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JORNADA A PERÍCIA PSICOLÓGICA NO DIREITO DE FAMÍLIA 21 DE MAIO DE 2007 PROMOÇÃO JUSMULHER-RS APOIO: EMA/AJURIS SPRGS CRP-07 ABMCJ SIPERGS A JORNADA “A PERÍCIA PSICOLÓGICA NO DIREITO DE FAMÍLIA” FOI UM EVENTO PROMOVIDO PELO IBDFAM-RS E PELO JUSMULHER- RGS, QUE OCORREU NO DIA 21 DE MAIO DE 2007 NO AUDITÓRIO DA AJURIS, RUA CELESTE GOBATO, 229 EM PORTO ALEGRE, COM INSCRIÇÕES GRATUITAS AOS PARTICIPANTES, E QUE SE DESENVOLVEU EM TRÊS BLOCOS, CADA UM DELES REPRESENTADO POR UMA MESA ONDE TRÊS DIFERENTES GRUPOS DE CINCO CONVIDADOS DESENVOLVERAM OS TEMAS “DO JUDICIÁRIO”, “DO PERITO” E “DO PERICIADO”. ESTA PUBLICAÇÃO TENTA RETRATAR OS CONCEITOS ALI EXPOSTOS DE FORMA A TORNAR PASSÍVEL SUA DIVULGAÇÃO E CONSULTA. 3 Palestrantes: Ana Luiza Castro Delma Ibias Lucio Garcia Maria Aracy Costa Maria da Graça Corrêa Jacques Maria Inês Linck Maria Regina Fay de Azambuja Márcia Steffen Mônica Guazzelli Plínio Caminha de Azevedo Renato Caminha Rosa Magrinelli Silvia Tejadas Sonia Liane Reichert Rovinski Verônica Chaves Coordenação: Ivone Coelho de Souza 4 1 BLOCO - DO JUDICIÁRIO COMPOSIÇÃO DA MESA Ana Luiza Castro psicóloga coordenadora Maria Inês Linck juíza de direito relatora Márcia Steffen psicóloga Mônica Guazzelli advogada Plínio Caminha de Azevedo juiz de direito Mônica Guazzelli 5 A PERÍCIA EM DIREITO DE FAMÍLIA MÔNICA GUAZZELLI Advogada Especialista em Direito de Família Mestre em Direito pela PUC/RS Mônica Guazzelli 6 I – NOÇÕES SOBRE PROVA PERICIAL Antes de qualquer observação é preciso definir o que é e para o quê serve a produção de prova no processo. Assim, provar é investigar e demonstrar como ocorreu determinado FATO, confirmando sua exatidão. Ou seja, mesmo em um processo as questões de direito não são alvo de prova, pois esta se limita ao mundo fático. Vários são os meios de prova e a perícia ou a prova pericial, pode ser entendida como sendo qualquer trabalho de natureza específica. Pode haver em qualquer área, sempre onde existir a controvér- sia ou a pendência. Sua origem é no interesse de pessoas litigantes, no interesse da justiça e no interesse público, podendo ser: arbitral, judicial, extrajudicial, administrativa ou operacional. As mais conhecidas são clas- sificadas como sendo de natureza criminal, contábil, trabalhista e outras que, quando se necessite de constatação, prova ou demonstração, cientí- fica ou técnica, da veracidade de situações, coisas e fatos. Como sabido nos processos litigiosos diferentes são as provas que se podem valer as partes para formar o convencimento judici- al. Basicamente se usa das provas documentais – trazidas aos autos- oitiva de testemunhas e das partes – o que se dá em audiência – e, em certos casos pode-se postular a realização de diferentes provas periciais, com exames e laudos mais específicos sobre determinado assunto. Assim a perícia – antes de tudo – é um dos meios de prova admitidos no processo judicial. No direito processual vigora o princípio da inércia da jurisdição, isto é, o juiz é inerte e só atua mediante a “provocação das partes”. Em geral o juiz não devassa, mas apenas verifica e analisa as pro- vas trazidas pelos litigantes. Contudo, importa referir que também o pró- prio juiz poderá requisitar e determinar a realização de provas, mesmo Mônica Guazzelli 7 que sem a provocação das partes, para que se sinta absolutamente seguro quanto a decisão que deverá dar ao caso. Veja-se que, por exemplo, mesmo que as partes não te- nham requerido o juiz poderá fazer uma inspeção judicial ou determinar uma perícia. A orientação doutrinária mais recente é que o juiz, es- pecialmente quando tratar de direitos indisponíveis - o que ocorre no di- reito de família em geral – tenha uma maior intervenção. O juiz pode não ser suficientemente apto a proceder - pessoal e diretamente - a verificação e apreciação de certos fatos e – suas causas e conseqüências, precisando da atuação de entendidos na matéria. Este trabalho se apresentará ao juízo na forma de PROVA PERICIAL. Este requisito de especificidade é que determinará a necessidade – ou não – e, ou a conveniência - ou não- da realização deste tipo de prova. II – OBJETO DA PERÍCIA A perícia terá por fundamento a PERCEPÇÃO e CONSTATAÇÃO DE FATOS – os quais – na linguagem de Carnelutti – são fatos que devem ser percebidos e constatados por técnicos, pois necessi- tam de PERCEPÇÃO TÉCNICA, eis que exigem qualidades sensoriais especializadas e conhecimentos científicos e técnicos capazes de compreendê-los e distingui-los. Em Direito de Família um exemplo já clássico é o exa- me de DNA para determinar a existência ou não do vínculo biológico de paternidade. O qual precisa ser realizado através de perícia por especialis- tas em genética. Em casos como o exame de DNA, a perícia se limita em constatar o fato em si, mas há várias outras perícias – psiquiátricas e psico- lógicas, por exemplo – onde se conjuga não só a verificação do fato, mas a sua compreensão e apreciação, cumprindo ao perito, nesta hipótese, de- pois de informar quanto a existência do fato, emitir um parecer ou juízo Mônica Guazzelli 8 no tocante a sua natureza, valor e importância ou, ainda, sobre suas cau- sas e efeitos (presentes e futuros). Nestes casos é preciso tal valoração do experto, pois é ela que tornará o fato inteligível ao magistrado, o qual em tese é leigo no assunto específico. Percepção; Observação; Apreciação são momentos da Verificação. E a própria Interpretação dos fatos como apreciação que é – reclama prévia verificação. A perícia muitas vezes se resume na declaração de ciên- cia de um fato, noutras é a declaração + a afirmação de um juízo, o que resume a interpretação técnica, que nos casos de perícia psicológica tor- na-se imprescindível. O que caracteriza a perícia é justamente a QUALIDADADE da declaração, posto que se trata de declaração de caráter técnico, isto é uma declaração técnica sobre um elemento de prova. III – O PERITO / EXPERTO Os peritos – que são as pessoas entendidas tecnicamen- te no assunto – vão fornecer a sua VERIFICAÇÃO + INTERPRETAÇÃO dos fatos através de um laudo ou parecer. O profissional no desempenho da função pericial deve considerar os efeitos em benefício da sociedade, propiciando bem-estar a todos que têm interesse no deslinde da controvérsia. As características de excelência moral, intelectual e técnica são condições essenciais para o encargo a ser confiado pelo Juízo. Dentre as principais qualidades que formarão o conjunto de capacitação do perito, temos como exemplo, a ética que conduz a um trabalho honesto e eficaz em decorrência de uma formação sadia do profissional. É acrescida também ao perito a capacidade de estar sempre atualizado, pesquisando novas técnicas e estar sempre preparado para a execução de trabalhos de boa qualidade. O principal lastro de sustentação da realização profissi- Mônica Guazzelli 9 onal constitui-se basicamente pelo compromisso moral e ético do perito com a sua classe profissional e, consequentemente, com a sociedade. IV – PERÍCIA JUDICIAL / EXTRAJUDICIAL As perícias em relação ao processo podem ser JUDICI- AIS ou EXTAJUDICIAIS – se for executada por ordem do juiz, de ofício ou a requerimento da parte dentro do feito, ou se realizada fora do processo por uma ou por ambas as partes e trazida para os autos. Os pareceres escritos trazidos pelas partes para corro- borar alegações; ocorre com relativa freqüência na seara familiar e nestes casos o técnico funciona como um consultor da parte, e nessa condição seu parecer equivale a uma perícia extrajudicial – assemelha-se a um pare- cer emitidopor um jurisconsulto. A perícia também pode ser realizada para ser aproveita- da em processo futuro – quando se fala em perícia antecipada – ad perpe- tuam rei memoriam. V – BREVES NOTAS CONCLUSIVAS Nas disputas familiares é de grande importância a perí- cia psicológica até porque se está lidando com um ponto muito delicado do ser humano, representado pelo seu universo de relações mais íntimas. No processo, como se disse, o princípio é que o juiz é livre para ordenar a prova pericial, mas respeitando a necessidade e utili- dade que a prova poderá trazer ao feito. Assim, as causas que envolvem direito familiar, justa- mente pela natureza dos direitos postos em julgamento, quase sempre indisponíveis, são justamente aqueles feitos em que o juiz pode e muitas vezes até deve, ante a omissão das partes, determinar a realização de pro- va pericial psicológica, pois a riqueza e abordagem que serão trazidas pelo experto darão ao caso outra visão, muitas vezes mais ampla e rica, o que com certeza dará ao magistrado mais subsídios para decidir o processo. Mônica Guazzelli 10 A família é um sistema único, onde entre os membros coexistem vários laços e uma enorme gama de afetos. Nem sempre estes afetos redundam em harmonia e quando ocorrem as crises, os profissio- nais da área psi são imprescindíveis para ajudar a compreender os dilemas que precisarão ser analisados e considerados pelo magistrado, para que a decisão judicial possa ser a mais justa possível, como se deseja. 11 Plínio Caminha de Azevedo PERÍCIA É PROVA JUDICIAL? PLÍNIO CAMINHA DE AZEVEDO Juiz de Direito - 12 Plínio Caminha de Azevedo PERÍCIA É PROVA JUDICIAL? Diz o Código Civil de 2002: DA PROVA Art. 212. Salvo o negócio a que se impõe forma especial, o fato jurídi- co pode ser provado mediante: Vide art. 5º, XII e LVI, CF. Vide art. 136, CC/1916. Vide art. 332, CPC. I - CONFISSÃO; Vide arts. 213 e 214, CC. Vide art. 136, I, CC/1916. Vide arts. 348 a 354, CPC. II - DOCUMENTO; Vide arts. 107 a 109 e 215 a 226, CC. Vide art. 136, III, CC/1916. Vide arts. 364 a 399, CPC. Vide Lei 7.115/1983 (Prova documental). Vide Lei 7.116/1983 (Validade nacional das carteiras de identidade). Vide arts. 23 e 24, Lei 8.159/1991 (Política Nacional de Arquivos Públicos e Privados). III - TESTEMUNHA; Vide arts. 227 a 229, CC. Vide art. 136, IV, CC/1916. Vide arts. 400 a 419, CPC. 13 Plínio Caminha de Azevedo IV - PRESUNÇÃO; Vide art. 136, V, CC/1916. Vide art. 335, CPC. V - PERÍCIA. Vide arts. 231 e 232, CC. Vide art. 136, VI e VII, CC/1916. Vide arts. 18, § 2º, 420 a 439, 606, 607, 627, §§ 1º e 2º e 1.206, CPC. (...) Art. 231. Aquele que se nega a submeter-se a exame médico necessá- rio não poderá aproveitar-se de sua recusa. Art. 232. A recusa à perícia médica ordenada pelo juiz poderá suprir a prova que se pretendia obter com o exame. SEÇÃO VII - DA PROVA PERICIAL (ARTIGOS 420 A 439) Art. 420. A prova pericial consiste em exame, vistoria ou avaliação. Vide arts. 846, parte final, e 850, Código de Processo Civil. Parágrafo único. O juiz indeferirá a perícia quando: I - a prova do fato não depender do conhecimento es- pecial de técnico; II - for desnecessária em vista de outras provas produzi- das; III - a verificação for impraticável. Art. 421. O juiz nomeará o perito, fixando de imediato o prazo para a entrega do laudo. Caput com redação dada pela Lei nº 8.455, de 24.08.1992, DOU de 25.08.1992, em vigor quinze dias após sua publica- ção. Vide arts. 145, 331, § 2º, e 850, Código de Processo Civil. 14 Plínio Caminha de Azevedo Vide art. 35, Lei nº 9.099/95 (Juizados Especiais). § 1º Incumbe às partes, dentro em 5 (cinco) dias, contados da intimação do despacho de nomeação do perito: I - indicar o assistente técnico; II - apresentar quesitos. Vide arts. 276 e 426, II, Código de Processo Civil. § 2º Quando a natureza do fato o permitir, a perícia poderá con- sistir apenas na inquirição pelo juiz do perito e dos assisten- tes, por ocasião da audiência de instrução e julgamento a respeito das coisas que houverem informalmente examina- do ou avaliado. § 2º com redação dada pela Lei nº 8.455, de 24.08.1992, DOU de 25.08.1992, em vigor quinze dias após sua publicação. Art. 422. O perito cumprirá escrupulosamente o encargo que lhe foi cometido, independentemente de termo de compromisso. Os assistentes técnicos são de confiança da parte, não sujei- tos a impedimento ou suspeição. Artigo com redação dada pela Lei nº 8.455, de 24.08.1992, DOU de 25.08.1992, em vigor quinze dias após sua publica- ção. Vide art. 850, Código de Processo Civil. Art. 423. O perito pode escusar-se (art. 146), ou ser recusado por im- pedimento ou suspeição (art. 138, III); ao aceitar a escusa ou ao julgar procedente a impugnação, o juiz nomeará novo perito. Artigo com redação dada pela Lei nº 8.455, de 24.08.1992, DOU de 25.08.1992, em vigor quinze dias após sua publica- ção. Vide art. 850, Código de Processo Civil. Art. 424. O perito pode ser substituído quando: Caput com redação dada pela Lei nº 8.455, de 24.08.1992, DOU de 25.08.1992, em vigor quinze dias após sua publica- ção. Vide art. 850, Código de Processo Civil. I - carecer de conhecimento técnico ou científico; 15 Plínio Caminha de Azevedo II - sem motivo legítimo, deixar de cumprir o encargo no prazo que lhe foi assinado. Inciso II com redação dada pela Lei nº 8.455, de 24.08.1992, DOU de 25.08.1992, em vigor quinze dias após sua publica- ção. Parágrafo único. No caso previsto no inciso II, o juiz comu- nicará a ocorrência à corporação profissional respectiva, podendo, ainda, impor multa ao perito, fixada tendo em vis- ta o valor da causa e o possível prejuízo decorrente do atra- so no processo. Parágrafo único com redação dada pela Lei nº 8.455, de 24.08.1992, DOU de 25.08.1992, em vigor quinze dias após sua publicação. Art. 425. Poderão as partes apresentar, durante a diligência, quesitos suplementares. Da juntada dos quesitos aos autos dará o escrivão ciência à parte contrária. Vide art. 850, Código de Processo Civil. Art. 426. Compete ao juiz: Vide art. 130, 421, § 1º, II, e 850, Código de Processo Civil. I - indeferir quesitos impertinentes; II - formular os que entender necessários ao esclarecimento da causa. Art. 427. O juiz poderá dispensar prova pericial quando as partes, na inicial e na contestação, apresentarem sobre as questões de fato pareceres técnicos ou documentos elucidativos que considerar suficientes. Artigo com redação dada pela Lei nº 8.455, de 24.08.1992, DOU de 25.08.1992, em vigor quinze dias após sua publica- ção. Vide art. 850, Código de Processo Civil. Art. 428. Quando a prova tiver de realizar-se por carta, poderá proce- der-se à nomeação de perito e indicação de assistentes téc- nicos no juízo, ao qual se requisitar a perícia. Vide arts. 202, § 2º, e 850, Código de Processo Civil. 16 Plínio Caminha de Azevedo Art. 429. Para o desempenho de sua função, podem o perito e os as- sistentes técnicos utilizar-se de todos os meios necessários, ouvindo testemunhas, obtendo informações, solicitando do- cumentos que estejam em poder de parte ou em repartições públicas, bem como instruir o laudo com plantas, desenhos, fotografias e outras quaisquer peças. (...) Art. 431-B. Tratando-se de perícia complexa, que abranja mais de uma área de conhecimento especializado, o juiz poderá nomear mais de um perito e a parte indicar mais de um assistente técnico. Artigo acrescido pela Lei nº 10.358, de 27.12.2001, DOU de 28.12.2001, em vigor três meses após sua publicação. Art. 432. Se o perito, por motivo justificado, não puder apresentar o laudo dentro do prazo, o juiz conceder-lhe-á, por uma vez, prorrogação, segundo o seu prudente arbítrio. (...) Art.433. O perito apresentará o laudo em cartório, no prazo fixado pelo juiz, pelo menos 20 (vinte) dias antes da audiência da instrução e julgamento. Caput com redação dada pela Lei nº 8.455, de 24.08.1992, DOU de 25.08.1992, em vigor quinze dias após sua publica- ção. Parágrafo único. Os assistentes técnicos oferecerão seus pareceres no prazo comum de 10 (dez) dias, após intimadas as partes da apresentação do laudo. Parágrafo único com redação dada pela Lei nº 10.358, de 27.12.2001, DOU de 28.12.2001, em vigor três meses após sua publicação. O parágrafo alterado dispunha o seguinte: “Parágrafo único. Os assistentes técnicos oferecerão seus pareceres no prazo comum de 10 (dez) dias após a apresen- tação do laudo, independentemente de intimação.” * Parágrafo único com redação dada pela Lei nº 8.455, de 24.08.1992, DOU de 25.08.1992, em vigor quinze dias após 17 Plínio Caminha de Azevedo sua publicação. Vide art. 850 , Código de Processo Civil. (...) Art. 435. A parte, que desejar esclarecimento do perito e do assisten- te técnico, requererá ao juiz que mande intimá-lo a compa- recer à audiência, formulando desde logo as perguntas, sob forma de quesitos. Vide arts. 452, I, e 850, Código de Processo Civil. Parágrafo único. O perito e o assistente técnico só estarão obrigados a prestar os esclarecimentos a que se refere este artigo, quando intimados 5 (cinco) dias antes da audiência. Art. 436. O juiz não está adstrito ao laudo pericial, podendo formar a sua convicção com outros elementos ou fatos provados nos autos. Vide arts. 131 e 850, Código de Processo Civil. Art. 437. O juiz poderá determinar, de ofício ou a requerimento da parte, a realização de nova perícia, quando a matéria não lhe parecer suficientemente esclarecida. Vide arts. 130 e 850, Código de Processo Civil. Art. 438. A segunda perícia tem por objeto os mesmos fatos sobre que recaiu a primeira e destina-se a corrigir eventual omis- são ou inexatidão dos resultados a que esta conduziu. Vide art. 850, Código de Processo Civil. Art. 439. A segunda perícia rege-se pelas disposições estabelecidas para a primeira. Vide art. 850, Código de Processo Civil. Parágrafo único. A segunda perícia não substitui a primeira, cabendo ao juiz apreciar livremente o valor de uma e outra. STJ-201139) RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATI- VO. SERVIDOR PÚBLICO. CONCURSO. EXAME PSICOTÉCNICO. CARÁTER SUBJETIVO. IRRECORRIBILIDADE DOS TESTES. ILEGALIDADE RECONHECIDA. 18 Plínio Caminha de Azevedo 1. Impossível a apreciação de violação de dispositi- vos constitucionais em sede de recurso especial. 2. No exame de recurso especial, não se conhece de matéria que não foi objeto de apreciação pelo Tribunal de origem, ausente assim o necessário prequestionamento. 3. Prequestionamento é o exame pelo Tribunal de origem, e não apenas nas manifestações das par- tes, dos dispositivos que se têm como afrontados pela decisão recorrida. 4. Embora reconhecida a legalidade do exame psicotécnico para a carreira de policial federal, é vedada sua realização de modo sigiloso e irrecorrível. 5. No que diz com a inexigibilidade da avaliação psicológica em razão de anterior aprovação em outro certame, a compreensão atual do Superior Tribunal de Justiça é no sentido da imprescindibilidade do aludido exame. 6. Recurso provido. (Recurso Especial nº 396002/RS (2001/0193442- 0), 6ª Turma do STJ, Rel. Paulo Gallotti. j. 18.11.2003, unânime, DJ 30.10.2006). TJSC-090569) DIREITO DE FAMÍLIA. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE GUARDA E REGULAMENTAÇÃO DE VISITAS. INSURGÊNCIA CONTRA A REALIZA- ÇÃO DE EXAMES TÉCNICOS DE CUNHO PERICI- AL. INVIABILIDADE. PODER DISCRICIONÁRIO DO MAGISTRADO PARA AFERIR O MELHOR AMBI- ENTE CAPAZ DE PROPORCIONAR AO INFANTE PLENO DESENVOLVIMENTO. EXEGESE DO ART. 19 Plínio Caminha de Azevedo 130 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. PRETEN- SÃO DAS PARTES EM NOMEAREM ASSISTENTES TÉCNICOS. POSSIBILIDADE. INCLUSÃO DO ATU- AL COMPANHEIRO DA GENITORA NOS ESTUDOS PERICIAIS RECOMENDÁVEL. RECURSO PROVIDO. 1. “Em procedimentos que têm por objetivo pri- mordial a salvaguarda física, moral e psicológica da criança, conta o julgador com amplitude discricio- nária mais significativa para sublevar aspectos jurí- dico-formalísticos a fim de conferir maior seguran- ça e eqüidade às decisões que proferir” (AI nº 2004.033800-4, de Ibirama). 2. Determinada a realização de estudo social, to- mado este o caráter de perícia judicial ante a no- meação pelo juízo de especialistas que não fazem parte da equipe interprofissional, conveniente se faz, em respeito aos princípios do contraditório e ampla defesa, a intimação das partes para indica- ção de assistentes técnicos e apresentação de que- sitos (arts. 420 e seguintes do Código de Processo Civil). (Agravo de Instrumento nº 2005.001485-3, 3ª Câ- mara de Direito Civil do TJSC, Itajaí, Rel. Des. Marcus Túlio Sartorato. unânime, DJ 15.12.2005). 20 Plínio Caminha de Azevedo A PROVA PERICIAL E A NOVA REDAÇÃO DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL IVAN LIRA DE CARVALHO Juiz Federal Professor da UFRN Doutorando em Direito pela UFPE I. INTRODUÇÃO (...) II. A MODIFICAÇÃO DO PAPEL DO ASSISTENTE TÉCNICO. O primeiro dos preceptivos a sofrer alteração com a lei nova foi o inciso III do artigo 138 do Código de Ritos. Dispunha a redação originária do prefalado inciso que os mesmos motivos ensanchadores do impedimento e da suspeição do Juiz (singular ou membro de Colegiado), do representante do Ministério Público não-parte na demanda, do serventuário da Justiça e do intérprete seriam também aplicáveis ao perito e aos assistentes técnicos. A nova dicção do Código de Processo Civil excluiu do rol dos passíveis de suspeição e impedimento o assistente técnico, redu- zindo-o, ao que se depreende, a um mero colaborador da parte que o indicou, sem prejuízo de ser também visto como um eficaz colaborador do juízo (ainda que de forma transversa), no afã de atingir a verdade pro- cessual. A deliberada omissão do assistente técnico do elenco do artigo 138 do Código de Processo Civil está roborada, de forma explícita, na redação inovadora do artigo 422 do mesmo codex, que na parte final afir- ma que ditos auxiliares ‘são de confiança da parte, não sujeitos a impedi- mento ou suspeição’. Laborou acertadamente o legislador, ao impor esta revi- são redacional do Código de Processo Civil. Com efeito, por ser pessoa geralmente da estreita confiança de um dos litigantes, não se lhe deve ser outorgado o mesmo status do perito judicial, este sim, um auxiliar precio- 21 Plínio Caminha de Azevedo so do magistrado, que como tal deverá sempre exercer o encargo escru- pulosamente e vinculado ao Judiciário por força de nomeação, sendo, por isso mesmo, afastado da missão opinativa quando sobre si pesarem moti- vos de impedimento ou de suspeição. III. O PERITO E O PROCESSO. Havido para alguns doutrinadores como ‘sujeito secun- dário’ do processo, em face da sua configuração como auxiliar da Justiça (conforme MAURO CUNHA e ROBERTO G. COELHO SILVA, Guia para o Estudo da Teoria Geral do Processo, 1984, 122), o perito, ao dizer do artigo 146 do Código de Processo Civil, ‘tem o dever de cumprir o ofício, no prazo que lhe assina a lei, empregando toda a sua diligência’. Pode, inobstante, escusar-se do encargo, desde que por motivo legítimo. A escusa do experto tem prazo para ser apresentada: cinco dias, a contar da intimação de que foi escolhido para o encargo ou do aparecimento do motivo ensejador do impedimento ou da suspeição, sob pena de ser reputado como renunciado o direito de alegá-los. A vigente redação do parágrafo único do artigo 146 do Código de Processo Civil fixou, para a escusa doperito, um novo dies a quo: a intimação ou o impedimento ou a suspeição supervenientes ‘à re- ferida comunicação processual’. Anteriormente, a suspeição e o impedi- mento ulteriores à intimação somente poderiam ser apresentados como base para a declinação do mister pelo perito, após a tomada do compro- misso deste. Registre-se que o legislador perdeu, com a reforma em análise, excelente oportunidade para corrigir a omissão constatada no corpo do parágrafo único do artigo 146 do Código de Processo Civil, que apenas faz referência ‘ao impedimento’ como lastro para a escusa do peri- to, esquecendo elemento de igual importância interferidora na credibilidade do experto, que é a ‘suspeição’. Inobstante, como foi con- servada, ao fim do texto, a expressa remissão ao artigo 423, e neste dispo- sitivo está dito que o perito pode-se escusar ou ser recusado por impedi- mento ‘ou suspeição’, não resta dúvida que os dois motivos podem dar base à iniciativa do auxiliar pericial. 22 Plínio Caminha de Azevedo IV. FACILITANDO A PRODUÇÃO DA PROVA PERICIAL. Inovação de grande relevo foi introduzida na produção da prova pericial com a substituição do absurdo texto do § 2º do artigo 421, que previa, em caso de pluralidade de autores ou de réus, a escolha do assistente técnico pelo voto da maioria, e em caso de empate, pela decisão da sorte. Agride ao bom senso a aparição da álea como instrumen- to processual, mormente em um sistema jurídico que consagra o mono- pólio do Estado na prestação jurisdicional, sendo tímidas as ‘delegações’ em sentido inverso (verbi gratia, O Juízo Arbitral - Código de Processo Civil, artigo 1.072, e Lei nº 7.244, artigo 25). THEOTÔNIO NEGRÃO já havia criticado com acidez: ‘Esta disposição não tem sentido, em face do sistema adotado pelo Código de Processo Civil. De acordo com o antepro- jeto, os peritos eram indicados pelas partes. Justificava-se, portanto, o sor- teio, quando houvesse pluralidade de autores ou de réus. O assistente técnico não passa, porém, de mero assessor dos litigantes: não é perito do juízo; e, assim sendo, inexiste razão para que cada litisconsorte não fique livre de indicar seu assistente técnico, especialmente no caso de interes- ses distintos ou opostos (argumento do artigo 509, caput)’ (Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor, 1992, 274). Consoante o novo § 2º do artigo 421 do Código de Pro- cesso Civil, sempre que “a natureza do fato o permitir, a perícia poderá consistir apenas na inquirição pelo Juiz do perito e dos assistentes, por ocasião da audiência de instrução e julgamento a respeito das coisas que houverem ‘informalmente examinado’ ou ‘avaliado’” (grifei). Desnecessária, assim, a interferência presencial do Juiz na produção da prova técnica. Sequer a marcação de dia, hora e lugar para a realização da diligência é mais tarefa do magistrado, a teor da nova reda- ção do artigo 427 do Código de Processo Civil. Suprimindo tais atributos, passou o artigo 427 a cuidar de tema mais importante, qual seja o de facultar ao Juiz a dispensa da prova pericial, desde que as partes, na inicial ou na contestação, apresen- tarem pareceres técnicos ou documentos suficientes ao esclarecimento das questões fáticas. Consagrada está assim a atividade saneadora do Juiz, 23 Plínio Caminha de Azevedo independentemente da topografia processual, posto que, com esteio no mencionado artigo 427, exercerá mais confortavelmente a deliberação das provas que interessem ao desate da questão sub judice. Volvendo ao § 2º do artigo 421 do Código de Processo Civil, cumpre anotar que quando ali está permitida a inquirição do perito que houver examinado ou avaliado coisas, deve ser entendida a permis- são, também, para que o experto seja perguntado sobre idêntica análise que porventura tenha desenvolvido em pessoas. Creio eu que houve im- perfeição técnica na redação da norma, já que a produção da prova perici- al é perfeitamente incidível nas pessoas, servindo como exemplo as que são apuradas em questões de Direito de Família. V. A DESNESCESSIDADE DO COMPROMISSO E A RESPONSABILIDADE PELA ATUAÇÃO DO PERITO. Na redação antiga, dispunha o artigo 422 do Código de Processo Civil que os peritos e os assistentes técnicos seriam intimados a prestar, em dia, hora e local marcados pelo Juiz, o compromisso de bem cumprir o encargo que havia a eles sido cometido. A redação atual simpli- ficou mais uma vez o processo, prescindindo o perito da assinatura do anacrônico termo de compromisso. Idem o assistente da parte. Já não era sem tempo a tomada de tão significativa pro- vidência legislativa, escoimadora de uma das célebres sandices que atravancam a marcha processual. O perito é havido como auxiliar da justi- ça, e ainda que seja serventuário excepcional e temporário (conforme CINTRA, GRINOVER e DINAMARCO, Teoria Geral do Processo, 1991, 184), máxime por exercer o encargo mediante remuneração (para uns, uma taxa; para outros, um preço público), não foge ao enquadramento de ‘par- ticular em colaboração com o poder público’ (conforme MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO, Direito Administrativo, 1991, 308) ou mais precisa- mente de funcionário público, na amplitude conceptual do artigo 327 do Código Penal. Outro não era o desígnio do malfadado ‘termo de com- promisso’ do perito e dos assistentes técnicos, senão o de vincular-lhes à atividade estatal judicante, sujeitando-se aos rigores disciplinares e penais 24 Plínio Caminha de Azevedo em caso de tergiversação ou perjúrio. Mas, qual a necessidade do ‘termo’, se a própria lei prevê o sancionamento do experto que agir de maneira criminosa, levando inexatas informações ao processo? É indiscutível que ao exercer uma função pública (‘atri- buição ou conjunto de atribuições que a administração confere a cada categoria profissional, ou comete individualmente a determinados servi- dores para a execução de serviços eventuais’ - HELY LOPES MEIRELLES, Direito Administrativo Brasileiro, 1990, 356), o perito configure-se como funcionário público e portanto está exposto às punições antevistas no ar- tigo 147 do Código de Processo Civil, quais sejam a reparação civil dos prejuízos e a inabilitação, por dois anos, para funcionar em outras períci- as. No que concerne ao encaixe do perito como funcioná- rio público para efeitos penais (Código Penal, artigo 327), a matéria é pacífica, tanto em sede doutrinária como a nível pretoriano (conforme NELSON HUNGRIA, citado por JULIO FABBRINI MIRABETE, Manual de Direito Penal, 1991, 289, e Revista dos Tribunais, 640/349, 556/397, 569/ 376, 598/327; Revista Trimestral de Jurisprudência, 100/135; JUTACRIM, 69/552). Assim, se o perito, no exercício do seu mister, fizer afir- mação falsa, ou negar ou calar a verdade, incorrerá no crime de falsa perí- cia (Código Penal, artigo 342) e sofrerá reclusão, de um a três anos, além de multa, desde que não se retrate oportunamente e as informações te- nham potencialidade lesiva para desnaturar a distribuição de Justiça (Re- vista Trimestral de Jurisprudência, 107/134; e Revista dos Tribunais, 639/ 295). Além das sanções de natureza penal acima comentadas, é recomendável que o mau perito receba, também, o exemplamento do órgão administrativo incumbido de fiscalizar o seu exercício profissional (CREA, CRM, etc.). Se o perito, nessa condição, causar prejuízo a quaisquer das partes, responderá civilmente pelo seu agir, consoante dispõe o já citado artigo 147 do Código de Processo Civil. Mais fácil ainda será a repa- 25 Plínio Caminha de Azevedo ração devida pelo perito, se tiver este sido condenado por falsa perícia (Código Penal, artigo 342), já que aí a indenização advirá em simples exe- cução, precedidade liquidação. Em outro escrito, emiti opinião sobre o tema: ‘A liquidação da sentença condenatória criminal é feita por artigos (Código de Processo Civil, artigos 609 e seguintes), com a citação do exe- cutado para oferecer defesa (procedimento ordinário). Será aí apurado o montante da indenização e quem deverá recebê-la’ (Os Efeitos Civis da Sentença Penal Condenatória, Informativo ADV/COAD, 1992, 374). Por último, sendo o perito judicial um agente público, e tendo o seu agir dado azo ao prejuízo da parte, há base para que esta procure do Estado uma indenização, na conformação do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, bem assim do artigo 15 do Código Civil. Não é demais lembrar que, em casos tais, a responsabilidade do Estado é objeti- va, já que ‘pouco importa para o prejudicado e para o bom Direito que o prejuízo tenha decorrido da culpa do funcionário ou da proclamada defi- ciência e insegurança do serviço público. O contribuinte, o usuário, paga para ter um serviço satisfatório e, se o serviço, por ser notoriamente falho e mal aparelhado, ocasiona um prejuízo inescusável, deve a administração pagar pelo dano, notadamente quando se tem em conta que a responsabi- lidade do Estado é objetiva, isto é, independe de culpa’ (MÁRIO MOACYR PORTO, Temas de Responsabilidade Civil, 1989, 148). A responsabilidade sem culpa do Estado tem inspiração ‘no risco e na solidariedade social’ (conforme JOSÉ AUGUSTO DELGADO, Responsabilidade Civil do Estado pela Demora da Prestação Jurisdicional, RF, 297/406; Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul, 29/17, e RP, 40/147). VI. A SUBSTITUIÇÃO DO PERITO. Dispunha o artigo 424 do Código de Processo Civil, em sua redação original, que poderia haver a substituição do perito ou do assistente, desde que estes carecessem de conhecimento técnico ou cien- tífico sobre a matéria em exame ou se, sem motivo legítimo, deixassem de prestar o compromisso. Atualmente, nada está regulado no que tange ao assistente e não mais será exigido o compromisso do perito, devendo este 26 Plínio Caminha de Azevedo ser substituído se não reunir bagagem técnica ou científica sobre o tema examinado, bem assim se ‘deixar de cumprir o encargo no prazo que lhe foi assinado’ (inciso II). Nesta última hipótese, ‘o Juiz comunicará a ocor- rência à corporação profissional respectiva, podendo, ainda, impor multa ao perito, fixada tendo em vista o valor da causa e o possível prejuízo decorrente do atraso no processo’. VII. O LAUDO E OS PARECERES. PRAZOS. Sobre o ‘atraso no processo’, é bem de ver que foi mo- dificada a redação do artigo 433 do Código de Processo Civil, restando facultada ao Juiz a marcação do prazo para a entrega do laudo pericial em Cartório, pelo menos 20 dias antes da audiência de instrução e julgamen- to. Duas destacadas modificações foram introduzidas na produção da pro- va pericial pelo parágrafo único do prefalado artigo 433. A primeira diz respeito ao vocábulo usado para definir a peça informativa confeccionada pelo assistente técnico: ao invés de laudo, como dizia o dispositivo derrogado, chama-se agora de parecer, patenteando assim a intenção do legislador de excluir o assistente técnico da relação dos auxiliares da Justi- ça, para enquadrá-lo como ajudante da própria parte, às expensas desta, que tal qual um jurisconsulto emite uma opinião a pedido do litigante que com ele tenha contactado. Aliás, já era como mera ‘alegação da parte’ que a jurisprudência encarava o laudo extemporâneo apresentado pelo assis- tente técnico (1º Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, Jurisprudência ADV/COAD, 1991, verbete nº 55.257). Era o gérmen do parecer agora con- sagrado na lei. A segunda inovação trazida pelo novo texto do parágrafo único do artigo 433 do Código de Processo Civil é sobre o prazo para que os assistentes entreguem em juízo os seus pareceres. É este de 20 dias; é comum; e correrá independente- mente de intimação. O dies a quo deste prazo é a apresentação do laudo em Cartório, o que exigirá redobrada diligência das partes e dos seus res- pectivos advogados para evitar a preclusão, máxime em razão do prazo conferido ao perito ser de natureza judicial (marcado pelo Juiz, artigo 433, caput). 27 Plínio Caminha de Azevedo VIII. CONCLUSÕES. 1ª) Com as modificações introduzidas no Código de Processo Civil, pela Lei nº 8.455, o assistente técnico é considerado um auxiliar da parte que o contactou para dele receber um opinamento acerca das ques- tões técnicas ou científicas afloradas na sede da prova pericial. 2ª) O assistente técnico está expressamente excluído do rol das pessoas passíveis de suspeição ou impedimento no processo (Código de Pro- cesso Civil, artigo 422), não mais estando elencado no artigo 138 do Código de Processo Civil. 3ª) Para apresentar a sua escusa em não funcionar no processo, o perito tem o prazo de cinco dias, a contar da intimação de que foi nomeado ou do surgimento do fato novo ensejador do impedimento ou da suspeição. Não o fazendo nesse lapso, reputar-se-á renunciado o di- reito de argüir tais óbices. 4ª) Deveria o legislador de 1992 ter incluído na redação do artigo 146 a suspeição como causa autorizadora da escusa do perito em funcionar no processo. 5ª) Desde que compatível com a natureza do fato, é judicialmente válida a informação prestada em audiência, tanto pelo perito como pelo assistente técnico, acerca de fatos ou de pessoas que tenham sido examinadas por estes. 6ª) Se as partes oferecerem, no ajuizamento e/ou na defesa, pareceres técnicos ou documentos que bastem ao aclaramento da lide, o Juiz poderá dispensar a produção da prova pericial (Código de Processo Civil, artigo 427). 7ª) O perito e o assistente técnico não mais prestarão compromisso (Có- digo de Processo Civil, artigo 422). 8ª) É permitida a substituição do perito se este carecer de base técnica ou científica, bem assim se deixar de cumprir o seu mister no prazo assi- nado. 9ª) O laudo do perito deve estar em Cartório no prazo fixado pelo Juiz até 20 dias antes da audiência de instrução e julgamento. 10ª) É chamada de parecer a peça de opinamento dos assistentes técnicos, e deverá chegar a juízo no prazo comum de 10 dias, a contar da entre- ga do laudo oficial. 28 Plínio Caminha de Azevedo BIBLIOGRAFIA 1. ALVIM, Arruda e ALVIM PINTO, Tereza. ‘Manual de Direito Processual Civil’, 4ª edição, volume 2, São Paulo, Editora Revista dos Tri- bunais, 1991. 2. CARVALHO, Ivan Lira de. ‘Os Efeitos Civis da Sentença Penal Condenatória’, Informativo ADV/COAD, nº 34, Rio de Janeiro, 1992. 3. CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel; e GRINOVER, Ada Pellegrini. ‘Teoria Geral do Processo’, 8ª edição, São Pau- lo, Editora Revista dos Tribunais, 1991. 4. CUNHA, Mauro e SILVA, Roberto Geraldo Coelho. ‘Guia Para o Estudo da Teoria Geral do Proces- so’, Porto Alegre, Sagra, 1984. 5. DELGADO, José Augusto. ‘Responsabilidade Civil do Estado pela Demo- ra da Prestação Jurisdicional’, in Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul, volume 29, Porto Alegre, 1983. 6. GRECCO FILHO, Vicente. ‘Direito Processual Civil Brasileiro’, 5ª edi- ção, volume 2, São Paulo, Saraiva, 1992. 7. MEIRELLES, Hely Lopes. ‘Direito Administrativo Brasileiro’, 15ª edição, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 1990. 8. MIRABETE, Julio Fabbrini. ‘Manual de Direito Penal’, 5ª edição, volume 3, São Paulo, 1991. 9. NEGRÃO, Theotônio. ‘Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor’, 22ª edição, São Paulo, Malheiros, 1992. 10. PIETRO, Maria Sylvia Zanella di. ‘Direito Administrativo’, 2ª edição, São Paulo, Editora Atlas, 1991. 11. PORTO, Mário Moacyr. ‘Temas de Responsabilidade Civil’, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 1989. 29 Plínio Caminha de Azevedo A PROVA PERICIALNO PROCESSO CIVIL FRANCISCO MAIA NETO Engenheiro Advogado Ex-presidente do Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia Ao proferir a palestra de abertura do Congresso Extra- ordinário da Union Panamericana de Associaciones de Valuacion (UPAV), ocorrido em São Paulo, no ano de 1997, concomitantemente ao IX Con- gresso Brasileiro de Engenharia de Avaliações e Perícias (COBREAP), o ministro Carlos Mário da Silva Velloso, do Supremo Tribunal Federal, clas- sificou a perícia como a “rainha das provas”, o que demonstra sua impor- tância como instrumento probatório. Nossa análise da situação da perícia no processo civil inicia-se no Código de 1939, que previa a nomeação de um perito da livre escolha do juiz, permitindo a indicação pelas partes de assistentes técni- cos, que poderiam acompanhar os trabalhos do perito e impugnar as con- clusões trazidas em seu laudo, e segue a alteração, três anos depois, pelo Decreto-Lei nº 4.565, determinando que o juiz nomeasse o perito somen- te na hipótese de as partes não chegarem a um consenso sobre a escolha de um nome comum. Em 1946, surge outra alteração no texto legal, dessa vez consagrando a figura que vigorou até a publicação do Código de Processo 30 Plínio Caminha de Azevedo Civil de 1973, do perito desempatador, que só era nomeado caso as partes não indicassem um perito comum, ou, na hipótese de cada parte indicar o seu perito, se as conclusões não satisfizessem o juiz, o que invariavelmen- te ocorria, pois eles transformavam-se em “advogados de defesa” das par- tes que os haviam indicado. A mudança introduzida pelo Código de 1973 retroage ao dispositivo previsto no Código de 1939, inovando apenas no que se referia a determinados requisitos exigidos dos assistentes técnicos, no to- cante à sua imparcialidade, pois, ao contrário da concepção anterior, estes não eram mais os auxiliares da parte que os indicava, mas, antes de tudo, auxiliares do juiz. Essa foi a sistemática adotada até a edição da Lei nº 8.455, ocorrida em 1992, que retirou essas características, uma vez que o assistente técnico, na prática, nunca pautou pela imparcialidade, pois nin- guém contratava um profissional senão com o intuito de demonstrar o acerto de suas posições, baseado nos elementos técnicos obtidos. O assistente técnico é o auxiliar da parte, aquele que tem por obrigação concordar, criticar ou complementar o laudo do peri- to, por meio de seu parecer, cabendo ao juiz, pelo princípio do livre con- vencimento, analisar seus argumentos, podendo fundamentar sua deci- são em seu trabalho técnico. Seguindo o processo evolutivo do instituto da perícia, no final do ano de 2001, com a edição da Lei nº 10.358, surgiram algumas novidades, ainda muito recentes, pouco assimiladas e sem um acervo jurisprudencial, o que nos leva a interpretações doutrinárias sobre o tema. A primeira alteração refere-se à nomeação do perito e indicação dos assistentes técnicos, com a possibilidade de o juiz nomear mais de um perito e as partes indicarem mais de um assistente técnico, sendo a interpretação corrente que esta nova prerrogativa refere-se a uma mesma categoria profissional. Em nosso entendimento, a previsão legal se mostrou incompleta, uma vez não existir determinação quanto à forma de realiza- ção da perícia, que se recomenda seja feita em conjunto pelos profissio- 31 Plínio Caminha de Azevedo nais envolvidos, caso contrário poderão surgir antagonismos entre os pró- prios peritos e até mesmo entre os assistentes, o que dificultará a aprecia- ção da prova, existindo algumas opiniões no sentido de que o juiz deveria desde logo nomear um deles coordenador da perícia. No que tange à possibilidade de indicação de mais de um assistente, ainda que o juiz tenha nomeado um só perito, o entendi- mento é de sua admissibilidade, cabendo unicamente à parte o ônus des- sa escolha, cuja rejeição se enquadraria em cerceamento de defesa, assim como, inversamente, se o juiz nomear mais de um perito, a parte pode indicar somente um assistente técnico. Essa questão inclusive se torna mais evidente após a reforma constitucional que extinguiu as férias forenses nos meses de ja- neiro e julho, uma vez não existir mais suspensão de prazos, o que pode resultar em perda de prazo do assistente técnico na entrega de seu pare- cer, caso se encontre em férias quando da entrega do laudo pelo perito. A outra novidade refere-se ao termo inicial da perícia, ao determinar que as partes tenham ciência da data e do local designados pelo juiz ou indicados pelo perito para início dos trabalhos periciais. Com essa previsão, alguns profissionais incorreram em grave equívoco, ao entenderem que o perito seria obrigado a comunicar aos assistentes técnicos, quando na verdade a previsão legal obriga a co- municação aos advogados, pois são eles que representam as partes. Uma corrente entende que o perito deve apresentar petição ao juiz solicitando essa marcação ou até mesmo sugerindo a data e o local, o que não nos parece recomendável, pela notória demora que resulta no processo judicial. O procedimento que muitos estão adotando compre- ende o envio de carta via AR (aviso de recebimento) aos advogados das partes, comunicando, com antecedência, a data, que engloba dia e hora, e o local, não esquecendo de, por questões éticas, comunicar por fax ou telefone aos assistentes técnicos. A terceira e última alteração faz referência ao prazo de entrega do parecer pelo assistente técnico, fixado em até dez dias depois 32 Plínio Caminha de Azevedo de intimadas as partes da entrega do laudo, e não mais independente de intimação, que levou alguns a confundirem o termo inicial com o proto- colo, em clara ofensa ao princípio do devido processo legal. Uma dúvida que ainda persiste se refere à coincidência de prazos entre a vista ao advogado, cinco dias, e a entrega do parecer do assistente técnico, dez dias, podendo este último acontecer após o térmi- no do prazo para manifestação pelos advogados. Dessa forma, o que tem acontecido são os advogados peticionarem sobre o laudo pericial, reservando-se o direito de comenta- rem os pareceres dos assistentes técnicos após os respectivos protocolos. 33 Plínio Caminha de Azevedo PERÍCIA É PROVA JUDICIAL? DIZ O CÓDIGO CIVIL DE 2002: TÍTULO V - DA PROVA ART. 212. SALVO O NEGÓCIO A QUE SE IMPÕE FORMA ESPECIAL, O FATO JURÍDICO PODE SER PROVADO MEDIANTE: 34 Plínio Caminha de Azevedo I - confissão; II - documento; III - testemunha; IV - presunção; V - perícia. E DIZ AINDA: ART. 231. AQUELE QUE SE NEGA A SUBMETER-SE A EXAME MÉDICO NECESSÁRIO NÃO PODERÁ APROVEITAR-SE DE SUA RECUSA. ART. 232. A RECUSA À PERÍCIA MÉDICA ORDENADA PELO JUIZ PODERÁ SUPRIR A PROVA QUE SE PRETENDIA OBTER COM O EXAME 35 Plínio Caminha de Azevedo E O CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL COMPLETA: SEÇÃO VII DA PROVA PERICIAL (ARTIGOS 420 A 439) ART. 420. A PROVA PERICIAL CONSIS- TE EM EXAME, VISTORIA OU AVALIA- ÇÃO. O MINISTRO CARLOS MÁRIO DA SILVA VELLOSO, DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, CLASSIFICOU A PERÍCIA COMO A “RAINHA DAS PROVAS”, O QUE DEMONSTRA SUA IMPORTÂNCIA COMO INSTRUMENTO PROBATÓRIO. 36 Plínio Caminha de Azevedo O PAPEL DO ASSISTENTE O ASSISTENTE TÉCNICO NÃO PASSA, PORÉM, DE MERO ASSESSOR DOS LI- TIGANTES: NÃO É PERITO DO JUÍZO! O LAUDO E OS PARECERES Uma das modificações introduzidas na produção da prova pericial pelo parágrafo único do art. 433, diz respeito ao vocábulo usado para definir a peça informativa confeccionada pelo assistente técnico: ao invés de laudo, como dizia o dispositivo derrogado, chama-se agora de parecer, patenteando assim a intenção do legislador de excluiro assistente técnico da relação dos auxiliares da Justiça, para enquadrá-lo como ajudante da própria parte, às expensas desta 37 Plínio Caminha de Azevedo No § 2º do artigo 421 do CPC, houve imperfeição técnica na redação da norma, pois quando ali está permitida a inquirição do perito que houver examinado ou avaliado coisas, deve a permissão ser entendida, também, para que o experto seja perguntado sobre idêntica análise que porventura tenha desenvolvido em pessoas, já que a produção da prova pericial é perfeitamente cabível nas pessoas, servindo como exemplo as que são apuradas em questões de Direito de Família. OS RECURSOS A SEREM UTILI- ZADOS NA PERÍCIA Art. 429. Para o desempenho de sua função, podem o perito e os assistentes técnicos utilizar- se de todos os meios necessários, ouvindo testemunhas, obtendo informações, solicitando documentos que estejam em poder de parte ou em repartições públicas, bem como instruir o laudo com plantas, desenhos, fotografias e outras quaisquer peças. 38 Plínio Caminha de Azevedo A QUESTÃO DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO: NÃO HÁ DÚVIDA SOBRE A NECESSIDADE DA PERÍCIA RESGUARDAR OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS CITADOS, CONFORME EXEMPLIFI-CAM INÚMEROS JULGADOS. STJ- RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. CONCURSO. EXAME PSICOTÉCNICO. CARÁTER SUBJETIVO. IRRECORRIBILIDADE DOS TESTES. ILEGALIDADE RECONHE- CIDA. 1. (...) 2. (...) 3. (...) 4. Embora reconhecida a legalidade do exame psicotécnico para a carreira de policial federal, é vedada sua realização de modo sigiloso e irrecorrível. 5. No que diz com a inexigibilidade da avaliação psicológica em razão de anterior aprovação em outro certame, a compreensão atual do Superior Tribunal de Justiça é no sentido da imprescindibilidade do aludido exame. 6. (...) (Recurso Especial nº 396002/RS (2001/0193442-0), 6ª Turma do STJ, Rel. Paulo Gallotti. j. 18.11.2003, unânime, DJ 30.10.2006). 39 Plínio Caminha de Azevedo TJSC DIREITO DE FAMÍLIA. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE GUARDA E REGULAMENTAÇÃO DE VISITAS. INSURGÊNCIA CONTRA A REALIZAÇÃO DE EXAMES TÉCNICOS DE CUNHO PERICIAL. INVIABILIDADE. PODER DISCRICIONÁRIO DO MA- GISTRADO PARA AFERIR O MELHOR AMBIENTE CAPAZ DE PROPORCIONAR AO INFANTE PLENO DESENVOLVIMENTO. EXEGESE DO ART. 130 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. PRE- TENSÃO DAS PARTES EM NOMEAREM ASSISTENTES TÉCNI- COS. POSSIBILIDADE. INCLUSÃO DO ATUAL COMPANHEIRO DA GENITORA NOS ESTUDOS PERICIAIS RECOMENDÁVEL. RECURSO PROVIDO. 1. “Em procedimentos que têm por objetivo primordial a salvaguar- da física, moral e psicológica da criança, conta o julgador com amplitude discricionária mais significativa para sublevar aspec- tos jurídico-formalísticos a fim de conferir maior segurança e eqüidade às decisões que proferir” (AI nº 2004.033800-4, de Ibirama). 2. Determinada a realização de estudo social, tomado este o caráter de perícia judicial ante a nomeação pelo juízo de espe- cialistas que não fazem parte da equipe interprofissional, conve- niente se faz, em respeito aos princípios do contraditório e ampla defesa, a intimação das partes para indicação de assisten- tes técnicos e apresentação de quesitos (arts. 420 e seguintes do Código de Processo Civil). (Agravo de Instrumento nº 2005.001485-3, 3ª Câmara de Direito Civil do TJSC, Itajaí, Rel. Des. Marcus Túlio Sartorato. unânime, DJ 15.12.2005). Maria Inês Linck 40 CONSIDERAÇÕES DA RELATORA MARIA INÊS LINCK Juíza de Direito - Titular da 1ª Vara de Família e Sucessões Foro Central - Porto Alegre Maria Inês Linck 41 Ao participar deste bloco como revisora, coube a mim realizar um “fechamento” sobre as participações anteriores, passando a tecer as seguintes considerações: Certamente a perícia é um elemento assessor ao jurídi- co pois pode e deve ser utilizada sempre que a capacitação requerida pela situação não estiver inserida nos parâmetros daquilo que se pode esperar de um juiz médio, ainda que seja um juiz “moderno” (que investiga) como diz Dra. Mônica Guazzeli, que mitiga o princípio da inércia da jurisdição não esperando a provocação, podendo também determinar a realização da prova. Justifica-se a assertiva porque o magistrado não pode valer-se de conhecimentos pessoais, mesmo que de natureza técnica, para dispensar a prova pericial, uma vez que não pode ser dispensado o contraditório (há diversas decisões jurisprudenciais neste sentido). Os critérios utilizados para solicitar a avaliação confun- dem-se com os que foram identificados em relação à função assessora. O perito não dever trazer fatos para os autos, e sim opi- niões técnico-científicas a respeito dos fatos, apresenta juízos especializados, é alguém da confiança do juízo e pode ser levantado con- tra ele as mesmas exceções de suspeição, impedimentos... que ao juiz. É por isso que os peritos atuam diretamente com as partes e a eles cabe entrevistar as pessoas. Quanto aos assistentes técnicos cabe mais a obser- vação para posterior conferência. Sem dúvida, a perícia é prova judicial. Para o Dr. Plínio Caminha de Azevedo é a “Rainha das Provas”, porque trás segurança ao julgador e por isso é necessário que todos os “operadores do direito” atu- em de modo efetivo, sanando dúvidas, quesitando para que os laudos contenham as impressões técnicas com os embasamentos necessários, tendo em vista a possibilidade de influenciar diretamente na vida dos en- Maria Inês Linck 42 volvidos. É necessário também que os laudos periciais contenham pro- postas de encaminhamentos baseados nos fundamentos de seus juízos especializados e que atinjam efetivamente o seu objetivo, conclusivo con- forme o instrumental utilizado, cabendo ao juiz a valoração da prova, a livre valoração da prova desde que fundamentado. Em um segundo momento, trago à discussão a questão do exame psico-pericial como ato de profissional que atua na área médi- ca, especialmente área psicológica e ressalto aqui a possibilidade do peri- to agir com plena autonomia, pois enfrentei, ao jurisdicionar, questionamento sobre a possibilidade do assistente técnico participar (en- trar na sala) da entrevista do perito do juízo com o laudeando e a negativa do perito oficial fundamentada na autonomia do profissional, neste caso um médico psiquiatra, por acarretar inibição ou constrangimento ao periciado. Conforme parecer do Conselho Federal de Medicina, (que é mencionado pois no caso em relato o perito era médico psiquiatra) é dever inalienável do perito para com o paciente exigir a privacidade do ato. Pondero que neste aspecto a filmagem prevista no “Depoimento sem Dano”” poderá resolver o problema. Sobre o assistente técnico, o Código de Processo Civil, após a reforma não atribui a ele a função de auxiliar do juízo e sim da parte, portanto, sequer participa da confecção do laudo e deve emitir pa- recer após examinar o trabalho do perito do juízo (artigo 433 § único). Há possibilidade de conferência com o perito oficial visando transparência dos trabalhos. EM CONCLUSÃO: Se não houver objeção do perito é possível o juiz admi- tir a entrada do assistente técnico na sala de entrevista Caso houver obje- ção, deve prevalecer a autonomia do perito do juízo. Já existe acórdão recente referente a este tema e transcrevo a ementa do julgamento do Agravo de Instrumento nº 700.158.70397 - 5º Câmara Cível TJRS - Relator: Maria Inês Linck 43 Desembargador Umberto Guaspari Sudbrack, 16 de agosto de 2006, por bem apreciar e resumir a matéria: AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. PERÍCIA MÉDICA. AVALIAÇÃO PSIQUIÁTRICA. PRESENÇA DOS ASSIS- TENTES TÉCNICOS NA ENTREVISTA DE AVALIAÇÃO. DESNECESSIDADE. OFENSA AO PRINCÍPIO DA AMPLA DEFE- SA. INOCORRÊNCIA. Caso em que o fato de os assistentes técnicos nãopoderem participar de entrevista que avaliará o es- tado psiquiátrico do autor não consiste em ofensa aos princípios da ampla defesa e do contraditório. Presença de outras pessoas, além do examinador e do examinado, no “setting” da entrevista, é rica fonte de inibições à espontaneidade das respostas do periciado. Possibilidade de apresentação de pa- recer autônomo de avaliação pelos assistentes téc- nicos, bem como de realização de conferência com o perito judicial, que confere total transparência aos trabalhos. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. (Agravo de Instrumento Nº 70015870397, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Umberto Guaspari Sudbrack, Julgado em 16/08/ 2006). 44 2º BLOCO - DO PERITO COMPOSIÇÃO DA MESA Lucio Garcia psicólogo Maria da Graça Corrêa Jacques psicóloga relatora Rosa Magrinelli psicóloga coordenadora Sílvia Tejadas assistente social Sonia Liane R. Rovinski psicóloga Maria da Graça Corrêa Jacques 45 ALGUMAS REFLEXÕES ACERCA DA PERÍCIA PSICOLÓGICA (E SOCIAL) MARIA DA GRAÇA CORRÊA JACQUES Psicóloga, Mestre em Psicologia Organizacional, Doutora em Educação, Pós-Doutora em Psicologia Social, professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e conselheira do Conselho Regional de Psicologia do Rio Grande do Sul. Maria da Graça Corrêa Jacques 46 Inicio minha exposição como debatedora deste painel registrando a minha satisfação em estar aqui compartilhando com vocês da discussão de um tema que vem sendo objeto de preocupação entre os diversos segmentos sociais envolvidos: a questão da perícia no âmbito das relações entre Psicologia e Direito. Entre a categoria dos psicólogos e no Sistema Conselhos de Psicologia o tema da perícia psicológica é uma dis- cussão recorrente. No último Congresso Nacional de Psicologia onde se elegem as prioridades de atuação do Sistema Conselhos no próximo triênio, a Psicologia Jurídica recebeu, em um primeiro momento, 11 teses entre as 156 apresentadas, quais sejam: diálogo com a sociedade acerca da Psicologia Jurídica e fortalecimento das entidades representativas, ações para inclusão do psicólogo no Sistema Judiciário e na Segurança Pública, formação em Psicologia Jurídica, parâmetros para orientação e fiscalização do trabalho do psicólogo, avaliação psicológica na perícia e mediação. As teses sobre a avaliação psicológica na perícia se con- centraram em três grandes eixos: a definição de parâmetros mínimos para a realização da avaliação psicológica, a aquisição pelo Sistema Judiciário do instrumental para aplicação de testes psicológicos e a conscientização dos psicólogos para respeitarem os diferentes códigos jurídicos, especial- mente o Código Civil. No Rio Grande do Sul, a discussão no VI Congresso Regional de Psicologia levou a rejeição de 7 dessas 11 teses e a aprovação de 4 delas com alterações por julgá-las ou repetitivas, ou não condizentes com as atribuições do Sistema Conselhos ou por demandarem uma regu- lamentação sem uma maior discussão com os vários segmentos envolvi- dos. O Rio Grande do Sul encaminhou como proposta, entre outras, a abertura de espaços para debate a partir dos quais se possa propor parâmetros para a avaliação psicológica na perícia para posterior regula- mentação. Maria da Graça Corrêa Jacques 47 Na plenária final do VI Congresso Nacional ocorrida em Brasília com a presença de delegados das diferentes regiões do país e com o objetivo de definir as prioridades de atuação do Sistema Conselhos, 4 teses foram aprovadas referentes à Psicologia Jurídica, no eixo ‘Interven- ção dos psicólogos nos sistemas institucionais’, quais sejam: Tese nº 115, Tese nº 117, Tese nº 121 e Tese nº 125. A Tese nº 115 propõe ações para inclusão do psicólogo nos Sistemas de Justiça e de Segurança Pública; a Tese nº 117 versa sobre a avaliação psicológica no âmbito da Justiça, espe- cificamente, a proposição de ações que fomentem essa discussão e que sugerem condições a serem oferecidas pelo Sistema Judiciário para a atu- ação do psicólogo; a Tese nº 121, uma tese especialmente voltada para a Mediação; e, a Tese 125 que se refere a alguns encaminhamentos para a construção de referências quanto à prática do psicólogo nos Sistemas de Justiça e Segurança. O tema dessas teses nos informa qual vem sendo a pre- ocupação dos psicólogos e quais as suas expectativas em relação ao Siste- ma Conselhos. Chama a atenção a ausência de referências explícitas a questões sobre a perícia psicológica, embora as proposições referentes à avaliação psicológica as englobem. Neste caso, as proposições encami- nham tanto para ampliação da discussão no âmbito da categoria dos psi- cólogos como uma interlocução com os representantes do Sistema Judici- ário, esclarecendo e reivindicando condições básicas para a atuação dos psicólogos neste campo. Portanto, esse espaço vem atender a essa expectativa como um espaço em que se possa debater o tema e se ampliar o diálogo para além das fronteiras da Psicologia. Celso Pedro Luft1, em seu Dicioná- rio da Língua Portuguesa, define o verbo debater como “discutir, desper- tar, contender; agitar-se, estrebuchar-se.” Tal definição aponta, especial- mente, para o sentido negativo do debate que eu espero não seja a ten- dência de leitura da minha intervenção. Ao contrário. Espero que minha apresentação seja compreendida enquanto exposição de um ponto de vis- ta e que se transforme em um estímulo para o nosso diálogo. 1 LUFT, C.P. Pequeno Dicionário da Língua Portuguesa. S.P: Scipione, 1987, p. 159. Maria da Graça Corrêa Jacques 48 Tomo como ponto de partida a referência de Silvia Tejadas, expositora que me precedeu, sobre a necessidade de contextualização histórica e política da perícia social. Compartilho com sua argumentação e entendo que a construção de objetos de estudo e espaços de intervenção em Psicologia, assim como no Serviço Social, não são algo acima ou à margem da sociedade, mas componentes da própria sociedade em que se produzem, sujeitos aos limites do tempo e do espa- ço. O meu olhar retrocede ao Renascimento e a criação no mundo ocidental de novos conceitos sobre a natureza e a sociedade pau- tados nos grandes progressos das chamadas Ciências Físicas e Naturais de onde decorre a conclusão epistemológica de que métodos e procedimen- tos devem se estender a todo o domínio do conhecimento científico. A partir do século XVIII o grande debate que se instala é sobre a objetivida- de do conhecimento, sobre a problemática da Verdade e sobre a aproxi- mação maior ou menor com o real. Edgar Morin2 se refere criticamente a esse pensamento hegemônico qualificando-o de “Ciência-Verdade-Absolu- ta”, “Ciência-Solução”, “Ciência-Farol”, “Ciência-Guia”. Michel Foucault3, também um dos seus grandes críticos, escreve: “No fundo da prática científica existe um discurso que diz: nem tudo é verdadeiro, mas em todo o lugar e a todo o momento existe uma verdade a ser dita e a ser vista, uma verdade talvez adormecida que, no entanto, está somente a espera da nossa mão para ser desvelada”. É nesse contexto histórico que a Psicologia nasce como uma ciência autônoma da Filosofia. Ancora-se, na constituição do seu ob- jeto, na noção de indivíduo e no antropocentrismo que se instaura a par- tir das descobertas científicas e se apropria dos pressupostos das Ciências Físicas e Naturais no afã por reconhecimento. Inscreve-se como importan- te braço científico de consolidação da ordem social, como um dispositivo 2 MORIN, E. O despertar da razão. S.P.: Melhoramentos, 1986, p. 79. 3 FOUCAULT, M. Microfísica do poder. R.J.: Graal, 1982, p. 113. 4 PATTO, M.H. Psicologia e ideologia. S.P.: Queiroz, 1987. Mariada Graça Corrêa Jacques 49 cujas práticas se circunscrevem a prever e controlar, selecionar e orientar, nas palavras de Maria Helena Patto4. Constitui-se como ciência normativa, definidora dos padrões de normalidade e construtora de instrumentos de medida e quantificação do psiquismo. É nesse contexto histórico-social que a Psicologia fornece as ferramentas para a individualização dos pro- blemas sociais referidos por Silvia Tejadas quando se refere à construção do Serviço Social como profissão em que ao atribuir-se ao indivíduo a responsabilidade pela situação vivenciada, deixa-se de vislumbrar as de- terminações que emanam da estrutura econômica, social, política e cultu- ral. Tais fundamentos que se expressam na constituição da Psicologia como ciência e profissão, encontram na avaliação psicológica um terreno fértil enquanto um modo de legitimação fundamentada em princípios científicos a partir de uma concepção de ciência. A descoberta da “Verdade”, a aproximação com o “real”, a objetividade, balizam sua atuação. Da mensuração da sensação através de recursos fornecidos pela psicofísica, passando pela mensuração da inteligência e das aptidões, a Psicologia passa a avaliar características de personalidade ou, aspectos do psiquismo com nomes variáveis. E, ainda, sob uma perspectiva crítica, a avaliação psico- lógica, especificamente a perícia psicológica (assim como a social) pode se apresentar como um substituto científico à moral clássica, com reco- nhecimento social, pautada pelos valores hegemônicos de um determina- do contexto sócio-histórico. Hilton Japiassú5 alerta para o risco da prática psicológica se submeter aos ditames de uma ideologia dominante de cará- ter regulador sempre que desvinculada de uma reflexão ética constante sobre o seu fazer e sobre o que está sendo feito com o produto do seu trabalho. O mesmo autor assinala que assim como o indivíduo da Idade Média tinha certa compreensão de si mesmo graças ao modelo explicativo e moral proposto pela Igreja, constata-se, hoje, o que se pode- ria chamar de “psicologização” em que a sociedade delega com freqüência 5 JAPIASSÚ, H. Introdução à epistemologia da Psicologia. R.J.: Imago, 1982. Maria da Graça Corrêa Jacques 50 à Psicologia poderes de determinar os lugares na sociedade e de resolver problemas sociais. Tal “psicologização” pode ser uma das explicações para a crescente demanda pela avaliação psicológica em determinados espaços como, por exemplo, o espaço jurídico em que a decisão de julgar e suas conseqüências objetivas e subjetivas são delegadas a um saber técnico ex- terno ao saber jurídico. Daí a importância do apontamento de Sonia Liane Rovinski, também uma das expositoras que me precedeu, sobre o lugar do psicólogo e o lugar do juiz, que não se confundem. A função da perí- cia, em tese, é de ampliar as possibilidades de decisão do juiz, fornecendo elementos para seu convencimento. Porém, o que se percebe com mais freqüência é que o laudo pericial acaba por receber um valor maior a partir de uma concepção de “Ciência-Verdade-Absoluta”, “Ciência-Solu- ção”, ciência que desvela a Verdade oculta e que determina as conseqüên- cias daí derivadas. Tal tendência é interpretada por Silvana de Oliveira6 como uma das expressões da maior “judicialização” da vida cotidiana que no Conselho Regional de Psicologia se reflete como uma grande demanda por orientação e fiscalização. Tal demanda se reflete no significativo nú- mero de Resoluções do Conselho Federal de Psicologia pertinentes ao trabalho da perícia psicológica como bem apontou o primeiro expositor dessa mesa-redonda Lúcio Garcia. Também com uma posição crítica a esta tendência, Neuza Maria Guareschi7 pontua o quanto a Psicologia naturali- zou como um dever seu responder a determinadas demandas oriundas de outros campos disciplinares, os quais, também arbitrariamente, julgam que a Psicologia é capaz de atendê-las. Há alguns registros históricos da intervenção do Estado para manter a ordem social vigente através do aparato jurídico e da apro- ximação com os métodos de avaliação do psiquismo. É o caso, por exem- plo, do uso de provas psicométricas de inteligência como critério de emi- 6 OLIVEIRA, S. Psicologia e Justiça. Jornal Entrelinhas, CRPRS, ano VIII, n. 39, maio/junho de 2007, p. 8. 7 GUARESCHI, N. Editorial. Jornal Entrelinhas, CRPRS, ano VIII, n. 39, maio/junho de 2007, p.2. 8 MASIERO, A. “Psicologia das raças” e religiosidade no Brasil: uma intersecção histórica. Psico- logia, ciência e profissão, ano 22, n. 1, p. 66-79, 2002. Maria da Graça Corrêa Jacques 51 gração nos Estados Unidos no início do século XX. Deve-se lembrar, tam- bém, a posição de Galton como um dos principais defensores da proibi- ção de casamentos entre loucos, débeis mentais e alcoólatras para retar- dar o nascimento dos chamados degenerados8. O que se constata, hoje, é um aumento da demanda pelo poder judiciário dos conhecimentos e intervenções da Psicologia. Incorporar os questionamentos quanto a essa demanda não significa, ne- cessariamente, concordar plenamente com a qualificação de Louis Althusser9 à Psicologia de modo geral (e a perícia psicológica em particu- lar) como “técnicas humanas de adaptação” ou com Michel Foucault10 como “uma prática generalizada de perícia”. Implica em examinar critica- mente a filiação a práticas de dominação, segregação, exclusão. Implica em avaliar como insuficientes as pesquisas e regulamentações sobre a di- mensão técnica da perícia para dar conta da dimensão ética envolvida. Implica em reforçar a necessidade da reflexão crítica como uma constân- cia no exercício profissional. É esse o papel do Código de Ética dos Psicó- logos como foi apontado inicialmente por Lucio Garcia. Importante considerar que nenhuma profissão existe no vácuo, mas que se constrói a partir da atividade de diferentes pessoas que se apropriam dos conhecimentos produzidos. Estimular a reflexão contemplando as dimensões técnicas, sociais, políticas e éticas envolvidas é o papel dos órgãos de orientação e fiscalização do exercício profissional. Daí a importância de espaços como este em que se exercite a reflexão e o diálogo interdisciplinar sobre os limites, possibilidades e responsabilida- des de cada exercício profissional, os lugares que ocupam, as éticas que promovem e os efeitos das práticas que efetivam. Este é também o papel do debatedor em cada mesa-redonda: incitar o diálogo e a reflexão a par- tir das exposições que a precederam, compreendendo o verbo debater no sentido de discutir e, principalmente, despertar. 9 ALTHUSSER, L. Ideologia e aparelhos ideológicos do Estado. Lisboa: Presença, 1974. 10 FOUCAULT, M. As palavras e as coisas. S.P.: Martins Fontes, 1981. Sonia Liane Reichert Rovinski 52 A PERÍCIA PSICOLÓGICA NO DIREITO DE FAMÍLIA SONIA LIANE REICHERT ROVINSKI Psicóloga do Tribunal de Justiça do RS, Especialista em Psicologia Jurídica (CFP), Mestre em Psicologia Social e da Personalidade (PUC-RS) e Doutora em Psicologia Clínica e da Saúde (Universidade de Santiago de Compostela). Sonia Liane Reichert Rovinski 53 Perícia, em uma concepção genérica, é o “exame de si- tuações ou fatos relacionados a coisas e pessoas, praticado por especialis- ta na matéria que lhe é submetida, com o objetivo de elucidar determina- dos aspectos técnicos” (Brandimiller, 1996, p.25). No caso dela ser solici- tada na área do Direito de Família, terá como especificidade questões téc- nicas decorrentes das demandas típicas desta área que chegam aos agen- tes jurídicos para julgamento, ou seja, questões ligadas à adoção, guarda de filhos, separação, divórcio, entre outras. Os casos mais freqüentes encaminhados aos psicólogosque assessoram juízes das Varas de Família dizem respeito a avaliações relacionadas à disputa do poder familiar, no sentido de que este profissio- nal possa auxiliar na definição da guarda e da regulamentação de visitas. Muitas vezes, estes casos chegam acompanhados de denúncias de maus- tratos e abuso sexual, podendo a demanda jurídica incluir, nestas avalia- ções, questões ligadas à possibilidade da destituição do poder familiar. Apesar desta temática, do poder familiar, ser a mais freqüente nos encami- nhamentos das avaliações psicológicas, não chegam a esgotar o tipo de trabalho realizado pelos psicólogos na área do Direito da Família. Outras solicitações podem ser requisitadas como, por exemplo, a avaliação da capacidade laborativa em situações de separação, em que uma pensão ao cônjuge pode estar em jogo, ou a verificação das condições pessoais para responder por atos da vida civil (interdição). Esta última bastante freqüen- te para os técnicos da área da saúde mental, mas preferencialmente enca- minhada aos psiquiatras por ser, quase sempre, subsidiada por diagnósti- co de doença mental; ainda que os casos de deficiência mental deveriam ser rotineiramente avaliados por psicólogos, que possuem o instrumental necessário para a definição exata de tal transtorno. Considerando que os tipos de avaliações citadas podem Sonia Liane Reichert Rovinski 54 envolver temáticas psíquicas muito diferenciadas, privilegiar-se-á como foco de discussão na apresentação desta mesa sobre perícias apenas aque- la relacionada à questão do poder familiar, seja pela freqüência com que as solicitações chegam aos psicólogos ou, mesmo, pelos desafios éticos e metodológicos que suscita. Discutir o trabalho do psicólogo em perícias que envol- vam decisões quanto ao poder familiar exige de início uma reflexão sobre as questões éticas envolvidas. Primeiro, é muito importante que o psicólo- go tenha em mente os limites de seu trabalho técnico quanto à definição das capacidades parentais. Ainda que possa como técnico identificar pato- logias de vínculos entre pais e filhos, até identificar situações de risco à criança, não é compatível ao seu trabalho assumir um papel de julgamen- to, definindo em que momento um genitor deve ser dado como impedido para o desempenho de sua função parental. Esta decisão deve ser conside- rada como um “ato de julgamento”, pois envolve expectativas sobre os papéis sociais e a tolerância do grupo quanto aos limites da normalidade, sempre circunstanciado pela norma jurídica - aspectos todos pertinentes exclusivamente ao agente judiciário. Em outras palavras, é ao juiz que cabe o ato de julgar, sendo o psicólogo apenas um auxiliar da Justiça no sentido de fornecer informações pertinentes e suficientemente fundamen- tadas pela ciência. Este posicionamento traz repercussões diretas na ma- neira do psicólogo trabalhar e na forma de escrever seu informe ao judici- ário. O técnico deve estar atento, a todo o momento, sobre o que seria resultante de seus achados técnico-científicos e o que seria decorrente de suas crenças sociais, envolvendo os valores de sua própria formação pes- soal. Não cabe aqui discutir o quão intrincado pode ser a dinâmica destas forças na fundamentação do raciocínio clínico que deve ser descrito no laudo, na medida em que ciência e crenças sociais se constituem em uma verdadeira inter-relação na formação da sociedade e do próprio sujeito. Uma outra questão ética que diz respeito ao posicionamento do psicólogo frente aos genitores que está avaliando, no sentido de se colocar como aquele sujeito capacitado para decidir quem Sonia Liane Reichert Rovinski 55 seria o “melhor” dos pais para ter o cuidado da criança. Neste sentido, Emery, Otto e O’Donohue (2005), em uma revisão crítica sobre avaliações psicológicas para custódia nos EUA, chamaram a atenção para cuidado que os psicólogos devem ter ao dirigir seu trabalho pela premissa existen- te nestas avaliações “do melhor interesse da criança”. Salientam que além desta máxima ser um conceito vago, predispõe a que se construa estereó- tipos de genitores “mais ou menos saudáveis” pela indicação na avaliação daquele com quem a criança estaria sendo melhor cuidada. Estes autores sugerem que o foco da avaliação deveria ser deslocado para uma nova proposta, a da “regra da aproximação”, onde se buscaria manter de forma mais aproximada possível a organização da rotina de vida da criança com a que ela tinha antes da separação dos pais. Deste modo, não se buscaria um arranjo familiar “ideal” para esta criança, com o genitor mais “saudá- vel”, mas aquele que lhe trouxesse menores mudanças. É claro que esta regra só pode ser seguida se o arranjo familiar prévio à separação vinha atendendo as necessidades da criança. Ainda, segundo Emery e colaboradores (2005), as pes- soas mais capacitadas para definirem esta “melhor” reorganização familiar seriam os próprios pais. Toda a organização judiciária deveria estar prepa- rada para facilitar, desde o início do processo, que os pais mantivessem o poder de decisão quanto a como definir a guarda, através de atividades técnicas como a mediação. Antes que os genitores entrassem em litígio judicial deveriam ser alertados quanto aos prejuízos que um processo ju- dicial litigioso poderia gerar aos filhos. Estudos têm provado de que mais do que o tipo de arranjo familiar posterior a separação (guarda comparti- lhada ou individual), é o processo de dissolução e a natureza das relações familiares que se constroem que influenciarão no sofrimento psíquico dos filhos. Um processo de mediação judicial, ou preferencialmente extrajudicial, através do estímulo dos próprios advogados para que os genitores cheguem a um consenso, evitando o ingresso de um processo de separação litigiosa, é ainda a melhor e mais durável solução para todos os membros da família. Sonia Liane Reichert Rovinski 56 No Brasil, já temos alguns exemplos de atividades que são desenvolvidas pelos psicólogos com o objetivo de valorizar o poder familiar, são: atividades de orientação a advogados, antes do início do pro- cesso judicial, para que não se acirrem situações de litígio entre seus cli- entes, favorecendo a comunicação e o entendimento entre os mesmos (Polanczyk, 2002); atividades de mediação para a busca de soluções con- juntas entre os ex-cônjuges (Silva, 2003; Rivera et al., 2002); grupos focais de atendimento a famílias, com o objetivo de resolução dos impasses sur- gidos com o processo judicial (Silva e Polanczyk, 1998). De modo mais recente, a preocupação do próprio Conselho Federal de Psicologia em regulamentar a atividade de mediação como uma das atividades do Psicó- logo. No entanto, a realidade também mostra que nem sem- pre os genitores estão disponíveis, ou possuem capacidade para chegar a um acordo sobre a definição da guarda e do estabelecimento das visitas. Os diversos motivos e sentimentos associados à ruptura da relação, as questões financeiras, e as próprias limitações na capacidade emocional de lidar com fatores de estresse, podem criar situações de impasse e até de risco à integridade da criança, sendo necessária a intervenção do judiciá- rio. Para Emery e colaboradores (2005) as perícias ficariam indicadas sem- pre que houvesse indícios de violência familiar ou negligência, antes ou durante o processo de separação, e suspeita de doença mental em algum dos genitores, que poderia, da mesma forma, levar a condutas de maus- tratos aos filhos. O CONCEITO DE COMPETÊNCIA PARENTAL A perícia psicológica forense tem sempre por fim subsi- diar decisões judiciais, por isso é fundamental, para que possa atender sua demanda, que o foco do trabalho seja bem estabelecido desde o iní-
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