Prévia do material em texto
. 1 CAPA 1134121 E-book gerado especialmente para RAFAELA LOPES VERISSIMO . 2 1. Educação em ciências: conteúdo e metodologia. Questões sócio-científicas e as implicações éticas. Alfabetização científica ............................................................................................................................. 1 2. Origem da vida. Principais teorias do processo evolutivo. Origem das espécies.............................. 8 3. Seres vivos: Biodiversidade e características gerais; semelhanças e diferenças entre os seres vivos; constituição dos seres vivos - níveis de organização: células, tecidos, órgãos e sistemas. Os grandes reinos dos seres vivos (classificação, características básicas e representantes); Taxonomia, regras de nomenclatura (filos, classes, ordens, famílias, gêneros e espécies) e principais características anatômicas e fisiológicas dos táxons; Adaptações aos diferentes ambientes e representantes mais característicos 24 4. Biologia celular. Principais diferenças entre procariotas e eucariotas. Processos bioenergéticos: fundamentos, respiração e fotossíntese, biossíntese de proteínas. Reprodução celular: mitose e meiose. Desenvolvimento embrionário. Reprodução humana ............................................................................. 40 5. Genética básica: mendeliana e molecular. Fundamentos de citogenética. Código genético. Caracterização geral das biotecnologias e seus impactos sociais. Organismos geneticamente modificados. ........................................................................................................................................... 84 6. Ecologia. Conceitos fundamentais. Relações tróficas entre os seres vivos. O ecossistema e seus componentes. Os principais biomas. Relações ecológicas entre os seres vivos. Educação ambiental: princípios gerais. Ocupação histórica do meio ambiente pelo homem. Poluição e desequilíbrios ecológicos. Alternativas, resoluções e soluções populares, políticas e legais para os problemas ambientais. Tratamento de água, esgoto, coleta e destino do lixo. ....................................................... 105 7. Ser humano e Saúde. Nutrição e doenças carenciais. Parasitologia (viroses, bacterioses, protozooses, helmintoses e micoses). Educação para a promoção da saúde. Conceitos de saúde. Sistemas do corpo humano. Órgãos e estruturas dos sentidos. Tipos sanguíneos, transfusões, componentes sanguíneos e suas funções. Sexualidade. Doenças sexualmente transmissíveis, meio ambiente e qualidade de vida. Métodos anticoncepcionais e novas técnicas de reprodução humana. Implicações no contexto atual. ............................................................................................................. 142 8. Universo, Sistema Solar e Planeta Terra. Teoria do Big Bang. Energia e suas transformações. Sol como fonte básica de energia. Elementos da natureza: ar, água e solo. Ciclos biogeoquímicos e a vida na Terra. Importância e propriedades da água. . ....................................................................................... 193 9. Matéria. Teoria atômica-molecular: evolução do conceito de átomo. Tabela periódica. Aspectos macroscópicos: substâncias simples e compostas; misturas homogêneas e heterogêneas. Processos físicos de fracionamento e separação das misturas. Soluções. Funções químicas inorgânicas: conceitos, classificações e nomenclaturas de óxidos, ácidos, hidróxidos e sais. Ligações químicas..................... 204 10. Fundamentos de Física: estados físicos da matéria e mudanças de estado; leis de Newton; força; movimento; energia cinética e potencial; gravidade; massa e peso; Transformações térmicas e eletromagnéticas. Fenômenos ondulatórios: acústicos e ópticos.......................................................... 272 Questões ......................................................................................................................................... 316 1134121 E-book gerado especialmente para RAFAELA LOPES VERISSIMO . 3 Candidatos ao Concurso Público, O Instituto Maximize Educação disponibiliza o e-mail professores@maxieduca.com.br para dúvidas relacionadas ao conteúdo desta apostila como forma de auxiliá-los nos estudos para um bom desempenho na prova. As dúvidas serão encaminhadas para os professores responsáveis pela matéria, portanto, ao entrar em contato, informe: - Apostila (concurso e cargo); - Disciplina (matéria); - Número da página onde se encontra a dúvida; e - Qual a dúvida. Caso existam dúvidas em disciplinas diferentes, por favor, encaminhá-las em e-mails separados. O professor terá até cinco dias úteis para respondê-la. Bons estudos! 1134121 E-book gerado especialmente para RAFAELA LOPES VERISSIMO . 1 Antes de apresentar o central deste texto (onde trabalhamos as discussões de Chassot1) – a alfabetização científica –, parece oportuno, ainda que de uma maneira panorâmica, olhar a escola – na acepção de instituição que faz ensino formal, em qualquer nível de escolarização – nesses tempos de globalização. Não vou tecer, aqui e agora, comentários sobre os apossamentos da Organização Mundial do Comércio na fatia educação para dirigir sua voracidade por lucros, favorecendo a comercialização internacional dos serviços da educação como uma mercadoria qualquer. Parece não existir outro bem comerciável que segure um consumidor cativo por quatro ou mais anos, como o estudante que compra ensino de uma escola. Também, não preciso destacar as fantásticas modificações no mundo de hoje e o quanto elas atingem – e uso esse verbo na sua plenitude de significados – a educação, ou, mais especificamente, as salas de aula. Não temos dúvidas do quanto a globalização confere novas realidades à educação. Talvez, para uma facilitação, pudéssemos dirigir nosso olhar para duas direções. Primeira, o quanto são diferentes as múltiplas entradas do mundo exterior na sala de aula; e a outra direção, o quanto essa sala de aula se exterioriza, atualmente, de uma maneira diferenciada. Sobre a primeira das situações não precisamos fazer muitas ilustrações. Comparem, por exemplo, o quanto eram enclausuradas as escolas de nossos avós às invasões externas, em relação às nossas salas de aula hoje, expostas às interferências do mundo externo. A escola, então, era referência na comunidade pelo conhecimento que detinha. Quanto à segunda, consideremos apenas a parcela de informações que nossos alunos e alunas trazem hoje à escola. Aqui temos que reconhecer que eles, não raro, superam as professoras e os professores nas possibilidades de acesso às fontes de informações. Há situações nas quais temos docentes desplugados ou sem televisão, que ensinam a alunos que surfam na internet ou estão conectados a redes de TV a cabo, perdendo a escola (e o professor) o papel de centro de referência do saber. A proletarização dos profissionais da educação os faz excluídos dos meios que transformam o planeta, onde a quantidade e a velocidade de informações o fazem parecer cada vez menor. Esse é o lado trágico em não poucas das contemplações da escola hoje. Assim, parece que se pode afirmar que a globalização determinou, em tempos que nos são muito próximos, uma inversão no fluxo do conhecimento. Se antes o sentido era da escola para a comunidade, hoje é o mundo exterior que invade a escola. Assim, a escola pode não ter mudado; entretanto, pode-se afirmar que ela foi mudada. E talvez não diríamos isso há dez anos. Não há, evidentemente, a necessidade (nem a possibilidade)de fazermos uma reconversão. Todavia, é permitido reivindicar para a escola um papel mais atuante na disseminação do conhecimento. Sonhadoramente, podemos pensar a escola sendo pólo de disseminação de informações privilegiadas. A ciência como um saber escolar Agora, posto esse preâmbulo, para não incorrer em generalizações indevidas restrinjamos as observações ao ensino de ciências. No século passado, nos anos de 1980, e talvez sem exagero se poderia dizer até o começo dos anos de 1990, víamos um ensino centrado quase exclusivamente na necessidade de fazer com que os estudantes adquirissem conhecimentos científicos. Não se escondia o quanto a transmissão (massiva) de conteúdos era o que importava. Um dos índices de eficiência de um professor – ou de um transmissor de conteúdo – era a quantidade de páginas repassadas aos estudantes – os receptores. Era preciso que os alunos se tornassem familiarizados (aqui, familiarizar poderia até 1 http://www.scielo.br/pdf/rbedu/n22/n22a09 1. Educação em ciências: conteúdo e metodologia. Questões sócio- científicas e as implicações éticas. Alfabetização científica 1134121 E-book gerado especialmente para RAFAELA LOPES VERISSIMO . 2 significar simplesmente saber de cor) com as teorias, com os conceitos e com os processos científicos. Um estudante competente era aquele que sabia, isto é, que era depositário de conhecimentos. Talvez mais de um dos leitores deste texto poderá recordar quantos conhecimentos inúteis amealhou – especialmente quando foram feitas as primeiras iniciações na área das ciências – que há muito, afortunadamente, os deletou. Quantas classificações botânicas, quantas famílias zoológicas cujos nomes ainda perambulam em nossas memórias como cadáveres insepultos, quantas configurações eletrônicas de elementos químicos, quantas fórmulas de física sabidas por um tempo – até o dia de uma prova – e depois desejadamente esquecidas. Antes de mostrar salutares modificações nessa tendência, permito-me chamar a atenção para o sujeito da ação verbal antes descrita. Eram os professores (sujeitos) que faziam com que os estudantes (aqui vistos como passivos à ação do sujeito) adquirissem esses conhecimentos. Quando se faz essas considerações, não há como não evocar, mais uma vez, as concepções de uma educação bancária, que Paulo Freire denunciava, com veemência, já em tempos anteriores aos referidos. Também a ele podemos creditar muitas das alterações nas tendências referidas. Hoje não se pode mais conceber propostas para um ensino de ciências sem incluir nos currículos componentes que estejam orientados na busca de aspectos sociais e pessoais dos estudantes. Há ainda os que resistem a isso, especialmente quando se ascende aos diferentes níveis de ensino. Todavia, há uma adesão cada vez maior às novas perspectivas. Muito provavelmente, um dos temas mais polêmicos quando se discute formação de professores de ciências é o quanto se precisa procurar uma ciência da escola (= o saber escolar; essa ciência da escola não é necessariamente uma produção exclusiva para a escola e/ou na escola, mas, como ensina Lopes (1999), envolve um processo de reelaboração de saberes de outros contextos sociais visando o atendimento das finalidades sociais da escolarização), que é significativamente diferente daquela ciência da universidade (= saber acadêmico). É usual defender – até pela imensa dificuldade que existe de se fazer transposição (aqui transposição não é a palavra mais adequada, mas anuncia o que seria desejado) de conteúdos do ensino superior para os ensinos médio e fundamental – que o conhecimento científico é universal. Aqui universal parece ser, também, a estrutura verticalizada dos níveis de ensino. As necessidades de alfabetização científica A alfabetização científica pode ser considerada como uma das dimensões para potencializar alternativas que privilegiam uma educação mais comprometida. É recomendável enfatizar que essa deve ser uma preocupação muito significativa no ensino fundamental, mesmo que se advogue a necessidade de atenções quase idênticas também para o ensino médio. Sonhadoramente, ampliaria a proposta para incluir também, mesmo que isso possa causar arrepio em alguns, o ensino superior. Gostaria de ver essa inclusão privilegiada nas discussões que este texto possa desencadear. Mesmo que adiante eu discuta o que é alfabetização científica, permito-me antecipar que defendo, como depois amplio, que a ciência seja uma linguagem; assim, ser alfabetizado cientificamente é saber ler a linguagem em que está escrita a natureza. É um analfabeto científico aquele incapaz de uma leitura do universo. Atualmente, a alfabetização científica está colocada como uma linha emergente na didática das ciências, que comporta um conhecimento dos fazeres cotidianos da ciência, da linguagem científica e da decodificação das crenças aderidas a ela. Há aqueles que advogam que se deva procurar especialmente conhecimentos que estão no dia-a-dia do grande público, em particular os que são apresentados com imprecisão pelos meios de comunicação à opinião pública. Essas são propostas que veem a alfabetização científica como uma possibilidade para fazer correções em ensinamentos distorcidos. Acredito que se possa pensar mais amplamente nas possibilidades de fazer com que alunos e alunas, ao entenderem a ciência, possam compreender melhor as manifestações do universo. Aqui se defende essa postura mais ampla, mesmo que se reconheça válida a outra tendência, de fazer correções em ensinamentos que são apresentados distorcidos. Quando retomo e amplio os comentários acerca da alfabetização científica que estão em outro livro (Chassot, 2000), trago, mais uma vez, uma descrição de ciência que, mesmo que possa parecer reducionista, serve para os propósitos das discussões que se quer fazer aqui. A ciência pode ser considerada como uma linguagem construída pelos homens e pelas mulheres para explicar o nosso mundo natural. Compreendermos essa linguagem (da ciência) como entendemos algo escrito numa língua que conhecemos (por exemplo, quando se entende um texto escrito em português) é podermos compreender a linguagem na qual está (sendo) escrita a natureza. Também é verdade que nossas dificuldades diante de um texto em uma língua que não dominamos podem ser comparadas com as incompreensões para explicar muitos dos fenômenos que ocorrem na natureza. Por exemplo, é provável 1134121 E-book gerado especialmente para RAFAELA LOPES VERISSIMO . 3 que alguns dos leitores deste texto não saibam distinguir se uma página de um livro ou de uma revista está escrito em sueco ou em norueguês, assim como deve haver nórdicos que talvez não reconheçam a diferença entre um texto em português e um em espanhol. Essa é a analogia que busco quando falo na ciência como uma linguagem. Entender a ciência nos facilita, também, contribuir para controlar e prever as transformações que ocorrem na natureza. Assim, teremos condições de fazer com que essas transformações sejam propostas, para que conduzam a uma melhor qualidade de vida. Isto é, a intenção é colaborar para que essas transformações que envolvem o nosso cotidiano sejam conduzidas para que tenhamos melhores condições de vida. Isso é muito significativo. Aqueles que se dedicam à educação ambiental têm significativos estudos nessa área. Dentre as muitas ciências, a química, por exemplo, é aquela que estuda como as substâncias se transformam e são transformadas em outras substâncias. Assim, ao definirmos os objetos de cada uma das ciências que conhecemos, como a física, a biologia, a geologia etc., nos damos conta das muitas interações e, particularmente, das intersecções entre esses objetos. Temos nesse conjunto as ciências naturais. Aqui ainda poderíamos incluir especializaçõesde alguns campos muito específicos como a astrofísica, a geoquímica, a bioquímica. Se olharmos, por exemplo, as chamadas ciências humanas - a sociologia, a economia, a educação - e considerarmos as relações delas com as chamadas ciências naturais e a elas adicionarmos outros ramos das ciências, teremos a ciência, cada vez mais marcada por múltiplas interconexões. Também se entende o quanto uma discussão, aparentemente simples, sobre se devemos dizer a ciência ou as ciências, pode ser mais complexa do que imaginamos e se presta a muitas discussões epistemológicas, que não serão objeto deste texto. Granger (1994) tem um livro intitulado A ciência e as ciências. Aliás, é preciso dizer o quanto a divisão em ciências naturais e ciências humanas parece inadequada, pois a química, a física, a biologia e mesmo a matemática são também ciências humanas, porque são constructos estabelecidos pelos humanos. Lateralmente ainda, vale referir também o quanto a divisão em ciências hard e ciências soft é uma classificação no mínimo enviesada e, muito provavelmente, de autoria de um assim chamado cientista hard. Ainda na busca de interconexões, em termos de disciplinas escolares vale considerar a atual proposta curricular, chamada pela divulgação oficial de "novo ensino médio". O currículo disciplinar é substituído pelo currículo em áreas. A organização do conhecimento escolar foi estabelecida em três áreas: linguagens, códigos e suas tecnologias (língua portuguesa, língua estrangeira moderna, educação física, artes e informática), ciências da natureza, matemática e suas tecnologias (biologia, física, química e matemática) e ciências humanas e suas tecnologias (história, geografia, filosofia, antropologia & política e sociologia). Essa divisão – numa proposta oficial – tem como base reunir em uma mesma área aqueles conhecimentos que compartilham objetos de estudo e, portanto, que mais facilmente se comunicam (MEC & SMTEC, 1999), criando condições para uma prática escolar de interdisciplinaridade, dentro de uma perspectiva interdisciplinar e contextualizada em oposição à fragmentação e descontextualização do ensino disciplinar. É fácil entender o quanto as determinações oficiais buscam definir, por exemplo, o ensino de química como parte da área das ciências da natureza, matemática e suas tecnologias. Sou quase levado a inferir que há muitos envolvidos com esse ensino que não se dão conta de onde e como estão localizadas a física ou a química nas propostas curriculares. É verdade que o período de influência dessas últimas modificações é relativamente recente. Mas já há estudos, por exemplo, provenientes da comunidade envolvida com a educação química, que trazem questionamentos a esse quadro recente da educação brasileira. Assim, Rozana Abreu, na sua dissertação de mestrado, analisando particularmente os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio na área das ciências da natureza, matemática e suas tecnologias, mostra que a nova organização curricular proposta pelos documentos oficiais dos Parâmetros não favorece mudanças efetivas na promoção de um currículo mais integrado, na medida em que seus pressupostos estão associados às relações sociais da sociedade contemporânea, principalmente ao mercado de trabalho e ao mundo produtivo. Todavia, as diferentes concepções de Ciência nos convidam a adensar considerações acerca de uma proposta de vermos a ciência como uma linguagem. No segmento seguinte se ampliam discussões sobre alfabetização científica. Em outro texto discuto como essa alfabetização científica ganha uma outra dimensão: o quanto com ela se pode fazer inclusão social. 1134121 E-book gerado especialmente para RAFAELA LOPES VERISSIMO . 4 Ciência como linguagem Início aceitando críticas ao quanto a descrição da ciência como uma linguagem, que antes apresentei, possa ser considerada simplista. A seguir trago algumas preocupações. Também por isso reapresento criticamente outros textos que escrevi. Não ignoro que há (in)consistências teóricas nas minhas buscas. Vejo-me privilegiado em poder socializá-las aqui. Lateralmente, devo dizer que entendo que é para isso, também, que publicamos nossos textos em revistas. Assim, considerar a ciência como "uma linguagem para facilitar nossa leitura do mundo natural" e sabê-la como descrição do mundo natural ajuda a entendermos a nós mesmos e o ambiente que nos cerca. Merece um comentário essa adjetivação de mundo que foi feita. A ciência não tem preocupações com a descrição, e muito menos com a explicação do mundo sobrenatural ou do mundo espiritual. O mundo natural é aqui usado na acepção de nosso mundo orgânico e inorgânico, que forma o que chamamos de natureza. Japiassu e Marcondes a definem como um mundo visível ou físico (formado pelos reinos mineral, vegetal e animal) submetido às leis naturais, em oposição às ideias, sentimentos, emoções etc. governadas pelas leis morais e pelas leis políticas. Esses autores enfatizam que a natureza, num sentido teológico, deva ser considerada o mundo criado por Deus, em oposição à cultura no sentido daquilo que é criado pelas mulheres e pelos homens, assim, produto de uma obra humana. Quando nos referimos ao entendimento do mundo natural, há uma restrição epistemológica e ficamos limitados ao entendimento deste nosso mundo visível onde estamos inseridos, logo, do qual somos parte. Com isso não estamos excluindo ou desqualificando as ciências humanas, que facilitam nosso entendimento social (e aqui incluo o político) ou emocional; elas podem estar incluídas no mundo dito natural. Estão excluídas, sim, as manifestações ditas sobrenaturais. A elaboração dessa explicação do mundo natural – diria que isso é fazer ciência, como elaboração de um conjunto de conhecimentos metodicamente adquirido – é descrever a natureza numa linguagem dita científica. Propiciar o entendimento ou a leitura dessa linguagem é fazer alfabetização científica. Há, todavia, uma outra dimensão em termos de exigências: propiciar aos homens e mulheres uma alfabetização científica na perspectiva da inclusão social. Há uma continuada necessidade de fazermos com que a ciência possa ser não apenas medianamente entendida por todos, mas, e principalmente, facilitadora do estar fazendo parte do mundo. Sei o quanto estou laborando em (quase) utopias. Mas é por crer que essas mesmas utopias possam se transmutar na realidade de fazermos educação. Diria mais, é quase apenas por isso. Mas agora deixemos um pouco os sonhos. Há de se tentar convertê-los em realidades. Trago, assim, a proposta teórica para adensar uma discussão. Essas são as minhas expectativas para a frutificação do binômio escrita - leitura. Sei também que posso estar sendo acusado de dicotômico, ao apelar para essa relação binomial. Aceito que não há uma separação nítida entre aquele que é o autor e aquele que é o leitor. Um e outro, nesse processo, interconvertem papéis. O leitor também passa a ser autor, refazendo com sua leitura um novo texto. Mesmo que refaça caminhadas, buscando outros embasamentos, tenho em outros livros dois capítulos4,5 acerca do tema, que (des)constroem essa discussão. Para fazer uma oposição ao presenteísmo (vinculação exclusiva ao presente, sem enraizamento com o passado e sem perspectivas para o futuro) e ao cientificismo (crença exagerada no poder da ciência e/ou atribuição à mesma de fazeres apenas benéficos), ainda tão marcadamente presentes nos dias atuais, especialmente em nossas salas de aula, inclusive nas universidades, insisto na necessidade de considerar que essa linguagem é um constructo humano, portanto, mutável e falível. Sempre parece oportuno ter presente as afirmações de Granger: A ciência é uma das mais extraordinárias criações do homem, que lhe confere, ao mesmo tempo, poderes e satisfação intelectual, atépela estética que suas explicações lhe proporcionam. No entanto, ela não é lugar de certezas absolutas e [...] nossos conhecimentos científicos são necessariamente parciais e relativos. É para essa concepção de ciência um dos mais extraordinários feitos humanos, mas não-lugar de certezas – que trago interrogações para ampliar a possibilidade de pensarmos a ciência como uma linguagem para entendermos o mundo natural. Por isso, quando discuto alfabetização científica, insisto na necessidade de considerá-la como "o conjunto de conhecimentos que facilitariam aos homens e mulheres fazer uma leitura do mundo onde vivem". Assim, concordo com Woolgar (1991), que, ao tentar abrir aquela caixa preta em que os cientistas – com sua linguagem hermética e esotérica -converteram a ciência, mostra que ela não descobre o mundo, mas o quanto é o mundo que a descobre. O mundo é 1134121 E-book gerado especialmente para RAFAELA LOPES VERISSIMO . 5 (existe) independente da ciência. Esta o torna inteligível, e a tecnologia, como aplicação da ciência, modifica esse mundo. Por exemplo, a produção de energia elétrica a partir de uma queda d'água ou do aproveitamento de ventos é o resultado de uma aplicação de conhecimento acerca da natureza do mundo natural. Isso transforma o mundo natural mas não altera a sua essencialidade, por exemplo, em termos do princípio da conservação da energia. Amplio mais a importância ou as exigências de uma alfabetização científica. Assim como se exige que os alfabetizados em língua materna sejam cidadãs e cidadãos críticos, em oposição, por exemplo, àqueles que Bertolt Brecht classifica como analfabetos políticos, seria desejável que os alfabetizados cientificamente não apenas tivessem facilitada a leitura do mundo em que vivem, mas entendessem as necessidades de transformá-lo - e, preferencialmente, transformá-lo em algo melhor. Tenho sido recorrente na defesa da exigência de com a ciência melhorarmos a vida no planeta, e não torná-la mais perigosa, como ocorre, às vezes, com maus usos de algumas tecnologias. Parece que merece ser questionado, liminarmente, se essa alfabetização científica é algo próprio, ou melhor, é de interesse apenas daqueles que estão diretamente ligados à ciência. Usualmente, conhecer a ciência é assunto quase vedado àqueles que não pertencem a essa esotérica comunidade científica. Já discuti em diversos textos o quanto há necessidade de nós, professoras e professores de disciplinas escolares, especialmente aquelas da área de ciências, fazermos a migração do esoterismo para o exoterismo. Assim, a primeira explicação para a exclusão que decretamos a muitos é fazermos do nosso instrumental de leitura da natureza algo hermético ou esotérico. Thuillier, ao exemplificar o quanto se consegue ser hermético na linguagem da ciência, apresenta esotéricas (e desnecessárias) definições do número um quase incompreensíveis para os mais expertos algebristas. Não desconheço, aqui, as razões históricas, muitas vezes até de segurança, que fizeram a ciência usar uma linguagem asséptica e hermética. Nunca desconsidero, como professor de química, minha ancestralidade nos alquimistas medievos. Discuto isso mais extensamente em diferentes capítulos de Educação consciência, quando falo de desafios curriculares para fazer possível um outro mundo e também quando discuto a alfabetização científica fazendo inclusão social. Relato, por exemplo, o trabalho com sementes que não são sementes em um curso de pedagogia. Retomo a problematização da concepção da ciência como uma linguagem. Proponho fazermos juntos alguns adensamentos teóricos nessa dimensão. Tomo como referência a aula inaugural da cadeira de Semiologia Literária no Collège de France pronunciada por Roland Barthes no dia 7 de janeiro de 1977. Sem enveredar na área da semiótica, busco em Barthes (1996) uma ratificação, quando ele afirma, categórico: "O objeto em que se inscreve o poder, desde toda a história humana, é: a linguagem – ou, para ser mais preciso, sua expressão obrigatória: a língua". Uma leitura (da história) da ciência quase que poderia ser feita com essas mesmas palavras. Encontramos, nas sucessivas disputas de poder na história da construção do conhecimento científico, isso que Barthes diz sobre a língua. A aula prossegue afirmando: A linguagem é uma legislação, a língua é seu código. Não vemos o poder que reside na língua, porque esquecemos que toda língua é uma classificação, e que toda classificação é opressiva: ordo quer dizer, ao mesmo tempo, repartição e cominação. Barthes falava, então, da língua francesa, e mostrava, por exemplo, as dificuldades impostas pelas exigências de ter que escolher sempre entre o masculino e o feminino, enquanto o neutro é proibido. Eu o vejo falando da ciência, ou melhor da linguagem científica, que com seus códigos se faz língua, quando ele diz: Assim, por sua própria estrutura, a língua implica em uma relação fatal de alienação. Falar, e com maior razão discorrer, não é comunicar, como se repete com demasiada frequência, é sujeitar. Toda a língua é uma reição generalizada. Mesmo quando A aula assume um tom aparentemente mais radical, é possível fazer associações com a ciência quando Barthes diz: "a língua, como desempenho de toda a linguagem, não é nem reacionária, nem progressista; ela é simplesmente fascista; pois o fascismo não é impedir de dizer, é obrigar a dizer". Trago, como ratificação à minha adesão barthesiana, Paul Feyerabend (1924-1994), autor de obras que foram decisivas para novas concepções de ciência, como seu discutidíssimo livro Contra o método. Ele destaca que "a distinção entre Ciência e mito não é tão evidente". Então, mais uma vez, me parece claro por que Feyerabend, um dos críticos mais perspicazes, faz análises da ciência tão desestabilizadoras. Não é sem razão que ele é chamado em rodas mais fechadas de "terrorista epistemológico", tendo sido chamado por alguns físicos, mais recentemente, de "o pior inimigo da ciência", encabeçando uma lista em que são nomeados Karl Popper, Imre Lakatos e Thomas Kuhn. Prefiro estar ao lado de Feyerabend, e não de seus críticos conservadores. 1134121 E-book gerado especialmente para RAFAELA LOPES VERISSIMO . 6 Quando se busca entender o porquê da contestação que cientistas, especialmente os (auto)denominados hard, fazem, por exemplo, àqueles que buscam uma leitura da ciência em dimensões menos positivistas, podemos entender o que Barthes diz da linguagem e ver também a ciência, ou seus autores canônicos ou mais ortodoxos, exercendo dominação: obrigando a dizer ou a fazer. Há duas dimensões que demandam estudos e investigações: a primeira, o quanto o conhecimento científico é uma instância privilegiada de relações de poder e esse conhecimento, como patrimônio mais amplo da humanidade, deve ser socializado; a segunda, o quanto há cada vez mais exigências de que migremos do esoterismo ao exoterismo, para que se ampliem as possibilidades de acesso à ciência. Uma e outra dessas dimensões mereceram textos que já referi aqui. Outra vez trago Barthes falando da língua, considerando – para os propósitos deste texto – como se sua aula fosse acerca dos códigos da ciência: [...] a língua entra a serviço de um poder. Nela, infalivelmente, duas rubricas se delineiam: a autoridade da asserção, o gregarismo da repetição. Por um lado, a língua é imediatamente assertiva: a negação, a dúvida, a possibilidade, a suspensão de julgamento requerem operadores particulares que são eles próprios retomados num jogo de máscaras linguageiras. [...] Por outro lado, os signos de que a língua é feita, os signos só existem na medida em que são reconhecidos, isto é, na medida em que se repetem; o signo é seguidor, gregário; em cada signo dorme este monstro: nunca posso falar senão recolhendo aquilo que se arrasta na língua.[...] Na língua, portanto a servidão e o poder se confundem inelutavelmente. Pode-se ver, na releitura que faço de A aula, usando-a para a ciência, que há uma tentativa de rebeldia barthesiana contra os códigos da ciência, assim como ele desentranhou a semiologia da linguística. Todavia, não adiro ao quase consenso de que nossos textos devam parecer herméticos e escritos apenas para uma autossatisfação acadêmica. Há situações em que parece ser possível dizer de alguns de nossos textos acadêmicos aquilo que se diz de algumas obras de arte: um outro artista não a identifica como arte; um outro cientista, da mesma área, não entende o texto. Nunca é demais recordar o aprendizado que as ciências humanas tiveram com o caso Sokal. Há, com a ciência que se faz, um compromisso ético de ajudar aos homens e às mulheres na solução de importantes problemas (Del Percio, 2000). Ao referir a necessidade de ajuda, parece evidente que não esteja propondo aqui uma postura messiânica da Academia. A ciência, todavia, tem compromissos com a sociedade, pois é a sociedade a cofinanciadora das pesquisa que se fazem na ciência. Defendo o quanto há necessidade de nós, professoras e professores de disciplinas científicas, fazermos a migração do esoterismo para o exoterismo. Há aqui uma outra direção que pode iluminar nossas pesquisas: como fazer do saber acadêmico um saber escolar. Tenho me envolvido também em como fazer do saber popular um saber escolar. Essa é uma discussão que ainda não está suficientemente presente na Academia. Há nessa dimensão a busca de se investigar um ensino mais impregnado com posturas mais holísticas – isto é, com um ensino de ciências que contemple aspectos históricos, dimensões ambientais, posturas éticas e políticas, mergulhadas na procura de saberes populares e nas dimensões das etnociências –, proposta que traz vantagens para uma alfabetização científica mais significativa, como também confere dimensões privilegiadas para a formação de professoras e professores. Mesmo que também reconheçamos no desempenho da ciência posturas que nem sempre são progressistas, ou que até são nitidamente reacionárias, e muitas vezes, simplesmente fascistas no seu não impedir de dizer, mas obrigar a dizer, usando as referências de Barthes à língua e à linguagem, é preciso reconhecer que esse constructo que denominamos ciência é decisivo, ainda que não definitivo. Logo, a ele não devemos nos submeter. Precisamos saber usá-lo. Isso me parece ser um indicador para uma alfabetização científica. Assim, poderíamos pensar que alfabetização científica signifique possibilidades de que a grande maioria da população disponha de conhecimentos científicos e tecnológicos necessários para se desenvolver na vida diária, ajudar a resolver os problemas e as necessidades de saúde e sobrevivência básica, tomar consciência das complexas relações entre ciência e sociedade. Parece válido considerar a ciência como uma parte da cultura de nosso tempo. Isso não significa uma adesão exclusiva à ciência imposta pela Europa, a partir do século XV. Há, assim, uma continuada necessidade de revermos marcos que usualmente definem o início da chamada ciência moderna. Por exemplo, eu fui simplista e reducionista em A Ciência através dos tempos (Chassot, 1994), quando refiro a revolução galilaica e a copernicana e encimo um capítulo com um título no mínimo tendencioso: Século 16: nasce a ciência moderna, numa leitura que desconhece o que se fez no mundo não-europeu. Reabilito-me, um pouco, em outros textos. Vale recordar que há 100 anos o químico francês Marcelin Berthelot (1827-1907), um dos primeiros grandes especialistas em síntese orgânica, com investigações que alçaram a termoquímica a uma 1134121 E-book gerado especialmente para RAFAELA LOPES VERISSIMO . 7 especialização muito importante, exageradamente profetizava, como senador da República e presidente da Academia de Ciências: A Ciência possui doravante a única força moral que pode fundamentar a dignidade da personalidade humana e constituir as sociedades futuras. A Ciência domina tudo: só ela presta serviços definitivos. [...] Na verdade, tudo tem origem no conhecimento da verdade e dos métodos científicos pelos quais ele é adquirido e propagado: a política, a arte, a vida moral dos homens, assim como sua indústria e sua vida prática. Vivia-se o auge de descobertas significativas, e que, então, pareciam definitivas. Mesmo que possa parecer não crível, é preciso acentuar que não devemos pensar a ciência como pronta, acabada, completamente despojada, como uma nova e dogmática religião, com o "deus saber" imperando no novo milênio. A marca da ciência de nossos dias é a incerteza. É importante recordar Ilya Prigogine, Prêmio Nobel de Química de 1977, em uma afirmação categórica: "Só tenho uma certeza: as de minhas muitas incertezas". Assim, é preciso que vejamos nessas incertezas a marca da pós-modernidade; uma realidade, e não um estigma. Antigamente a ciência nos falava de leis eternas. Hoje, nos fala da história do universo ou da matéria e nos propõe sempre novos desafios que precisam ser investigados. Este é o universo das probabilidades, e não das certezas. Ao referir as nossas não-certezas, vale destacar o quanto o dogmatismo é uma marca muito presente em nossas salas de aula. Pode-se creditá-lo às origens da universidade e da escola. É preciso recordar que a universidade (no mundo ocidental) e também as escolas têm suas origens na Igreja e a ela permaneceram simbioticamente ligadas durante séculos. Assim a escola – como sempre ocorreu com a Igreja – parecia ser o locus da verdade. Vale lembrar um exemplo histórico de contestação: Para Celso (1493-1541) sabia o segredo das minas, da medicina popular, da alquimia e da ciência dos clássicos, mas rejeitava o que era estabelecido como verdade. Rebelou-se contra a autoridade eclesiástica e contra o dogmatismo presente na universidade. Como consequência, foi considerado um pária na academia. Nas aulas, em qualquer etapa da escolarização, poucas vezes falamos em modelos prováveis, mesmo que a maioria de nossas discussões nas ciências se desenvolvam através de modelos. Nunca é demais insistir que os modelos que usamos não são a realidade. São aproximações facilitadoras para entendermos a realidade e que nos permitem algumas (limitadas) generalizações. Talvez a marca da incerteza, hoje tão mais presente na ciência, devesse estar mais fortemente presente em nossas aulas. Retifiquemos as certezas de Berthelot: a ciência não tem a verdade, mas tem algumas verdades transitórias. Aliás, na educação brasileira, principalmente aquela do início do século XX, ao lado da influência do dogmatismo que herdamos pelas origens da escola e da universidade, temos que acrescentar o positivismo comtiano. O livro Cours de philosophie positive foi certamente a obra mais lida pela elite intelectual brasileira, e nesta se incluem os militares que fizeram a República. O positivismo comtiano, mesmo com características de um sistema filosófico fechado e inspirado em resultados científicos, teve no Brasil uma significativa influência nas escolas militares e foi legado durante a República para as escolas de engenharia, e delas para os níveis anteriores à universidade. A ideologia positivista comtiana funcionou como um inibidor para a expansão do conhecimento, pois, entre outras afirmações, Comte dizia que "a ciência estava pronta, acabada, pois seus fundamentos estavam consolidados". E ainda: "Ciência, logo previsão, logo ação." O positivismo garante a justificação do poder técnico e, mais que isso, do poder dos tecnocratas. A força das ideias comtianas sobre a ciência pode ser vista nas suas ideias sobre a evolução. Tendo falecido dois anos antes da publicação, em 1857, da Origem das espécies, de Darwin, Comte não aceitava a teoria da evolução por julgá-lacontrária aos fatos que conhecia e, por isso assim escreveu, no Curso de filosofia positiva (1973): "Mas a fixidez essencial das espécies garante-nos que essa série [a grande série biológica] será sempre composta de termos nitidamente distintos, separados por intervalos intransponíveis". Acredito que essa frase serve como um bom exemplo do chamado positivismo comtiano. Superar essas marcas de um jeito muito continuado de pensar é uma tarefa nem sempre fácil. A superação do dogmatismo parece ser uma das necessidades do ensino das ciências. 1134121 E-book gerado especialmente para RAFAELA LOPES VERISSIMO . 8 Evolução Entre os seres vivos e o meio em que vivem há um ajuste, uma harmonia fundamental para a sobrevivência. O flamingo rosa, por exemplo, abaixa a cabeça até o solo alagadiço em que vive para buscar ali seu alimento; os beija-flores, com seus longos bicos, estão adaptados à coleta do néctar contido nas flores tubulosas que visitam. A adaptação dos seres vivos ao meio é um fato incontestável. A origem da adaptação, porém, sempre foi discutida. Na Antiguidade, a ideia de que as espécies seriam fixas e imutáveis foi defendida pelos filósofos gregos. Os chamados, fixistas propunham que as espécies vivas já existiam desde a origem do planeta e a extinção de muitas delas deveu-se a eventos especiais como, por exemplo, catástrofes, que teriam exterminado grupos inteiros de seres vivos. O filósofo grego Aristóteles, grande estudioso da natureza, não admitia a ocorrência de transformação das espécies. Acreditava que os organismos eram distribuídos segundo uma escala que ia do mais simples ao mais complexo. Cada ser vivo nesta escala, tinha seu lugar definido. Essa visão aristotélica, que perdurou por cerca de 2.000 anos, admitia que as espécies eram fixas e imutáveis. Lentamente, a partir do século XIX, uma série de pensadores passou a admitir a ideia da substituição gradual das espécies por outras, por meio de adaptações a ambientes em contínuo processo de mudança. Essa corrente de pensamento, transformista, explicava a adaptação como um processo dinâmico, ao contrário do que propunham os fixistas. Para o transformismo, a adaptação é conseguida por meio de mudanças: à medida que muda o meio, muda a espécie. Os adaptados ao ambiente em mudança sobrevivem. Essa ideia deu origem ao evolucionismo. Evolução Biológica é a adaptação das espécies a meios em contínua mudança. Nem sempre a adaptação implica aperfeiçoamento. Muitas vezes, leva a uma simplificação. É o caso, por exemplo, das tênias, vermes achatados parasitas: não tendo tubo digestório, estão perfeitamente adaptadas ao parasitismo no tubo digestório do homem e de outros vertebrados. Criacionismo: origem da vida por criação especial 2. Origem da vida. Principais teorias do processo evolutivo. Origem das espécies 1134121 E-book gerado especialmente para RAFAELA LOPES VERISSIMO . 9 Anterior às tentativas científicas relacionadas à origem da vida, já era difundida a ideia de criação especial, segundo a qual a vida é fruto da ação consciente de um Criador. Essa corrente de pensamento, que passou a ser denominada criacionista, baseia-se na fé e nos textos bíblicos, principalmente no livro de Gênesis , que relatam a ideia sobre a origem da vida do ponto de vista religioso. Ao longo da história, muitas controvérsias chegaram a extremos por causa de uma interpretação errônea que não levava em contra o contexto e o caráter muitas vezes poético e simbólico dos textos da bíblia, que não tem nenhum objetivo científico. Assim, principalmente na Idade Média, uma interpretação literal e, portanto, limitada dos textos bíblicos era imposta como dogma e criava uma barreira em relação à ciência que estava e está em constante progresso. Nota: O criacionismo, que se opõe à teoria da evolução segundo a qual a vida teria surgido da matéria bruta, tem hoje defensores, que se esforçam em demonstrar que os textos bíblicos, tomados em seu contexto próprio, em nada contradizem as mais novas descobertas científicas. As Evidências da Evolução O esclarecimento do mecanismo de atuação da evolução biológica somente foi concretamente conseguido a partir dos trabalhos de dois cientistas, o francês Jean Baptiste Lamarck (1744 – 1829) e o inglês Charles Darwin (1809-1882). A discussão evolucionista, no entanto, levanta grande polêmica. Por esse motivo é preciso descrever, inicialmente, as principais evidências da evolução utilizadas pelos evolucionistas em defesa de sua tese. Dentre as mais utilizadas destacam-se: - os fósseis; - a semelhança embriológica e anatômica existente entre os componentes de alguns grupos animais (notadamente os vertebrados), - a existência de estruturas vestigiais e - as evidências bioquímicas relacionadas a determinadas moléculas comuns a muitos seres vivos. Fósseis Um fóssil (do latim fossilis, tirado da terra) é qualquer vestígio de um ser vivo que habitou o nosso planeta em tempos remotos, como uma parte do corpo, uma pegada e uma impressão corporal. O estudo dos fósseis permite deduzir o tamanho e a forma dos organismos que os deixaram, possibilitando a reconstrução de uma imagem, possivelmente parecida, dos animais quando eram vivos. Fossil de um dinossauro e de uma planta. Anatomia Comparada A asa de uma ave, a nadadeira anterior de um golfinho e o braço de um homem, ainda que muito diferentes, possuem estrutura óssea e muscular bastante parecidas. A semelhança pode ser explicada admitindo-se que esses seres tiveram ancestrais em comum, dos quais herdaram um plano básico de estrutura corporal. 1134121 E-book gerado especialmente para RAFAELA LOPES VERISSIMO . 10 Semelhanças Embrionárias As semelhanças entre os embriões de determinados grupos de animais são ainda maiores do que as semelhanças encontradas nas formas adultas. Por exemplo, é difícil distinguir embriões jovens de peixes, sapos, tartarugas, pássaros e seres humanos, todos pertencentes ao grupo dos vertebrados. Essa semelhança pode ser explicada se levarmos em conta que durante o processo embrionário é esboçado o plano estrutural básico do corpo, que todos eles herdaram de um ancestral comum. Órgãos ou Estruturas Homólogos Certos órgãos ou estruturas se desenvolvem de modo muito semelhante nos embriões de todos os vertebrados. São os órgãos homólogos. Apesar de terem a mesma origem embrionária, os órgãos homólogos podem ter funções diferentes, como é o caso do braço humano e da asa de uma ave, por exemplo: 1134121 E-book gerado especialmente para RAFAELA LOPES VERISSIMO . 11 Órgãos ou Estruturas Análogos Se dois órgãos ou estruturas desempenham a mesma função, mas têm origem embrionária diferente, são chamados análogos. As asas de aves e de insetos, por exemplo, são estruturas análogas: ambas servem para voar, porém suas origens embrionárias são totalmente distintas. Órgãos Vestigiais Órgãos vestigiais são estruturas atrofiadas, sem função evidente no organismo. O apêndice cecal do intestino humano, por exemplo, é um órgão vestigial. Esse órgão é uma pequena projeção do ceco (região do intestino grosso) e não desempenha nenhuma função importante no homem e nos animais carnívoros. Já nos herbívoros, o apêndice é muito desenvolvido e tem importante papel na digestão da celulose; nele vivem microrganismos que atuam na digestão dessa substância. Tudo indica que os mamíferos atuais, carnívoros e herbívoros, tiveram ancestrais comuns, cuja dieta devia ser baseada em alimentos vegetais, ricos em celulose. Entretanto, no decorrer da evolução, cecos e apêndices deixaram de ser vantajosos para alguns grupos de organismos, nos quais se encontramreduzidos, como vestígios de sua origem. As Ideias de Lamarck Lamarck, naturalista francês, foi o primeiro a propor uma teoria sintética da evolução. Sua teoria foi publicada em 1809, no livro Filosofia Zoológica. Ele dizia que formas de vida mais simples surgem a partir da matéria inanimada por geração espontânea e progridem a um estágio de maior complexidade e 1134121 E-book gerado especialmente para RAFAELA LOPES VERISSIMO . 12 perfeição. Em sua teoria, Lamarck sustentou que a progressão dos organismos era guiada pelo meio ambiente: se o ambiente sofre modificações, os organismos procuram adaptar-se a ele. Nesse processo de adaptação, um ou mais órgãos são mais usados do que outros. O uso ou o desuso dos diferentes órgãos alterariam características do corpo, e estas características seriam transmitidas para as próximas gerações. Assim, ao longo do tempo os organismos se modificariam, podendo dar origem as novas espécies. Segundo Lamarck, portanto, o princípio evolutivo estaria baseado em duas leis fundamentais: Lei do uso ou desuso: no processo de adaptação ao meio, o uso de determinadas partes do corpo do organismo faz com que elas se desenvolvam, e o desuso faz com que se atrofiem. Um exemplo clássico da lei do uso e do desuso é o crescimento do pescoço da girafa. Segundo Lamarck: Devido ao esforço da girafa para comer as folhas das arvores mais altas o pescoço do mesmo acabou crescendo. Lei da transmissão dos caracteres adquiridos: alterações no corpo do organismo provocadas pelo uso ou desuso são transmitidas aos descendentes. Vários são os exemplos de abordagem lamarquista para a evolução. Um deles se refere às aves aquáticas, que se teriam tornado pernaltas devido ao esforço que faziam para esticar as pernas e assim evitar molhar as pernas durante a locomoção na água. A cada geração esse esforço produziria aves com pernas mais altas, que transmitiam essa característica à geração seguinte. Após várias gerações, teriam sido originadas as atuais aves pernaltas. Na época, as ideias de Lamarck foram rejeitadas, não porque falavam na herança das características adquiridas, mas por falarem em evolução. Não se sabia nada sobre herança genética e acreditavam-se que as espécies eram imutáveis. Somente muito mais tarde os cientistas puderam contestar a herança dos caracteres adquiridos. Uma pessoa que pratica atividade física terá musculatura mais desenvolvida, mas essa condição não é transmitida aos seus descendentes. Mesmo estando enganado quanto às suas interpretações, Lamarck merece ser respeitado, pois foi o primeiro cientista a questionar o fixismo e defender ideias sobre evolução. Ele introduziu também o conceito da adaptação dos organismos ao meio, muito importante para o entendimento da evolução Darwinismo A viagem de Darwin ao redor do mundo Muitas das observações que levaram Charles Darwin a elaborar sua teoria evolucionista ocorreram durante a viagem ao redor do mundo, como naturalista do navio inglês H. S. S. Beagle. Durante os cinco anos que durou a viagem, iniciada em 1831, Darwin visitou diversos locais da América do Sul (inclusive o Brasil) e da Austrália, além de vários arquipélagos tropicais. Durante a viagem do Beagle, Darwin fez escavações na Patagônia, onde encontrou fósseis de mamíferos já extintos. Darwin descobriu o fóssil de um animal gigantesco, com a organização esquelética muito semelhante à dos tatus que hoje habitam o continente sul-americano. Nas ilhas Galápagos, um conjunto de ilhas pequenas e áridas, situadas no Oceano Pacífico a cerca de 800Km da costa do Equador, Darwin encontrou uma fauna e uma flora altamente peculiares, que variavam ligeiramente de ilha para ilha. 1134121 E-book gerado especialmente para RAFAELA LOPES VERISSIMO . 13 Darwin se torna adepto do evolucionismo Darwin só se tornou verdadeiramente evolucionista vários meses após regressar de sua viagem, em cerca de 1837. Só então, pode compreender o significado evolutivo de suas observações em Galápagos e em outros locais ao rever suas anotações e submeter o material coletado na viagem a diversos especialistas. A pergunta que Darwin se fazia era: se os animais e plantas tinham sido criados tal e qual se apresentam hoje, porque razão espécies distintas, mas notadamente semelhantes, como as de pássaros e tartarugas de Galápagos, foram colocadas pelo criador e ilhas próximas, e não distribuídas homogeneamente pelo mundo? Era realmente surpreendente que ilhas de clima e condições físicas semelhantes, mas distantes uma das outras (como Galápagos e Cabo Verde, por exemplo) não tivessem espécies semelhantes. Darwin acabou concluindo que a flora e a fauna de ilhas próximas são semelhantes porque se originam de ancestrais comuns, provenientes dos continentes próximos. Em cada uma das ilhas, as populações colonizadoras sofrem adaptações específicas, originando diferentes variedades de espécies. Por exemplo, as diversas espécies de pássaros fringilídeos de Galápagos provavelmente se originaram de uma única espécie ancestral oriunda do continente sul-americano. A diversificação da espécie original, que teria originado as diferentes espécies atuais, deu-se como resultado às diferentes ilhas do arquipélago. Seleção Artificial Um dos argumentos apresentados por Darwin em favor da seleção dos mais aptos baseou-se no estudo das espécies cultivadas pelo homem. Sabia-se que pelo menos alguns animais domésticos e vegetais cultivados pertenciam a espécie com representantes ainda em estado selvagem. Os exemplares domésticos, entretanto, diferiam em tantas características dos selvagens que podiam, quanto ao seu aspecto geral, até ser classificados como espécies diferentes. Darwin se dedicou à criação de pombos, cujas as variedades domésticas eram sabidamente originadas de uma única espécie selvagem, a Columba livia, a partir da seleção artificialmente conduzida pelos criadores. Sua conclusão foi que a seleção artificial podia ser compara àquela que a natureza exercia sobre as espécies selvagens. Da mesma forma que o homem seleciona reprodutores de uma determinada variedade ou raça, permitindo que apenas os que têm a característica desejadas se reproduzam, a natureza seleciona, nas espécies selvagens, os indivíduos mais adaptados às condições reinantes. Estes deixam um número proporcionalmente maior de descendentes, contribuindo significativamente para a formação da geração seguinte. A publicação da teoria de Darwin Em 1844, Darwin escreveu um longo trabalho sobre a origem das espécies e a seleção natural. Não o publicou, porém, porque tinha receio de que suas ideias fossem um tanto revolucionárias. Amigos de Darwin, conhecedores da seriedade de seu trabalho, tentaram inutilmente convencê-lo a publicar o manuscrito antes que outros publicassem ideias semelhantes. A teoria selecionista de Wallace Em junho de 1858, Darwin recebeu uma carta do naturalista inglês Alfred Russel Wallace (1823 – 1913), que continha conclusões fundamentalmente semelhantes às suas. Wallace havia estudado as faunas da Amazônia e das Índias Orientais, chegando à conclusão de que as espécies se modificavam por seleção natural. Darwin ficou assombrado com as semelhanças do trabalho de Wallace em relação ao seu próprio trabalho, entre outras coisas pelo fato de Wallace ter também se inspirado em uma mesma fonte não biológica, o livro de Malthus, Ensaio sobre a lei da população. Darwin escreveu, então, um resumo de suas ideias, que foram publicadas juntamente com o trabalho de Wallace, em 1º de julho de 1858. Um ano mais tarde, Darwin publicou o trabalho completo no livro A origem das espécies. As anotações de Darwin confirmaram que ele concebeu a sua teoria de evolução cerca de 15 anos antes de terrecebido a carta de Wallace, e este admitiu que Darwin tinha, realmente, sido o pioneiro. 1134121 E-book gerado especialmente para RAFAELA LOPES VERISSIMO . 14 Análise Filogenética Qual foi o ancestral dos répteis (lagartos, cobras) que vivem na Terra atual? Essas e outras perguntas relativas à origem dos grandes grupos de seres vivos eram difíceis de serem respondidas até surgir, em 1859, a Teoria da evolução Biológica por Seleção Natural, proposta por Charles Darwin e Alfred Russel Wallace. Com a compreensão de "como" a evolução biológica ocorre, os biólogos passaram a sugerir hipóteses para explicar a possível relação de parentesco entre os diversos grupos de seres vivos. Diagramas em forma de árvore - elaborados com dados de anatomia e embriologia comparadas, além de informações derivadas do estudo de fósseis - mostraram a hipotética origem de grupos a partir de supostos ancestrais. Essas supostas "árvores genealógicas" ou "filogenéticas" (do grego, phylon = raça, tribo + génesis = fonte, origem, início) simbolizavam a história evolutiva dos grupos que eram comparados, além de sugerir uma provável época de origem para cada um deles. Como exemplo veja a figura abaixo. O esquema representa uma provável "história evolutiva" dos vertebrados. Note que estão representados os grupos atuais - no topo do esquema- bem como os prováveis ancestrais. Perceba que o grupo das lampreias (considerados "peixes" sem mandíbula) é bem antigo (mais de 500 milhões de anos). Já cerca de 150 milhões de anos, provavelmente a partir de um grupo de dinossauros ancestrais. Note, ainda, que o parentesco existe entre aves e répteis é maior do que existe entre mamífero e répteis, e que os três grupos foram originados de um ancestral comum. Atualmente com um maior número de informações sobre os grupos taxonômicos passaram-se a utilizar computadores para se gerar as árvores filogenéticas e os cladogramas para estabelecer as inúmeras relações entre os seres vivos. Estabelecendo Filogenias com os Cladogramas Ao dispor de um grande número de características comparativas, mais confiáveis - anatômicas, embriológicas, funcionais, genéticas, comportamentais etc. - os biólogos interessados na classificação dos seres vivos puderam elaborar hipóteses mais consistentes a respeito da evolução dos grandes grupos. Influenciados pelo trabalho de Wili Hennig - um cientista alemão, especialista em insetos - passaram a apresentar as características em cladogramas. Neste tipo de diagrama, utiliza-se uma linha, cujo ponto de origem - a raiz- simboliza um provável grupo (ou espécie) ancestral. De cada nó surge um ramo, que conduz a um ou a vários grupos terminais. Com os cladogramas pode-se estabelecer uma comparação entre as características primitivas - que existiam em grupos ancestrais - e as derivadas - compartilhadas por grupos que os sucederam. 1134121 E-book gerado especialmente para RAFAELA LOPES VERISSIMO . 15 Seleção Natural Mutação, Derivação, Fluxo Gênico A ação da seleção natural consiste em selecionar indivíduos mais adaptados a determinada condição ecológica, eliminando aqueles desvantajosos para essa mesma condição. A expressão mais adaptado refere-se à maior probabilidade de determinado indivíduo sobreviver e deixar descendentes em determinado ambiente. A seleção natural atua permanentemente sobre todas as populações. Mesmo em ambientes estáveis e constantes, a seleção natural age de modo estabilizador, está presente, eliminando os fenótipos desviantes. Entretanto, o ambiente não representa um sistema constante e estável, quer ao longo do tempo, quer ao longo do espaço, o que determina interações diferentes entre os organismos e o meio. Essa heterogeneidade propicia diferentes pressões seletivas sobre o conjunto gênico da população, evitando a eliminação de determinados alelos que, em um ambiente constante e estável, não seriam mantidos. Dessa forma, a variabilidade genética sofre menor redução. Exemplos de Seleção Natural Resistência a Antibióticos ou a Inseticidas A resistência de bactérias a antibióticos e de insetos a inseticidas têm aumentado muito nos últimos anos, havendo sempre a necessidade de se desenvolverem novos antibióticos e novos inseticidas. Tomemos como exemplo a resistência a antibióticos. Para isso imaginemos inicialmente a existência de indivíduos adaptados a determinada condição ambiental. Se introduzirmos nesse ambiente certa quantidade de antibiótico, haverá grande mortalidade de bactérias, mas algumas, que já apresentavam mutações que lhes conferem resistência a essa substância sobreviverão. Estas, por sua vez, ao se reproduzirem originarão indivíduos com características distribuídas em torno de outro tipo médio. Se esses indivíduos forem submetidos a doses mais alta desse mesmo antibiótico, novamente haverá alta mortalidade e sobreviverão apenas os que já tiverem condições genéticas para resistir a doses mais altas do remédio. Repetindo-se o procedimento, será possível obter populações cada vez com mais indivíduos resistentes ao antibiótico em questão, podendo ocorrer um deslocamento da média das características no sentindo da maior resistência a determinada substância. 1134121 E-book gerado especialmente para RAFAELA LOPES VERISSIMO . 16 Resistência bacteriana Coloração de advertência Alguns animais produzem ou acumulam substâncias químicas nocivas e apresentam coloração vistosa, chamada coloração de advertência, sinalizando que eles não devem ser ingeridos. Quem tenta se alimentar de um desses organismos aprende a não comer outro semelhante. A cobra coral e a rã de cores vibrantes acima possuem um veneno muito perigoso O Melanismo Industrial Antes da industrialização da Inglaterra, predominavam as mariposas claras; mas as vezes apareciam mutantes escuros, dominantes, que, apesar de serem mais robustos, eram eliminados pelos predadores por serem visíveis. Depois da industrialização, no século passado, os mutantes escuros passaram a ser mimetizados pela fuligem. Estes passaram a ser menos predados, por estarem "escondidos", o que aumentou a sua frequência na população. Os predadores das mariposas, como por exemplo, os pássaros atuam como agentes seletivos. Camuflagem e Mimetismo 1134121 E-book gerado especialmente para RAFAELA LOPES VERISSIMO . 17 A ação da seleção natural também é verificada no estabelecimento de características que tornam os organismos semelhantes a outros ou a objetos do ambiente, de modo que passam despercebidas de seus predadores ou estes às suas presas. Falsa coral e coral verdadeira. Fluxo Gênico É uma migração de genes entre populações. O efeito destas transferências de genes entre populações depende da diferença nas frequências do gene nas duas populações e da proporção de indivíduos migrantes. Na realidade, o fluxo gênico é uma medida da fertilização, no caso de pólen, ou estabelecimento de indivíduos férteis, no caso de sementes, em razão da distância percorrida da fonte até o local onde a dispersão ocorreu. Quando um indivíduo migra de uma população para outra, ele carrega genes que são característicos de sua população ancestral para população recipiente. Em caso de sucesso em seu estabelecimento, e realização de cruzamentos, ele irá transmitir esses genes entre as populações. Caso os genes migrados confiram alguma vantagem seletiva aos indivíduos receptores, a seleção natural também pode atuar a favor de elevar frequências dos alelos inseridos. Genes que não oferecem vantagem competitiva ou evolutiva no meio em que se encontram estas populações, portanto genes neutros, não devem causar um grande impacto, vistonão haver pressão seletiva atuando no sentido de aumentar ou diminuir suas frequências. No caso de genes desfavoráveis, ou seja, mutações desvantajosas, se a frequência de inserção for inferior à seleção natural contra estes genes, eles devem ser eliminados em algumas gerações. Mas, se a inserção for superior à seleção natural, a mesma nunca poderá eliminar totalmente o gene, pois ele continuará reaparecendo por mutação. Nesse caso poderíamos determinar a frequência em equilíbrio da mutação entre a criação do gene mutante, por meio de sua mutação recorrente e a sua eliminação por seleção natural. O fluxo gênico tende a unificar as frequências gênicas entre populações rapidamente, em termos evolutivos. Se não atuar a seleção natural, a migração tem grande força para igualar as frequências gênicas de populações em uma espécie. Se a taxa de migração for positiva, as frequências irão, eventualmente, igualar-se. Mesmo que apenas um migrante bem-sucedido se mova para uma população a cada geração, o fluxo gênico direciona de forma inevitável a frequência gênica da população para a media da espécie. De certo modo, o fluxo gênico atua para manter as espécies unidas. Migração para ou de uma população pode resultar em importantes mudanças nas frequências do pool de genes (o número de indivíduos da população com uma característica particular). A imigração pode resultar na adição de material genético novo ao pool de genes estabelecido de uma espécie em particular enquanto a emigração pode resultar na remoção de material genético. Vários fatores afetam a taxa de fluxo gênico entre diferentes populações. Um dos mais significativos é a mobilidade, e animais tendem a ser mais móveis que plantas. A maior mobilidade de um indivíduo tende a lhe dar um maior potencial migratório. O Fluxo Gênico é também conhecido como Escape Gênico e está associado ao termo Poluição Gênica, que seria uma dispersão descontrolada de genes. Fluxo Gênico e Seleção Natural A atuação da Seleção Natural pode manter duas populações distintas mesmo se entre elas houver contínuo fluxo gênico. Se a seleção natural é fraca, o fluxo gênico através da migração, pode unificar rapidamente as frequências gênicas de populações separadas. Por outro lado, em teoria, uma força seletiva intensa pode manter duas populações diferenciadas, apesar do fluxo gênico. Um importante estudo sobre essa teoria foi o realizado por Bradshaw (1971) sobre genética ecológica de plantas, particularmente a gramínea Agrostis tenuis, nos montes de rejeitos e nos arredores deles, no Reino Unido. Os montes de rejeitos eram caracterizados por conter altas concentrações de metais pesados tóxicos. A A. tenuis é uma das poucas plantas que têm sido capazes de colonizá-los e foi estudada de forma mais aprofundada. Ela tem colonizado essas áreas por meio de variantes genéticas que tornam possível o desenvolvimento dessas plantas onde a concentração de metais pesados é alta; em torno de uma região de rejeito, portanto, há uma classe de genótipos de crescimento nos montes de 1134121 E-book gerado especialmente para RAFAELA LOPES VERISSIMO . 18 rejeito, e outra classe na área ao redor. A seleção natural trabalha fortemente contra as sementes das formas ao redor quando elas caem no monte de rejeito: as sementes são envenenadas. A seleção também atua contra as formas de metal tolerante fora do monte de rejeito. A razão é menos clara, mas o mecanismo de desintoxicação pode ser custoso. Portanto onde o mecanismo não é necessário a grama tem melhor desenvolvimento sem ela. As populações de A. tenuis mostram divergência na frequência dos genes que possuem a característica de resistência a metais entre as gramíneas dentro e fora dos montes de rejeito. O padrão é claramente favorecido pela seleção natural, mas o que acontece com o fluxo de genes? O conceito biológico de espécie prevê que o fluxo de genes será pequeno, caso contrário, a divergência não poderia ter ocorrido. Na verdade, o fluxo gênico é grande. Nuvens de pólen são lançadas para além dos limites do montes de rejeito e o cruzamento entre os genótipos é extenso. Esta diferença de ambientes para desenvolvimento (dentro e fora dos montes de rejeito) é um exemplo de situação onde o fluxo gênico permanece constante, porém a seleção tem sido mais forte para superar o fluxo gênico. No entanto, caso este impedimento seja retirado, ou seja, o monte de rejeitos seja limpo, as gramíneas tendem a ter suas características unificadas novamente em algumas poucas gerações, pois não mais necessitarão das adaptações adquiridas. Neste caso, é a adaptação ecológica, e não o fluxo gênico reduzido que explica a divergência entre a gramínea dentro e fora do monte de rejeito. Alternativamente, o fluxo gênico pode ser reduzido. Os tempos de floração dos tipos tolerantes e normal já diferem em A. tenuis, o que irá reduzir o fluxo gênico entre elas. No futuro as duas formas poderiam evoluir para duas espécies separadas. De qualquer modo, o conflito entre fluxo gênico e Seleção Natural será de curta duração. Ou mudará o padrão de fluxo gênico, ou o do regime de seleção. Há um caso de uma rã norte-americana Rana pipien, em que a distribuição geográfica dessa espécie de animal ocorre do norte ao sul da América do Norte. As diferentes populações apresentam diferentes características morfológicas. No entanto, dificilmente uma rã do Norte se acasala com uma do Sul. Se isso for feito artificialmente, poderá ocorrer uma grande quantidade de descendentes defeituosos. Porém, se os cruzamentos acontecerem entre populações vizinhas, a porcentagem de indivíduos normais será de 100%. Esse fato mostra que em Rana pipiens ocorre o chamado fluxo gênico entre populações vizinhas, desde o Norte até o Sul, de forma que todas essas populações pertencem à mesma espécie. É provável que, se as populações intermediárias forem eliminadas, as que se encontram em extremos opostos venham a constituir duas novas espécies, incapazes de trocar genes. Barreiras ao Fluxo Gênico Barreira de isolamento: uma barreira de isolamento é uma propriedade evolutiva de uma espécie, que impede o intercruzamento. Quando duas populações estão separadas geograficamente, o fluxo gênico cessa apenas porque os membros das populações não se encontram. Essas duas populações ainda não desenvolveram uma diferença genética. A evolução de uma barreira de isolamento exige que alguma característica nova, por exemplo, um novo canto de cortejo, evolua em pelo menos uma das populações. Essa nova característica precisa ter o poder de impedir o fluxo gênico. Na teoria da especiação alopátrica, a cessação do fluxo gênico entre as populações alopátricas leva, com o tempo, à evolução de barreiras profundas de isolamento entre elas. A barreira física reduz o fluxo gênico (migração) entre as populações. Esta barreira pode aparecer por mudanças geológicas e geomorfológicas (rios, cursos de água, cadeias de montanhas, deriva continental, vulcões, etc.) ou por eventos de dispersão (deslocamento de populações para locais distantes, dispersão provocada pelo vento, correntes marinhas, etc.). Aqui estão algumas das barreiras ao fluxo gênico. Elas resultam da seleção natural, seleção sexual ou deriva genética: A evolução de distintos locais, períodos ou ritos de acasalamento: As mudanças de base genética desses aspectos de acasalamento completam o processo de isolamento reprodutivo e especiação. Por exemplo, os pássaros caramancheiros (Amblyornis macgregoriae) constroem caramanchões elaborados e os ornamentam com diferentes cores para cortejar as fêmeas. Se duas espécies desenvolvem diferenças em seu ritual de acasalamento, essas podem isolá-las permanentemente e concluir o processo de especiação. Diferentes espécies de pássaros caramancheiros constroem caramanchões elaborados e os decoram com diferentescores para cortejar as fêmeas. Os Satin Bowerbird constrói um canal entre varas verticais, e decora com objetos azuis brilhantes, enquanto que o MacGregor’s Bowerbird constrói uma torre alta de varas e a decora com pequenos pedaços de carvão. Mudanças evolutivas em rituais de acasalamento, como a construção de caramanchões, podem contribuir para a especiação e, para o fim do fluxo gênico. 1134121 E-book gerado especialmente para RAFAELA LOPES VERISSIMO . 19 - Inviabilidade ou esterilidade da descendência: Todo aquele cortejo e acasalamento é desperdiçado se os descendentes do acasalamento entre os dois grupos não sobreviverem ou não puderem se reproduzir. Segundo Dobzhansky (1970), ainda temos as seguintes barreiras evolutivas: - Isolamento sazonal ou temporal. As épocas de acasalamento ou de florescimento ocorre em estacoes diferentes. - Isolamento sexual ou etológico. A atração sexual mútua entre espécies diferentes é fraca ou ausente. - Isolamento mecânico. A falta de correspondência física entre genitálias ou entre partes das flores impede a cópula ou a transferência do pólen. - Isolamento por polinizadores diferentes. Em plantas floríferas, espécies relacionadas podem ser especializadas em atrair diferentes insetos como polinizadores. - Isolamento gamético. Em organismos com fertilização externa, os gametas masculino e feminino podem não se atrair. Em organismos com fertilização interna, os gametas ou gametófitos de uma espécie podem ser inviáveis nos dutos sexuais ou estilos da outra espécie. Mutações As mutações podem ser cromossômicas ou gênicas. As mutações cromossômicas podem ser alterações no número ou na forma dos cromossomos. As mutações gênicas originam-se de alterações na sequência de bases nitrogenadas de determinado gene durante a duplicação da molécula de DNA. Essa alteração pode ocorrer por perda, adição ou substituição de nucleotídeos, o que pode originar um gene capaz de codificar uma proteína diferente da que deveria ter sido codificada. As mutações gênicas são consideradas as fontes primárias da variabilidade, pois aumentam o número de alelos disponíveis em um lócus, incrementando um conjunto gênico da população. Embora ocorram espontaneamente, podem ser provocados por agentes mutagênicos, como radiações e certas substâncias químicas (a droga ilegal LSD, por exemplo). As mutações não ocorrem para adaptar o indivíduo ao ambiente. Elas ocorrem ao acaso e, por seleção natural, são mantidas quando adaptativas (seleção positiva) ou eliminadas em caso contrário (seleção negativa). Podem ocorrer em células somáticas ou em células germinativas; neste último caso as mutações são de fundamental importância para a evolução, pois são transmitidas aos descendentes. Evolução Molecular A comparação entre moléculas de DNA de diferentes espécies tem revelado o grau de semelhança de seus genes, o que mostra o parentesco evolutivo. O mesmo ocorre para as proteínas que, em última análise, refletem as semelhanças e diferenças genéticas. O citocromo c é uma proteína presente em todos os seres vivos que fazem respiração aeróbica, sendo constituído por 104 aminoácidos encadeados. A porcentagem de cada tipo de aminoácido presente nessa proteína varia nas diferentes espécies de organismos e está relacionada com a proximidade evolutiva entre as espécies. O citocromo c surgiu, como provavelmente, nos primórdios da vida na Terra, quando os primeiros seres vivos passaram a utilizar a respiração como processo para obtenção de energia. Hoje essa proteína apresenta pequenas variações em cada grupo de organismos, nas quais devem ter se estabelecido ao longo do processo evolutivo. A variação da estrutura primária de uma determinada proteína, em diferentes espécies, revela indiretamente suas diferenças genéticas uma vez que o código para a proteína está escrito nos genes. Semelhanças entre moléculas de DNA Os recentes avanços da Biologia Molecular têm permitido comparar diretamente a estrutura genética de diferentes espécies, através da comparação das sequências de nucleotídeos presentes nas moléculas de DNA. Os resultados das análises bioquímicas têm confirmado as estimativas de parentesco entre espécies obtidas por meio do estudo de fósseis e anatomia comparada. Isso reforça ainda mais a teoria de que os seres vivos atuais resultam da evolução de seres vivos que viveram no passado, estando todos os seres vivos relacionados por graus de parentescos mais ou menos distantes. Origem da Vida As primeiras formas de vida nasceram nas águas quentes e serenas do mar, ao abrigo dos raios ultravioletas do Sol. Eram pequenas esferas protegidas por uma membrana, em condições de se 1134121 E-book gerado especialmente para RAFAELA LOPES VERISSIMO . 20 dividirem. Com o passar do tempo, essas primitivas "máquinas" vivas se uniram a corpúsculos prontos para a fotossíntese, para a respiração e para a reprodução. Tornaram-se assim verdadeiras células. Até, aproximadamente, um bilhão de anos, os habitantes da Terra eram seres microscópicos (semelhantes aos organismos unicelulares de hoje) que viviam isolados ou agregados em grandes colônias. A vida provavelmente esteve presente por todo o Arqueano, mas deve ter sido limitada a simples organismos unicelulares não nucleados, chamados procariontes, pois não há fósseis de eucariotos tão antigos. Fósseis de tapetes de cianobactérias (estromatólitos) são encontrados por todo o Arqueano, tornando-se especialmente comum mais tarde no éon, enquanto uns poucos fósseis prováveis de bactérias são conhecidos de certos depósitos de chert. Em adição ao domínio Bactéria, microfósseis de extremófilos do domíio Arquea também têm sido identificados. Não se conhecem fósseis de eucariontes, apesar de que eles podem ter evoluído durante o Arqueano e simplesmente não ter deixado quaisquer fósseis. Podemos compreender razoavelmente a história da atmosfera da Terra até há um bilhão de anos atrás. A atmosfera moderna é também chamada "terceira atmosfera", para distinguir a composição química atual das duas anteriores. A primeira atmosfera, era principalmente hélio e hidrogênio. O calor provindo da crosta terrestre ainda em forma de plasma, e o sol a dissiparam. Há aproximadamente 3,5 bilhões de anos atrás, a superfície do planeta tinha esfriado o suficiente para formar uma crosta endurecida, povoando-a com vulcões que liberaram vapor de água, dióxido de carbono e amoníaco. Desta forma, surgiu a "segunda atmosfera", que era formada principalmente de dióxido de carbono e vapor de água, amoníaco, metano e óxidos de enxofre. Nesta segunda atmosfera quase não havia oxigénio livre, era aproximadamente 100 vezes mais densa do que a atmosfera atual. Acredita-se que o efeito estufa, causado por altos níveis de dióxido de carbono, impediu a Terra de congelar. Durante os bilhões de anos seguintes, devido ao resfriamento, o vapor de água condensou para precipitar chuva e formar oceanos, que começaram a dissolver o dióxido de carbono. Seriam absorvidos 50% do dióxido de carbono nos oceanos. Surgiram organismos Fotossíntese que evoluíram e começaram a converter dióxido de carbono em oxigênio. Ao passar do tempo, o carbono em excesso foi fixado em combustíveis fósseis, rochas sedimentares (notavelmente pedra calcária), e conchas animais. Estando o oxigénio livre na atmosfera reagindo com o amoníaco, foi liberado azoto, simultaneamente as bactérias também iniciaram a conversão do amoníaco em azoto. Aumentando a população vegetal, os níveis de oxigénio cresceram significativamente (enquanto níveis de dióxido de carbono diminuíram). No princípio o oxigénio combinou com vários elementos (como ferro), mas eventualmente acumulou na atmosfera resultando em extinções em massa e evolução. Com o aparecimento de uma camada de ozônio(O3), a Ozonosfera,