um balão de fundo chato de 250 mL previamente pesado. O filtrado foi levado ao rotoevaporador em que se procedeu a total evaporação do solvente. O resíduo obtido de cafeína bruta foi pesado em uma balança analítica e a porcentagem extraída de cafeína bruta presente no café foi calculada conforme a Equação (1), em que Pi/café % é o valor percentual da cafeína bruta no café, mrecipiente+i é a soma da massa do balão de fundo chato e da cafeína bruta, mrecipiente vazio é a massa do balão de fundo chato vazio e mpó de café é a massa do pó de café. Todos os valores foram medidos em gramas. (1) O resíduo foi então purificado por meio da recristalização em aproximadamente 6 mL de acetona a temperatura ambiente. Em seguida, a solução foi transferida para um béquer de 100 mL previamente pesado e aproximadamente 10 gotas de hexano foram adicionadas usando-se um conta gotas descartável de 3 mL. O béquer foi tampado com um vidro de relógio e a solução foi deixada em repouso por 24 horas. O resíduo sólido obtido foi pesado e uma pequena amostra foi retirada em um tubo capilar de vidro para a aferição do ponto de fusão usando-se o aparelho de determinação do ponto de fusão a seco da marca Fisatom, modelo 431D. A porcentagem de cafeína purificada presente no café também foi calculada utilizando-se a Equação (1), porém, neste caso, Pi/café % é o valor percentual da cafeína purificada, mrecipiente+i é a soma da massa do béquer e da cafeína purificada, mrecipiente vazio é a massa do béquer vazio. 3. Resultados e discussão A extração e purificação da cafeína a partir do pó de café foi realizada extraindo-se do pó a cafeína com água quente juntamente com carbonato de cálcio, seguida da extração da cafeína da fase aquosa por extração líquido-líquido com cloreto de metileno. O solvente foi então evaporado e a cafeína impura foi recristalizada usando-se como solvente acetona e heptano. As porcentagens de cafeína bruta e pura foram calculadas e o ponto de fusão da cafeína pura foi medido. A cafeína é muito mais solúvel em água quente (0,67 g/mL) do que em água fria (0,02 g/mL) [11]. Por isso, a água quente foi utilizadapara se extrair a cafeína. A cafeína pode ser encontrada nas plantas na forma livre ou combinada com taninos. Taninos são uma classe de compostos fenólicos, com caráter ácido e também são extraídos com água quente. A adição de carbonato de cálcio faz com que os taninos formem sais e, assim, se separem da cafeína e fiquem menos solúveis em água, sendo separados posteriormente da fase aquosa na etapa de filtragem à quente e à vácuo. O carbonato de cálcio reduz a eficiência da extração da cafeína, pois seu caráter básico diminui a solubilidade da cafeína em água, que na verdade, seria mais solúvel ainda se a solução fosse ligeiramente ácida. Porém, se fosse utilizada uma solução ácida, a cafeína ficaria tão solúvel em meio aquoso que na etapa de extração líquido-líquido, sua passagem para o solvente orgânico ficaria prejudicada. A seguir à filtragem à quente e à vácuo, a solução foi resfriada para que se pudesse realizar a extração com cloreto de metileno, pois este é um composto muito volátil (ponto de ebulição igual a 39,6 ºC) e, se fosse utilizada a solução aquosa com a cafeína extraída ainda quente, o cloreto de metileno poderia passar para a fase gasosa no funil de separação, prejudicando a extração e aumentando a pressão no sistema, podendo fazer com que a rolha saísse da vedação e causasse vazamentos e algum acidente indesejado. Assim, uma vez resfriada a solução, efetuou-se a extração líquido-líquido com cloreto de metileno. Durante essa extração múltipla com cloreto de metileno, procedeu-se com agitação suave para evitar a formação de emulsão. A cafeína, apesar de ser uma molécula polar e ter certa afinidade com a água, que também é polar, é uma molécula orgânica, e tem muito mais afinidade pelo diclorometano, que também é polar e possui hidrocarbonetos em sua cadeia. Desta forma, a cafeína migrou da fase aquosa para a orgânica. Em seguida, o cloreto de metileno foi removido por meio de evaporação rotativa o balão com a cafeína bruta foi pesado. A massa de cafeína bruta obtida foi de 0,11 g e a porcentagem de cafeína obtida nessa etapa foi de 0,73%. A cafeína bruta foi então solubilizada e retirada do balão de fundo chato com acetona em temperatura ambiente e transferida para um béquer. No béquer adicionou-se heptano e esperou-se que a cafeína cristalizasse. Porém, o que ocorreu foi que os solventes evaporaram totalmente, deixando um corpo sólido marrom no fundo e nas paredes do béquer, com aspecto mais de pontos sólidos do que de lâminas de cristais. Desta forma, entende-se que o que ocorreu foi a solidificação e não a recristalização. Isso pode indicar que o heptano possa não ter conseguido provocar a cristalização da cafeína como esperado, pois mesmo que os solventes tenham evaporado totalmente, cristais poderiam se formar, embora impuros. A massa de cafeína “purificada” foi pesada e o valor obtido foi de 0,05 g. Assim, a porcentagem de cafeína obtida nessa etapa em relação à massa de café foi de 0,32%. Como os solventes evaporaram e nenhum outro composto indesejado que estava na solução pôde ser removido, a massa obtida nessa etapa deveria ser a mesma da etapa de obtenção da cafeína bruta. Pode, então, ter ocorrido perdas de massa durante a transferência da cafeína e outros compostos do balão de fundo chato para o béquer. Durante a medida do ponto de fusão da cafeína “purificada”, observou-se que os pontos de cafeína se transformaram em pequenas lâminas entre as temperaturas de 194 e 215 ºC e depois esse material começou a ficar preto, como que queimado. Isso indica que a cafeína e as impurezas presentes na amostra começaram a sublimar a 194 ºC e quando a temperatura atingiu 215 ºC, os compostos começaram a se degradar. Desta forma, não foi possível analisar o ponto de fusão do produto obtido. 4. Conclusão Para a extração da cafeína do pó de café torrado e moído, procedeu-se à extração sólido-líquido com água quente, seguido de extração líquido-líquido com cloreto de metileno e à recristalização com acetona e heptano. As porcentagens de cafeína obtida após as duas extrações e após a recristalização foram respectivamente de 0,73% e 0,32%. Como não houve retirada de compostos indesejados durante a recristalização, a perda de massa deveu-se provavelmente a perdas durante o processo. Desta forma, para análise do ponto de fusão, uma amostra muito impura foi utilizada. O fato da cafeína se apresentar marrom e não branca, como reportado na literatura, corrobora o fato. Não foi possível observar o ponto de fusão porque a amostra se degradou antes. Pôde-se observar a sublimação, que variou mais de 10 ºC, também indicando um composto muito impuro. Desta forma, as extrações sólido-líquido e líquido-líquido se mostraram eficientes para o processo de extração da cafeína, porém a etapa de recristalização deve ser revista, ficando como sugestão para trabalhos futuros a avaliação de outros solventes para esta etapa. Referências [1] De Maria, C. A. B.; Trugo, L. C.; Cora, G.; Compostos bioativos em café integral e descafeinado. Quim. Nova 1996, 19, 350. [2] Bucci, L. R.; Am. J. Selected helbasand human exercise performance. Clin. Nutr. 2000, 72, 624S. [3]Caudle, A. G.; Yifang, G.; Bell, L. N.; Analytical methods for caffeine. Food Res. Int. 2001, 34, 599 [4] de Andrade, J. B.; Pinheiro, H. L. C.; Lopes, W. A.; Martins, S.; Amorim, A. M. M.; Brandão, A. M.; Determinação de cafeína em bebidas através de cromatografia líquida. Quim. Nova 1995, 18, 379 [5] Engel, R. G. et. al. Extrações, separações e agentes secantes. In:Química orgânica experimental: Técnicas de escala pequena. São Paulo, S.P: Cengage Learning, 2013. p. 136-162. [6] Pavia , Donald L. et al. Química Orgânica Exp erimental – Técnicas de escala pequena. – 2 ed. – Porto Alegre : Bookman, 2009. [7] VOGEL, A.I. Química Orgânica: análise orgâni ca qualitativa. Rio de Ja neiro, Ao Livro Técnico S.A, 1985, V.1 [8] Marambio,O.G., Métodos Experimentales en Química Orgânica. Pizarro DC.1a Ed. UTEM, , Mayo 2007 .Editorial Universidad Tecnológica Metropolitana. [9] Marques, A, Jacqueline; Borges, F.P, Cristiane; E.A.Práticas de Química Orgânica 2ed. SP: LTC. 2007. [10] Cláudio, A. F. M., et al. Enhanced Extraction of Caffeine from Guaraná Seeds using Aqueous Solutions of Ionic Liquids. Green Chem., v. 15, n. 7, p. 2002-2010, 2013. [11] Preedy, V. R. Caffeine: Chemistry, analysis, function and effects. 2012. The Royal Society of Chemistry: Cambridge, UK.