Buscar

Poder_Constituinte

Prévia do material em texto

PODER CONSTITUINTE
Prof.ª Renata Dayanne
2014.2 
1. INTRODUÇÃO:
	A teoria do poder constituinte é basicamente uma teoria de legitimação do poder. Surge quando uma nova forma de poder, contida nos conceitos de soberania nacional e soberania popular, faz sua aparição história e revolucionária em fins do século XVIII. 
	
	Esse poder novo, oposto ao poder decadente e absoluto das monarquias de direito divino, invoca a razão humana ao mesmo passo que substitui Deus pela Nação como titular da soberania. 
	O francês Sièyes desenvolve a teoria do Poder Constituinte em sua obra “O que é o terceiro Estado?” Ele fala que a ciência havia a se feito progredir com a descoberta desse conceito, extraído das páginas de sua monografia sobre o terceiro Estado. A verdade é que, na prática, os americanos já tinham efetuado essa separação básica entre poder constituinte e poder constituído, esse é um dos avanços apontados a Declaração de direitos do bom povo da Virgínia, em relação às declarações das demais colônias americanas. 
	Com efeito, a distinção fundamental entre poder constituinte e poderes constituídos consentiu o advento das Constituições rígidas, bem como, desde aí, o dogma de uma soberania que se exercitava mediante instrumentos constitucionais de limitação do poder. 
Poder essencialmente soberano, o poder constituinte, ao teoriorizar-se, marca com toda a expressão e força a metamorfose do poder, que pode ele alcançar a máxima institucionalização ou despersonalização. Dessa despersonalização, resultou, por conseguinte, uma vasta mudança nas bases da legitimidade histórica do poder constituinte, doravante reconhecida menos na vontade de um princípio de direito divino do que na vontade nacional onipotente. Sem o poder constituinte, essas duas categorias modernas do pensamento político não teriam vingado: o povo e a nação. 
Sièyes desenvolve a ideia de que a nação se fundamenta no direito natural, ao passo que o governo (poder constituído) só se orienta pelo direito positivo. Ele é o teórico do sistema representativo e acaba vendo nisto, uma perfeita oportunidade de junção com a ideia do Poder Constituinte, já que não obstante este esteja fundamentado na soberania popular, atribuir de maneira indistinta seu exercício a todos os populares, por isso, ele vê no sistema representativo uma boa oportunidade para instrumentalizar e viabilizar sua teoria do poder constituinte. 
A fórmula é a seguinte: o poder constituinte, distinto dos poderes constituídos, é do povo, mas se exerce por meio de representantes especiais. Não se faz necessário, acrescentava Sièyes, que a sociedade o exerça de modo direito, por seus membros individuais, podendo fazê-lo mediante representantes, entregues especificamente à tarefa constituinte, sendo-lhe vedado o exercício de toda a atribuição que caiba aos poderes constituídos. 
	Estudar o tema referente ao Poder Constituinte significa debruçar-se sobre o intricado problema do fundamento de uma Constituição, já que é sobre esta que repousará todo ordenamento jurídico da nação.
	É aceito que, por definição, não existe norma jurídica superior à constitucional. Esta, portanto, ocupa o patamar último do direito. Nesse sentido, o fundamento da Constituição não poderá ser encontrado em nenhuma regra de matiz jurídico, vale dizer, positivada. O Poder Constituinte é o supremo fornecedor das diretrizes normativas que constarão desse documento supremo. A Constituição, fruto dessa potência criadora, simboliza o nível jurídico último. 
	Questiona-se a respeito do fundamento da supremacia da Constituição. Responde-se afirmando que a supremacia da Constituição decorre da sua origem. Provém ela de um poder que institui a todos os outros e não é instituído por qualquer outro, de uma poder que constitui dos demais e é por isso denominado Poder Constituinte. 
	
2. CONCEITO DE PODER CONSTITUINTE:
	É a expressão maior da vontade de um povo ou grupo destinada a estabelecer os fundamentos de organização de sua própria comunidade. É um poder político fundamental e supremo capaz de criar as normas constitucionais, organizando o Estado, delimitando seus poderes e fixando-lhes a competência e limites. 
3. NATUREZA DO PODER CONSTITUINTE:
	A natureza do Poder Constituinte está relacionada diretamente à disputa entre as correntes jus naturalistas e jus positivista acerca do que é o direito. 
	Para a corrente jus naturalista, o Poder Constituinte é um poder de direito, porque é assentado no direito natural, que lhe é anterior e superior. Essa era a posição de Sieyès, para quem a nação e acima dela só há o direito natural. 
	Para os juspositivistas o Poder Constituinte é um poder de fato, porque se impõe como tal, e se funda a si próprio, e não em direito pré-existente. É um poder de fato que se impõe como tal, como força ou energia social; um poder exclusivamente político ou histórico, não jurídico, anterior ao Estado.
4. TITULARIDADE DO PODER CONSTITUINTE:
	Quando Sieyès construiu sua teoria sobre o Poder Constituinte, atribuía sua titularidade à nação. Atualmente, é predominante na doutrina a ideia de que o titular desse poder é o povo, conceito que seria mais abrangente do que nação. 
	A Assembleia Nacional Constituinte não é titular do Poder Constituinte é apenas uma das formas de sua expressão, que possibilita o exercício do Poder Constituinte originário através dos representantes populares, que tem delegação popular. Assim, distingue-se a titularidade e o exercício do Poder Constituinte, já que titular é o povo e o exercente aquele que, em nome do povo, cria o Estado, editando a nova Constituição. 
5. ESPÉCIES DE PODER CONSTITUINTE: 
	O Poder Constituinte se apresenta como originário e derivado. Destaque-se diante da implicação de que o Poder Constituinte é uno e indivisível, a adoção da terminologia Poder Constituinte Deriva traz uma contradição em termos. O que existe na verdade é uma autorização concedida pelo Poder Constituinte para que o Poder Constituído possa alterar a Constituição, seguinte um procedimento estipulado pelo Poder Constituinte Originário. 
6. PODER CONSTITUINTE ORIGINÁRIO:
	6.1. Conceito:
	É o poder que estabelece a Constituição. É um poder político supremo, destinado a elaborar o texto da Constituição do Estado e que, para tal mister, não encontra qualquer condição ou limites pré-estabelecidos no Direito, pois a este precede. 
	6.2. Características:
Inicial: pois inaugura uma nova ordem jurídica, rompendo com a anterior. Isso significa que ele revoga a Constituição anterior e todas as normas infraconstitucionais que com a nova ordem jurídica forem incompatíveis. 
Autônomo: só a seu exercente cabe fixar os termos em que a nova Constituição será estabelecida e qual o Direito deverá ser implantado.
Ilimitado: por ser soberano, não há qualquer limitação prévia imposta a ele. Essa característica deve ser entendida em termos, isso porque se o Poder Constituinte é a expressão da vontade política da nação, não pode ser entendido sem referência aos valores éticos, religiosos, culturais que informam essa mesma nação e que motivam as suas ações. Por isso, um grupo que se arrogue a condição de representante do Poder Constituinte Originário, se se dispuser a redigir uma Constituição que hostilize esse valores dominantes, não haverá de obter o acolhimento de suas regras pela população, não terá êxito no seu empreendimento revolucionário e não será considerado Poder Constituinte Originário. Quem atua como Poder Constituinte Originário deve-se consistir numa força histórica efetiva, apta a realizar os fins a que se propõe. 
Incondicionado: porque não se sujeito ou submete a nenhum processo ou procedimento prefixado para sua manifestação. Pode agir livremente, sem condições ou forma pré-estabelecida.
Permanente: não se exaure com a elaboração da Constituição. Ele continua presente, em estado de hibernação, podendo a qualquer momento ser ativado pelavontade sempre soberana de seu titular. 
6.3. Formas de expressão:
Por ser incondicionado e não está sujeito a procedimento prévio, ele pode se expressar de qualquer forma. Contudo, a maneira mais comum de expressão desse poder nas democracias representativas é através da chamada Assembléia Nacional Constituinte ou Convenções, que promulgam textos constitucionais. 
7. PODER CONSTITUINTE DERIVADO:
	7.1. Conceito:
	Trata-se de uma competência constitucional atribuída pelo Poder Constituinte Originário aos poderes constituídos de poderem alterar a Constituição ou a instituição de coletividades, tem limitações expressas e tácitas e é um poder jurídico. 
	7.2. Características:
Derivado: porque é poder de direito, juridicamente estabelecido, fundado no Poder Constituinte Originário. 
Limitado: porque a Constituição lhe impõe limitações, que podem ser temporais, circunstanciais, materiais ou procedimentais, explícitas ou implicitamente, restringido o seu exercício.
Condicionado: porque só pode manifestar-se de acordo com as formalidades traçadas pela Constituição. 
7.3. Espécies: 
Nos Estados de organização federal, o Poder Constituinte Derivado não se limita a ser aquele que reforma a Constituição, abrange também a possibilidade de, através dele, se instituir e organizar coletividades políticas regionais. Por isso, o Poder Constituinte Derivado se manifesta através do Poder Constituinte reformador e o Poder Constituinte decorrente. 
Poder Constituinte Reformador:
É aquele que se destina a reformar a Constituição. No Brasil, ele se manifesta através das Emendas Constitucionais, na forma do art. 60 da Constituição Federal de 1988. São elas, proposições destinadas a alterar pontualmente a Constituição, seguinte um procedimento específico, que adota com rigor, formalidades solenes e complexas e que torna nossa Constituição rígida.
É de se salientar que ao lado do poder de reforma, nosso Constituinte Originário de 1988, trouxe a possibilidade de uma revisão constitucional, expressa pelo art. 3º do ADCT. No entanto, essa previsão foi excepcional e autorizada a ocorrer uma única vez. 
Limitações impostas ao Poder Constituinte reformador:
	- Limitações temporais: são todas aquelas que vedam as reformas constitucionais durante determinado período de tempo. Essas limitações não mais subsistem dentro do nosso sistema constitucional, tendo ocorrido apenas na Constituição de 1824 que em seu art. 174 trazia a vedação de que a Constituição fosse emendada nos quatros primeiros anos de sua outorga.
	- Limitações circunstanciais: são aquelas que proíbem as reformas constitucionais durante a vigência de determinadas circunstâncias, consideradas anormais e inadequadas para as mudanças constitucionais, que, como natural, supõem equilíbrio, prudência e paz de espírito. Na nossa Constituição as circunstâncias que impõem essa limitação são: intervenção federal, estado de defesa e estado de sítio (art. 60, §1º). 
	- Limitações materiais ou substanciais: são aquelas que excluem do poder de reforma determinadas matérias consideradas relevantes, previstas expressa ou implicitamente pelo texto originário. São as chamadas cláusulas pétreas. Contudo, cumpre destacar que tais limitações materiais não vedam a alteração ou reforma das matérias que visam a proteger, mas sim a supressão total ou parcial delas, assegurando seu conteúdo mínimo. 
	- Limitações procedimentais ou formais: são as limitações que submetem a Emenda Constitucional à observância de um determinado procedimento. 
O exercício do Poder Constituinte Reformador está sujeito ao controle de constitucionalidade, devendo ser declaradas inconstitucionais e suprimidas do ordenamento jurídico os dispositivos de Emenda Constitucional ou a Emenda Constitucional que desrespeito esses limites. Porém é importante observar que o parâmetro do controle nessas hipóteses é bastante estreito, pois corresponde apenas àquelas limitações.
Poder Constituinte decorrente:
É aquele que, decorrendo do originário, não se destina a rever sua obra, mas institucionalizar coletividades, com caráter de organizações políticas regionais, no caso brasileiro, os Estados-Membros da nação. 
É o Poder Constituinte dos Estados-Membros da federação, que se assenta na autonomia de que eles gozam. 
É um poder ainda mais limitado, pois além das limitações impostas ao poder reformador, ele também é limitado por outras limitações difundidas pelo texto constitucional que, em virtude do princípio da simetria, obriga que os Estados-Membros a contemplarem em seus textos: observância aos princípios constitucionais sensíveis (art. 34, VII da CF/88), às limitações ao poder de tributar, às limitações decorrentes dos direitos e garantias fundamentais, das limitações concernentes às regras de repartição de competência, das limitações relativas à organização e independência dos poderes, limitações associadas ao processo legislativo, entre outras. 
Esse Poder Constituinte decorrente ele se manifesta seja na instituição do Estado-Membro ou Distrito Federal, mas também quando se quer reformar as Constituições estaduais e a Lei orgânica do Distrito Federal. 
8. MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL:
	É um processo de alteração informal da Constituição que se dá por via da tradição, costumes, interpretação judicial e doutrinária. Segundo Anna Cândida da Cunha Ferraz é o processo que altera o sentido, o significado e o alcance do texto constitucional sem violar-lhe a letra e o espírito. 
	É um processo informal de alteração de sentidos, significados e alcance dos enunciados normativos contidos no texto constitucional através de uma interpretação constitucional que se destina a adaptar, atualizar e manter a Constituição em contínua interação com a sua realidade social. 
9. DIREITO CONSTITUCIONAL INTERTEMPORAL:
	É a parte do direito constitucional que cuida da situação jurídica do direito infraconstitucional precedente diante da nova Constituição.
	9.1. Recepção: 
	Com a revogação da Constituição anterior pela nova Constituição, o direito infraconstitucional existente à época fica sem fundamento de validade, com isso, pode ele seguir dois rumos: ou é recepcionado pela nova Constituição ou é revogado pela mesma. 
	Haverá a recepção quando o direito infraconstitucional anterior à nova Constituição estiver em consonância material com a nova Constituição. Assim, a recepção é o fenômeno pelo qual a Constituição recebe a ordem normativa infraconstitucional anterior, surgida sob a égide das Constituições precedentes, se com ela tais normas forem substancialmente compatíveis, ainda que formalmente não o sejam, havendo a devida adequação de ordem formal. 
	9.2. Repristinação:
	É o fenômeno jurídico através do qual se restabelece uma norma revogada por ter havido a revogação da lei que a revogou. A princípio, no nosso ordenamento jurídico pátrio isso é vedado pela Lei de Introdução ao Código Civil (art. 2º, §3º). Contudo pode uma Constituição vir a restabelecer lei que, não obstante não tenha sido recepcionado pela Constituição anterior, é compatível com a que se estabelece, mas para que isso ocorra, é necessária expressa disposição constitucional. 
	9.3. Desconstitucionalização: 
	É a recepção pela nova ordem jurídica, de disposições da Constituição anterior, mas como lei ordinária. É o aproveitamento das normas constitucionais da Constituição que se está revogando, por guardarem pertinência material com a nova Constituição, contudo com status de lei ordinária, devendo, para tanto, haver expressa disposição constitucional para isso. 
 
************************************************************** 
BIBLIOGRAFIA UTILIZADA:
BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 20ª Edição. São Paulo: Malheiros, 2007. 
BRANCO, Paulo Gustavo Gonet; COELHO, Inocêncio Mártires; MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional. 4ª Edição. São Paulo: Saraiva, 2009. 
CANOTILHO,Joaquim José Gomes. Direito Constitucional e teoria da Constituição. 7ª Edição. Coimbra: Almedina, 2003. 
CUNHA JÚNIOR, Dirley da. Curso de Direito Constitucional. Salvador: Juspodivm, 2008. 
DANTAS, Ivo. Constituição e Processo. 2ª Edição. Curitiba: Juruá, 2008. 	
MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 17ª Edição. São Paulo: ATLAS, 2005.
TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2003. 
�PAGE �
�PAGE �2�

Continue navegando