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Resumo Alfa

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Resumo Alfa
Projetos Pedagógicos em Alfabetização
“Sabemos que o trabalho do professor não começa na sala de aula. Muito antes disso, é necessário planejar a ação, definir claramente o que se deseja com ela, questionar-se por que e para que realizamos cada proposta, cada atividade. Esse é um dos motivos que tornam o processo de alfabetização, na perspectiva sociointeracionista, muito mais trabalhoso para o professor do que no processo mecanicista. No primeiro caso, é preciso investigar, conhecer o universo e a realidade das crianças. O primeiro passo é ouvi-las para saber o que já trazem de conhecimento, quais são as suas hipóteses sobre a leitura e a escrita, para só então consolidar o que se pensou planejar. Já no segundo caso, no processo mecanicista basta planejar o que julgamos melhor para preparar as atividades, previamente definidas , apenas pelo professor, e oferecê-las com a certeza de que serão “muito legais” para os nossos alunos.” (Aula 21, Volume 3 de Alfabetização 1). 
Estruturação para a elaboração de um projeto pedagógico. 
 Capa: Apresenta o nome da instituição, título, nome do autor do projeto, cidade, ano. 
 Folha de rosto: Consta o nome da instituição, título do trabalho e texto com uma breve apresentação do trabalho. 
 Sumário: Deverá apresentar: introdução, justificativa, objetivos, público-alvo, metodologia, formas de registro, resultados planilha de custos. 
 Introdução: Apresenta o tema genericamente descrito, anunciando a ideia básica e situando a área de trabalho em que se enquadra o projeto. 
 Justificativa: Estabelece o porquê do projeto e sua relevância para a comunidade a que se destina. Por que fazer? Para que fazer? 
 Objetivos: Enumera os objetivos a serem alcançados (claros e curtos). As ações devem ficar bem definidas para que todos sai bam quais são os resultados a serem atingidos. 
 Público-alvo: Indica o grupo e número de alunos envolvidos. 
 Metodologia: Descreve cada passo a ser dado, pelo menos os previstos. Compreende a descrição ou exposição narrativa da experiência ou pesquisa da aparelhagem e do material utilizado. Deverá apresentar a utilização de alguma ferramenta tecnológica. 
 Forma de registro: São as produções escritas (textos de diferentes gêneros), desenhos, fotos. Descrição de atividades em grupo ou individualmente. 
 Resultado: É a escrita de todo resultado do processo e do trabalho. Avaliação e análise crítica de todos os aspectos: participação do aluno, atuação do professor, recursos utilizados. 
 Planilha de custos: apresenta uma planilha com a descrição dos gastos (se houver) em cada etapa e no geral. 
É fundamental que o professor alfabetizador perceba a importância de criar estratégias que oportunizem o contato do aluno com os mais diversos tipos de textos para que, a partir de atividades muito bem planejadas e conduzidas em sala de aula, possa garantir ao seu aluno a apropriação da leitura e da escrita. Sabe-se que não há receitas prontas para realizar essa perspectiva na prática. Entretanto, tendo concepções de leitura e de escrita bem defi nidas, o professor, com um pouco de criatividade, poderá trilhar seu próprio caminho na direção de um trabalho que assegure ao aluno uma aprendizagem signifi cativa.
Vantagens e desvantagens de trabalhar com projetos pedagógicos no processo de alfabetização, sob o ponto de vista do professor.
Vantagens – Atendimento às necessidades e interesses dos alunos; possibilidade de vínculo com a realidade que cerca a comunidade escolar; possibilidade de relação com os fatos que acontecem no mundo; oportunidade de questionamento de valores; posturas éticas e temas diversos, normalmente não contemplados nos currículos; produção de diferentes formas de registro do trabalho, utilizando material diversificado e não apenas textos copiados em cadernos ou prontos em folhas de exercício, cartazes etc.; envolvimento e compromisso do grupo com o trabalho, uma vez que houve participação deles na escolha e na organização do projeto; co-autoria de alunos e professores na construção do conhecimento.
Desvantagens – Mais trabalhoso para o professor; o material não pode ser preparado com muita antecedência; não é possível aproveitar os planejamentos de anos anteriores na íntegra; é preciso desenvolver um trabalho paralelo com as famílias para que compreendam e valorizem o trabalho; muitas vezes, colegas e gestores (diretores, coordenadores ou supervisores) não acreditam nem apóiam esse trabalho etc.
Entendemos que planejar atividades em parceria com as crianças é uma maneira de caminhar na direção de uma aprendizagem significativa, pois a participação delas, como atores principais do processo pedagógico oferece pistas ao trabalho do professor. Sugerimos ao professor que, antes de redigir o projeto, proponha à turma a visita técnica e deixe que as crianças manifestem opiniões, curiosidades e que façam sugestões para a visitação. Anote o que julgar importante como contribuição para o projeto.
Antes de iniciar o planejamento das atividades, aquele professor que se dispõe a conversar com as crianças sobre alimentação, qualidade de vida, suas preferências, dentre outros assuntos, já se coloca na direção de uma aprendizagem significativa, pois como atores principais do processo pedagógico, as crianças oferecem pistas para o trabalho docente.
Assim, cabe ao professor oferecer oportunidades para que as crianças manifestem seus interesses, suas curiosidades e suas necessidades a partir dos relatos das suas experiências e das suas leituras de mundo para que tendo feito a coleta dos dados, seja possível definir um tema específico para as atividades a serem desenvolvidas com a turma.
Todas as atividades, antes de iniciadas, devem ser discutidas com a turma que opinará e apresentará sugestões a respeito. Deste modo, o professor, já de início, terá garantias de que o tema escolhido e as atividades propostas serão do interesse dos alunos e os seus resultados terão utilidade para suas vidas.
É fundamental que o professor perceba que trabalhar com projetos pedagógicos não é perda de tempo mas, pelo contrário, é um ganho para o trabalho do professor e para o processo de aprendizagem do aluno. No entanto, ao contrário do que se pensava anteriormente, o trabalho na perspectiva sociointeracionista demanda um cuidadoso planejamento. Para isso é preciso conhecer a realidade dos alunos, ouvindo-os. A escolha do tema, a determinação dos objetivos, a coleta de dados, sua análise e interpretação até o relatório final, tudo deve obedecer a um plano preestabelecido, nenhuma dessas etapas deve ser feita de forma improvisada, pois o risco de não atingir os objetivos é grande.
As atitudes de um professor não devem contar com o espontaneísmo, fruto do descompromisso profissional e/ou do despreparo para a função de professor. Trabalho docente é coisa séria!
AMBIENTE ALFABETIZADOR 
Durante a década de 70, foram realizadas numerosas pesquisas sobre alfabetização na Europa, nos Estados Unidos e na América Latina. Dentre as pesquisas realizadas destacamos a de Emília Ferreiro que muito influenciou no Brasil. Tais pesquisas deslocavam a discussão sobre alfabetização, mudando o foco da análise da professora que ensina e dos métodos e técnicas para alfabetizar. 
 Todas as crianças são sujeitos de conhecimento e, como tal, quando crescem em comunidades letradas, não permanecem indiferentes ao código escrito e constroem conhecimento sobre a leitura e a escrita, antes mesmo que algum adulto decida ensinar-lhe sistematicamente. 
 O uso cotidiano e sistemático de situações de leitura e de escrita em seu universo cultural marca, desde o primeiro momento, as explorações das crianças com relação à escrita e à leitura. 
 Ferreiro denominou de “AMBIENTE ALFABETIZADOR” a proposta de levar para a sala de aula um ambiente semelhante ao que as crianças vivem em seu cotidiano, quando expostas a situações de leitura e escrita. 
 Uma boa parte dos professores vindas de uma experiência de organização de “cantos” estanques, separados, na escolade Educação Infantil traduziu a proposta para “canto de leitura”, sem que isso implicasse, de fato, a construção de novas práticas pedagógicas que contribuíssem para que as crianças se apropriassem da linguagem escrita. 
 A construção de ambientes alfabetizadores favoráveis à aprendizagem das crianças precisa tomar como base a relação leitura de mundo-leitura da palavra, procurando garantir que o processo de ensinar a ler e a escrever se torne um espaço de se “tomar a palavra”. 
 A simples exposição de materiais escritos não garante um ambiente alfabetizador adequado. É preciso que haja interferência direta do adulto/professor na análise e exploração dos materiais disponibilizados. 
 O ambiente alfabetizador deve incorporar as diferentes leituras de mundo da criança, não apenas reproduzir o ambiente letrado das classes abastadas. 
 O termo “ambiente alfabetizador” produziu muitos mal-entendidos, segundo os quais a professora, inúmeras vezes, abre mão do seu papel de orientadora desse processo. Incorporar apenas a idéia de um ambiente alfabetizador sem uma compreensão mais profunda do que isso significa, tem feito com que algumas professoras tragam para a sala de aula toda sorte de textos – rótulos, revistas, embalagens, jornais, bulas, receitas – sem saber bem o que poderiam fazer com estes materiais.
A concepção de ambiente alfabetizador presente na escola tem levado as professoras a concluírem que criar um ambiente alfabetizador, na sala de aula, significa seguir o modelo do ambiente cultural das cri-anças das classes médias, uma vez que se afirma que as crianças das classes médias se alfabetizam porque o ambiente da sala de aula é uma continuidade do ambiente de suas casas.
Estimular a exploração de objetos que são portadores de escrita como jornais, rótulos, calendários, dentre outros, permite trazer para a discussão sobre alfabetização as formas de as crianças pensarem, sentirem, agirem, se relacionarem com os outros, em outras palavras, a compreensão que elaboram sobre o mundo.
Como afirma Paulo Freire, a compreensão sobre o mundo construída por crianças, jovens e adultos nas mais variadas dimensões de sua prática social – “sua forma de contar, de calcular, seus saberes em torno do chamado outro mundo, sua religiosidade, seus saberes em torno da saúde, do corpo, da sexualidade, da vida, da morte, da força dos santos, dos conjuros” (FREIRE, 1992, pp. 85-86) – tudo isso constitui suas leituras de mundo.
Como alfabetizar para a cidadania? Que novos conteúdos e metodologias são necessários quando se trabalha numa perspectiva de potencializar os alunos para o exercício da cidadania? Como afirma Freire (1987), alfabetizar é um ato político. Assim, ao radicalizar a concepção de ambiente alfabetizador, a professora entenderia que, deslocando a sua proposta, as crianças ampliariam o ambiente alfabetizador que ela inicialmente criou em sala de aula, tornando-o muito mais rico – porque teve a interferência das crianças. O papel da professora seria, então, continuar a investir na ampliação do universo cultural das crianças, transformando em conteúdos alfabetizadores toda a experiência trazida por elas.
É preciso consolidar o conhecimento que a criança traz, para que ela se sinta sujeito do conhecimento e, ao mesmo tempo, possa atuar no sentido de ampliar, ao máximo, o seu conhecimento anterior, lembrando sempre que só aprende quem acredita na sua capacidade de aprender. Criando estratégias de uso da linguagem escrita a partir das leituras de mundo das crianças, a professora possibilita o acesso à leitura da palavra visando à incorporação e ampliação de novas leituras de mundo às leituras anteriores já realizadas a partir das próprias experiências das crianças.
A concepção de ambiente alfabetizador presente na escola tem levado as professoras a concluírem que criar um ambiente alfabetizador na sala de aula significa seguir o modelo do ambiente cultural das crianças das classes médias, uma vez que se afirma que as crianças das classes médias se alfabetizam porque o ambiente da sala de aula é uma continuidade do ambiente de suas casas. As leituras de Paulo Freire nos convidam a pensar não mais em um ambiente alfabetizador, único para todas as crianças, mas sim em ambientes alfabetizadores que possam incorporar na sala de aula as leituras de mundo que professoras e crianças constroem no cotidiano, ampliando-as e diversificando-as. A construção de ambientes alfabetizadores favoráveis à aprendizagem das crianças das classes populares, construídos a partir das diferenças culturais, precisa tomar como base a relação leitura de mundo-leitura da palavra, procurando garantir que o processo de ensinar a ler e a escrever se torne um espaço onde os que foram silenciados e não usufruem dos benefícios socioculturais produzidos pela sociedade em seu conjunto possam “tomar a palavra”.
Compreender o aprendizado da língua escrita como um processo linear, cumulativo, hierarquizado – concepção que fundamenta grande parte das cartilhas representa, na verdade, uma visão simplificadora do processo de aprender a ler e a escrever que desintegra a complexidade do real, como explica Morin (1990), na medida em que a correspondência grafo-sonora não garante a compreensão do escrito. Ou seja, aprender a ler e a escrever não é se apropriar de um código de transcrição sonora. Pressupõe uma construção conceitual realizada por sujeitos históricos a partir da interação com a própria língua escrita.
Tendo como referência uma concepção dialógica do processo ensino-aprendizagem, a alfabetização implica para Freire uma atitude de criação e recriação e, por isso, não pode ser feita de cima para baixo, como uma doação ou uma imposição, mas de dentro para fora, pelo próprio sujeito, com a colaboração do educador.
Daí a importância do diálogo entre as professoras alfabetizadoras e as crianças, de forma que possam emergir e interagir, nos diferentes ambientes alfabetizadores, os modos de pensar, viver, agir, sentir que encontrem no processo de alfabetização um canal de expressão e um instrumento de intervenção em seu contexto.
Pensar a alfabetização a partir dos conteúdos vivos que permeiam a sala de aula e não apenas a partir do estudo da estrutura da língua abre espaço para que novos caminhos que tenham como base a palavramundo dos sujeitos em processo de alfabetização possam ser construídos na prática alfabetizadora.
O diálogo entre professoras e crianças, ao favorecer a interação entre diferentes modos de pensar, viver, agir, sentir na sala de aula é um caminho que torna a alfabetização um canal de expressão e um instrumento de intervenção no mundo e fortalece, dessa forma, ambientes alfabetizadores mais favoráveis às crianças das classes populares. Pensar os ambientes alfabetizadores a partir dos conteúdos que permeiam a sala de aula e não apenas a partir do estudo da estrutura da língua abre espaço para que novos caminhos possam ser construídos na prática alfabetizadora. Para que possa dar conta dessa tarefa, é preciso que a escola, desde a Educação Infantil, se produza como um espaço de construção e circulação de conhecimentos; que tenha como compromisso ampliar as leituras de mundo das crianças, reconhecendo-as como seres humanos completos e não apenas como seres em construção.
A PALAVRAMUNDO COMO CONTEÚDO ALFABETIZADOR 
A palavramundo como conteúdo alfabetizador = práticas interculturais presentes na sala de aula. 
Aprender a ler lendo. Aprender a escrever escrevendo. 
PALAVRAMUNDO: Conceito de Paulo Freire que expressa a articulação entre os conhecimentos e saberes cotidianos do educando e a aprendizagem da leitura e da escrita. Não se refere à memorização mecânica e à descrição de objetos e situações como interpretação; pelo contrário, refere-se a uma prática alfabetizadora fundada no exercício da curiosidade e na apreensão do significado e do sentido existencial da palavra, no mundo e na vida cotidiana de cada educando.
A criança leva consigo as leituras de mundo de seu contexto familiar e local. Leituras impregnadasde conteúdos culturais singulares – alfabetização existencial que produz saberes, crenças, valores e desejos. A escola, ao reunir crianças de meios sociais deferenciados, possibilita a circulação e o cruzamento de práticas culturais diversas, e por isso constitui o espaço privilegiado de geração de ambiências próprias de uma educação intercultural.
A interculturalidade está presente no cotidiano da escola, embora muitas vezes negada e invisibilizada por uma forma de organização que faz do espaço escolar uma máquina de “aprender” e de vigiar, de classificar, hierarquizar e recompensar os melhores, como nos lembra FOUCAULT.
A educação intercultural transmuta conteúdos existenciais em conhecimentos socialmente validados, assim, a alfabetização toma a palavramundo como referência para aprendizagem da palavra escrita.
CONCEPÇÃO FREIANA DE EDUCAÇÃO:
O pensamento freireano é um pensamento radical comprometido com a solidariedade entre os homens. Paulo Freire lutou contra a opressão, contra a exploração e contra a injustiça social. A educação foi sua arena, e as idéias e as palavras suas armas de luta.
A obra de Freire produziu uma nova sintaxe no campo educacional. Ao defender a alfabetização como ato de reflexão, criação, conscientização e libertação, Freire rejeita a concepção que vê a alfabetização como aquisição mecânica de codificação/decodificação de palavras e signos. Soares (2003) nos aponta que Paulo Freire criou “... uma concepção de alfabetização, que transforma fundamentalmente o material com que se alfabetiza, o objetivo com que se alfabetiza, as relações sociais em que se alfabetiza – enfim: o método com que se alfabetiza” (p.120). A sintaxe freireana que transforma o material, o objetivo, as relações sociais e o método e a própria concepção de alfabetização materializa-se em conceitos e categorias tais como: solidão-comunhão, suporte e mundo, esperança, seriedade e alegria, dialogicidade, conscientização, transformação, liberdade, dentre outros.
Na perspectiva freireana, o estar só não significa solidão, o homem como ser finito precisa do mundo, assim como o mundo precisa do homem, de cada homem: “o isolamento só tem sentido quando, em vez de negar a comunhão, a confirma como um momento seu” (FREIRE, 2001, p. 17). A história é a história do mundo, do homem no mundo, com os outros homens e com o próprio mundo. O homem faz a história em comunhão com o mundo e com os outros homens no mundo, o homem não está isolado no e do mundo. Solidão e comunhão são parte da experiência existencial do homem, que tem como suporte os processos de comunicação e intercomunicação. 
A perspectiva humanista, que atravessa toda a obra de Paulo Freire, se constitui na marca fundamental de sua concepção de educação. Freire vê o homem como um ser no mundo, com o mundo e com os outros no mundo. Um ser criador, produtor de técnicas e inventor de instrumentos, que aperfeiçoam sua inserção no mundo.
Aprender a ler e escrever é antes de mais nada aprender a ler o mundo; compreender seu contexto, localizar-se no espaço social mais amplo, a partir da relação linguagem-realidade. O processo de alfabetização se realiza no movimento dinâmico entre palavra e mundo: a palavra dita flui do mundo carregada de significação existencial: “palavramundo” – a mais perfeita tradução do acontecer humano. 
Ler o mundo é apreender a linguagem do mundo, traduzindo-o e representando-o: a percepção do espaço e sua representação é um processo de múltiplas operações mentais que se desenvolve a partir da compreensão simbólica do mundo e das relações espaciais topológicas locais. A localidade do educando é, segundo Freire (1993), o ponto de partida para a construção do conhecimento do mundo.
Alfabetizar, na perspectiva da leitura do mundo, é respeitar esses saberes de que nos fala Freire, é valorizar a sabedoria que resulta das experiências culturais locais da criança, para possibilitar que ela avance para além de suas crenças em torno de si-no-mundo e de si-com-o-mundo.
Freire (1990) nos chama atenção para o fato de que nada sobre a sociedade, a língua, a cultura ou a alma humana é simples; nada se desenrola “naturalmente”, nem na Natureza, nem na História. O homem é um ser-em-situação, sujeito circunstanciado por e submerso nas condições espaço-temporais do mundo. Como ser situado, o homem é desafiado pelas circunstâncias a refletir sobre sua ação – ao refletir sobre seu contexto – ele constrói e reconstrói seu espaço existencial, produzindo cultura e fazendo história. Ao produzir a cultura e a história, o homem produz vida, a sua vida como indivíduo e como espécie. O fluxo vital do homem o coloca num estado permanente de tornar-se: criando, aumentando e intensificando suas potencialidades e energias. Sendo o acontecer humano um permanente processo de tornar-se, o seu cotidiano pode ser interpretado como o espaço-tempo do movimento de fazer-se e refazer-se, intensamente vivido no processo de fazer o mundo e produzir a história.
ALFABETIZAÇÃO E A EDUCAÇÃO INFANTIL
A Educação Infantil ocupa-se precisamente de atualizar as experiências e conhecimentos que a criança, na faixa de 2 a 6 anos de idade, constrói em seu cotidiano. Ela vai buscar na produção lúdica o caminho para ingressar no mundo adulto, descobrindo-o a sua maneira.
É importante que todos compreendam a forte influência do trabalho escolar no desenvolvimento infantil e sua contribuição positiva para a formação do cidadão consciente e cumpridor dos seus direitos e deveres, dentro da sociedade.
A nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9.394/96, pela primeira vez na história da Educação brasileira, menciona o segmento da Educação Infantil como etapa obrigatória da escolaridade. Logo após a promulgação da lei, o Ministério da Educação publicou um documento intitulado Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil, propondo uma base única nacional de objetivos e propostas para o referido segmento.
Educação não pode ser restrita à definição de ensino (educação formal ou escolaridade), mas concebida como um processo amplo que se dá no interior das sociedades, envolvendo os indivíduos durante a vida toda.
 Entende-se por Educação Infantil toda e qualquer educação destinada à criança com idade inferior à mínima exigida para o ingresso no Ensino Fundamental. 
 A Educação Infantil antes era considerada assistencialista. A criança era um “vir a ser”. Atualmente é considerada espaço de circulação e produção de conhecimento por crianças pequenas, sendo a Pré- Escola, etapa obrigatória da educação básica. 
 Segundo Sonia Kramer existem 5 funções determinadas à Educação Infantil de acordo com o modo que a mesma é oferecida. Destacamos: 
1. Função guardiã – A Educação Infantil como um lugar seguro com alimentação, serviço médico e área para brincar; 
2. Função preparatória – Com o objetivo de dar a criança o que lhe é exigido para entrar no 1º grau; 
3. Função com objetivo em si mesma – Busca moldá-la aos padrões escolares, sem mudar em nada a escola; 
4. Função socializadora – Valoriza a aquisição de hábitos e atitudes; 
5. Função pedagógica – Busca fornecer a aquisição de conhecimentos escolares tendo como ponto de partida a valorização dos conhecimentos das crianças. 
O trabalho da Educação Infantil baseia-se numa posição filosófica de crença no ser humano, em sua capacidade de atualizar suas potencialidades, em sua possibilidade de vir a ser, numa visão otimista do homem. A criança há de ser vista de forma dinâmica: não unicamente o que ela é, mas sobretudo o que se tornará. Partindo dessa posição, cabe à escola criar condições favoráveis e facilitadoras para esse desabrochar. Para isso, é preciso um clima de liberdade e respeito às características e diferenças individuais, a partir de propostas que enfatizem a necessidade de atividade do sujeito, de maneira que seja livre para criar, num ambiente em que o que ele produza seja valorizado.
As crianças devem ser colocadas em situações que estimulem perguntas e as atividades que executam devem levá-lasa encontrar respostas. Elas devem ser acompanhadas, mas não conduzidas pela professora, de maneira que possam desenvolver sua própria linguagem, seu modo de pensar e a capacidade de chegar as suas próprias conclusões.
O trabalho deve ser consciente e intencional. É importante que o professor saiba por que deve haver “a hora das novidades’’ e não o faça simplesmente porque aprendeu que o dia de uma turma de Educação Infantil deve ser iniciado com tal atividade. Deve ter claro que, ao estimular as crianças a falarem sobre as suas vidas, as pessoas de que gostam e desgostam, os passeios que fazem, seus animais ou objetos prediletos e suas famílias, está possibilitando o desenvolvimento de linguagem oral. Além disso, ao ouvir as experiências e os sentimentos de seus colegas, eles estarão se percebendo no outro, abrindo-se para o mundo, situando-se no mundo, conhecendo-se. Ao falar de suas vidas, ou ao dar vazão a sua imaginação, vão, pouco a pouco, elaborando suas dificuldades.
É importante que no trabalho de Educação Infantil esteja claro que cada criança tem seu ritmo, seu tempo. Esse tempo e esse ritmo devem ser respeitados, do mesmo modo que sua cultura deve ser respeitada.
PHILLIPPE ARIÈS relata as modificações do conceito de infância ocorridas historicamente, desde a Idade Média até a sociedade moderna, relacionado-as diretamente às mudanças ocorridas nas formas de organização da sociedade. Tudo o que se referia às crianças e à família tornara-se um assunto sério e digno de atenção. Não apenas o futuro da criança, mas também sua simples presença e existência eram dignas de preocupação – a criança havia assumido um lugar central dentro da família (ARIÈS, 1981, p. 52).
A partir dos estudos de Ariès, foi possível perceber que a criança possui características próprias. Não era mais possível tratá-las como adultos em miniatura. Nesse sentido, é necessário compreender que os diferentes autores, tanto o próprio Ariès, quanto Piaget, por exemplo, afirmam que existem duas dimensões que precisam ser percebidas, concomitantemente, nas crianças: uma que diz respeito às características do desenvolvimento que são comuns a todas as crianças, ou seja, etapas doprocesso que acontecem aproximadamente da mesma forma para todas; e uma outra, que se refere à individualidade de cada criança, isto é, sua personalidade, sua afetividade, até mesmo fatores hereditários, que são únicos, inigualáveis.
Ao longo do tempo, a ênfase dos estudos (entre eles estão: Freud, Piaget, Vygotsky e Rogers, entre outros) focou-se na formação do sujeito frente ao conhecimento, priorizando a participação deste no processo ensino-aprendizagem. Para eles, o importante não é o meio, mas sim a formação do sujeito, em todas as suas potencialidades e dimensões biopsicossociais.
• O desenvolvimento mental é influenciado por quatro fatores inter-relacionados: maturação, experiências, interação social e equilibração.
• Para os professores, três estágios do desenvolvimento são especialmente importantes: pensamento intuitivo, operações concretas e operações formais.
• O desenvolvimento mental das crianças impõe limitações definidas sobre o que podem aprender e sobre como (as condições sob as quais) aprendem.
• O pensamento cresce partindo de ações e não de palavras.
• O conhecimento não pode ser dado às crianças. Ele tem que ser descoberto e reconstruído através das atividades dos alunos.
• As crianças aprendem melhor partindo de experiências concretas.
• Por natureza, as crianças estão continuamente ativas. Elas têm de descobrir e dar sentido ao seu mundo. Quando estão fazendo isto, elas refazem as estruturas mentais que permitem tratar de informações cada vez mais complexas.
Aprendizagem depende, em grande parte, da motivação. Se ela é forte, as crianças (como os adultos) fazem, de boa vontade, enormes esforços para dominar coisas difíceis. Por esta razão, as necessidades e os interesses intrínsecos da criança têm mais importância do que qualquer outro aspecto para que a criança se entretenha e conclua uma atividade: mais especificamente, os objetivos socioafetivos referentes à criança, são os seguintes, segundo Kamii (1992):
a) Que ela esteja em segurança nas relações com o adulto e que se torne cada vez mais autônoma;
b) Que respeite os sentimentos e os direitos dos outros e que comece a coordenar diferentes pontos de vista (descentração e cooperação);
c) Que seja independente, esperto e curioso, que faça prova de iniciativa perseguindo suas curiosidades, que tenha confiança na sua capacidade de construir a sua própria idéia das coisas e que exprima o seu pensamento com convicção (idem).
O aspecto social compreende o elemento mais marcante na atividade lúdica da criança; nos anos seguintes será, sem dúvida, um dos componentes mais importantes do seu desenvolvimento. Deixando de lado o egocentrismo, a criança passa a usar a linguagem para coordenar atividades de grupo visando a algum objetivo comum. Os horizontes sociais da criança lentamente se ampliam: aos poucos, a curiosidade recíproca aparece e ela procura realizar trocas afetivas. O jogo paralelo vai cedendo lugar ao intercâmbio aberto.
Quanto mais a criança for tratada como indivíduo, com algo a oferecer à comunidade na qual se encontra (na qualidade de criança), mais útil poderá tornar-se; quanto mais se lhe permitir o uso da experiência direta, tanto melhor aprenderá a aprender; quanto mais puder participar da organização e da coletividade escolar, melhor enfrentará a solução de problemas, a tomada de decisões e melhor será sua possibilidade de agir em colaboração com os outros. Assim sendo, tanto mais adaptável se tornará às transformações da vida.
Ao desenhar, a criança registra a sua experiência subjetiva; aquilo que é significativo para ela naquele momento. Assim, não é o tema que importa, mas sim como ele foi trabalhado por ela. Seu trabalho nos oferece dados sobre a sua relação consigo mesmo e com o mundo, e sobre o seu desenvolvimento. O professor precisa estar consciente de que o importante não é o produto final e sim o processo vivenciado.
Quanto mais oportunidades de experimentar, de optar livremente por muitas possibilidades, mais aumentará a sua capacidade de se comunicar de forma autêntica.
É pelo processo de criação que a criança organiza seus pensamentos e sentimentos, confrontando-se constantemente com suas próprias experiências, aliviando-se de suas tensões e sobretudo capacitando-se para uma vida plena.
É importante para a criança participar de comunidades diferentes de sua família, experimentar contatos menos pessoais e intensos em seu relacionamento que possibilitam a relação com grupo de iguais. É por meio desse convívio que, ajudada pela professora, vai interiorizando as normas morais e éticas da sociedade.
O processo de apropriação da leitura e da escrita se dá no âmbito das atividades cotidianas simples e presentes na sala de aula e em todos os espaços escolares, independentemente de uma preocupação específica com a alfabetização.
Cuidados e dicas:
• Escreva sempre na presença das crianças. Não espere que elas estejam ausentes para preparar murais e cartazes. Elas precisam ver a escrita acontecendo, os movimentos e a dinâmica.
• Leia muito para elas, não apenas histórias (estas merecem um estudo à parte que faremos mais adiante), mas avisos que estejam espalhados pela escola, cartazes, propaganda, jornal, tudo o que despertar a curiosidade delas.
• Peça a elas que tragam "coisas para ler", isto é, tudo o que considerem leitura. Explore o material, faça descobertas, junto com elas. A resposta que você constrói com elas, organizando o pensamento e as idéias, depois da descoberta, será mais produtiva, mais criativa, e dificilmente será esquecida.
• Estimule-as a realizar escritas espontâneas, pois como já vimos nas aulas sobre a concepção construtivista, toda criança possui hipóteses acerca da escrita e da leitura. O que você precisa fazer é estimulá-las a expressar o que pensam.
• Toda a produção de escrita espontânea precisa ser contextualizada,ou seja, deve necessariamente referir-se às suas vivências, deve ser significativa.
• Não se esqueça de rever os níveis propostos por Emília Ferreiro para saber que a "escrita" das crianças varia de acordo com a faixa etária. Não exija nem espere de seus alunos além daquilo que eles são capazes de fazer, de acordo com sua etapa de desenvolvimento.
Cuidado!!!
Estimular a escrita espontânea não significa ficar, o tempo todo, fazendo diagnóstico dos níveis e provocar os desequilíbrios antes que a criança esteja disposta a prosseguir. Lembre-se de que o conceito de prontidão não cabe nesse processo. Portanto, não se trata de preparar a criança para a alfabetização. Trata-se de desenvolver as habilidades necessárias para que o processo de alfabetização se dê no momento em que a criança dominar o funcionamento do sistema de escrita.
Realizar o trabalho da Educação Infantil com seriedade requer estudo e conhecimento acerca do desenvolvimento infantil e dos processos pedagógicos necessários ao processo de aprendizagem, nessa faixa etária. A tarefa da Educação Infantil diz respeito à formação da criança em todas as suas dimensões: corporal, afetiva, cognitiva. O que alguns autores chamam de biopsicossocial. Nesse contexto, o desenvolvimento de habilidades necessárias à apropriação da leitura e da escrita passa a ser conseqüência e não a única meta do trabalho. Se a escola de Educação Infantil conseguir realizar um trabalho sério no desenvolvimento das crianças, já estará contribuindo, necessariamente, para o letramento e o processo de alfabetização.
PROFESSORA ALFABETIZADORA:
A formação da professora-reflexiva ou professora-pesquisadora tem sido um dos caminhos propostos, no campo da formação de professores, para a superação dos graves impasses enfrentados pela escola, dentre eles a produção de analfabetos e analfabetos funcionais.
Atualmente, o foco das reformas educacionais mundiais, como afirma o pesquisador americano Kenneth Zeichner (2002), volta-se para a preocupação não apenas com o acesso e permanência das crianças na escola, como também com a qualidade deste atendimento. Reaparece com força a premência de mudanças no que se refere às metodologias de ensino trabalhadas nas salas de aula, especialmente no campo da alfabetização que acumula os maiores índices de fracasso escolar.
Incorporando estudos e pesquisas realizadas ao longo das décadas, as propostas de mudanças incluem dentre outras questões: a valorização da experiência de vida dos alunos como ponto de partida para o trabalho escolar; o reconhecimento e a legitimação dos recursos culturais e lingüísticos trazidos pelos alunos, em vez de encará-los como déficits, e estímulo a uma participação maior dos alunos nos rumos da educação.
Mesmo sendo os professores os principais responsáveis pelas mudanças pretendidas, a abordagem dominante das reformas educacionais tem sido preparar/capacitar os professores para implementar propostas e executar metodologias produzidas por quem está fora da realidade da sala de aula. Não se espera que os professores sejam criativos ou autores, espera-se apenas que implementem currículos prescritos pelas Secretarias de Educação e sigam metodologias de ensino também prescritas.
Daí, a conclusão apontada ainda por Zeichner, “as mudanças qualitativas nas práticas de salas de aula somente ocorrerão quando os professores compreenderem e aceitarem como suas estas mudanças”. Em outras palavras, quando os professores forem reconhecidos como agentes ativos neste processo. Em função desta constatação cresceu nos últimos 20 anos, na literatura educacional, a discussão sobre a importância de se pensar a formação de professores como profissionais reflexivos que desempenham um papel central na condução do processo ensino-aprendizagem e na tomada de responsabilidade por seu próprio desenvolvimento profissional.
A idéia da professora como um profissional reflexivo surge a partir do reconhecimento dos saberes que estão presentes nas práticas dos bons professores. Isto significa que a prática reflexiva implica um processo de reflexão sobre a própria experiência que, na avaliação de Schön (1992), envolve três movimentos: o conhecimento-em-ação; a reflexão-em-ação e a conversa-reflexiva-com-a-situação.
O conhecimento-em-ação é o conhecimento construído e revelado no cotidiano. É um conhecimento não problemático, que emerge na própria ação, podendo ser observado e descrito.
A reflexão-em-ação acontece no decorrer da ação pedagógica e não se vale de palavras. No processo ensino-aprendizagem, ocorre, por exemplo, quando a professora é interrompida em sua explicação ou na orientação que está dando para alguma tarefa, para responder às perguntas inesperadas ou resolver problemas não previstos. Corresponde a uma investigação efêmera, que emerge e desaparece rapidamente, dando lugar a outro evento, mas deixando em seu rastro uma visão talvez mais clara da situação.
O terceiro movimento, a conversa-reflexiva-com-a-situação, acontece quando a professora/pesquisadora surpreende-se com algum obstáculo que a perturba e provoca incerteza. Busca então refletir e transformar a situação de modo a eliminar a incerteza.
No exercício da prática cotidiana, a professora se depara com problemas para os quais não tem resposta imediata, sendo forçada a buscar soluções, procurar alternativas, construir caminhos. Da prática emergem as questões, as necessidades e os caminhos para dar conta destas questões. É esse movimento de investigação e produção de conhecimentos que caracteriza a natureza pesquisadora da prática docente. Daí a importância de se pensar a qualificação da professora como pesquisadora, desde os Cursos de Formação, de maneira que se possa romper a tradicional dicotomia teoria e prática, percebendo-as numa perspectiva dialética, na qual os desafios da prática cotidiana promovem a busca por novos conhecimentos que por sua vez, transforma a prática inicial numa nova prática.

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