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AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO E TRANSPARÊNCIA ORGANIZACIONAL: UM ESTUDO EXPLORATÓRIO NUMA EMPRESA BENCHMARK DA BOVESPA William Barbosa Vianna (UFSC) wpwilliam@hotmail.com Leonardo Ensslin (UFSC) ensslin@deps.ufsc.br Lucas Dantas Freire (UFSC) lucasdfreire@gmail.com Gabriel Alba da Silva (UFSC) gabriel2102@gmail.com Marcos Valério de Castro Júnior (UFSC) marcoscastrojr@gmail.com O objetivo do artigo é investigar em que medida a transparência das informações divulgadas nos relatórios de gestão de uma empresa benchmark da BOVESPA, permitem operacionalizar as estratégias auto-declaradas de sustentabilidade. Utiliza-sse os Indicadores da Global Reporting Initiative (GRI) como categoria de análise e o Mapa Estratégico e o Painel do Balanced Scocecard (BSC) como instrumento para avaliar o desempenho. O resultado identifica uma alta ocorrência e frequência dos objetivos (90%), mas baixa aptidão para alimentar o BSC com indicadores, metas e iniciativas (20%). Palavras-chaves: Gestão Estratégica, Transparência Organizacional, Avaliação de Desempenho XXX ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO Maturidade e desafios da Engenharia de Produção: competitividade das empresas, condições de trabalho, meio ambiente. São Carlos, SP, Brasil, 12 a15 de outubro de 2010. 2 1. Introdução A temática da „transparência organizacional‟ vem ganhando relevância na agenda de pesquisa em estudos organizacionais. Após os escândalos envolvendo manipulações de balanço da Enron, WorldCom e Xerox, dentre outras, houve um aumento na preocupação das empresas com a divulgação dos resultados de suas operações. Entretanto, transparência pode significar muitas coisas, e sua operacionalização na gestão estratégica é uma tarefa complexa, que exige conceituação, explicitação de requisitos para alcançá-la, além de instrumentos de avaliação de desempenho adequados para medir sua efetividade no mundo real das operações. A avaliação da transparência organizacional em termos de gestão estratégica, além de atender as demandas crescentes dos stakeholders por informações consistentes, é capaz de potenciar uma gestão sistêmica, bem como promover melhores e mais acurados resultados, com ganhos inclusive em termos de imagem e comunicação com investidores, consumidores e com a própria sociedade. Nesse sentido, pergunta-se: em que medida a transparência das informações divulgadas nos relatórios de gestão em uma organização permitem avaliar a operacionalização das estratégias auto-declaradas de sustentabilidade? O objetivo do estudo é investigar a prática da transparência organizacional a partir de informações divulgadas nos relatórios de gestão, por um lado, e os objetivos auto-declarados de sustentabilidade, por outro, utilizando um instrumento de avaliação de desempenho que permita avaliar a efetividade na operacionalização de estratégias. Quanto à caracterização da pesquisa, Vergara (2003, p. 46) propõe dois critérios básicos para a classificação: quanto aos fins e quanto aos meios. Quanto aos fins, esse estudo é exploratório. Quanto aos meios, utiliza a análise documental de uma organização benchmark. São utilizados como dados primários, informações públicas e disponíveis nos relatórios de gestão dos últimos três anos (2006-2008) de uma organização de capital aberto, benchmark na Bolsa de Valores de São Paulo, do setor de cosméticos. A categoria utilizada para análise dos documentos é o framework de indicadores de sustentabilidade proposto pela Global Reporting Initiative (GRI), denominado Diretrizes G3. O instrumento para avaliar a efetividade na operacionalização das estratégias é o Balanced Scorecard (1997) de Kaplan e Norton. 2. Demandas, Conceito e Requisitos para Transparência Organizacional Diversas transformações organizacionais vêm sendo requeridas das empresas em seu relacionamento com seus stakeholders, no que se refere à transparência de suas ações e a publicação dos resultados financeiros e, sobretudo, não financeiros. Milano (2002) declara que uma empresa deve adotar uma conduta ética e responsável na plenitude das suas redes de relações, seja com consumidores, empregados, acionistas, governo, meio ambiente e comunidade em geral. Tachizawa (2002) alerta que os novos tempos se caracterizam por uma rígida postura dos clientes, voltada para a expectativa de interagir com organizações que sejam éticas, detentoras de boa imagem institucional no mercado e que atuem de forma ecologicamente responsável. 3 Bernardi (2003), por sua vez, enfatiza que o sucesso de uma empresa está diretamente relacionado à percepção do mercado quanto à imagem que ela cria, sendo que a sociedade participa de muitas questões ambientais, de cunho social, econômico ou político e o cliente está sendo informado constantemente, por meio da mídia, de muitas causas e efeitos da negligência empresarial que impacta sobre o meio ambiente. No caso do Brasil, Schommer e Fischer (1999), afirmam que a recente demanda por ética nos negócios realmente se intensificou no país especialmente a partir da criação do Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, em 1998. Para o Instituto Ethos (2005), de que adianta uma empresa ser a primeira no ranking do seu negócio, deter as melhores máquinas e tecnologia, se ela não puder contar com uma sociedade que compartilhe das mesmas perspectivas? Nesse contexto, tem sido utilizado o conceito de transparência organizacional. Entretanto, transparência pode significar muitas coisas, e sua operacionalização na gestão estratégica é uma tarefa complexa que exige primeiramente definição e explicitação dos requisitos das informações para que a mesma seja alcançada. Para fins desse estudo, adota-se o conceito de transparência de Capelli L. e Leite J. C. S. P. (2008), enunciado a partir de uma ampla revisão de literatura. A transparência no processo organizacional é a existência de políticas organizacionais que visam fornecer aos interessados informações sobre a organização segundo características gerais de acesso, uso, apresentação, entendimento e auditabilidade (CAPELLI & LEITE, 2008). Os autores apresentam ainda atributos para o alcance da transparência: Acessibilidade, Usabilidade, Informatividade, Entendibilidade e Auditabilidade. As relações hierárquicas entre esses atributos são representadas na figura 1. Figura 1: Requisitos da Transparência. Fonte: Capelli e Leite (2008) A evidenciação dos requisitos de transparência obedece a uma ascensão por graus hierárquicos de dependência, ou seja, não é possível atingir os patamares superiores se os requisitos inferiores não forem atendidos. Dessa forma, têm-se: 4 a) Grau 1 – Acessibilidade. A transparência é realizada através da capacidade de acesso. Esta capacidade é identificada através da aferição de práticas que implementam características de portabilidade, operabilidade, disponibilidade, divulgação e desempenho. b) Grau 2 – Usabilidade. A transparência é realizada através das facilidades de uso. Esta capacidade é identificada através da aferição de práticas que implementam características de uniformidade, intuitividade, simplicidade, amigabilidade e compreensibilidade. c) Grau 3 – Informatividade. A transparência é realizada através da qualidade da informação. Esta capacidade é identificada através da aferição de práticas que implementam características de clareza, acurácia, completeza, corretude, consistência e integridade. d) Grau 4 – Entendimento. A transparência é realizada através do entendimento. Esta capacidade éidentificada através da aferição de práticas que implementam características de composição, concisão, divisibilidade, dependência, adaptabilidade e extensibilidade. e) Grau 5 – Auditabilidade. A transparência é realizada através da auditabilidade. Esta capacidade é identificada através da aferição de práticas que implementam características de explicação, rastreabilidade, verificabilidade, validade e controlabilidade (CAPELLI & LEITE, 2008). E ainda, quanto à qualidade da informação têm-se: a) Informação completa: todas as informações estão disponíveis sem restrição; b) Informação objetiva: a informação responde diretamente às perguntas feitas; c) Informação confiável: a informação é correta, consistente e precisa; d) Informação de qualidade: a informação é correta, íntegra, consistente e precisa; e) acesso fácil à informação: o mecanismo usado para acessar tem tempo de resposta e funcionalidades adequadas; f) Compreensão da informação: a informação não causa dúvidas. Todos podem compreender; g) Canais totalmente abertos de comunicação: acesso livre e fácil às informações (ALÓ, C.C., 2009). Considera-se que o alcance da transparência organizacional em termos de gestão estratégica exige ainda, de forma adicional, políticas organizacionais que visem fornecer aos interessados informações: a) a identificação explícita dos objetivos estratégicos a serem alcançados e, b) quais os indicadores serão utilizados para avaliar a efetividade e o alcance dessas finalidades, uma vez que a transparência é um meio operativo para comunicar e alcançar um ou mais fins. Quanto aos objetivos estratégicos, esses podem ser os auto-declarados pela organização ou ainda auto-declarados a partir de algum framework pré-definido. Os objetivos são, dessa forma, categorias para analisar as informações, ou seja, se essas atendem àquilo que é buscado, conforme apresentado na seção 3. Quanto aos indicadores em escalas cardinais, propõe-se na seção 4 a utilização de um instrumento de avaliação de desempenho validado, considerado capaz de atender esse requisito. 3. O framework de indicadores do Global Reporting Initiative (GRI) como Categoria de Análise 5 Em nível internacional, diversas análises, avaliações e operacionalizações que buscam avaliar a transparência organizacional vem utilizando de forma destacada o framework de Diretrizes e indicadores da Global Reporting Initiative (GRI). A Global Reporting Initiative (GRI) é uma organização baseada em redes, pioneira no desenvolvimento de relatórios de sustentabilidade. Em 2010 a organização realiza na Holanda a Conferência Global em Sustentabilidade e Transparência 2010, com o tema “Repense. Refaça. Relate”. A conferencia debate sobre o modo como os relatórios de sustentabilidade podem se constituir em ferramentas eficazes de mudanças. O GRI desenvolveu um framework que define os princípios e indicadores que as organizações podem usar para medir e comunicar o seu desempenho econômico, ambiental e social. A base desse framework é o denominado Sustainability Reporting Guidelines, cuja terceira versão das Orientações, conhecida como as Diretrizes G3, foi publicada em 2006, e é um bem público e gratuito. A fim de assegurar o mais elevado grau de qualidade técnica, credibilidade e relevância, o sistema das Diretrizes do GRI foi desenvolvido por meio de um processo de obtenção de consenso com os participantes em nível mundial das empresas, sociedade civil, trabalhadores e instituições profissionais. Os indicadores essenciais foram desenvolvidos por meio dos processos multistakeholders da GRI, que visam identificar os indicadores geralmente aplicáveis e considerados relevantes para a maioria das organizações. Os indicadores adicionais, ou representam práticas emergentes, ou tratam de temas que podem ser relevantes para algumas organizações, mas não para outras. Os Relatórios de sustentabilidade com base na estrutura da GRI podem ser utilizados para o desempenho organizacional de referência no que diz respeito às leis, normas, códigos de normas, de desempenho e iniciativas voluntárias; demonstrar comprometimento organizacional para o desenvolvimento sustentável, e comparar o desempenho organizacional ao longo do tempo. As Diretrizes identificam as informações a serem divulgadas, que são relevantes e essenciais para a maioria das organizações e que são do interesse da maior parte dos stakeholders. Essas informações estão divididas em três categorias de conteúdo: a) perfil, b) forma de gestão e; c) indicadores de desempenho. Nas diretrizes encontram-se os princípios, que servem para assegurar a qualidade do relatório. As decisões relativas ao processo de preparação das informações no relatório deverão ser coerentes com esses princípios. Todos eles são fundamentais para uma transparência efetiva. São eles: a) equilíbrio, b) comparabilidade, c) exatidão, d) periodicidade, e) clareza e; f) confiabilidade. A GRI desenvolveu 79 indicadores, cujas categorias, incluídas nas Diretrizes, abordam os seguintes elementos: econômico, ambiental e social. O agrupamento econômico se refere aos impactos da organização sobre as condições econômicas de seus stakeholders e sobre os sistemas econômicos em nível local, nacional e global. Os indicadores econômicos ilustram o fluxo de capital entre diferentes stakeholders. O agrupamento ambiental se refere aos impactos da organização sobre sistemas naturais vivos e não-vivos, incluindo ecossistemas, terra, ar e água. Os indicadores ambientais abrangem o desempenho relacionado a insumos (como material, energia, água) e a produção (emissões, 6 efluentes, resíduos). Além disso, abarcam o desempenho relativo à biodiversidade, à conformidade ambiental e outras informações relevantes, tais como gastos com meio ambiente e os impactos de produtos e serviços. O agrupamento social é categorizado em termos de práticas trabalhistas, direitos humanos, sociedade e responsabilidade pelo produto e se refere aos impactos da organização nos sistemas sociais nos quais opera. Cada categoria inclui informações sobre a forma de gestão e um conjunto correspondente de indicadores de desempenho essenciais e adicionais. Entretanto, considera-se que as diretrizes e indicadores do GRI sejam genéricos e aplicáveis a um amplo espectro de países e organizações, não sendo seu escopo ser um instrumento gerencial específico para uma organização. Seu valor maior reside na sua capacidade de orientar ordinalmente e servir de parâmetro para análises, avaliações e operacionalizações que buscam evidenciar a transparência organizacional em relação à sustentabilidade, sendo necessária a sua contextualização no ambiente das organizações e ainda uma avaliação operacional da sua prática, tendo em vista o alcance de resultados. 4. Instrumento para avaliar o desempenho das estratégias auto-declaradas A definição do conceito de transparência, seus atributos e os requisitos para sua identificação nas informações divulgadas, tratados nas seções 2, bem como a definição de categorias de análise apresentadas na seção 3, representam condições necessárias, mas insuficientes para avaliar a transparência das estratégias auto-declaradas de sustentabilidade de uma organização. Faz-se necessário um adequado instrumento de avaliação de desempenho que contemple a verificação do desdobramento das estratégias em indicadores, metas e iniciativas reais. Ou que, ao menos, as informações disponíveis atendam os requisitos de transparência descritos na seção 2 e ainda o alinhamento com os objetivos (seção 3) de forma a permitir ao gestor, de forma clara, a sua operacionalização ou alimentaçãode um adequado instrumento para avaliação de desempenho. Na realidade da gestão, as organizações necessitam estabelecer relações reais entre os objetivos estratégicos e as ações operacionais e avaliar tal alinhamento. No entanto, observa-se que esse desdobramento ocorre, em geral, de forma empírica, sem auxílio de uma metodologia adequada. Falhas na comunicação dos objetivos estratégicos, indefinição de critérios quantitativos e qualitativos para estabelecer as ações operacionais e ausência de sistemática para acompanhar o processo de implementação das ações necessárias à consecução dos objetivos propostos, são geradores da baixa eficiência dos resultados (MOREIRA, 2002). Hacker & Brotherton (1998) afirmam que um efetivo sistema de indicadores deve propiciar capacitação aos administradores de uma organização para determinar se as atividades programadas ocorrem de fato na direção do atendimento dos objetivos da empresa. Considera-se, dessa forma, necessário escolher um instrumento reconhecido de avaliação de desempenho (AD), capaz de suportar a identificação dos objetivos, mensuração e projeção da transparência na gestão das operações em diversas perspectivas, financeiras e não-financeiras. Nesse sentido, esse estudo adota o Balanced Scorecard (BSC) de Kaplan e Norton (1997) que, embora seja um instrumento que necessite ainda desenvolvimento, tendo em vista algumas deficiências identificadas pela literatura especializada, possui uma estrutura consistente, destacando-se dentre os instrumentos que buscam operacionalizar estratégias. 7 Segundo Marinho (1999), o BSC obriga a organização a traduzir o que genericamente é dito em medidas específicas que realcem os fatores importantes. O Balanced Scorecard deve traduzir a missão e a estratégia da organização em objetivos e medidas tangíveis. As medidas representam o equilíbrio entre indicadores externos voltados para acionistas e clientes, e as medidas internas dos processos críticos de negócios, inovação, aprendizado e crescimento (KAPLAN e NORTON, 1997). Para Niven (2002), a predominância de medidas financeiras na Avaliação de Desempenho é inadequada, pois as atividades que criam valor nas organizações não estão presentes nos ativos tangíveis das organizações, e sim nos aspectos intangíveis. Para Ensslin et al. (2007) muitas foram as organizações que construíram sistemas de Avaliação de Desempenho centrados em processo de coleta de dados, por vezes até sofisticados. Porém o sistema não forneceu os resultados esperados, apesar de parecer tão bem planejado, programado e operacionalizado. Estava avaliando o que era fácil medir ou estava disponível em termos de dados, mas não o que era necessário medir. Considera-se que o BSC seja um modelo conceitual que traduz a visão de uma organização em um conjunto equilibrado de indicadores de desempenho, distribuídos em quatro perspectivas: financeira, do cliente, do processo interno e de aprendizado e crescimento, propiciando a formação de uma estrutura de mensuração e de um sistema de gestão eficiente, por meio do alinhamento sinérgico das unidades de negócios e de serviços compartilhados para a execução da estratégia (KAPLAN E NORTON, 1997). O BSC se propõe a: esclarecer e traduzir a visão e a estratégia; comunicar e associar objetivos e medidas estratégicas; planejar, estabelecer metas e alinhar iniciativas estratégicas; melhorar o feedback e o aprendizado estratégico. O input do BSC são as estratégias formuladas juntamente com a visão e a declaração de missão. O Mapa Estratégico permite organizar os objetivos estabelecendo entre si relações lógicas e auxiliam no entendimento da estratégia, e em como transformar ativos intangíveis em resultados tangíveis (KAPLAN & NORTON, 2000a, 2000b). Os Indicadores informam como é medido e acompanhado o resultado de cada objetivo. As Metas tratam do nível de desempenho esperado ou a taxa de melhoria requerida para cada indicador. E as iniciativas são as ações concretas, associadas às metas fixadas ao longo do tempo. São ações de intervenção para garantir que as metas sejam alcançadas. (KAPLAN E NORTON, 1997, 2000b). 5. O caso Natura A Natura foi selecionada intencionalmente para essa investigação considerando-se que: a) a empresa demonstra desempenho crescente no cenário nacional e internacional, b) declara adesão aos indicadores de sustentabilidade do GRI e, c) possui capital aberto na Bolsa de Valores de São Paulo (BOVESPA), publicando seus dados, d) auto-declara a crença no valor da “Transparência – Vive seus processos abertamente. É franca, à vontade” e, e) é aderente ao Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE) da BOVESPA. A empresa situa-se no setor da Indústria Brasileira de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos, que apresentou um crescimento médio deflacionado composto de 10,5% nos últimos 14 anos, tendo passado de um faturamento "ExFactory", líquido de imposto sobre vendas, de R$ 4,9 bilhões em 1996 para R$ 24,9 bilhões em 2009 (ABIHPEC, 2010). 8 Na análise setorial, segundo dados da Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (ABIHPEC), enquanto o PIB do país e das indústrias gerais em 2008 cresceu, respectivamente, 5,1% e 4,3%, o do setor das indústrias de cosméticos bateu 7,1%. A Natura foi criada em 1969 a partir de um laboratório e uma pequena loja em São Paulo, hoje a empresa possui cerca de 6,2 mil colaboradores. A Natura está presente no Brasil, Argentina, Peru, Chile, México, Colômbia e França, onde mantém uma loja e um centro- satélite de pesquisa e tecnologia. Na Bolívia, Guatemala, Honduras e El Salvador, atua por meio de distribuidores. Sua força de vendas é formada por mais de 1 milhão de consultoras, sendo 875 mil no Brasil e 160 mil no exterior. Com um faturamento bruto de 3,246 bilhões de Reais em 2005, superou a Avon, que no mesmo ano obteve um faturamento estimado de 3,1 bilhões de Reais, e que até 2004 era líder de mercado (CORREA, 2006). As vendas da companhia aceleram trimestre após trimestre. Ao final do ano de 2008, seu faturamento havia ultrapassado os 2 bilhões de dólares. E o lucro atingiu 191 milhões de dólares. A Natura também se destacou entre as demais fabricantes de bens de consumo na rentabilidade, com uma taxa de 36,9%, uma das mais altas desse mercado. A Revista EXAME escolheu a Natura como a Empresa do Ano em 2009, na 36ª edição de MELHORES E MAIORES. A maior fabricante brasileira de cosméticos ganhou o prêmio pela segunda vez por ter sido considerada uma das empresas que melhor atravessou a crise mundial. Entre os concorrentes da empresa incluem-se a Avon, Boticário, Seda, Nívea, Johnson & Johnson, L‟Oreal e outras empresas do setor de cosméticos. A Natura informou que seu lucro líquido encerrou 2008 em R$ 542,2 milhões, 17,3% acima do resultado de 2007. Já a receita líquida consolidada atingiu R$ 3,6 bilhões, 17,7% superior a de 2007, enquanto o Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização), de R$ 859,9 milhões, cresceu 22,5%. Segundo balanço divulgado, a empresa terminou o ano com R$ 350,5 milhões em caixa e um nível de endividamento líquido considerado baixo, equivalente a 0,11 vezes o Ebitda do ano (NATURA, 2010). A receita líquida das operações no Brasil foi de R$ 3,4 bilhões, crescimento de 16,3% em relação a 2007. A participação das operações internacionais na receita total da Natura representou 5,9% do total em 2008, ante 4,7% um ano antes (NATURA, 2010). Figura 2: Evolução da Receita Bruta da Natura 2003-2009 Fonte: Natura Em 2004 a Natura abriu seu capital na BOVESPA (Bolsa de Valores de São Paulo) e estálistada no Novo Mercado, nível mais elevado do índice de Governança Corporativa da 9 Bovespa. De uma maneira geral, a empresa em questão está bem posicionada, com pouco endividamento de curto prazo (Ativo Circulante sobre Passivo Circulante igual a 1,39). Ainda, a evolução histórica do preço de sua ação sugere que a empresa teve um crescimento consistente ao longo de sua existência, gerando dividendos e valor aos stakeholders mais atentos: os acionistas (NATURA, 2010). Figura 3: Evolução histórica da ação NATU3 Fonte: Cotações ADVFN No relatório denominado 1T10 (primeiro trimestre de 2010) pode-se observar os dados mais relevantes da empresa, como evolução das receitas, dos lucros, EBTIDA e endividamentos. Em comparação com o 1T09, houve um crescimento de 21,2% da Receita Bruta. O Lucro Líquido no mesmo período evoluiu em 2%, passando de R$138,7 milhões para R$141,6 milhões. Já a margem EBITDA, o indicador que mede o grau de capacidade de uma empresa em gerar capital com os recursos que obtém, evoluiu 29,5%, passando de R$188,1 milhões para R$243,5 milhões (NATURA, 2010). O Plano de Ação da NATURA contempla investimentos adicionais em marketing de R$ 400 milhões para o período 2008-2010. A lógica desse plano foi, por um lado, melhorar e aumentar os investimentos em marketing para acelerar o crescimento de vendas, financiado por ganhos de produtividade (NATURA, 2010). Em 2008 houve um investimento adicional de R$400 milhões em marketing e no modelo comercial. No primeiro semestre de 2008 as despesas adicionais em marketing cresceram R$26,0 milhões (NATURA, 2010). 5.1 Análise dos resultados A obtenção de resultados desse estudo se deu inicialmente por meio da construção do Mapa Estratégico do BSC que forneceu uma representação visual dos componentes da estratégia, organizados em torno das 6 áreas de abrangência propostas pelas diretrizes do GRI. Nessas áreas concentram-se um conjunto de 79 indicadores de sustentabilidade. Em seguida tratou-se de identificar ordinalmente a ocorrência e a freqüência dos indicadores propostos pelo GRI nos relatórios de gestão da Natura no período de 2006-2008. E finalmente verificou-se se os indicadores do GRI presentes nos relatórios de gestão da Natura como objetivos, dispunham de informações suficientes de indicadores, metas e iniciativas capazes de alimentar os painéis do BSC. 10 1º. Passo: O Mapa Estratégico Primeiramente, considerando-se o objetivo do estudo elegeu-se como estratégia-âncora para o Mapa Estratégico do BSC - a Transparência. Em relação às perspectivas do modelo clássico do BSC, a perspectiva “clientes” foi substituída por “stakeholders”. E como objetivos estratégicos foram dispostos nas perspectivas os 6 áreas que estruturam os indicadores do GRI, que são também auto - declaradamente assumidos pela NATURA. Missão: Criar e comercializar produtos e serviços que promovam o bem-estar/estar bem. Bem-estar é a relação harmoniosa, agradável, do indivíduo consigo mesmo, com seu corpo. Estar bem é a relação empática, bem-sucedida, prazerosa, do indivíduo com o outro, com a natureza da qual faz parte, com o todo. Visão: A Natura, por seu comportamento empresarial, pela qualidade das relações que estabelece e por seus produtos e serviços, será uma marca de expressão mundial, identificada com a comunidade das pessoas que se comprometem com a construção de um mundo melhor através da melhor relação consigo mesmas, com o outro, com a natureza da qual fazem parte, com o todo. Mapa Estratégico Estratégia âncora: Transparência Perspectivas Objetivos estratégicos Financeira Stakeholders Processos Internos Apredizagem & Crescimento Figura 4: Mapa Estratégico: Transparência Fonte: GRI. Natura. Elaborado pelos autores. O Mapa Estratégico estabeleceu a ligação entre as Diretrizes do GRI que, contextualizadas na organização, tornam-se objetivos a serem alcançados, em torno dos quais as estratégias podem ser operacionalizadas. No BSC tal operacionalização pode ser visualizada nos Painéis. 2º. Passo: Análise dos Relatórios: ocorrência e frequência dos indicadores do GRI O GRI propõe a utilização de 79 indicadores de sustentabilidade que se organizam em torno das 6 áreas dispostas no Mapa Estratégico. Em relação às perspectivas do BSC, ficam assim distribuídos tais indicadores: 9 na perspectiva financeira; 47 na dos stakeholders, 14 nos processos internos e 9 no aprendizado em crescimento. Responsabilidade pelo produto Trabalho decentes Práticas trabalhistas Desempenho Social Desempenho Ambiental Direitos humanos Desempenho Econômico 11 Tomando como categoria de análise os 79 indicadores G3 da GRI foram analisados os relatórios de gestão da Natura no período de 2006 a 2008 com vistas a identificar a evidenciação ordinal dos mesmos nos relatórios de gestão. Utilizando os requisitos da transparência da informação apresentados na seção 2, a tabela abaixo mostra o resultado da análise dos Relatórios de Gestão da Natura (2006-2008). Quadro 1: Indicadores GRI X Objetivos Natura Fonte: Relatórios de Gestão 2006-2008. Elaborado pelos autores. Em termos ordinais, o estudo identificou que a Natura adota 91% dos indicadores GRI em seus relatórios de gestão, sendo que, partir dessa adoção, esses passam a ser considerados objetivos da empresa. Os 72 objetivos identificados nos relatórios da NATURA (2006-2008) atendem, de maneira geral, os 4 requisitos da transparência: Acessibilidade, Usabilidade, Informatividade e Entendibilidade. Quanto à Auditabilidade, será necessário verificar a partir da alimentação dos painéis do BSC, onde é possível identificar, de fato, indicadores cardinais. Para alimentação inicial do Painel do BSC (campo 1 – objetivo), somente foram considerados os objetivos divulgados em ao menos 2 anos (66%) no triênio considerado (2006-2008). O resultado aponta os objetivos aptos a compor o campo 1 (objetivo) do painel do BSC, ou seja, que ocorreram em ao menos 2 relatórios: 9 objetivos na perspectiva financeira; 40 na perspectiva dos stakeholders, 14 nos processos internos e 9 na perspectiva do aprendizado e crescimento, num total de 72 objetivos. 3º passo: Informações completas sobre indicadores, Metas e Iniciativas Os 72 objetivos da Natura foram analisados quanto à transparência das informações necessárias para composição do painel do BSC, onde são dispostos não apenas os objetivos, esses já identificados, mas também os indicadores, metas e iniciativas que, por sua vez, conferem certa auditabilidade aos objetivos. Em outras palavras, tornam o objetivo passível de avaliação e operacionalização e, consequentemente de verificação da sua capacidade de operacionalizar estratégias e atingir os objetivos representados no Mapa Estratégico. Indicadores GRI OBJETIVOS NATURA Frequência de Objetivos > 2/3 2006 2007 2008 FINANCEIRA 9 7 8 9 9 STAKEHOLDERS 47 47 27 40 40 PROCESSOS INTERNOS 14 14 11 14 14 APRENDIZAGEM E CRESCIMENTO 9 9 7 9 9 12 Quadro 2: Objetivos Natura com Indicadores, Metas e Iniciativas Fonte: Relatórios de Gestão 2006-2008. Elaborado pelos autores. Na Perspectiva Financeira, dos 9 objetivos identificados, 1 atende à verificação da disponibilidade de informações quanto a indicadores, metas e iniciativas. Na perspectiva dos stakeholders, 9 dos 40 objetivos atendem à verificação. Na perspectiva dos processos internos, 2 objetivos dos 14, atendem à verificação. E na perspectiva da Aprendizagem e Crescimento,não foi encontrado objetivo com as informações necessárias. 5.2 Considerações Finais Do ponto de vista ordinal, no que se refere à formulação, ocorrência e freqüência de objetivos estratégicos, foram encontrados nos Relatórios de Gestão 2006-2008 da empresa analisada, 91% dos indicadores propostos pelas Diretrizes do GRI, num total de 72 objetivos. Gráfico 1: Objetivos NATURA aptos a operacionalização via BSC Fonte: Relatórios de Gestão. Elaborado pelos autores. Desses, aqueles considerados aptos para alimentar o instrumento de gestão utilizado no estudo, o BSC, foram encontrados 12 objetivos, ou seja, 17% dos objetivos auto-declarados de sustentabilidade já dispõem de informações completas, públicas e disponíveis, quanto a OBJETIVOS NATURA COM INDICADORES COM METAS COM INICIATIVAS COM INDICADORES METAS INICIATIVAS FINANCEIRA 9 8 1 1 1 STAKEHOLDERS 40 28 11 16 9 PROCESSOS INTERNOS 14 11 3 9 2 APRENDIZAGEM E CRESCIMENTO 9 1 0 1 0 13 indicadores, metas e iniciativas, sendo possível, por parte de um gestor genérico e não pertencente à organização, avaliar ou operacionalizar as estratégias auto-declaradas, considerando-as transparentes desde a formulação até a ação. Referências ABIHPEC. Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos. Disponível em: http://www.abihpec.org.br/index.php Acesso em 15 abr.2010. ALÓ, C.C. Uma Abordagem para Transparência em Processos Organizacionais Utilizando Aspectos. 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