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1 Tópico 10 – Política Monetária Introdução Este tópico tem por objetivo desenvolver habilidades e competências que permitam ao aluno compreender o significado e as funções da moeda no sistema de economia de mercado, bem como os indicadores de seu volume conjuntural; interpretar o processo inflacionário, conhecer suas causas segundo a Teoria Econômica e manipular corretamente os diversos índices utilizados para mensurá-la; e avaliar a política monetária do governo e os instrumentos que a constituem. O tema desta aula é a moeda. Este termo designa de forma genérica o que costumamos chamar de dinheiro. Vamos discutir o conceito e os atributos da moeda e qual seu papel na economia. Também entraremos no tema da principal doença da moeda: a inflação. Vamos conhecer um pouco a política monetária, observando os instrumentos que o governo utiliza para controlar o volume de moeda em circulação e controlar a inflação. Além disso, vamos discorrer, de forma sumária, sobre o sistema financeiro no Brasil, no qual circula a maior parte da moeda existente na economia. 1. Breve História da Moeda A necessidade de algum tipo de medida de valor dos bens, que servisse também para trocá- los entre si, vem desde o final da pré-história. As primeiras civilizações já realizavam intensas trocas de mercadorias, tanto internamente como umas com as outras. Comunidades primitivas podem trocar os bens entre si sem precisar de moeda, simplesmente através da troca direta. Isso deixa de funcionar quando as trocas não são mais eventuais (produzi mais feijão do que precisava, gostaria de ter mais arroz; procuro alguém que tenha excesso de arroz e o troque por feijão). Definir os valores recíprocos (quanto de um vale o outro), acertar as quantidades, achar o interessado na troca exata que desejamos fazer, tudo isso é complexo e não funciona regularmente. A moeda simplifica tudo. Vendo meu feijão por moeda e utilizo-a para comprar arroz, sem precisar achar quem deseja fazer a troca inversa. Os preços dos bens também acabam se acertando mais facilmente. Enfim, as trocas frequentes tornaram a moeda uma necessidade. A moeda teve várias fases. Inicialmente, usava-se algum bem abundante na época e no lugar: o sal foi um dos primeiros, daí a palavra salário. Gado também foi utilizado: carneiros na Roma antiga (antes de ser o grande Império que todos conhecem) – daí a palavra “pecúnia”, “pecuniário”, que se refere a algo pago em dinheiro, cuja raiz é o latim “pecus” – gado (que também é a origem de pecuária, pecúlio1, etc.). Mais tarde, usou-se algum metal tido como precioso, por ser muito útil e escasso. Daí as moedas de cobre, bronze, prata e ouro. Essa foi a fase das moedas metálicas, que durou até o final da Idade Média na Europa. Essas moedas primeiramente eram locais e mais tarde passaram a ser nacionais (somente o governo do país podia emiti-las). 1 E significa: soma economizada e reservada em dinheiro para uma eventualidade futura. 2 Mas logo essas moedas conheceram a inflação: os reis emitiam moedas com menor teor metálico para cobrir suas despesas excedentes (já existia déficit público); isso gerou alguns tumultos sociais famosos naquele período, pois as pessoas se viam mais pobres – as moedas valiam menos, o que significava preços mais altos. Uma terrível crise inflacionária sacudiu a Europa um século após a descoberta da América. Os metais preciosos encontrados pelos espanhóis circularam pela Europa durante o final do século XVI e metade do século XVII, quadruplicando os preços em geral. Essa explosão de preços teve importantes consequências sociais e econômicas, as quais estão na raiz da Revolução Industrial - origem do capitalismo contemporâneo. Nessa época, começou a circular a chamada moeda-papel, títulos emitidos pelos bancos e casas de crédito em nome do depositante do metal real. Os negócios fluíam muito rapidamente dentro dos países e entre estes. Ninguém saía mais carregando sacolas de ouro e prata, substituídos por esses documentos das instituições a quem o metal estava confiado. Eles tinham aceitação geral e as casas de crédito intercambiavam-nos entre si, cobrindo apenas o saldo devedor com metal sonante. O passo seguinte foi a emissão do papel-moeda (as cédulas oficiais do dinheiro de cada país) emitidas e garantidas pelo governo através de uma reserva em ouro – o lastro da moeda. O sistema foi acertado entre as principais potências e passou a ser chamado de padrão ouro. Cada país emitia sua moeda (em metal comum e em papel) de acordo com suas reservas em ouro e o governo comprometia-se a trocá-la por ouro a quem desejasse, a uma taxa fixa. Assim, também, as contas dos diversos países nas suas transações comerciais eram acertadas, seguindo as taxas de conversão para o ouro de cada moeda nacional. O sistema do padrão-ouro foi substituído no final da Segunda Guerra Mundial (1945) por um sistema em que apenas o dólar norte-americano seria trocado por ouro, a uma taxa fixa. Todas as demais moedas podiam ser trocadas por dólares, a taxas também fixas. Em 1971, o presidente Nixon, dos EUA, decretou o fim da conversibilidade do dólar em ouro, encerrando essa fase. Desde então, as moedas nacionais flutuam de forma aleatória e são garantidas pelos governos como fonte de valor – mas sem qualquer garantia em bens reais (moeda escritural). Paralelamente a essa evolução dos tipos de moeda, assistimos ao desenvolvimento do Sistema Financeiro, em especial dos bancos comerciais, que trouxe consigo um novo tipo de moeda: a moeda escritural. Inicialmente, os bancos surgem como depositários das reservas (moedas, primeiramente ouro, depois papel-moeda) dos indivíduos. Mantendo uma cobertura de 100% sobre os depósitos realizados, isto é, sendo apenas um guardião das moedas, concedia um certificado conversível para que os indivíduos realizassem suas transações. Estes depósitos realizados nos bancos possuem a mesma liquidez do papel-moeda, já que o certificado era conversível a vista em papel-moeda: são os depósitos à vista. Também existe a possibilidade de se efetuar depósitos a prazo, onde os depositantes recebem dos bancos certificados que, no entanto, só podem ser resgatados depois de passado algum tempo, em geral acrescido de um ganho adicional de papel-moeda (por exemplo, os CDB – Certificados de Depósitos Bancário). 3 Com a evolução do sistema bancário e a proliferação de agências, essas notas bancárias passaram a ser aceita como moedas e cada vez mais a liquidação das transações se deram pela compensação entre estas notas, com transferência de saldos entre os titulares. Assim, passou-se a requerer cada vez menos a conversão dessas notas nas moedas depositadas. A quantidade de moeda (os meios de pagamentos) passou a constituir-se tanto do papel- moeda emitido pelos governos e carregado pelos indivíduos (moeda manual), como dos depósitos à vista (moeda escritural) no sistema bancário, já que através das notas (cheques) podia-se livremente dispor destes depósitos. Esse processo de desenvolvimento do sistema bancário e a crescente aceitação de suas moedas mostrou que os bancos não precisariam manter em reservas a totalidade dos recursos que lhes eram confiados, uma vez que a probabilidade de saque simultâneo de todos os depósitos era muito baixa. Assim, a prática bancária mostrou que poderiam manter em reservas um volume inferior ao depositado, emprestando o resto para outros agentes. Dessa forma, transfere-se poder de compra ao tomador de empréstimos, sem que o titular do depósito perca o direito de sacá-loquando assim o desejar. Nesse processo, os bancos comerciais criam moeda, uma vez que a mesma unidade monetária que possui liquidez absoluta para o depositante é transferida ao mutuário (recebedor do empréstimo) que também pode utilizar seu poder de compra. Temos, dessa forma, o chamado mecanismo multiplicador de meios de pagamento, com os bancos compartilhando com as autoridades monetárias (governo) o poder de criação de moeda. Com base em determinado nível de reservas, os bancos comerciais criam poder de compra adicional em um sistema de reservas fracionárias, ao transformar os depósitos em empréstimos, dando poder de compra a ambos (depositantes e tomadores de empréstimos). 2. Funções e Características da Moeda A moeda não tem uma definição aceita universalmente, por isso se delimita a moeda a partir das suas funções. Assim, a moeda possui três funções: 1) meio de troca; 2) unidade de conta; 3) reserva de valor. Portanto, a moeda é algo que é aceito pela coletividade por desempenhar essas três funções. A função meio de troca pode ser entendida ao se pensar o que seria a sociedade atual se não houvesse um meio de troca aceito por todos. Sem moeda, todas as trocas deveriam ser diretas, ou seja, voltava-se a economia do escambo, troca de mercadorias por mercadorias. Assim, um criador de galinhas que desejasse comprar roupas deveria procurar um alfaiate que desejasse comer galinhas e com ele entrar em entendimento para fechar o negócio. Assim, teria que ocorrer uma dupla coincidência de desejos, e em seguida teriam que ser resolvidas as questões da quantidade e da divisibilidade: quanto de roupas seria necessário para comprar uma galinha? Ou vice-versa. Com a moeda esse problema pode ser resolvido, ou seja, elimina-se a dupla coincidência de desejos. O criador de galinhas pode vender suas galinhas para um comprador e receber moeda em troca. Por sua vez, utilizará essa moeda para comprar o que quiser de qualquer outro fornecedor, inclusive as roupas do alfaiate. Com isso, tem-se uma economia de tempo, esforço e informações que serão utilizados no setor produtivo, aumentando o nível de produção e de bem-estar da sociedade. Portanto, como meio de troca, a moeda é o intermediário para todas as transações econômicas, tanto de bens e serviços, quanto de fatores de produção (já que é usada para 4 pagar salários, lucros, juros e aluguéis). Somente se tiver aceitação generalizada, ela pode cumprir essa função. O governo impõe o uso da moeda nacional em todas as transações – por isso se diz que a moeda possui curso forçado. A segunda função da moeda é ser unidade de conta, ou seja, a moeda serve para comparar o valor de mercadorias diversas. Imagine uma sociedade sem a moeda e que alguém se interessa por uma camisa de uma determinada loja e indaga pelo seu preço. Certamente a resposta será complexa, uma vez que sem moeda o preço teria que ser expresso em relação a cada bem da economia: tantas dúzias de bananas, tantas galinhas, tantas laranjas e assim por diante. Diante disso, a loja provavelmente levaria muito tempo para determinar o preço de suas camisas, já que existem milhares de bens na economia. E quando finalmente isso fosse feito, certamente as relações de oferta ou de demanda desses bens na economia teriam mudado, tendo que recalcular todos os preços novamente. Com a introdução da moeda, todos esses cálculos são eliminados. A moeda fornece o “referencial” para que as demais mercadorias cotem seus valores. O preço da camisa ou de qualquer outro bem seria único e expresso em moeda corrente. O preço relativo entre as diferentes mercadorias passa ser definido pela relação entre os respectivos preços monetários. Com isso, todo tempo dispendido no cálculo do bem seria liberado para o setor produtivo, aumentando o nível de produção e, por conseguinte, de bem-estar da sociedade. Como reserva de valor, parte da renda pode ser poupada, isto é, não utilizada imediatamente no consumo. Uma pessoa que recebe uma renda qualquer tem que administrar o seu uso. Sem moeda, a sua renda seria recebida em bens ou produtos reais e o que não fosse logo consumido teria que ser trocado ou estocado. Porém, surge três problemas. Primeiro, não é todo produto que pode ficar estocado por um período relativamente longo de tempo, como os produtos perecíveis, de modo que corre o risco de perder parte ou toda a poupança/estoque se não for trocada imediatamente. Porém, para ser trocado deve haver a coincidência de desejos, o que muitas vezes leva algum tempo. Portanto, o risco de perder parte da poupança/estoque é muito alto. Segundo, o estoque de produtos gera custos e perda de espaço, reduzindo o bem-estar da sociedade. Terceiro, os bens estocados sofrem algum tipo de depreciação e que, portanto, reduz o seu valor em relação ao momento em que a pessoa estocou esse bem. Em outras palavras, de um jeito ou de outro o poder de compra do bem não é preservado. Contudo, sendo a moeda um ativo líquido e com um poder de compra generalizado para a aquisição de qualquer bem, em qualquer data, permite ao usuário reter o excedente da renda praticamente a custos nulos. Esta característica dá à moeda a função de reserva de valor. Os problemas da moeda – e da economia – começam quando ela perde uma ou mais dessas funções. Houve época, no Brasil, em que ninguém guardava moeda, pois era o mesmo que gelo: derretia. As contas também eram feitas usando outro padrão – geralmente, o dólar. Só assim podiam-se comparar preços, lucros, salários, etc., sem incorrer em equívoco. Estivemos a um passo de ver nossa moeda nacional perder até a função de meio de troca, sem o que ela deixaria de ter qualquer significado econômico. Esse trabalho destrutivo foi feito pelo maior dos males que pode acometer uma moeda: a inflação. No entanto, para cumprir as funções devidas, a moeda precisa ter as seguintes características físicas: 5 1) Ser facilmente divisível (divisibilidade) 2) Ser bastante portátil (portabilidade) 3) Ser durável em termos físicos (durabilidade) O governo possui o monopólio da emissão da moeda e tem a tarefa de assegurar essas características físicas e, principalmente, as três funções descritas mais acima. Para isso, ele precisa defender o valor da moeda, combatendo a inflação. Também deve evitar o oposto, a deflação (queda de preços). Esse problema causa tantos ou mais horrores econômicos quanto à inflação. Deflação associa-se a depressão econômica: queda do PIB, falências e desemprego. Uma redução dos preços pode gerar uma redução nas taxas de lucros, gerando desestímulos ao investimento e, por conseguinte, aumentando a taxa de desemprego, provocando reduções no consumo e, portanto, no PIB. Por isso, a função estabilizadora do governo é tão importante e reconhecida por economistas de todas as tendências. Por isso, a política monetária busca manter estável o valor da moeda nacional. 3. Política Monetária O objetivo de estabilizar o valor (ou poder aquisitivo) da moeda nacional é perseguido pelo governo através da política monetária. Esta compõe-se de diversos instrumentos. Os mais importantes são os seguintes: a) Taxa de juros: ao fixar os juros que pagará pelos seus próprios títulos, o governo (através do Banco Central) estabelece um piso no mercado de crédito. Ninguém lançará títulos a taxas mais baixas que as dos títulos públicos, pois estes são muito mais garantidos e os aplicadores recusarão taxas mais baixas. Como os empréstimos em geral são garantidos por títulos lançados pelas instituições financeiras (depósitos a prazo, etc.), estas precisam competir com o governo na captação derecursos de aplicadores para obterem os fundos que utilizarão no crédito, na outra ponta. Juros altos desestimulam os tomadores de crédito e esfriam os negócios, dificultando a prática de aumentos de preços; b) Emissões: seu volume e limites são definidos pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) e sua execução está a cargo do Banco Central. O governo deve emitir moeda para acompanhar o crescimento dos negócios. Se o crescimento dos negócios for menor do que o crescimento da oferta de moeda, o governo pode reduzir a oferta de moeda até que seja adequada com o crescimento dos negócios. Se o crescimento dos negócios for maior do que o crescimento da oferta de moeda, o governo pode aumentar a oferta de moeda de forma adequada com o crescimento dos negócios. No primeiro caso, a política monetária é contracionista e no segundo caso expansionista. Quando se observa excesso/escassez de moeda e o governo tenciona reduzir seu volume ou aumentá-lo sem novas emissões, os demais instrumentos entram em ação; c) Compulsórios: são depósitos obrigatórios dos bancos comerciais junto ao Banco Central, de um percentual dos depósitos à vista de seus correntistas. O objetivo é evitar que os bancos utilizem o dinheiro desses depósitos no crédito, ampliando os meios de pagamento. Assim, se ocorrer uma diminuição do % de recolhimento do compulsório, a oferta de moeda aumenta. O Banco Central faz uma política monetária expansionista. Se ocorrer um aumento do % de recolhimento do compulsório, a oferta de moeda diminui. O Banco Central faz uma política monetária contracionista. 6 d) Taxa de redesconto: é um empréstimo de última instância do Banco Central aos bancos comerciais que se encontram descobertos ao final de suas operações diárias. Aumentando ou reduzindo a taxa desse empréstimo, o Banco Central estimula ou desestimula a ousadia dos bancos comerciais na concessão de crédito (maior ousadia implica em maior risco de terminar descoberto e ter de recorrer ao redesconto). Assim, temos uma: Política monetária expansionista quando ocorrer uma queda na taxa de juros do redesconto. Uma vez que essa queda aumenta a ousadia dos bancos comerciais em conceder empréstimos e, portanto, aumenta a oferta monetária. Política monetária contracionista quando ocorrer um aumento na taxa de juros do redesconto. Uma vez que esse aumento reduz a ousadia dos bancos comerciais em conceder empréstimos e, portanto, reduz a oferta monetária. e) “Open Market”: é o mercado onde as autoridades monetárias negociam os títulos da dívida pública com objetivos ligados à política monetária. Assim, se as autoridades monetárias quiserem aumentar a quantidade de moeda em circulação (política monetária expansionista), compram títulos da dívida pública ao preço de mercado. Se quiserem diminuir a quantidade de moeda em circulação, vendem títulos da dívida pública ao preço de mercado; Em geral, o combate à inflação é feito com elevação da taxa de juros, aumento das porcentagens e prazos de recolhimento dos compulsórios, aumento da taxa de redesconto e operações de enxugamento de moeda via open market. O combate à recessão utiliza os instrumentos opostos (baixa dos juros, redução do compulsório e do redesconto, ampliação dos meios de pagamento através do open market). As doses de cada instrumento e a combinação final de todos eles dependem dos objetivos mais específicos do governo, além do estudo de seus impactos sobre outras variáveis (déficit público, dívida pública, câmbio, etc.). 4. Agregados Monetários Há dois conceitos de moeda muito utilizados para mensurar o seu volume na economia (tanto o governo como os analistas privados estão sempre acompanhando as alterações nesse volume). O primeiro é chamado de base monetária. Esse é o agregado básico, do qual decorrem os demais. A base monetária inclui o papel- moeda em poder do público (PMPP) de pessoas físicas e empresas não financeiras, e o volume de reservas (R) mantidos pelos bancos comerciais (sendo uma parte mantida no caixa dos bancos e outra no caixa do Banco Central) 2 . B = PMPP + Reservas A base monetária pode ser entendida como o dinheiro com poder de multiplicação. Corresponde a toda moeda física disponível (papel moeda e moeda metálica), exceto a que ficou retida no caixa das autoridades monetárias. É esta variável que o Banco Central pode tentar controlar, por meio do controle do nível de emissão e pelo controle sobre o nível de reservas bancárias mantidas pelos bancos comercias. O segundo é chamado de Meios de Pagamento, que se dividem em M1, M2, M3 e M4. 2 Estes depósitos são em parte obrigatório e em parte voluntário. 7 A convenção universal estabelece que, no conceito de meios de pagamento M1, a moeda seja constituída do papel-moeda emitido pelo Banco Central em poder do público mais o saldo dos depósitos à vista 3 (DV) nos bancos comerciais. Assim, M1 = PMPP + DV Este conceito foi ampliado ao longo do tempo, porém, em sentido mais amplo no qual se incluem outros ativos com elevado grau de liquidez, as definições de moeda têm se alterado ao longo do tempo. O desenvolvimento do sistema financeiro tem permitido a ampliação da liquidez dos ativos, o que complica a tarefa de definir o que incluir na categoria meios de pagamento. Esses ativos financeiros, que rendem juros, e são de alta liquidez, constituem-se em quase- moedas. O surgimento das quases-moedas levou a novos conceitos de agregados monetários, cuja diferença decorre do grau de liquidez dos ativos considerados. Além de M1, no caso brasileiro os agregados utilizados são: M2 = M1 + depósitos especiais remunerados + depósitos de poupança + títulos emitidos por instituições depositárias M3 = M2 + quotas de fundo de renda fixa + operações compromissadas registradas na Selic M4 = M3 + títulos públicos de alta liquidez Teoricamente, cada um destes diferentes agregados tem liquidez diferente, ou seja, capacidade diferente para transformar-se em moeda para realizar transações com bens e serviços; ao mesmo tempo, há um prêmio maior (rendimento), dada a perda de liquidez. Em períodos de inflação elevada, diminui o grau de monetização da economia, pois a coletividade, para defender-se, procura aplicar mais recursos que rendem juros, retendo menos moeda ou depósitos à vista. Ou seja, diminui o total de M1 relativamente ao total de aplicações financeiras (M4). Quando a inflação diminui, ocorre o contrário: aumenta a relação M1/M4, ocorrendo a remonetização da economia. Comparando os dois conceitos, percebemos que: a) Os depósitos à vista nos bancos comerciais não fazem parte da Base Monetária e sim dos Meios de Pagamento; b) O papel-moeda mantido em caixa pelos bancos está na Base Monetária, mas não nos Meios de Pagamento; c) Os depósitos dos bancos comerciais junto à autoridade monetária (Banco Central) estão na Base Monetária, mas não nos Meios de Pagamento. 3 Depósitos em conta corrente. 8 5. A Inflação, Deflação e Desinflação: conceito, causas, consequências e medidas A inflação pode ser conceituada como um aumento contínuo e generalizado no nível geral de preços (os preços “inflam”, daí o nome). Ou seja, os movimentos inflacionários representam elevações em todos os bens produzidos pela economia e não meramente o aumento de um determinado preço. Outro aspecto fundamental refere-se ao fato de que o fenômeno inflacionário exige a elevação contínua dos preços durante um períodode tempo, e não meramente uma elevação esporádica dos preços. A desinflação corresponde ao aumento de preço, mas em um ritmo cada vez mais lento. Por outro lado, a deflação corresponde ao inverso da inflação da inflação, ou seja, reduções de preços. Portanto, taxas de inflação negativas. A deflação acontece quando um tênis que custava R$ 100 no mês passado passa a custar R$ 90, por exemplo. Já na desinflação, um tênis que havia ficado 10% mais caro no mês anterior ficou apenas 5% mais caro no mês seguinte. A deflação, quando se transforma em uma tendência, pode ser tão ruim quanto à inflação alta. A causa mais comum é a recessão. Quando os preços caem demais e se transforma em uma tendência, os consumidores deixam de consumir e passam a poupar, acreditando que o dinheiro valerá mais no futuro. Com efeito, isso provoca uma queda no consumo agregado (supondo tudo o mais constante), que por sua vez gera uma tendência de queda do PIB. Por sua vez, os consumidores ao reduzirem suas compras, forçam as empresas a reduzirem seus preços, o que implica na redução dos lucros e, portanto, na redução dos investimentos. Desse modo, agravando ainda mais a recessão. A principal forma de se controlar ou combater uma deflação é através do estimulo ao consumo que pode ser via emissão de moeda, redução da taxa de juros, estimulo ao crédito dentre outras alternativas. Causas da inflação Tradicionalmente, a literatura econômica consagrou duas correntes básicas: a inflação provocada pelo excesso de demanda agregada (inflação de demanda) e a inflação causada por elevação de custos (inflação de custos ou de oferta). Inflação de demanda A inflação de demanda, considerada o tipo mais clássico de inflação, diz respeito ao excesso de demanda agregada, em relação à produção disponível de bens e serviços. Intuitivamente, pode ser entendida como dinheiro demais à procura de poucos bens. Parece claro que a probabilidade de inflação de demanda aumenta quanto mais à economia estiver próxima de um ponto de pleno emprego de recursos. Afinal, se houver recursos ociosos em larga escala na economia, é de se esperar que um aumento da demanda agregada deva corresponder a um aumento da produção agregada de bens e serviços, pela maior utilização de recursos antes desempregados, sem que necessariamente ocorra um aumento generalizado de preços. Quanto mais próxima do pleno emprego, reduz-se a possibilidade de uma expansão rápida da produção, e a repercussão maior deve se dar sobre os preços. 9 Como esse tipo de inflação está associado ao excesso de demanda agregada, e tendo em vista que, a curto prazo, a demanda é mais sensível a alterações de política econômica que a oferta agregada (cujos ajustes normalmente se dão a prazos relativamente longos), a política preconizada para combate-la assenta-se em instrumentos que provoquem uma redução da demanda agregada por bens e serviços. Portanto, quando as pressões inflacionárias são decorrentes de excesso de demanda agregada, isto quando o produto efetivo (Q) é maior que o produto potencial (Qp), a prescrição é simples: reduzir a demanda agregada, mediante políticas monetárias e/ou fiscais contracionistas, até trazer a economia de volta a Qp. A lógica é a mesma demonstrada abaixo: Se a economia encontra-se inicialmente no ponto 0 (P0, Qp) e sofre um deslocamento da demanda agregada de DA0 para DA1 – em consequência, digamos, de um choque “favorável” de demanda -, ela superaquecerá, e seu equilíbrio de curto prazo passará a ocorrer no ponto 1 (P1, Q1). Neste caso, indubitavelmente, a terapia correta consiste em trazer a economia de volta para o ponto 0 através de uma política monetária e/ou fiscal contracionista. O governo pode agir tanto direta como indiretamente para reduzir o processo de inflação de demanda. A atuação direta dá-se pela redução dos próprios gastos do governo. Evidentemente, a redução dos gastos do principal comprador de bens e serviços tem um efeito imediato e eficaz sobre a demanda agregada. A atuação indireta do governo ocorre por meio de políticas que desencorajam o consumo e o investimento privado. Por exemplo, pode implementar uma política monetária que procure restringir a quantidade de moeda e de crédito, ou então uma política fiscal que provoque um aumento da carga tributária, tanto sobre bens de consumo como sobre bens de capital. Os keynesianos ou fiscalistas atribuem a inflação de demanda à aceleração excessiva da economia, quando os negócios fluem com muita rapidez e a renda monetária cresce mais que a oferta de bens e serviços. Nessa situação, defendem política monetária restritiva (reduzindo o volume de moeda em circulação) e política fiscal contracionista para contrair a demanda agregada, como a diminuição dos gastos públicos e/ou aumento de impostos. Os economistas da escola monetarista (corrente conservadora crítica do keynesianismo e que ganhou terreno nas últimas décadas) atribuem a inflação ao descontrole monetário do governo, devido aos seus excessos fiscais: ao aumentar seus gastos e gerar sucessivos déficits, o governo emite moeda para cobrir esses déficits e, portanto, desvalorizando-a. Os 1 0 P1 P0 Q1 Qp Q P OA DA0= DA2(↓M S ) DA1(↑G) 10 monetaristas não acreditam na política fiscal e defendem uma política monetária mais forte no sentido de redução da oferta de moeda (que pode ser feita através dos instrumentos de política monetária visto anteriormente). Inflação de Custos A inflação de custos pode ser associada a uma inflação tipicamente de oferta. O nível de demanda permanece praticamente o mesmo, mas os custos de certos insumos importantes aumentam e são repassados aos preços dos produtos. Como o preço de um bem ou serviço tende a relacionar-se bastante com seus custos de produção, se estes aumentam, mais cedo ou tarde o preço do bem provavelmente aumentará. Diante disso, é possível identificar pelos três fontes da inflação de custos: 1) crescimento dos salários acima da produtividade; 2) poder de monopólio ou oligopólio; 3) choques de oferta. Se o crescimento do salário for acompanhado de um crescimento proporcional da produtividade, os custos unitários de produção não são afetados. Portanto, não é todo aumento de salário que vai provocar aumento dos preços. Este ocorre apenas quando o crescimento dos salários for maior do que o crescimento da produtividade. Isto pode ocorrer, por exemplo, quando os sindicatos possuem um poder de barganha capaz de forçar um aumento de salários a níveis acima dos índices de produtividade. Quando isso ocorre, os custos de produção de bens e serviços aumentam que, ao ser repassado para os preços, resulta no surgimento da inflação. A inflação de custos também está associada ao fato de algumas empresas, com elevado poder de monopólio ou oligopólio, terem condições de elevar seus lucros acima do aumento dos custos de produção. Nesse sentido, a inflação de custos também é conhecida como inflação de lucros. Geralmente a inflação de lucros estar associada ao fenômeno da estagflação, ou seja, a combinação de desemprego com inflação. Isso pode ser devido ao fato de, em períodos de queda de atividade produtiva, as firmas com poder de monopólio terem condições de manterem suas margens de lucros sobre os custos (ou mark-up), ao aumentarem o preço de seus produtos finais. O nível de produto e de emprego está caindo e, mesmo assim, os preços estão subindo. Finalmente, os choques de oferta têm raiz no clima ou na política: quebras de safra,altas de insumos-chave como o petróleo, “apagões” como tivemos no Brasil em 2001, desvalorizações cambiais violentas como a de 2002. A oferta se retrai e os preços sobem. Nesse caso, recomenda-se usar a política monetária apenas para evitar a propagação desses choques para toda a economia; outras opções, que muitos consideram mais eficazes em tais casos, são a abertura para importações ou negociações de preços e salários entre o governo, empresários e sindicatos de trabalhadores. Uma distinção necessária, quando se trata de analisar a inflação de custos, é separar a inflação de custos induzida pela inflação de demanda da inflação de custos autônoma. A inflação de custos induzida ocorre quando a inflação de demanda leva a um aumento do lucro das empresas, em termos nominais. Esse aumento de lucros pode estimular as empresas a aumentarem sua produção e, consequentemente, a procura de mão de obra. Entretanto, se a mão de obra estiver quase que completamente empregada, deve ocorrer uma concorrência entre firmas pela mão de obra escassa, redundando num aumento dos 11 salários oferecidos aos trabalhadores. Ou seja, o aumento de custos, devido ao aumento dos salários, foi, em última instância, induzido pela inflação de demanda preexistente. Mas o que caracteriza, na realidade, o termo inflação de custos é o aumento de preços devido a pressões autônomas, causadas pela circunstância de alguns grupos econômicos, como sindicatos e empresas oligopolistas, terem suficiente poder de barganha para forçarem aumentos de sua participação na renda nacional ou, então, por choques de oferta associados a aumentos de preços de matérias-primas (como petróleo e derivados) e de produtos agrícolas. No caso da inflação de demanda agregada, o controle da inflação é feito através da redução da demanda agregada. Porém, no caso da inflação de custos, o controle é um pouco mais complicado. Por exemplo, considere que a pressão sobre os preços seja originária de um choque de oferta desfavorável, ou seja, de um deslocamento da função oferta agregada para cima e para a esquerda, de OA0 para OA1 – digamos, em consequência de um “choque do petróleo” ou “apagão”, ou mesmo de um aumento do salário-mínimo. O resultado é o abaixo ilustrado: o choque de oferta desfavorável tem efeitos “estagflacionários” sobre a economia, fazendo com que ela simultaneamente eleve os preços e reduza produção/renda real, transitando do ponto A (P0, Q0) para o ponto B (P1, Q1). Suponha que se tente tratar tal fenômeno como se fosse uma inflação de demanda, aplicando, como no caso anterior, uma política monetária contracionista destinada a trazer de volta os preços a P0. Como se pode perceber no gráfico abaixo, o tratamento, se adequadamente dimensionado, realmente é capaz de fazer com que o nível de preços volte a P0 (ponto C). Perceba, porém, que o resultado no curto prazo é piorar ainda mais o desemprego, na medida em que a referida política reduz ainda mais o nível de produção/renda real (de Q1 para Q2) e, portanto, o emprego. B A OA1 DA0 P1 P0 Q1 Qp Q P OA0 Q2 C B A DA1(↓M) OA1 DA0 P1 P0 Q1 Qp Q P OA0 12 Assim, a tentativa de tratar uma inflação de custos com instrumentos desenvolvidos para o tratamento da inflação de demanda pode dar resultados muito ruins. Uma alternativa consistiria em tentar reconduzir a economia ao ponto Qp mediante políticas expansionistas, que desloquem o equilíbrio para o ponto D (P2, Qp) ao invés de C. Como se pode perceber no gráfico abaixo, o tratamento, se adequadamente dimensionado, realmente é capaz de fazer com que o nível de produção/renda real volte a Qp, deslocando a curva de demanda de DA0 para DA1 mediante, digamos, uma política monetária expansionista (↑M S ). Perceba, porém, que o resultado no curto prazo é aumentar ainda mais as pressões inflacionárias, na medida em que a referida política eleva o nível geral de preços de P1 para P2: Economistas mais keynesianos argumentam que esta solução é melhor – ou menos ruim – que a anterior, na medida em que o aumento de preços seja considerado um “mal menor” que o desemprego do ponto de vista social. Mas a política meio que sanciona o surto inflacionário. Em tese, a solução correta para o choque de oferta desfavorável consistiria em tentar deslocar a curva de oferta agregada de volta ao ponto de partida A, como mostra o gráfico abaixo: A solução permitiria, se adequadamente dimensionada, reduzir o nível de preços de volta a P0 e, ao mesmo tempo, reconduzir o nível de produção/renda real a Qp. Contudo, intervenções de política econômica sobre a curva de oferta agregada são consideravelmente mais complicadas de conceber e executar que mudanças na demanda agregada. Além da inflação de demanda e da inflação de custos, a inflação pode ser do tipo inercial. A inflação inercial na verdade é um tipo de inflação de custos que pode ser definida como um padrão auto-reprodutor das elevações de preços e salários. Esse padrão tende a ocorrer quando se tem uma indexação generalizada na economia – todos os preços, impostos, D B A P2 DA1(↑M S ) OA1 DA0 P1 P0 Q1 Qp Q P OA0 B A OA1 DA0 P1 P0 Q1 Qp Q P OA0 = OA2 13 contratos, salários e aluguéis acabam sofrendo reajustes de acordo com um ou alguns índices de preços, que medem a inflação. Assim, todos vão jogando a alta de preços de ontem para frente e ela se eterniza. Gera-se uma tendência estável de inflação, em lugar de preços estáveis. Choques de oferta, nesses casos, só aumentam o patamar da inflação, que depois se repete ano a ano naquele patamar. Esse tipo de inflação foi diagnosticado no Brasil por economistas brasileiros que elaboraram uma série de planos antiinflacionários apoiados nessa teoria, culminando no Plano Real. Consequências da Inflação A inflação pode levar a diversas consequências negativas sobre o funcionamento da economia, destacando-se os seguintes: a) Altas de preços generalizadas produzem distorções econômicas, porque os preços não sobem todos ao mesmo tempo, há uma dispersão dos preços relativos: a relação entre os preços sofre mudanças pulverizadas e eles deixam de serem referências válidas para decisões dos agentes econômicos. b) A inflação causa concentração de renda, porque os mais pobres têm maiores dificuldades de se defender, enquanto os ricos podem reajustar suas rendas, ganhar no mercado financeiro, dolarizar seus ativos, etc. c) Ambientes de alta inflação, ao dificultar o cálculo de ganhos, perdas e comparações, e também por atiçar ganhos especulativos e levar a altas taxas de juros como meio de defesa do governo, inibem o investimento produtivo, causando impasse no crescimento econômico. d) Elevadas taxas de inflação, em níveis superiores ao aumento de preços internacionais, encarecem o produto nacional relativamente ao produzido externamente. Assim, devem provocar um estímulo às importações e um desestímulo às exportações, diminuindo o saldo do balanço comercial (SBC = X – M). Para eliminar esse déficit na balança comercial, o governo pode permitir a desvalorização cambial, que torna as exportações mais baratas e as importações mais caras. No entanto, o setor produtivo pode ser dependente de insumos importados como petróleo, fertilizantes, equipamentos sem similar nacional entre outros que se tornarão maiscaros. Com isso, os custos de produção se elevam e são repassados para os preços, elevando novamente os preços nacionais e gerando todo o efeito novamente. e) Outra distorção provocada por elevadas taxas de inflação prende-se à formação das expectativas sobre o futuro. Particularmente o setor empresarial é bastante sensível a esse tipo de situação, dada a relativa instabilidade e imprevisibilidade de seus lucros. O empresário fica num compasso de espera, enquanto a conjuntura inflacionária perdurar, e dificilmente tomará iniciativas no sentido de aumentar seus investimentos na expansão da capacidade produtiva. Assim, a própria capacidade de produção futura e, consequentemente, o nível de emprego pode ser afetado pelo processo inflacionário. f) A distorção da inflação sobre a formação das expectativas sobre o futuro também afetam as vendas parceladas e o acesso ao crédito. Para evitar perdas diante de um processo inflacionário, o número de parcelas tende a ser menor e o acesso ao crédito se torna mais restrito e mais caro, já que o credor não sabe o valor que a moeda terá no momento em que o devedor pagar sua dívida. Portanto, ao tornar o crédito mais restrito e mais caro, o consumo tende a diminuir e, por consequência, a reduzir o nível de emprego e produto da economia. 14 Medidas A medição da inflação é feita por índices de preços, que acompanham o nível geral dos preços ao longo do tempo para detectar sua variação. Em geral, observamos três tipos principais de índices de preços: no varejo (também chamados de índices do Custo de Vida ou de Preços ao Consumidor), no Atacado e Gerais. A maioria dos índices conhecidos refere-se ao varejo. Somente a Fundação Getúlio Vargas (FGV) calcula o Índice de Preços no Atacado (IPA) e o Índice Geral de Preços (IGP). O IGP é uma média ponderada do Índice de Preços ao Consumidor, coletado em doze capitais brasileiras (peso de 30%), do IPA (peso de 60%) e do Índice Nacional da Construção Civil (INCC), com peso de 10%. Assim, é o único índice que mede realmente a inflação, porque observa os principais preços na economia, tanto para as famílias (varejo), como para as empresas (atacado). Uma versão do IGP para o mercado financeiro (o IGP-M, cuja sigla incorpora a expressão “de mercado”) é calculada com antecedência de dez dias, com divulgação no final de cada mês (o IGP normal é divulgado no dia 10 do mês seguinte). Na verdade, a coleta de preços do IGP vai de 1 a 30 de cada mês e a do IGPM, de 21 a 20. Costuma-se utilizar o IGP no conceito de Disponibilidade Interna (daí a sigla completa: IGP-DI), que acompanha apenas os preços no mercado interno. O IGP também é calculado no conceito de Oferta Global (OG), incluindo produtos transacionados no mercado internacional, mas seu uso é mais restrito. O IBGE calcula o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) e o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Índices desse tipo baseiam-se em Pesquisas de Orçamentos Familiares (conhecidas pela sigla POF), nas quais famílias selecionadas têm suas compras acompanhadas durante alguns meses, gerando uma distribuição de bens e serviços em termos percentuais. Esses percentuais médios transformam-se na ponderação (pesos) do índice. Em seguida, pesquisas mensais desses preços são realizadas e as variações são ponderadas por esses pesos para compor o índice do mês. O INPC utiliza ponderações de famílias com renda até oito salários mínimos e o IPCA, de um a quarenta salários mínimos. Ambos pesquisam onze regiões metropolitanas do País. Além destes, o IPC da FGV, citado acima, assim como o IPC elaborado pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas da USP (FIPE) e o Índice do Custo de Vida calculado pelo Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio-Econômicos (Dieese), compõem a lista dos índices mais conhecidos e populares no Brasil. Os dois últimos restringem-se aos preços coletados no município de São Paulo: a FIPE usa uma ponderação extraída de famílias de um a vinte salários mínimos e o Dieese, de um a trinta. O IPCA é o índice adotado para fixar as metas da inflação e consta dos acordos com o FMI. Em certo sentido, isso o torna o índice mais importante: todo o mercado acompanha a sua evolução, projetando as reações do governo a qualquer “estouro” da meta oficial. No entanto, nem sempre esse índice é utilizado em estudos econômicos, onde o IGP, pelas razões já assinaladas, costuma ter preferência, principalmente quando se analisa não apenas o consumo, mas também a produção (os custos das empresas são melhor expressos pelos preços no atacado). 15 6. Sistema Financeiro O conjunto das instituições públicas e privadas que organiza e concentra os fluxos de moeda na economia é chamado de sistema financeiro. O sistema financeiro público é composto pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), pelo Banco Central do Brasil (BACEN), pelo Comitê de Política Monetária (COPOM), pelo Banco do Brasil, pela Caixa Econômica Federal (CEF), pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e pelos bancos de desenvolvimento regionais (Banco do Nordeste e Banco da Amazônia). O CMN é o órgão superior que define a política monetária do governo (os instrumentos de política monetária vistos anteriormente). As metas e a orientação geral são definidas pelo CMN, composto pelos ministros da Fazenda e do Planejamento e pelo presidente do BACEN. Uma das atribuições do CMN é estabelecer a meta de inflação do ano corrente e, principalmente, do ano seguinte, acompanhando a execução da política monetária pelo BACEN de forma a avaliar se a meta está sendo atingida. O COPOM levanta as informações sobre a inflação e o desempenho da economia, as projeções do mercado sobre a inflação, o PIB e a taxa de juros e define a taxa de juros dos títulos públicos (denominada taxa Selic – Sistema de Liquidação e Custódia), compatível com a meta fixada pelo governo (CMN). O BACEN é o principal órgão executor da política monetária. Ele concentra quatro funções: Banco dos bancos – fornecedor de recursos de última instância para os bancos privados em caso de necessidade e receptor de depósitos voluntários e compulsórios dos mesmos. Gestor do Sistema Financeiro Nacional – o BACEN autoriza o funcionamento das instituições financeiras e regulamenta suas atividades, emitindo normas e circulares. Emissor da moeda nacional – compete ao BACEN a decisão de emitir e a definição do volume emitido. Banqueiro do Governo – o BACEN financia o Tesouro Nacional através da emissão de títulos de crédito, recebe depósitos do Governo e administra sua dívida interna e externa. Também é o gestor das reservas internacionais do País e do fluxo de capitais do e para o País. O Banco do Brasil e a CEF são instituições financeiras federais. O primeiro atua como agente financeiro do governo e opera o crédito rural e industrial, além de administrar o comércio exterior brasileiro. A CEF atua no financiamento da habitação e saneamento básico e capta depósitos de poupança e contas correntes. O BNDES é o instrumento do governo para financiar projetos de investimento públicos e privados com impacto importante na economia. Tanto as empresas estatais, como empresas privadas nacionais e estrangeiras, utilizam-se das linhas de financiamento desse banco para ampliar (ou instalar) suas atividades. O mesmo papel, em escala regional, é desempenhado pelos bancos oficiais de desenvolvimento do Nordeste e da Amazônia, mais envolvidos em financiamentos a pequenas e médias empresas, produtores cooperados, etc. 16 O sistema financeiro privado é constituídopelos bancos comerciais, que captam depósitos à vista e atuam no crédito de curto prazo; bancos de investimento, que captam depósitos a prazo e fornecem capital de mais longo prazo às empresas; pelas sociedades de crédito, financiamento e investimento (financeiras), responsáveis pelo crédito ao consumidor; pelas sociedades de arrendamento mercantil (leasing); pelas associações de poupança e empréstimo; e pelos bancos múltiplos, que são uma fusão da maioria dessas instituições numa única com diversas carteiras de crédito e financiamento. Como já dito, a regulamentação desse setor é uma das atribuições do Banco Central. 7. O Regime de Metas de Inflação Desde 1999, a política monetária brasileira segue o regime de metas de inflação. Sinteticamente, ele funciona com base em decisões do CMN sobre a inflação desejada no ano corrente e nos seguintes. O COPOM analisa os indicadores da conjuntura econômica para observar se a inflação está caminhando em direção à meta definida ou, ao contrário, está se afastando dela. Além dos indicadores da economia real e dos índices de preços, também é observada a previsão dos principais agentes financeiros do mercado, porque ela forma expectativas dos agentes econômicos que se refletirão em suas políticas de preços. Com base nesse conjunto de informações, o COPOM decide mensalmente a taxa de juros dos títulos públicos (denominada Selic), influindo sobre o conjunto das taxas de juros do mercado. Os demais instrumentos de política monetária também podem ser acionados, mas nos últimos anos a taxa de juros tem sido de fato, a arma principal do governo no combate à inflação. As críticas a essa concentração da política monetária na taxa de juros partem de economistas que não a consideram como o instrumento mais eficiente, devido a seus efeitos colaterais. De fato, aumentos na taxa de juros fazem crescer a dívida interna do governo e ocasionam novas despesas, pressionando os déficits públicos. No final do processo, se o governo financiar esse déficit através da emissão de moeda, pode-se ter mais inflação. Além disso, taxas de juros muito altas – como tem ocorrido no Brasil – desestimulam os investimentos produtivos. Sem estes, é impossível manter o crescimento do PIB em bases sustentáveis. Se o PIB não cresce, as receitas tributárias também ficam estagnadas, obrigando o governo a aumentar a carga fiscal (o que acaba prejudicando de novo o crescimento econômico via redução do consumo) ou a incorrer em novos déficits. Essa crítica parte fundamentalmente de um diagnóstico de inflação de custos, para a qual as restrições de política monetária são pouco eficazes, a não ser para evitar a propagação dos efeitos a toda à economia. O debate prossegue até os dias de hoje. Questões originais têm vindo à tona. Por exemplo, será que o Brasil possui uma taxa de juros de equilíbrio – isto é, aquela que estabiliza a inflação em patamares baixos – mais alta que a média dos países? E, se for, quais serão os motivos? Ou será que tudo não passa de uma visão política estreita, que acaba beneficiando o setor financeiro em prejuízo dos setores produtivos da economia? 17 Síntese Este tópico teve por objetivo proporcionar ao aluno o conhecimento básico sobre a política monetária de qualquer governo, bem como conhecer o sistema financeiro brasileiro. Mas antes foi reservada uma seção para uma breve revisão história da moeda. Em seguida, discorreu sobre as funções da moeda e os instrumentos de política monetária. Depois, discutiram-se os diversos tipos de agregados monetários e diversos tipos de inflação. Por foi, colocado em evidencia o sistema financeiro nacional e o regime de metas de inflação.
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