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Parecer Juarez Tavares ADPF

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PARECER∗ 
 
1. Consulta-me o ilustre Professor Doutor Daniel Sarmento, Coordenador da Clínica 
de Direitos Fundamentais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e 
doravante identificado como consulente, acerca da relação entre as condições concretas 
de funcionamento do sistema prisional brasileiro e o alcance dos objetivos manifestos da 
pena, bem como sobre a viabilidade de o Poder Judiciário levar em conta tais condições 
nos momentos da fixação e execução das penas privativas de liberdade e medidas 
cautelares de prisão. 
 
2. O consulente apresenta, de forma objetiva, as seguintes indagações: 
 
1. O atual cenário do sistema prisional brasileiro compromete a 
realização dos objetivos normalmente atribuídos à pena de prisão? 
2. Quais são os efeitos do cumprimento da pena, nessas condições, 
sobre a segurança pública? 
3. Pode-se dizer que a pena cumprida nessas condições se afigura, na 
prática, mais gravosa ao apenado do que aquela prevista em lei e 
imposta pelo Poder Judiciário? 
4. Neste caso, deve o Poder Judiciário levar em consideração esta 
natureza mais gravosa da sanção, ao fixar a pena e ao decidir os 
incidentes da execução penal? 
5. Estas condições degradantes devem ser levadas em consideração 
também na imposição de medidas cautelares penais? 
 
3. No presente parecer, busca-se esclarecer algumas questões controvertidas acerca 
do funcionamento do sistema carcerário, de forma também a propor instrumentos 
político-dogmáticos de contenção de tendências autoritárias do poder de punir. A resposta 
aos quesitos seguirá, em síntese, o seguinte roteiro argumentativo: (i) inicialmente, 
discorrer-se-á brevemente acerca das funções manifestas da pena e da sua atual 
relevância para uma discussão sobre eficácia; (ii) na sequência, levando em conta 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
∗ Parecer pro bono, redigido em face da relevância da matéria para o direito brasileiro. Gostaria de 
agradecer, nesta oportunidade, a Ademar Borges, João Marcos Braga de Melo, Patrick Cacicedo, Rafael da 
Escossia e Tiago Joffily pela colaboração inestimável na pesquisa, coleta de informações e sugestões 
relacionadas ao tema. 
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especialmente as teorias da prevenção especial positiva e negativa, confrontar-se-ão tais 
elaborações discursivas com dados concretos de funcionamento do sistema carcerário 
nacional; (iii) por fim, na penúltima seção deste parecer, desenvolver-se-ão os conceitos 
de pena real, pena ficta e também o princípio da flexibilidade da pena, bem como a 
relação entre culpabilidade e individualização da pena, de forma a – no contexto da 
produção de sentenças, imposição de medidas cautelares e incidentes da execução penal – 
propor estratégias de contenção da sistemática violação aos direitos fundamentais de 
centenas de milhares de pessoas submetidas ao sistema carcerário brasileiro. 
 
I – As funções manifestas da pena em vista do contexto carcerário nacional 
 
4. Acerca da primeira indagação realizada pelo consulente, devem ser traçados, para 
fins metodológicos, alguns questionamentos acessórios: 
 
(i) Quais são os objetivos normalmente atribuídos à pena de prisão? 
No contexto de tais objetivos (ou funções manifestas) da pena, quais 
possuem relevância teórica para a discussão ora apresentada? 
(ii) Qual é a atual situação do sistema carcerário nacional? 
(iii) Qual relação pode ser estabelecida entre os questionamentos (i) e 
(ii)? 
 
5. Em um primeiro momento, é necessário que se esclareçam os possíveis sentidos 
de que se pode valer a atuação punitiva. Embora consciente da pluralidade de adesões 
teóricas que o tema vem adquirindo, ao longo dos anos, reserva-se este parecer a 
apresentar uma breve digressão histórica do discurso jurídico-penal de legitimação da 
pena. 
 
6. No decorrer da evolução do sistema punitivo, encontram-se, de um lado, as 
chamadas teorias absolutas, cuja expressão se consubstancia nos conceitos de expiação 
ou compensação da culpabilidade;1 de outro, identificam-se as teorias relativas – ou 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
1 SANTOS, Juarez Cirino dos. Direito Penal – Parte Geral. 5.ed. Florianópolis: Conceito Editorial, 2012, 
p. 419. 
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preventivas –, estas destrincháveis nas correntes da prevenção geral (positiva ou 
negativa) e da prevenção especial (também positiva ou negativa). 
 
7. As teorias absolutas, independente da dificuldade em resumi-las em uma única 
formulação, estão sempre, de algum modo, vinculadas a um mero juízo formal2 ou a 
certos pressupostos normalmente enunciados pela doutrina corrente, tais como o prévio 
cometimento do crime3 ou o problemático ideário abstrato de justiça.4 Pode-se dizer, 
assim, que as concepções absolutas – historicamente dispersas – não pretendem afirmar, 
em princípio, qualquer tipo de argumento utilitário da pena.5 Para todos os efeitos, não 
parece lógico que se recorra a dados objetivos de criminalização a fim de se aferir a 
eficácia concreta (ou as condições para tanto) da sanção orientada retributivamente, uma 
vez que o seu objetivo reside, de maneira tautológica, na própria repressão.6 Depois da 
Segunda Guerra Mundial, especialmente com a edificação de Estados regidos por uma 
Constituição, cuja guarda foi cometida às Cortes Constitucionais, as quais passaram a 
enfatizar a subordinação do poder de punir à demonstração de sua efetiva utilidade para a 
pessoa humana e a sociedade (princípio da idoneidade), a doutrina penal vem 
demonstrando certo desprezo pelas teorias absolutas ou retributivas. Assim, ROXIN 
enumera os seguintes argumentos contra sua adoção: a) a teoria não explica quando se 
tenha que punir, senão afirma sempre a necessidade da punição; b) fracassa diante de 
traçar um limite ao poder de punir; c) não impede que se inclua no Código Penal qualquer 
conduta e, dá, assim, um cheque em branco ao legislador para criminalizar tudo o que 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
2 TAVARES, Juarez. La racionalidad, el derecho penal y el poder de penar: los límites de la intervención 
penal en el Estado Democrático. In: Racionalidad y derecho penal. Lima: Idemsa, 2014, p. 133. 
3 BOSCHI, José Antonio Paganella. Das penas e seus critério de aplicação. 7. ed. Porto Alegre: Livraria do 
Advogado Editora, 2014, p. 88. 
4 ROXIN, Claus. Problemas Fundamentais de Direito Penal. Coleção Vega Universidade: Lisboa, 1986, p. 
16. 
5 Opta-se aqui, pois, por uma adesão tácita – o que não se confunde com concordância – ao sentido 
categorial de punição proposto por Immanuel Kant. A saber: ZAFFARONI, Eugenio Raúl; BATISTA, 
Nilo, et al. Direito Penal Brasileiro: primeiro volume – Teoria Geral do Direito Penal. 4. ed. Rio de Janeiro: 
Revan, 2011, p. 114. 
6 É evidente que a busca pela noção abstrata deproporcionalidade pode resultar na coerente indagação 
acerca da gravidade em concreto da punição frente ao grau de intensidade da lesão do bem jurídico. Mais 
adiante neste parecer, no entanto, tal questão será abordada sob outro enfoque, qual seja, o do atendimento 
aos princípios constitucionais e internacionais de proteção à pessoa. Para todos os efeitos, tal perquirição 
não se situa na seara da teleologia e, portanto, não é objeto da atual controvérsia. 
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quiser; d) é insustentável a tese de compensação de culpabilidade, pois se baseia num 
atributo indemonstrável, que é a liberdade de vontade; e) mesmo se admitindo a 
possibilidade de uma retribuição, essa ideia só pode ser considerada plausível mediante 
um ato de fé, porque não será racional pretender excluir um mal por meio de outro mal, 
que é sofrer a pena. Relativamente ao último argumento, assim se pronuncia ROXIN: 7 
 
Certamente, está claro que tal procedimento corresponde ao arraigado 
impulso de vingança humana, do qual surgiu historicamente a pena; 
mas que a assunção de retribuição pelo Estado seja algo 
qualitativamente diverso da vingança, que a retribuição elimine a 
culpa de sangue do povo, expie o delinquente, etc., tudo só concebido 
por um ato de fé, que, conforme nossa Constituição, não pode ser 
imposto a ninguém, nem é válido para a fundamentação, vinculante a 
todos, da pena estatal. 
 
8. Esses argumentos são encampados pela doutrina penal contemporânea, que não se 
vê autorizada a descartar que ao Estado democrático cumpre o papel de evitar a vingança 
e buscar todos os recursos a tornar exequível a convivência. A crítica de ROXIN é 
pertinente, mas, ao contrário do que enuncia, não corresponde a uma suposta natureza 
humana a subsistência de um impulso de vingança. Mais correta, nesse ponto, é a 
consideração de FROMM, em oposição à chamada etologia de LORENZ, no sentido de 
que o ser humano não está cunhado naturalmente por um instinto agressivo, o qual nada 
mais é do que a expressão das contradições sociais que se desenvolvem em seu contexto.8 
Essa assertiva, ainda que sob outros enfoques, vem sendo corroborada, com estudos de 
psicologia experimental, efetuados, principalmente, pela Escola de Psicologia de Yale, 
que descartaram a origem instintiva da agressão e consequentemente do chamado 
impulso de vingança.9 
 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
7 ROXIN, Claus. Fundamentos político-criminales del derecho penal. Buenos Aires: Hammurabi, 2008, 
p. 52 e ss. 
8 FROMM, Erich. Anatomia da destrutividade humana, Rio de Janeiro: Zahar, 1975, p. 22. 
9 MEILI/ ROHRACHER. Lehrbuch der experimentellen Psychologie, Stuttgart/ Wien: Hans Huber, 1972, 
p. 323 e ss. 
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9. Apesar das deficiências das teorias absolutas, centradas na retribuição, há um 
movimento moderno de recuperá-las, no sentido de uma teoria de retribuição negativa, 
limitadora, que serviria ao postulado de redução do poder punitivo sob a égide de uma 
textura ética. Para tanto, é indispensável valer-se, inicialmente, da teoria do bem jurídico 
e só admitir a punição de uma conduta quando se tratar de lesão ou de perigo a bens 
essenciais à pessoa humana; também, ao se contrapor à tendência das teorias relativas ou 
preventivas, que pretendem excluir o conceito de culpabilidade e substituí-lo pela 
periculosidade, o que implicaria uma ampliação desmedida do leque das punições; 
finalmente, deve-se sedimentar a ideia de que uma teoria retributiva só terá validade na 
medida em que esteja vinculada a um conceito substancial de fato punível, restringido 
àquelas hipóteses de uma efetiva lesão de bens jurídicos essenciais. Assim, diz 
NAUCKE:10 
 
A proposição de que a pena deve ser retribuição justa não é uma forma 
simples com a qual o âmbito de punição, a partir do Direito positivo, 
ou mesmo a pena possam ser justificados. Essa proposição tem um 
significado bastante preciso, exigindo ela um conceito determinado de 
delito. Não pode ser uma teoria absoluta da pena sem um conceito 
estrito de delito. 
 
10. Mas NAUCKE, por seu turno, admite que o direito penal atual se orienta por 
finalidades, daí concebendo que, ao lado de um direito penal retributivista, subsista um 
direito penal utilitário.11 Este parece ser, assim, o ponto principal a ser enfrentado: como 
superar as teorias retributivistas e como manejar a teoria preventiva, no sentido utilitário, 
sob o lema da proteção do sujeito. 
 
11. A análise das teorias relativas ou preventivas – aquelas cuja pena criminal se 
justifica em virtude dos conceitos de segurança social e prevenção do crime 12– conduz, 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
10 NAUCKE, Wolfgang. O alcance do direito penal retributivo em Kant. In: Greco/Tortima (org.). O bem 
jurídico como limitação do poder estatal de incriminar? Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 95. 
11 NAUCKE, Wolfgang. Op. cit., p. 97. 
12 BRUNO, Aníbal. Direito Penal: Parte Geral, Tomo 3o – Pena e Medida de Segurança. Editora Forense: 
São Paulo, 1956, p. 34. 
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como consequência, à investigação mais pormenorizada acerca do funcionamento das 
agências punitivas, especialmente do sistema carcerário. Com isso será possível 
identificar as condições efetivas da execução, bem como da eficácia da pena sobre a vida 
futura do condenado e sobre o próprio processo criminalizador. 
 
12. As teorias preventivas têm como característica se estenderem a toda a 
coletividade (prevenção geral negativa ou positiva), mediante um ato de coação 
decorrente da ameaça de pena, e também aos autores dos fatos puníveis (prevenção 
especial negativa ou positiva), com sua execução. Convém observar, todavia, que não 
existe uma teoria preventiva exclusiva. Todas estão mescladas com asserções retributivas 
ou relativas. As teorias da prevenção geral negativa (ou dissuasão) foram constituídas, 
sobretudo, pelas contribuições de FEUERBACH, ROMAGNOSI e BENTHAM. 13 
Conforme indicam ZAFFARONI e NILO BATISTA,14 as teorias da prevenção geral 
negativa ora se acossam de conteúdo retributivo,15 ora assumem teor relativo16 mais 
evidente. Em ambas as situações, “a medida da pena é uma moderação da 
exemplarização”. 17 
 
13. Indagações acerca da eficácia de tal efeito dissuasório, no entanto, encontram-se 
fora da análise das condições concretas do sistema prisional18 e devem ser perquiridas 
mediante um estudo conjunto da extensão da programação criminal, da gravidade em 
abstrato das cominações e da população carcerária em termos numéricos. A avaliação 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
13 BRUNO, Aníbal. Op. cit., p. 38. 
14 ZAFFARONI, Eugenio Raúl; BATISTA, Nilo, et al. Op. cit., pp. 115-116. 
15 Aproximam-se da retribuição, pois, em duas versões (conforme indicam os autores): “quando pretendemdissuadir para assegurar os bens daquelas que poderiam ser futuras vítimas de outros, postos em perigo 
pelo risco da imitação da lesão aos direitos da vítima e, por isso, carentes de retribuição na medida da 
injustiça e da culpabilidade pelo ato” ou ainda “para introduzir obediência ao estado, lesionado por uma 
desobediência objetiva apenada na medida adequada à retribuição do injusto”. Idem, p. 115. 
16 Assim, quando “a dissuasão persegue tanto a obediência ao estado quanto a segurança dos bens 
daqueles que não são vítimas, o delito é um sintoma de dissidência (inferioridade ética) e a medida da 
pena deve ser a retribuição por essa condução desobediente da vida”. Idem, pp. 115-116. 
17 Idem, p. 116. 
18 É de se destacar, ainda mais, que a aproximação do teor retributivo, conforme já foi indicado, implica 
uma menor potencialidade de verificação teleológica. Assim, a relevância da presente investigação deveria, 
ainda que hipoteticamente, restringir-se ao sentido mais utilitário possível acerca do termo “dissuasão”. 
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acerca da eficácia desse efeito pedagógico geral da pena, de cuja legitimidade se deve 
seriamente duvidar,19 não faz parte do objetivo do presente parecer.20 
 
14. Na seara da prevenção especial, a variante negativa visa, fundamentalmente, à 
“neutralização (ou inocuização) do condenado, consistente na incapacitação para 
praticar novos crime durante a execução da pena” 21 , o que corresponde a um dos 
enunciados do Programa de Marburg, apresentado por VON LISZT.22 Uma corrente mais 
radical postula ainda a eliminação (orgânica) do sentenciado.23 Aqui, cabe atentar para 
dois pontos fundamentais: (i) o primeiro consiste na inviabilidade constitucional, em vista 
dos princípios de proteção à pessoa,24 de sustentação do paradigma organicista de 
eliminação do sentenciado, tal como se encontra em GAROFALO;25 (ii) o segundo, à 
parte de qualquer indagação acerca da legitimidade legal ou teórica de tal corrente 
preventiva, corresponde à aferição concreta da ocorrência de crimes durante o 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
19 A prevenção geral negativa, defendida por Feuerbach, segundo a qual o objetivo final da norma é a 
intimidação geral, por meio da anulação do impulso da sensualidade de todas as ações delituosas, também é 
seriamente criticada, sendo pertinente o alerta de que a prevenção geral não oferece limites ao poder 
punitivo do Estado (QUEIROZ, Paulo. Funções do direito penal. 2.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 
2005, p. 36). Essa teoria, ademais, está baseada na máxima de que a intimidação – cuja eficácia é bastante 
discutível – é atingida com a imposição de um mal a alguém para que os outros se omitam de cometer outro 
mal. Não há fundamento válido de legitimação da aplicação da pena para o desviante. A legitimação estaria 
fora do fato e do sujeito concreto. Em suma, a teoria “é político-criminalmente discutível e carece de 
legitimação” (Idem, p. 36). 
20 Esboça-se aqui, todavia, a ineficácia da ameaça penal para coibir comportamento criminosos. Tal 
afirmativa, entretanto, comporta raras hipóteses passíveis de comprovação, tais quais – conforme indicam 
Zaffaroni e Nilo Batista (Op. cit., p. 118) – os crimes de menor gravidade, em que a comprovação empírica 
do efeito dissuasório “é completamente excepcional e nem sequer o próprio protagonista poderia afirmá-la 
com certeza” ou ainda os estados de terror caracterizados por penas cruéis e indiscriminadas, estas 
naturalmente vedadas pelo ordenamento pátrio (art. 5o, XLVII, CF). Nesse sentido, ainda: SANTOS, Juarez 
Cirino dos. Op. cit., p. 427. 
21 SANTOS, Juarez Cirino dos. Op. cit., p. 424. 
22 LISZT, Franz von. Der Zweckgedanke im Strafrecht, in ZStW, vol. 3 (1883), p. 1-47. 
23 GAROFALO, Raffaele. Criminologia. Studio sul delitto e sulla teoria de la repressione, 1891, p. 158. 
24 Assim, TAVARES, Juarez. Culpabilidade e Individualização. In: Cem anos de reprovação. Rio de 
Janeiro: Editora Revan, 2011, p. 132. 
25Vide dispositivo constitucional: “Art. 5o [...] 
XLVII - não haverá penas: 
a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX; 
b) de caráter perpétuo; 
c) de trabalhos forçados; 
d) de banimento; 
e) cruéis;” 
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cumprimento de pena.26 Relativamente ao Programa de Marburg, ressalta BAURMANN 
que, independentemente de seu sentido preventivo, que aparentemente implicaria um 
direito penal substancialmente orientado para a proteção de bem jurídico, padece de, pelo 
menos, dois defeitos: a preferência pelos interesses da sociedade e do Estado, em 
desconsideração dos direitos e interesses do condenado e do efetivo benefício que esse 
poderia obter com a execução da medida, portanto, no sentido puramente epistemológico 
e intelectualista, e a vinculação da pena a um sistema de valores, que expressam 
sentimentos de pura moralidade.27 
 
15. No setor das teorias relativas associadas ao sujeito, autor da infração, desde a 
influência exercida nos países ibero-americanos pelo correcionalismo, vêm se 
destacando, cada vez mais, as teorias da prevenção geral positiva, as quais, ora “reforçam 
simbolicamente internalizações valorativas do sujeito não delinquente para conservar e 
fortalecer os valores ético-sociais elementares em fase de ações que lesionam bens 
jurídicos e se encaminham contra esses valores”, 28 ora “pretendem reforçar 
simbolicamente a confiança do público no sistema social (criar consenso), a fim de que 
este possa superar a desnormalização provocada pelo conflito ao qual deve responder a 
pena, na medida necessária para obter o reequilíbrio do sistema”.29 Essas duas variantes 
correspondem a modelos teóricos diferenciados. Enquanto a primeira está vinculada à 
obra de WELZEL, 30 a segunda decorre das proposições funcionalistas, desde 
DURKHEIM 31 até JAKOBS. 32 Em qualquer dos casos, a eficácia almejada, seja 
simbólica, seja preventivo-integralmente, não pode ser aferida a partir de uma análise 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
26 Embora seja comum uma noção ampla de “criminalidade” – possivelmente imiscuída do conceito de 
“delinquência” –, opto por restringir o estudo ao cometimento de crimes durante o período de 
encarceramento. Não considerarei, portanto, a prática genérica de faltas como evidência da ineficácia do 
projeto preventivo especial negativo. 
27 BAURMANN, Michael. Kriminalpolitik ohne Maß. Zum Marburger Programm Franz von Liszts, in 
Liszt Vernunft, Kriminalsoziologische Bibliographie, 1984, p. 54-79. 
28 ZAFFARONI, Eugenio Raúl; BATISTA, Nilo, et al. Op. cit., p. 116. 
29 Idem, ibidem. 
30 WELZEL, Hans. Derecho penal alemán, tradução de Juan Bustos Ramírez e Sergio Yañez Perez. 
Santiago: Editorial Jurídica de Chile, 1970, p. 12. 
31 DURKHEIM, Emile. La división del trabajo social, tradução de Carlos Posada, Barcelona: Planeta-
Agostini, 1993, p. 136. 
32 JAKOBS, Günther. Norm, Person, Gesellschaft. Berlin: Duncker & Humblot, 1997, p. 52. 
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exclusiva da população carcerária (e de suas condições de vida), senão mediante uma 
ampla aferição sociológica. 
 
16. Os problemasdas teorias da prevenção especial positiva residem em dois pontos: 
na incapacidade empírica de se obter do condenado um compromisso com a ordem 
jurídica, de não mais delinquir, de aceitar, portanto, as regras de comportamento social 
impostas pelo direito, por um lado, e na impossibilidade jurídica de se exigir dele que 
ajuste sua personalidade e sua concepção do mundo àquelas que lhe são ofertadas na 
prisão. Se o Estado democrático se funda na proteção da dignidade humana e na 
liberdade, a qual engloba não apenas a de ir e vir, senão também a de crença, de 
conhecimento, de concepções políticas e outras, não será possível exigir-se de ninguém, 
nem mesmo do condenado, que acolha a ideologia dominante do sistema. A chamada 
ressocialização do condenado e sua reinserção social devem ser delimitadas por atos que 
o possam orientar para a convivência e a tolerância. Tão só. Os demais são acessórios que 
podem lhe ser ofertados como complementos aos procedimentos de reinserção. As teorias 
da prevenção especial positiva não podem servir à “função de reparar a inferioridade 
perigosa da pessoa para os mesmos fins, diante dos mesmos conflitos”,33 como se a 
pessoa do condenado fosse um objeto desprovido de individualidade e personalidade. 
Isso corresponderia à ideologia de um estado autoritário bem próximo ao fascismo. O que 
o sistema pode e deve fazer é empreender esforços para que o condenado possa conviver, 
em primeiro lugar, com os demais, sem violar seus direitos subjetivos, depois, 
mostrando-lhe as regras vigentes para que não se aventure a novamente infringir a lei 
penal. Observe-se que, independentemente de qualquer regime ou de qualquer efeito 
supostamente benéfico que essa tarefa possa produzir no comportamento do condenado, a 
pena constitui sempre uma humilhação, que não desaparece nunca de sua vida futura. 
Como informa FABRICIUS, a humilhação já decorre da própria publicidade de sua 
imposição. Por sua vez, a humilhação gera o sentimento de vergonha, que se manifesta 
diante de todos e o qual jamais poderá representar um papel juridicamente positivo, 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
33 ZAFFARONI, Eugenio Raúl; BATISTA, Nilo, et al. Op. cit., p. 116. 
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porque sempre associado a um juízo de reprovação, o qual fortalece cada vez mais os 
traumas internos e impede o procedimento de reinserção.34 O grande passo, portanto, da 
prevenção positiva é evitar que as regras e tarefas ressocializadoras se transformem em 
mais um puro e simples elemento de repressão. 
 
17. Desde a primeira versão do Código Penal de 1940, advinda da comissão composta 
por NELSON HUNGRIA, ROBERTO LIRA e NARCELIO DE QUEIROS, o Brasil 
demonstra a preferência por uma teoria mista da pena, ora calcada no classicismo italiano 
de viés retribucionista, ora nos preceitos preventivistas, enunciados pelo positivismo. A 
primitiva redação do art. 42, da antiga Parte Geral, expressava bem essa postura. O 
legislador de 1984, que procedeu à alteração da atual Parte Geral, também estava, à 
primeira vista, orientado por essa concepção, ao dispor no art. 59 que a pena deve ser 
individualizada “conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do 
delito”. Convém observar, todavia, que, apesar dessa terminologia sustentar essa antiga 
tendência, uma visão integral da nova da Parte Geral e da ordem jurídica pode indicar que 
aqui se adota uma teoria dialético-unificadora da pena: no momento da cominação 
(ameaça), prepondera um caráter preventivo geral; no momento da aplicação 
(individualização), desponta o caráter preventivo especial positivo e negativo; no 
momento da execução da pena, sobreleva a função preventiva especial positiva. Essa 
conclusão pode ser bem justificada pela análise do diploma inspirador do código. A regra 
fixada no art. 59 do Código Penal tem seus antecedentes no Projeto Alternativo alemão, 
de 1966, em cujo § 2 (1) estava consignado que a pena deveria ser aplicada de modo a 
servir para a proteção de bem jurídico e para a reinserção do autor na comunidade 
jurídica. A referência a essas finalidades descartava, portanto, a adoção de uma teoria 
retributiva da pena. A pena deveria ter uma finalidade utilitária, de ser apta à proteção do 
bem jurídico e de conduzir o condenado a uma condição que pudesse conviver na 
comunidade jurídica. Essa consigna, no entanto, pelos termos do próprio projeto, que foi 
elaborado por uma plêiade de catedráticos renomados, estava associada a um pressuposto 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
34 FABRICIUS, Dirk. Kriminalwissenschaften: Grundlagen und Grundfragen, II. Münster: Lit Verlag, 
2011, p. 299 e ss. 
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indeclinável imposto pela ordem jurídica, de que a pena não poderia, em qualquer caso, 
superar os limites da culpabilidade. Isso significa que, no controle do crime e em sua 
prevenção, geral ou especial, o Estado não poderá atuar desmedidamente, nem quanto à 
definição das condutas e à cominação das sanções, nem relativamente aos projetos de 
ressocialização. Há, portanto, um limite para a chamada ressocialização. Esse limite é 
imposto, desde logo, pela escala da culpabilidade. 
 
18. Ainda que a culpabilidade constitua um limite da pena, isso não é suficiente para 
estabelecer as condições que deverão afetar o sujeito, uma vez condenado e submetido à 
sua execução. O Projeto Alternativo vinculou essas condições a um processo de 
reinserção social do autor, quer dizer, àqueles procedimentos a convencê-lo de poder 
conviver com os demais, uma vez livre da sanção. 
 
19. Está claro que o art. 59 do Código Penal não instituiu uma fórmula tão incisiva 
como seu antecedente alemão, mas pode comportar uma interpretação conforme a 
Constituição. Ao afirmar, inicialmente, em termos de gradação, que a pena deve ser 
aplicada tendo em vista a culpabilidade do agente, já indicou o caminho para sua própria 
limitação: a pena não pode ultrapassar os limites da culpabilidade. Nem teria sentido 
outra conclusão, porque, então, de nada valeria a definição e a própria configuração da 
culpabilidade, que, em lugar de constituir um elemento funcional da ordem jurídica, 
passaria a ser um simples pressuposto formal da condenação. 
 
20. Observada unicamente a expressão contida no art. 59 do Código Penal, de que a 
pena deverá ser aplicada de modo a ser necessária e suficiente para a reprovação e 
prevenção do crime, poder-se-ia entender, à primeira vista, que aqui se adotou também 
uma teoria retributiva da pena. Ocorre, porém, que a Constituição estabeleceu como 
objetivo da República a promoção do “bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, 
sexo, cor, idade ou quaisquer outras formas de descriminação” (art. 3º, IV). Isso 
significa que esse objetivo alcança não apenas as pessoas não condenadas, mas também 
aquelas que estejam respondendo a processos, que tiverem sido condenadas e estiverem 
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cumprindo pena. Nesse aspecto, a perda ou a restrição de liberdade do sujeito não pode 
implicar sua eliminaçãocomo pessoa, a qual deve merecer do Estado todos os benefícios 
destinados aos demais. A adoção de uma teoria retributiva, que pudesse decorrer da 
expressão “repressão”, não pode se contrapor aos objetivos traçados pela Constituição, ou 
seja, o Estado não pode simplesmente reprovar o sujeito e nem subordiná-lo a um 
procedimento preventivo exclusivo, sem atentar para seu próprio bem. A fim de 
compatibilizar os termos do art. 59 do Código Penal com a Constituição, deve-se 
entender que a expressão “repressão” está a indicar a exigência de que a medida da pena 
se oriente em função de critérios de proporcionalidade e não de uma retribuição moral. 
Daí ser importante reconstruir o próprio conteúdo da culpabilidade e de sua relação com a 
medida da pena. 
 
21. Na moderna concepção da teoria do delito, a culpabilidade não pode estar 
desvinculada do fato injusto. Essa vinculação é uma consequência do princípio da 
legalidade. O juiz, ao aplicar a pena, ao dosá-la, não pode criar por si próprio as 
condições e o conteúdo da culpabilidade. A culpabilidade, como elemento último da 
configuração da conduta como ação criminosa, extrai seu conteúdo do que a lei 
expressamente estabeleça. Norteia-se, assim, inicialmente, pela exclusão da 
imputabilidade (art. 26, CP) ou do conhecimento do ilícito (arts. 20, § 1º, e 21, CP), pelos 
motivos de exculpação legalmente previstos (coação irresistível e obediência hierárquica) 
ou decorrentes da ordem jurídica (excesso escusável de legítima defesa, estado de 
necessidade exculpante, colisão exculpante de deveres e inexigibilidade de outra conduta) 
e se delimita pelo conteúdo do injusto. Não terá sentido afirmar-se a culpabilidade do fato 
doloso, por exemplo, sem levar em conta a diferenciação, feita no injusto, entre dolo 
direto e dolo eventual. O juiz não pode criar parâmetros de medida da culpabilidade sem 
atender ao conteúdo do injusto, que, por sua vez, está amparado na respectiva definição 
do delito e seus elementos. 
 
22. Por seu turno, se a culpabilidade constitui o limite máximo da pena, os demais 
elementos referidos no art. 59 do Código Penal não podem implicar um aumento além 
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desse limite, salvo nos casos expressos em lei, como ocorre com as qualificadoras e as 
causas de especial aumento, que estão legalmente previstas, ou das agravantes, respeitado 
o limite da cominação. Nesse ponto, os propósitos preventivos não podem levar em 
conta, por exemplo, a conduta social do réu para aumentar a pena. Em primeiro lugar, 
esse aumento extrapola os limites do injusto, impostos pelo princípio da legalidade. Em 
segundo lugar, viola os termos do art. 3º, IV, da Constituição, porque irá avaliar contra o 
réu suas condições de existência, o que representa uma nítida discriminação. A 
discriminação, aqui, ademais de impor reprimenda ao condenado além do que a própria 
lei estabelece, tem também outros efeitos maléficos, os quais se refletem em todo o 
processo de sua readaptação social. 
 
23. Essas assertivas correspondem à proteção dos direitos das pessoas privadas de 
liberdade, tutelados fundamentalmente na Convenção Americana sobre Direitos 
Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), a qual entrou em vigor em julho de 1978 e 
que atualmente é vinculante para os Estados membros da Organização dos Estados 
Americanos – OEA –, da qual o Brasil faz parte.35 No item 5.6 da referida Convenção, 
ressalta-se que a reforma e a readaptação dos condenados, como finalidade essencial 
das penas privativas de liberdade, são garantias da segurança cidadã e direitos das 
pessoas privadas de liberdade.36 Assim: 
 
Artigo 5. Direito à integridade pessoal 
[...] 
 6. As penas privativas de liberdade terão como finalidade essencial a 
reforma e a readaptação social dos condenados. 
 
24. Dessa forma, ao menos normativamente,37 parece-me que a prevenção especial 
positiva – tal como descrita no dispositivo supracitado e amplamente prevista na 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
35 COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Informe sobre los derechos humanos 
de las personas privadas de libertad en las Américas. OEA/Ser.L/V/II. Doc. 64. 31 deciembre 2011. 
Disponível em: www.cidh.org, p. 9. 
36 Idem, p. 8. 
37 Cabe sublinhar, a propósito, que o disposto no item 5.6 do Pacto de São José da Costa Rica, norma 
supralegal, prevalece sobre o disposto no artigo 59 do Código Penal brasileiro. O tema concernente à 
	
  
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legislação,38 na jurisprudência39 e na doutrina nacionais – deve ser o ponto de partida 
norteador da avaliação do sistema carcerário nacional.40 Frise-se, em acréscimo, que o 
Subcomitê para a Prevenção da Tortura e Outros Tratos ou Penas Cruéis, Desumanos ou 
Degradantes da Organização das Nações Unidas, em informe de 2013, afirmou que é 
objetivo da execução penal propiciar as condições (sejam elas educativas, religiosas, 
materiais, sociais) mínimas para que os condenados se reintegrem harmoniosamente à 
sociedade, de forma a se evitar a reiteração da prática criminosa.41 
 
25. Seguindo, ainda, as recomendações propostas pela Comissão Interamericana de 
Direitos Humanos, é notório que o cárcere está inserido no grupo das chamadas 
instituições totais, isto é, estabelecimentos onde se detêm controle sobre a maior parte da 
vida das pessoas que lá se encontram.42 Tal domínio cronológico, físico e epistemológico 
– na locução de Foucault43 – representa, em vista dos princípios constitucionais de 
proteção à pessoa e das mencionadas diretrizes internacionais de reforma e 
ressocialização dos apenados, a obrigação de o Estado zelar pela integridade física, moral 
e psíquica dos internos, bem como de seus visitantes.44 Isso significa, finalmente, o 
reconhecimento de que as pessoas encarceradas se encontram em posição de 
vulnerabilidade e, portanto, devem ser objeto da atenção estatal, de forma a confrontar a 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
função primordial da pena de prisão deve ter como balizamento normativo, portanto, a norma 
convencional. 
38 A Lei de Execução Penal, por exemplo: “Art. 1º A execução penal tem por objetivo efetivar as 
disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social 
do condenado e do internado.” 
39 STJ - HC: 216711 RJ 2011/0200425-3, Relator: Ministra LAURITA VAZ, Data de Julgamento: 
10/12/2013, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 03/02/2014; STJ - HC: 277496 SP 
2013/0315374-3, Relator: Ministra LAURITA VAZ, Data de Julgamento: 17/12/2013, T5- QUINTA 
TURMA, Data de Publicação: DJe 03/02/2014); STJ - AgRg no HC: 283010 PE 2013/0387154-4, Relator: 
Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Data de Julgamento: 17/12/2013, T6 - SEXTA TURMA, Data de 
Publicação: DJe 03/02/2014; TJ-RS - AC: 70052584968 RS , Relator: Jorge Luís Dall'Agnol, Data de 
Julgamento: 27/03/2013, Sétima Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 01/04/2013. 
40 Proponho-me, para todos os efeitos, a fazer comentários passageiros acerca da eficácia da prevenção 
neutralizadora, nos moldes do que já foi anteriormente proposto. 
41 “Informe sobre la visita al Brasil del Subcomité para la Prevención de la Tortura y Otros Tratos o Penas 
Crueles, Inhumanos o Degradantes – Adición”, de autoria da Organização das Nações Unidas, p. 3. 
42 Vide: GOFFMAN, Erving. Manicômicos, Conventos e Prisões. São Paulo: Editora Perspectiva, 2001; e 
COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Op. cit., p. 19. 
43 FOUCAULT, Michel. A verdade e as formas jurídicas. Rio de Janeiro: Nau Editora, 2013, pp. 117-123. 
44 COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Op. cit., p. 17. 
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norma incriminadora com os preceitos de garantia individual – centro de convergência de 
toda a ordem jurídica.45 
 
El Estado, al privar de libertad a una persona, se coloca en una 
especial posición de garante de su vida e integridad física. Al momento 
de detener a un individuo, el Estado lo introduce en una “institución 
total”, como es la prisión, en la cual dos diversos aspectos de su vida 
se somete a una regulación fija, y se produce un alejamiento de su 
entorno natural y social, un control absoluto, una pérdida de intimidad, 
una limitación del espacio vital y, sobre todo, una radical disminución 
de las posibilidades de autoprotección. Todo ello hace que el acto de 
reclusión implique un compromiso específico y material de proteger la 
dignidad humana del recluso mientras esté bajo su custodia, lo que 
incluye su protección frente a las posibles circunstancias que puedan 
poner en peligro su vida, salud e integridad personal, entre otros 
derechos.46 
 
26. Também a Corte Europeia de Direitos Humanos decidiu que “as medidas 
privativas de liberdade se acompanham inevitavelmente de sofrimento e de humilhação. 
Se se trata de um estado de fato indeclinável que, de per se, não se traduz em uma 
violação do artigo 3, que impõe, não obstante, ao Estado garantir que todo prisioneiro 
seja detido em condições compatíveis com o respeito à dignidade humana, que a 
modalidade de execução da pena não insira o interessado em uma situação de 
desconforto ou a um grau de intensidade tal que exceda o nível inevitável de sofrimento 
inerente à detenção e que, em consideração das exigências práticas da reclusão, a saúde 
e o bem-estar do detido sejam garantidos de maneira adequada; de outro modo, as 
medidas tomadas no âmbito da detenção devem ser necessárias ao cumprimento dos fins 
legítimos perseguidos”47. 
 
27. Levando em conta, portanto, os direitos sociais da educação, da saúde, da 
alimentação, do trabalho, da moradia, do lazer (art. 6o, CF); os direitos individuais e 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
45 TAVARES, Juarez. La racionalidad, el derecho penal y el poder de penar: los límites de la intervención 
penal en el Estado Democrático. In: Racionalidad y derecho penal. Lima: Idemsa, 2014, p. 124. 
46 COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Op. cit., p. 19. 
47 CEDU, decisão n. 19606/08, Pavet contra França, de 20 de janeiro de 2011. 
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coletivos – tais como a proteção aos locais de culto (art. 5o, VI, CF), à intimidade e à 
honra (art. 5o, X, CF); o atendimento inexorável à dignidade da pessoa humana (art. 1o, 
III, CF) e as recomendações propostas pela Comissão Interamericana de Direitos 
Humanos e pelo Subcomitê para a Prevenção da Tortura e Outros Tratos ou Penas Cruéis, 
Desumanos ou Degradantes da ONU, é necessário concluir que um pressuposto 
necessário para a efetivação das metas ressocializadoras da pena reside precisamente na 
configuração de um ambiente carcerário que não viole os direitos fundamentais dos 
apenados. Ademais, é imperioso que se verifique o trabalho continuado dos mencionados 
“empresários morais”, isto é, acompanhamento psicológico e social de qualidade. É sobre 
essa perspectiva, portanto, que deverá se orientar, para os fins específicos do presente 
trabalho, a análise das condições concretas do funcionamento do sistema carcerário 
brasileiro.48 Não faz parte do objetivo deste parecer, como se depreende dos termos da 
consulta, o exame da crise de legitimidade do discurso penal. O problema, tal como 
identificado para os presentes fins, situa o confronto entre a defesa da pessoa humana, por 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
48 Quando se chega a esse ponto, as indagações parecem conduzir a outras perspectivas, que não podem 
ficar adstritas a sintomas puramente jurídicos. O jurídico praticamente desaparece como algo imutável e 
duradouro para se transformar, rapidamente, em preceitos de justificação política. Cabe, mais uma vez, 
verificar se vale a pena manter o sistema penal. Quando se fala em alterar o sistema penal ou mesmo de o 
abolir, afloram argumentos por sua manutenção. Esses argumentos, independentemente de sua variedade, 
podem ser dispostos em dois grandes segmentos: ora são argumentos de base empírica, ora de base moral. 
Os argumentos de base empírica trabalham com critérios de verdade; os de base moral, com critérios de 
validade. Mas, a alteração ou mesmo a superação do sistema penal não pode ser tratada como uma questão 
de superestrutura, mas, sim, como uma expressão das relações que se processam no âmbito das respectivas 
formações sociais. A norma penal, como expressão desse sistema, não é nem boa nem má, é apenas um 
instrumento de manutenção de poder. Quando se invoca a norma penal como meio de proteção da pessoa, 
estar-se-á também legitimando o poder e, consequentemente, aceitando e mantendo as relações sociais do 
sistema capitalista. É pura ingenuidade pretender modificar o Estado ou proteger eficazmente as pessoas 
por meio da norma penal. No fundo, os mesmos elementos de desigualdade e de comprometimento 
sistêmico continuam presentes em sua aplicação, que jamais deixará de ser seletiva e exclusivista. A 
chamada cruzada moral em prol da punição dos culpados, como forma de estruturação de uma sociedade 
democrática, não passa de um discurso ideológico sedimentado no simbólico ou, pior do que isso, de um 
discurso legitimante em face de um sistema intrinsecamente destruidor da pessoa. Esse discurso é 
ideológico porque busca convencer de que a norma, como instituição, pode solucionar definitivamente 
problemas de relacionamento, sem qualquer demonstração empírica. É simbólico porque orientado por 
mitos de verdade e validade. Se falta ao discurso uma base empírica (e a evidência é de que essa base 
empírica é falsa), não se poderá comprovar sua verdade. Se, por outro lado, o discurso é pronunciado sem 
que todos possam dele participar em igualdade de condições e criticá-lo com eficiência, não poderá gerar 
uma pretensão de validade. Quando se chega a esse ponto, pareceque toda a discussão em torno da 
racionalidade ou legitimidade de uma norma penal só poderá ter cabimento com a alteração estrutural das 
relações sociais e do próprio poder. Muitos grupos e movimentos sociais têm em comum o objetivo de 
alterar as estruturas econômicas e, como consequência, o próprio poder. 
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um lado, e os interesses punitivos, de outro, como uma questão de superestrutura mal 
resolvida. Embora essa não seja a perspectiva que adotamos,49 nada impede a análise da 
questão exclusivamente sob esse ponto de vista, com o objetivo imediato exclusivo de 
garantir o respeito aos direitos fundamentais dos presos, o que, no contexto brasileiro, 
certamente impõe a adoção de um programa de deflação penitenciária. 
 
28. Para tanto, utilizar-se-ão os seguintes critérios inferidos dos dispositivos 
constitucionais supracitados e das mencionadas recomendações da Comissão 
Interamericana de Direitos Humanos e do referido Subcomitê das Nações Unidas: (a) 
vida e integridade física, (b) educação, (c) saúde, (d) alimentação, (e) trabalho, 
(f) moradia, (g) lazer, (h) liberdade de culto, (i) intimidade e honra e, por fim, 
(j) acompanhamento psicológico e social. 
 
29. Neste parecer serão utilizados os dados concernentes ao sistema de inspeções 
prisionais realizado pelo Ministério Público em março de 2013, 50 bem como as 
informações acerca dos números da população carcerária apresentados em 2014 pelo 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
49 Enfocada a questão como uma crise de legitimidade, pode-se, então, entender que o discurso penal é um 
discurso de justificação do sistema, tanto quando o enaltece, como quando procura sua correção por meio 
da própria estrutura normativa. Em qualquer dos casos, não há verdadeira oposição de ideias, há apenas 
compromissos. Quem se aventure a acreditar que possa resolver questões penais apenas no âmbito 
normativo e que, com isso, estará exercendo uma atividade de crítica social, não pode fugir do dilema de ter 
que se conformar com o próprio sistema, ou repudiá-lo integralmente. Para repudiá-lo, terá que negar o 
sistema, mas, com isso, terá que negar também seus próprios argumentos. Se quiser manter seus 
argumentos, terá que aceitar o sistema. Não há como fugir desse dilema. É o dilema próprio do sistema 
capitalista e de seus desdobramentos. À medida que esse discurso se solidifica, também se fortalece o 
sistema, com as consequências marcantes da ampliação das bases punitivas, da inflação legislativa e, 
inclusive, dos movimentos de emancipação calcados na esperança de que possam obter sucesso mediante o 
emprego da pena criminal. O direito penal, portanto, como condensação normativa do poder punitivo, é 
elevado a uma categoria transcendental, como se fosse superior a todas as contradições do sistema e 
sobrepairasse aos próprios antagonismos de classe. Nunca na história do desenvolvimento dos poderes do 
Estado se deu tanta importância ao direito penal, que, por artes de uma internalização simbólica de ideais 
frustrados, ou por força de uma projeção externa sobre os outros, os chamados inimigos, de recalques 
paranoides, passa a se solidificar como uma nova modalidade de ideologia. 
50 CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO. A visão do Ministério Público brasileiro sobre 
o sistema prisional brasileiro. Brasília: CNMP, 2013. Disponível em: http://goo.gl/4iWhVi. 
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Conselho Nacional de Justiça,51 o “Informe sobre los derechos humanos de las personas 
privadas de libertad en las Américas”,52 de autoria da Comissão Interamericana de 
Direitos Humanos, o “Informe sobre la visita al Brasil del Subcomité para la Prevención 
de la Tortura y Otros Tratos o Penas Crueles, Inhumanos o Degradantes”, proveniente 
da Organização das Nações Unidas, os relatórios de inspeção em 2014 no Centro de 
Detenção Provisória de Pinheiros IV e no Centro de Detenção Provisória de Santo André, 
ambos de autoria da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, e, por fim, o relatório de 
auditoria governamental do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (processo 
TCE/RJ nº 116.234-9/13). 
 
(a) Vida e Integridade Física 
 
30. Dos 1.598 (mil quinhentos e noventa e oito) estabelecimentos penitenciários 
respondentes às inspeções realizadas pelo Ministério Público em 2013,53 foi registrado 
um total de 83 (oitenta e três) suicídios, 110 (cento e dez) homicídios, 3.443 (três mil, 
quatrocentos e quarenta e três) presos com ferimentos e 2.772 (duas mil, setecentas e 
setenta e duas) lesões corporais. Agregam-se a esses números, ademais, as considerações 
da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, as quais indicam que as principais 
situações de risco para a vida de pessoas encarceradas consistem na violência entre 
internos,54 de que são exemplos os mais de 70 (setenta) motins ocorridos em 2006 na 
cidade de São Paulo, assim como os eventos sucedidos na Casa de Detenção José Mário 
Alves da Silva, o “Urso Branco”, em Porto Velho; no Centro de Detenção Provisória 
Raimundo Vidal Pessoa, em Manaus;55 no Complexo Penitenciário de Pedrinhas, em São 
Luís; 56 e, ainda, no Presídio Professor Aníbal Bruno, em Recife (este último 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
51 “Novo Diagnóstico de Pessoas Presas no Brasil”, de autoria do Departamento de Monitoramento e 
Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas – DMF. 
Disponível em: http://goo.gl/vh2LC9. 
52 COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Op. cit., prefacio. 
53 Fonte: Sip-MP, Resolução CNMP n. 56, 28/05/2013. In: CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO 
PÚBLICO. Op. cit., p. 73. 
54 COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Op. cit., p. 6. 
55 Idem, p. 65. 
56 Idem, p. 110. 
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caracterizado, sobretudo, pela presença de pessoal paralelo de segurança e organização, 
os denominados “chaveiros”). 57 
 
31. O Subcomitê para a Prevenção da Tortura e Outros Tratos ou Penas Cruéis, 
Desumanos ou Degradantes da ONU registrou, ainda, a ocorrência de inúmeros casos de 
maus-tratos, humilhações, insultos, sanções arbitrárias, espancamentos e privação de 
comida e água nos estabelecimentos penitenciários pesquisados, sobretudo como forma 
de castigo ou punição.58 Além disso, o mesmo Subcomitê ressaltou a complacência da 
magistratura brasileira em relação ao grave quadro de sistemática prática de tortura e 
maus-tratos em estabelecimentos prisionais.59 Daí porque recomendou encarecidamente 
aos juízes brasileiros que rechacem as confissões quando haja motivos razoáveis para 
acreditar que tenham sido obtidas mediante tortura ou maus-tratos, ao tempo em que 
recomendou, ainda, que os juízes passem a notificar de imediato o Ministério Público 
para que possa abrir investigações sobre os casos de tortura nos mais diversos 
estabelecimentos prisionais. A magistratura brasileira não é simples coadjuvante no 
processo de sistemática violação aos direitos fundamentais dos presos, senão seu 
elemento propulsor à medida que contribui ativamente para um projeto de ampla 
encarcerização – acionando voluntariamentea ordem jurídica vigente para estender, por 
via interpretativa, a aplicação de penas privativas de liberdade e de prisões cautelares –, 
ao mesmo tempo em que consente, ainda que por omissão, a ofensa, por parte do Estado, 
aos direitos mais básicos dos presos. Cabe ao órgão de cúpula do Judiciário brasileiro, o 
Supremo Tribunal Federal, exigir da magistratura o cumprimento das recomendações do 
Subcomitê da ONU, de modo a eliminar a constante violação dos direitos fundamentais 
da população carcerária, aí incluídos também os presos provisórios. 
 
32. Apenas para que se tenha uma ideia concreta da contribuição decisiva do Poder 
Judiciário na consolidação de um estado de autorizado menoscabo dos direitos básicos 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
57 Idem, p. 153. 
58 “Informe sobre la visita al Brasil del Subcomité para la Prevención de la Tortura y Otros Tratos o Penas 
Crueles, Inhumanos o Degradantes”, de autoria da Organização das Nações Unidas, pp. 15 e 21. 
59 Idem, p. 7. 
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dos presos brasileiros, vale mencionar, a título de exemplo, a postura adotada pela cúpula 
do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo a propósito da matéria. Em 7 de março de 
2014, o Presidente desse importante Tribunal suspendeu decisão proferida por magistrado 
de primeira instância que determinara, a pedido da defensoria pública, a implantação, em 
45 dias, de duas equipes mínimas de saúde na Penitenciária Masculina de Ribeirão Preto 
e o fornecimento dos medicamentos necessários ao tratamento dos presos.60 Invocou-se, 
para tanto, o argumento de que a providência estatal determinada pelo juiz exporia a risco 
grave a ordem pública, por comprometer a “regular implementação da política pública 
em curso no Estado de São Paulo” e servir “de paradigma para situações relacionadas 
com outros estabelecimentos prisionais”. Em 2 de dezembro de 2013, o Presidente 
antecessor do mesmo Tribunal de Justiça paulista suspendeu decisão de primeira 
instância que determinara ao Estado, também a pedido da defensoria pública, a 
disponibilização em todas as suas unidades prisionais, no prazo de seis meses, de 
equipamentos para banho dos presos em temperatura adequada.61 Argumentou-se, para 
suspender os efeitos dessa decisão, que “os prédios antigos e aqueles adaptados para 
servir como estabelecimento penal” não possuíam “rede elétrica planejável e compatível 
com as exigências específicas de consumo de água necessárias para suportar chuveiros 
nas celas” e que “a instalação dos cogitados equipamentos exigiria intervenção no 
estabelecimento prisional que não se faria sem o deslocamento dos detentos nele 
custodiados, o que não se apresenta plausível, tendo-se em vista o déficit de vagas no 
sistema penitenciário paulista”. 
 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
60 Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Pedido de Suspensão de Liminar n. 2031991-
72.2014.8.26.0000. 
61 Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Pedido de Suspensão dos Efeitos da Tutela Antecipada n. 
0203905-78.2013.8.26.0000. 
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(b) Educação 
 
33. Do total mencionado de estabelecimentos penitenciários respondentes às 
inspeções realizadas pelo Ministério Público,62 60% registraram a ausência de bibliotecas 
para os internos.63 O já indicado Subcomitê da ONU, em acréscimo, destacou que, no 
complexo de Viana, no Espírito Santo, a maior parte dos internos não tinha acesso a 
programas de atividade e lazer, sendo que, quando ofertados, os livros não poderiam ser 
escolhidos segundo suas preferências pessoais.64 A indisponibilidade de tais atividades 
foi verificada, segundo o Subcomitê, em diversos outros estabelecimentos. 
 
34. Já no que se refere especificamente ao Centro de Detenção Provisória de 
Pinheiros IV, em São Paulo, a Defensoria Pública destacou a inexistência, por completo, 
de atividades educacionais na unidade. 
 
(c) Saúde 
 
35. Destaca-se que, do total supramencionado de estabelecimentos penitenciários 
respondentes às inspeções realizadas pelo Ministério Público:65 
 
- Aproximadamente 55% indicaram a inexistência de farmácias;66 
- Aproximadamente 56% não apresentaram enfermarias; 67 
- Aproximadamente 76% afirmaram não haver procedimentos específicos 
para troca de roupas de cama e banho e uniforme em face de patologias 
de presos/as; 68 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
62 Fonte: Sip-MP, Resolução CNMP n. 56, 28/05/2013. In: CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO 
PÚBLICO. Op. cit., p. 81. 
63 O equivalente a 968 (novecentos e sessenta e oito) estabelecimentos penitenciários. 
64 “Informe sobre la visita al Brasil del Subcomité para la Prevención de la Tortura y Otros Tratos o Penas 
Crueles, Inhumanos o Degradantes”, de autoria da Organização das Nações Unidas, p. 19. 
65 Fonte: Sip-MP, Resolução CNMP n. 56, 28/05/2013. In: CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO 
PÚBLICO. Op. cit., p. 69. 
66 O equivalente a 886 (oitocentos e oitenta e seis) estabelecimentos penitenciários. 
67 O equivalente a 899 (oitocentos e noventa e nove) estabelecimentos penitenciários. 
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- Aproximadamente 66% assumiram não serem prestados atendimentos pré-
natais às internas gestantes.69 
 
(d) Da alimentação 
 
36. A avaliação presencial do Parquet 70 indicou ainda que, em 29% dos 
estabelecimentos penitenciários, a alimentação foi considerada regular71 ou ruim.72 Vale 
chamar atenção, em acréscimo, para o elevado número de avaliações subjetivas 
chanceladas sob a rubrica “não se aplica”, equivalente a 20% do total. Conjectura-se, a 
esse ponto, se tal dado guarda relação com a informação apresentada pela Comissão 
Interamericana de Direitos Humanos de que parte dos insumos destinados à alimentação 
dos reclusos são comercializados ilegalmente pelas autoridades penitenciárias, não 
chegando definitivamente aos internos.73 
 
37. No que tange ao Centro de Detenção Provisória de Santo André, a Defensoria 
Pública do Estado de São Paulo verificou que “os alimentos oferecidos são sempre os 
mesmos, bem como […] é comum que a comida chegue até [os internos] azeda, 
estragada ou mal cozida”. O mesmo quadro foi descrito no relatório de inspeção 
concernente à unidade de Pinheiros IV. 
 
(e) Trabalho 
 
38. A partir dos dados apresentados pelo órgão ministerial, pode-se inferir a ausência 
generalizada de oficinas de trabalho nos cárceres respondentes, uma vez que, quando da 
avaliação pessoal, 68% dos estabelecimentos penitenciários apresentaram a avaliação68 O equivalente a 1.220 (mil duzentos e vinte) estabelecimentos penitenciários. 
69 O equivalente a 1.508 (mil quinhentos e oito) estabelecimentos penitenciários. 
70 Fonte: Sip-MP, Resolução CNMP n. 56, 28/05/2013. In: CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO 
PÚBLICO. Op. cit., p. 120. 
71 O correspondente a 23% das avaliações. 
72 O correspondente a 6% das avaliações. 
73 COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Op. cit., p. 183. 
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subjetiva “não se aplica” 74. A situação, que já é grave, vem se tornando cada dia mais 
grave. No Estado do Rio de Janeiro, por exemplo, segundo o Relatório de Auditoria 
Governamental do respectivo Tribunal de Contas (TCE/RJ nº 116.234-9/13), a 
porcentagem dos detentos que laboram diminui de 80,85%, em 2009, para 32,11%, em 
2013. 
 
(f) Moradia 
 
39. A pena de prisão, por evidente, implica a lesão de certos direitos imediatamente 
correlatos à privação de liberdade. Isso, entretanto, não pode acarretar a negação da 
potencialidade de desenvolvimento pessoal – pilar constitucional que é –, mediante a 
inobservância de condições mínimas de sobrevivência digna (art. 1o, III, CF) e honrosa 
(art. 5o, X, CF), tais como higiene, ventilação, iluminação e temperatura adequada. 
 
- Quanto à higiene, a avaliação presencial do Ministério Público75 indicou que, 
em 58% dos estabelecimentos penitenciários, as instalações sanitárias foram 
consideradas regulares76 ou ruins.77 A ONU, na mesma esteira, afirmou serem 
as condições sanitárias dos cárceres inspecionados profundamente 
deficientes.78 
- Quanto à ventilação,79 57% dos estabelecimentos apresentaram instalações 
igualmente regulares80 ou ruins.81 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
74 Fonte: Sip-MP, Resolução CNMP n. 56, 28/05/2013. In: CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO 
PÚBLICO. Op. cit., p. 60. 
75 Fonte: Sip-MP, Resolução CNMP n. 56, 28/05/2013. In: CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO 
PÚBLICO. Op. cit., p. 118. 
76 O correspondente a 34% das avaliações. 
77 O correspondente a 24% das avaliações. 
78 “Primera respuesta del Subcomité para la Prevención de la Tortura y Otros Tratos o Penas Crueles, 
Inhumanos o Degradantes a las respuestas del Brasil a las recomendaciones y solicitudes de información 
formuladas por el Subcomité para la Prevención de la Tortura en su informe sobre su primera visita 
periódica al Brasil”, de autoria da Organização das Nações Unidas, p. 15. 
79 Fonte: Sip-MP, Resolução CNMP n. 56, 28/05/2013. In: CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO 
PÚBLICO. Op. cit., p. 117. 
80 O correspondente a 31% das avaliações. 
81 O correspondente a 26% das avaliações. 
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- No que se refere à iluminação,82 56% dos estabelecimentos trouxeram, da 
mesma forma, avaliações regulares ou ruins.83 
- Por fim, no que se refere à temperatura,84 59% das avaliações mostraram 
resultados regulares85 ou ruins.86 
 
40. No que tange em específico aos Centros de Detenção Provisória de Santo André e 
Pinheiros IV, as inspeções realizadas pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo 
indicaram sérios problemas estruturais, dentre os quais: deficiências no sistema de 
aeração e iluminação, racionamento desmedido de água, existência de percevejos e 
insetos nos colchões e péssimo odor nas celas. 
 
(g) Lazer 
 
41. A partir das informações apresentadas pelo Ministério Público,87 ressalto que, em 
957 (novecentos e cinquenta e sete) estabelecimentos penitenciários – o equivalente a 
aproximadamente 60% dos 1.598 (mil quinhentos e noventa e oito) cárceres respondentes 
à pesquisa realizada –, não estavam sendo desenvolvidas atividades culturais e de lazer à 
época das inspeções. 
 
42. Os informes apresentados pelo Subcomitê para a Prevenção de Tortura e Outros 
Tratos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes da ONU foi menos otimista, ao 
afirmar que nem todos os presídios inspecionados dispunham da hora diária reservada ao 
“banho de sol” exigida pelas normas nacionais e internacionais. Segundo o Subcomitê, os 
internos do centro Ary Franco no Rio de Janeiro costumavam passar até três semanas 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
82 Fonte: Sip-MP, Resolução CNMP n. 56, 28/05/2013. In: CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO 
PÚBLICO. Op. cit., p. 117. 
83 Avaliações regulares corresponderam a 33%; enquanto as avaliações ruins, a 23%. 
84 Fonte: Sip-MP, Resolução CNMP n. 56, 28/05/2013. In: CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO 
PÚBLICO. Op. cit., p. 117. 
85 O correspondente a 33% das avaliações. 
86 O correspondente a 26% das avaliações. 
87 Fonte: Sip-MP, Resolução CNMP n. 56, 28/05/2013. In: CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO 
PÚBLICO. Op. cit., p. 81. 
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encerrados em celas pouco iluminadas, sujas e mal ventiladas, sem a necessária hora 
diária no pátio para atividades físicas.88 
 
(h) Liberdade de culto 
 
43. Em conformidade com os dados apresentados pelo Ministério Público, 89 
constatou-se, ainda, que 54%90 dos estabelecimentos penitenciários não possuíam local 
apropriado à realização de cultos religiosos. 
 
(i) Intimidade e Honra 
 
44. Quanto à intimidade e à honra, é imperioso denunciar alguns dos mais 
característicos problemas do sistema prisional brasileiro: a superlotação e as (quase 
sempre inexistentes) separações entre as diversas clientelas carcerárias. 
 
45. Nesse sentido, ressalta-se que, das 563.52691 (quinhentas e sessenta e três mil, 
quinhentas e vinte e duas) pessoas encarceradas em 2014, apenas 357.219 (trezentas e 
cinquenta e sete mil, duzentas e dezenove) se encontravam dentro da capacidade máxima 
do sistema, restando, pois, um déficit total de 206.307 (duzentas e seis mil, trezentas e 
sete) vagas.92,93 No mesmo sentido, ressaltam as Nações Unidas que deve ser respeitada 
uma metragem por metro quadrado mínima para cada detento,94 o que, segundo o 
Subcomitê, não foi observado em inúmeros estabelecimentos pesquisados. Assim:95 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
88 “Informe sobre la visita al Brasil del Subcomité para la Prevención de la Tortura y Otros Tratos o Penas 
Crueles, Inhumanos o Degradantes”, de autoria da Organização das Nações Unidas, p. 19. 
89 Idem, p. 91. 
90 O equivalente a 878 (oitocentos e setenta e oito) estabelecimentos penitenciários. 
91 Não foram consideradas as pessoas em cumprimento de prisão domiciliar. 
92 Disponível em: http://goo.gl/JGju25. 
93 Em se considerando, ainda, as 147.937 (cento e quarenta e sete mil, novecentas e trinta e sete) pessoas 
em cumprimento de prisão domiciliar, o Brasil se alça à terceira posição mundial em número absoluto de 
encarcerados. 
94 Segundo o Subcomitê (“Informe sobre la visita al Brasil del Subcomité para la Prevención de la Tortura y 
Otros Tratos o Penas Crueles, Inhumanos o Degradantes - Adición”, p. 7): “La ResoluciónNo 9 establece 
además que la capacidad de cada bloque de celdas no deberá exceder de 200 reclusos. Asimismo, estipula 
	
  
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El Subcomité considera que el hecho de someter a los detenidos a 
condiciones de hacinamiento extremas constituye una forma grave de 
malos tratos. El Estado parte debe adoptar medidas inmediatas para 
prevenir los niveles extremos de hacinamiento descritos. En todas las 
dependencias policiales del país debe respetarse estrictamente una 
superficie mínima por detenido, de conformidad con las normas 
internacionales. 
 
46. A título ilustrativo, é de se destacar que – segundo informações da Defensoria 
Pública do Estado de São Paulo – os Centros de Detenção Provisória de Santo André e 
Pinheiros IV apresentaram, quando das inspeções realizadas, uma superlotação de – 
respectivamente – 338% e 345% de suas capacidades. 
 
47. Ressalta a ONU, em acréscimo, que o problema da superlotação – com especial 
ênfase para os cárceres Nelson Hungria, em Belo Horizonte, e Ary Franco, no Rio de 
Janeiro – está amplamente associado à falta de privacidade dos internos, ao realizarem 
tarefas básicas de higiene, e às putrefatas condições de salubridade das celas, muitas 
habitadas também por baratas e outros insetos.96 
 
48. Levando em conta, ainda, a pesquisa realizada pelo Ministério Público em 2013,97 
79%98 dos estabelecimentos penitenciários não apresentavam separação entre os presos 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
que todos los centros penitenciarios y las cárceles municipales dotados de celdas colectivas deberán 
asegurarse de que al menos el 2% de las celdas individuales estén disponibles en caso de que sea 
necesario separar reclusos. Asimismo, establece que cada celda individual deberá contar con una cama y 
un espacio de higiene personal con al menos un lavabo y un inodoro, además de una zona para circular; 
como mínimo, las celdas individuales deberán medir 6 m2. Las celdas colectivas podrán albergar hasta 
ocho reclusos y deberán tener una superficie de al menos 13,85 m2 […].” 
95 “Informe sobre la visita al Brasil del Subcomité para la Prevención de la Tortura y Otros Tratos o Penas 
Crueles, Inhumanos o Degradantes”, de autoria da Organização das Nações Unidas, p. 14. 
96 “Informe sobre la visita al Brasil del Subcomité para la Prevención de la Tortura y Otros Tratos o Penas 
Crueles, Inhumanos o Degradantes”, de autoria da Organização das Nações Unidas, p. 18. 
97 Fonte: Sip-MP, Resolução CNMP n. 56, 28/05/2013. In: CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO 
PÚBLICO. Op. cit., p. 57. 
98 O equivalente a 1.243 (mil duzentos e quarenta e três) estabelecimentos penitenciários. 
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provisórios e os presos em cumprimento definitivo de pena. A mesma informação 
constou do informe produzido pelo referido Subcomitê das Nações Unidas.99 
 
(j) Acompanhamento psicológico e social 
 
49. Frise-se que, do total mencionado de estabelecimentos respondentes à pesquisa 
realizada pelo Ministério Público,100 aproximadamente 67%101 afirmaram inexistir uma 
equipe de assistentes sociais que acompanhasse os internos, bem como 60%102 não 
apresentaram recintos adequados para a atividade de assistência social. Não foram 
obtidos dados acerca de eventual acompanhamento psicológico. 
 
50. (iii) Considerado esse lamentável quadro fático, faz-se necessário retomar a 
primeira questão apresentada na consulta: o atual cenário do sistema prisional brasileiro 
compromete a realização dos objetivos normalmente atribuídos à pena de prisão? 
 
51. Por evidente, a indagação se situa em nível de verificação da eficácia das funções 
manifestas da pena, as quais, oportunamente, devem ser agrupadas em duas vertentes: as 
teorias da prevenção especial negativa e positiva. 
 
52. Quanto à primeira forma – a variante negativa –, a presente investigação deve-se 
centrar – conforme já mencionado linhas atrás – na aferição da prática de delitos durante 
o período de encarceramento. 
 
53. Se, por um lado, os já mencionados números de homicídios e lesões corporais 
registrados pelo Ministério Público em 2013 indicam uma certa relativização do objetivo 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
99 “Informe sobre la visita al Brasil del Subcomité para la Prevención de la Tortura y Otros Tratos o Penas 
Crueles, Inhumanos o Degradantes”, de autoria da Organização das Nações Unidas, p. 13. 
100 Fonte: Sip-MP, Resolução CNMP n. 56, 28/05/2013. In: CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO 
PÚBLICO. Op. cit., p. 87. 
101 O equivalente a 1.069 (mil e sessenta e nove) estabelecimentos penitenciários. 
102 O equivalente a 974 (novecentos e setenta e quatro) estabelecimentos penitenciários. 
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supostamente neutralizador da pena de prisão, por outro, Juarez Cirino dos Santos103 
atenta corretamente para o fato de que “a incapacitação seletiva de indivíduos 
considerados perigosos constitui efeito evidente da execução da pena porque impede a 
prática de crimes fora dos limites da prisão”.104 
 
54. Dessa forma, extraem-se, acerca da variante negativa da prevenção especial, duas 
conclusões: em relação ao ambiente intramuros, a pena de prisão tem sua eficácia 
neutralizadora relativizada, uma vez que a reiterada ocorrência de delitos violentos 
demonstra o déficit empírico de eficácia do projeto preventivo especial, isto para não 
mencionar a notória e ramificada estrutura de corrupção e as mais distintas formas de 
negociações ilegais que existem em qualquer cadeia; quanto ao ambiente extramuros, 
sem desconsiderar o acerto da lição de Juarez Cirino dos Santos, convém observar que os 
efeitos do confinamento não podem ser tomados em conta apenas no que toca à estrita 
conduta do indivíduo encarcerado. O encarceramento produz outros efeitos no âmbito 
social, os quais podem corresponder à prática de outros delitos por parte do próprio 
encarcerado e de pessoas a ele vinculadas, ainda que fora do estabelecimento prisional. O 
problema do tráfico de drogas, para suprir a demanda de consumo interno dos presos, por 
exemplo, acaba tornando ineficaz a finalidade preventiva atribuída à pena, na medida em 
que companheiras e familiares daqueles são diuturnamente utilizados como mecanismo 
para introduzir drogas e outros objetos ilícitos nas prisões. Nesse sentido o aumento 
vertiginoso de mulheres condenadas por tráfico de drogas no Brasil está diretamente 
relacionado a esse mecanismo de alimentação do consumo por parte daqueles que já 
estão

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