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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO–UFMT FACULDADE DE ECONOMIA- FE DEPARTAMENTO DE ECONOMIA QUAL É O DETERMINANTE DA EXPANSÃO DA FRONTEIRA AGRÍCOLA MATOGROSSENSE NO PERÍODO 2001/2007: PRODUÇÃO AGRÍCOLA OU PECUÁRIA? José da Silveira Melo CUIABÁ –MT SETEMBRO/2009 José da Silveira Melo QUAL É O DETERMINANTE DA EXPANSÃO DA FRONTEIRA AGRÍCOLA MATOGROSSENSE NO PERÍODO 2001/2007: PRODUÇÃO AGRÍCOLA OU PECUÁRIA? Dissertação apresentada à Universidade Federal de Mato Grosso como requisito para obtenção do título de Mestre em Agronegócios e Desenvolvimento Regional, no Programa de Pós-Graduação em Agronegócios e Desenvolvimento Regional. Profº. Orientador(a): Dr. Arturo A. Z. Zavala CUIABÁ – MT SETEMBRO/2009 Melo, J. S. Dissertação: Qual é o determinante da expansão da fronteira agrícola matogrossense, no período de 2001/2007: Produção Agrícola ou Pecuária?/José da Silveira Melo, Cuiabá: FE, 2009. p. 112; 21 cm JOSE DA SILVEIRA MELO QUAL É O DETERMINANTE DA EXPANSÃO DA FRONTEIRA AGRÍCOLA MATOGROSSENSE NO PERÍODO 2001/2007: PRODUÇÃO AGRÍCOLA OU PECUÁRIA? Dissertação apresentada à Universidade Federal de Mato Grosso como requisito para obtenção do título de Mestre em Agronegócios e Desenvolvimento Regional, no Programa de Pós-Graduação em Agronegócios e Desenvolvimento Regional. Defesa Publica em: 25 de Setembro de 2.009 ( x ) Aprovado ( ) Reprovado COMISSÃO EXAMINADORA _______________________________________________________ Examinador Externo: Prof. Dr. Écio de Faria Costa Universidade Federal do Pernambuco (UFPE) _______________________________________________________ Examinador Interno: Prof. Dr. Lazaro Camilo Recompensa Joseph Faculdade de Economia (UFMT) _______________________________________________________ Orientador : Prof. Dr. Arturo Alejandro Zavala Zavala Faculdade de Economia (UFMT) DEDICATÓRIA Dedico este trabalho a minha esposa e meus filhos que sempre me apoiaram, estiveram presentes e acreditaram em meu potencial, me incentivando na busca de novas realizações. AGRADECIMENTOS A Deus, pela vida, pelos meus familiares, pelos meus amigos e meus professores pela sabedoria, força, proteção, inspiração, saúde e por todas as bênçãos que derramou sobre mim durante toda a minha existência; Aos meus pais, Antonio Costa Melo (in memorian) e Mercedes da Silveira Melo, por todo o apoio, dedicação, amor e por acreditarem em mim durante toda a minha vida, o meu mais profundo agradecimento; Aos meus irmãos por todo apoio e atenção dedicados a mim; Aos meus amigos, muito mais do que colegas de curso, por todo carinho, amor, companheirismo, pela alegria e pela espontaneidade na troca de informações e materiais numa rara demonstração de amizade e solidariedade; Ao meu orientador Profº Dr. Arturo pelo incentivo e presteza no auxílio às atividades e discussões sobre o andamento e normatização desta dissertação, mas sobretudo pela amizade e paciência. E a todos que de uma maneira ou de outra, foram instrumentos de conhecimentos, experiência, e colaboraram para o feliz êxito e conclusão do curso. “A preocupação com o homem e seu destino deve ser o principal interesse de toda pesquisa científica. Nunca a esqueça em meio a seus diagramas e equações”. Albert Einstein LISTAS DE ABREVIATURAS COOPERCOL- Cooperativa de colonização DETER - Detecção do Desmatamento em Tempo Real ECO 92 – Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária EMC – Estratégia Mundial para Conservação FBC – Fundação Brasil Central FPM – Fundo de Participação dos Municípios FUNBIO - Fundo Brasileiro para a Biodiversidade IBGE- Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ICMS – Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços INPE – Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais ISA – Instituto Socioambiental ONU- Organização das Nações Unidas PAM – Produção Agrícola Municipal PIN – Programa de Integração Nacional PPM- Pesquisa Pecuária Municipal PRODES – Programa de Cálculo e Desflorestamento da Amazônia SAD- Sistema de Alerta de Desmatamento SEMA – Secretaria de Estado do Meio Ambiente SEPLAN – Secretaria Estado de Planejamento e Coordenação Geral SIDRA – Sistema IBGE de Recuperação Automática UA – Unidade de Alocação Animal WWF- World Wildlife Fund Sumário 1. INTRODUÇÃO ....................................................................................................................15 2. MATO GROSSO E A EXPANSÃO DA FRONTEIRA AGRÍCOLA .................................20 2.1. HISTÓRICO DE OCUPAÇÃO RECENTE DO ESTADO DE MATO GROSSO ..................................20 2.1.1 Os militares e o surto desenvolvimentista ...................................................................26 2.1.2 Os latifúndios agropecuários ......................................................................................27 2.1.3 A divisão do Mato Grosso ..........................................................................................28 2.1.4 Os primeiros projetos de colonização .........................................................................28 2.1.5 Propriedades de diferentes tamanhos .........................................................................29 2.2. DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL SEGUNDO A ECONOMIA ECOLÓGICA ...........................31 2.2.1 Sustentabilidade Forte vs. Fraca ................................................................................32 2.2.2 Economia Ecológica vs Economia do Meio Ambiente .................................................33 3 – O AGRONEGÓCIO EM MATO GROSSO ......................................................................37 3.1 – PRODUÇÃO DE ALGODÃO HERBÁCEO ..............................................................................37 3.2 – PRODUÇÃO DE CANA DE AÇÚCAR ...................................................................................40 3.3 – PRODUÇÃO DE MILHO (1ª E 2ª SAFRA) .............................................................................42 3.4 – PRODUÇÃO DE SOJA EM GRÃO ........................................................................................44 3.5 – PRODUÇÃO DE CARNE BOVINA .......................................................................................46 4 – O PROBLEMA DO DESMATAMENTO ..........................................................................50 4.1 - DESMATAMENTO POR CORTE RASO ..................................................................................57 4.2 O DESMATAMENTO POR DEGRADAÇÃO FLORESTAL ...........................................................57 5- METODOLOGIA.................................................................................................................595.1 MATERIAIS E MÉTODOS .....................................................................................................59 5.1.1 Área de Estudo ...........................................................................................................59 5.1.2 Fontes de Dados .........................................................................................................61 5.1.2.1 Dados da Produção Agrícola Municipal do IBGE: ..................................................61 5.1.2.2 Dados da Produção Pecuária Municipal do IBGE: ..................................................61 5.2 METODOLOGIA ..................................................................................................................62 5.2.1 Tipo de pesquisa .........................................................................................................62 6. RESULTADOS E DISCUSSÃO ...........................................................................................66 6.1 CORRELAÇÃO ENTRE AS VARIÁVEIS...................................................................................66 6.2 ANÁLISE DE RELAÇÃO CAUSAL ..........................................................................................70 6.3 ANÁLISE DOS RESULTADOS ...............................................................................................73 7. CONSIDERACÕES FINAIS ................................................................................................77 REFERÊNCIAS .......................................................................................................................79 TABELAS Tabela 1 - Evolução da área de Produção de Algodão em caroço (2001-2007), em Hectares .............38 Tabela 2 - Evolução da área plantada de Cana de Açúcar (2001-2007), em hectares ..........................41 Tabela 3 - Evolução da área de Produção de Milho (2001-2007), em hectares ...................................43 Tabela 4 - Evolução da área de Produção de Soja (2001-2007), em hectares ......................................45 Tabela 5. Evolução da área de Pastagem para o rebanho bovino (2001-2007), em hectares ................46 Tabela 6– Incremento do desmatamento em Mato Grosso de 2001-2007 ...........................................50 Tabela 7 - Principais Atividades agrícolas para fins comerciais de Mato Grosso ................................61 Tabela 8 - Atividade Pecuária (Bovinos) de Mato Grosso .................................................................62 Tabela 9 – Correlação entre o Desmatamento e as principais atividades agropecuárias em Mato Grosso .........................................................................................................................................................66 Tabela 10 – Correlação entre o Desmatamento e as principais atividades agropecuárias na Mesorregião do Norte de Mato Grosso ..................................................................................................................67 Tabela 11 – Correlação entre o Desmatamento e as principais atividades agropecuárias na Mesorregião do Nordeste de Mato Grosso .............................................................................................................68 Tabela 12 – Correlação entre o Desmatamento e as principais atividades agropecuárias na Mesorregião do Sudoeste de Mato Grosso .............................................................................................................68 Tabela 13 – Correlação entre o Desmatamento e as principais atividades agropecuárias na Mesorregião do Centro Sul de Mato Grosso ..........................................................................................................69 Tabela 14 – Correlação entre o Desmatamento e as principais atividades agropecuárias na microrregião do Sudeste de Mato Grosso ..........................................................................................69 Tabela 15 – Relação entre o Desmatamento e Atividades do Agronegócio por Mesorregião usando o teste VAR Grander Causality/Block Exogenety Wald Test ................................................................71 Tabela 16 – Relação entre o Desmatamento e Atividades do Agronegócio por Município usando o teste VAR Grander Causality/Block Exogenety Wald Test ................................................................71 Tabela 17 – Comparativo da evolução das atividades agropecuária em relação ao Desmate em Mato Grosso ..............................................................................................................................................72 GRÁFICOS Gráfico 1 - Distribuição da Produção de Algodão Herbáceo por Mesorregião em Mato Grosso .........39 Gráfico 2 - Evolução da área de Produção de Algodão Herbáceo em Mato Grosso comparativo com a produção do Brasil ............................................................................................................................39 Gráfico 3 - Distribuição da área de Produção de Cana de Açúcar por Mesorregião em Mato Grosso..41 Gráfico 4 - Evolução da área de Produção de Cana de Açúcar em Mato Grosso comparativo com a área de produção do Brasil ...............................................................................................................42 Gráfico 5 - Distribuição da área da Produção de Milho por Mesorregião em Mato Grosso.................43 Gráfico 6 - Evolução da área da Produção de Milho em Mato Grosso comparativo com a produção do Brasil.................................................................................................................................................43 Gráfico 7 - Distribuição da área de Produção de Soja por Mesorregião em Mato Grosso ...................45 Gráfico 8 - Evolução da Produção de Soja em Mato Grosso comparativo com a produção do Brasil ..46 Gráfico 9- Distribuição da área de pastagem do Rebanho Bovino Mesorregião em Mato Grosso .......47 Gráfico 10 - Evolução da área de criação de Rebanho Bovino em Mato Grosso comparativo com a produção do Brasil ............................................................................................................................47 Gráfico 11- Distribuição da área desmatada por Mesorregião em Mato Grosso ................................51 Gráfico 12- Evolução da área de desmatamento em Mato Grosso comparativo com a produção do Brasil.................................................................................................................................................51 Gráfico 13 – Relação entre o Desmatamento e principais atividades produtivas em MT .....................70 Gráfico 14 – Evolução percentual das principais atividades agropecuária e do desmatamento em MT .........................................................................................................................................................72 FIGURAS Figura 1 - Municípios brasileiros que indicaram desmatamento, com destaque para a Amazônia Legal, o Arco do Desmatamento e a BR-163 - Brasil - 2002 ..........................................................52 Figura 2- Distribuição do desmatamento em áreas de florestas no Estado de Mato Grosso .................58 Figura 3 – Localização geográfica do estado de Mato Grosso ............................................................59 Figura 4 - Arco do desmatamento na Amazônia legal ........................................................................60 Figura 5 – Distribuição das principais produtos por Mesorregiões no Estado de Mato Grosso. ...........75 RESUMO O controle do desflorestamento na região amazônica tem sido nas últimas décadas umgrande desafio à humanidade. Suas conseqüências têm aberto inúmeras discussões e gerado a mobilização do Governo, comunidade científica e sociedade civil. Partindo desse pressuposto, o trabalho teve como objetivo analisar, se as variações das atividades produtivas do agronegócio exerceram efeito positivo ou direto sobre o desmatamento. E ainda, identificar qual foi a atividade ou atividades responsáveis pela expansão da fronteira agrícola nos municípios do estado de Mato Grosso no período de 2001 a 2007. O estudo fundamenta-se na abordagem do desenvolvimento sustentável (economia ecológica). Os resultados evidenciaram que a expansão da fronteira agrícola permitiu que alguns municípios de Mato Grosso se tornassem exportadoras de produtos primários para mercados nacionais e internacionais. Por exemplo, a soja é a commodity importante para o País, assim como os produtos: algodão, álcool, açúcar e milho e a pecuária; no entanto, não deveria ser visto como a principal solução da economia do país, e principalmente na região amazônica. No presente estudo observou-se que as atividades produtivas de Soja, Milho e Pecuária estão, de alguma forma, relacionadas com o desmatamento do Estado de Mato Grosso. No entanto é bem possível que não exista um único agente ou atividade econômica responsável pelo desmatamento no estado, mas sim um conjunto de fatores, como: política de ocupação do território, atividades agropecuária, abertura de estradas entre outras que poderiam ser melhor investigadas. Palavras-chave: Desenvolvimento Sustentável; produção agropecuária; desmatamento. ABSTRACT The control of deforestation in the Amazon region in recent decades has been a great challenge to humanity. Its consequences have opened numerous discussions and generated the mobilization of government, scientific community and civil society. Based on this assumption, the study aimed to examine if the variation of the productive activities of agribusiness exerted a positive effect on direct or deforestation. And yet, was to identify which activity or activities responsible for expanding the agricultural frontier in the municipalities of Mato Grosso from 2001 to 2007. The study is based on the approach to sustainable development (ecological economics). The results showed that the expansion of agricultural expansion has allowed some municipalities of Mato Grosso to become exporters of primary products for domestic and international markets. For example, the soy is an important commodity for the country, as well as products: cotton, alcohol, sugar and corn and cattle, however, should not be seen as the leading solution of its economy, especially in the region Amazon. In the present study showed that the productive activities of Soybean, Corn and Livestock are somehow related to deforestation of Mato Grosso. However it is quite possible that there is a single agent or economic activity responsible for deforestation in the state, but rather a set of factors, such as politics of land use, agricultural activities, opening of roads and others that could be better investigated. Keywords: Sustainable Development, agricultural production, deforestation 1. INTRODUÇÃO O presente trabalho tem como tema determinar a relação das atividades produtivas agrícolas e pecuárias com o desmatamento da cobertura vegetal do Estado de Mato Grosso, o qual está localizado na Região Centro Oeste Brasileira, que faz parte da Amazônia Legal. Na década dos 40, existiram intentos de se promover o desenvolvimento e progresso para o país que enfrentava um momento de crise política e econômica. Uma dessas propostas governamentais para o desenvolvimento do país foi a chamada “Marcha para o Oeste” (ISA, 2003) que vislumbrava promover o desenvolvimento e a modernização da região Centro- Oeste através da expansão e reprodução ampliada do capital, ou seja, um desenvolvimento pautado na agregação de valores capitalistas aos seus recursos naturais, o objetivo era de ampliar os núcleos habitacionais nessas regiões aproveitando melhor os recursos praticamente inexplorados dentro das próprias fronteiras políticas. Dentro desta proposta governamental de desenvolvimento do país, fica uma preocupação que surge nas últimas décadas: a sustentabilidade da região. Será que só o crescimento econômico e a extinção dos recursos naturais são políticas adequadas para a Região do Centro-Oeste? A preocupação no Brasil sobre a sustentabilidade do meio ambiente vem sendo intensa, já em 1992 o Brasil foi sede da Conferência sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro, conhecida como ECO 92, nela acordou-se entre os países participantes, a constituição de uma agenda de compromissos. No Brasil, a mesma foi denominada de Agenda 21. Um dos pontos estratégicos consistiu na gestão sustentável do Cerrado. Mato Grosso não fica longe dessa preocupação e através do governo de Mato Grosso foi elaborado o Plano de Desenvolvimento de Mato Grosso – MT + 20 em 2006, que contempla ações de conservação ambiental visando alcançar ao longo do horizonte de tempo do Plano, até 2026, o desenvolvimento sustentável do Estado. No Plano, o conceito de desenvolvimento sustentável tem três grandes pilares, articulados e complementares: a competitividade, condição para a inserção da região na dinâmica econômica nacional e mundial; a melhoria das condições de vida e redução das desigualdades sociais - como o grande objetivo de qualquer esforço de desenvolvimento; e a conservação ambiental, para 16 garantir a sustentabilidade da grande riqueza natural do Estado e contribuir para a qualidade de vida da população, assegurando-a como herança para as gerações futuras. Sendo o Estado de Mato Grosso parte da Amazônia Legal e situado geográfica e economicamente na Região Centro-Oeste, apresenta três grandes biomas distintos: Floresta, Cerrado e o Pantanal. O crescimento da economia do Estado foi realizado, num primeiro momento, por intermédio da pecuária e, em seguida, através dos cultivos da soja, milho, cana de açúcar e algodão, todos de maneira comercial. A soja é geralmente associada ao cultivo de Milho, e atualmente representa um dos elementos propulsores da economia do Estado. O progresso tecnológico permitiu a incorporação de novas áreas de cultivo, uma dinâmica de ocupação do espaço regional, combinando desmatamento com novas atividades produtivas. Esta dinâmica de crescimento econômico no estado de Mato Grosso tem gerado grandes preocupações com questões ambientais. A ocupação e o uso dos cerrados ao longo das últimas décadas em Mato Grosso vincularam-se à expansão da fronteira agrícola e, esta, por sua vez, à produção de grãos destinada à exportação (agronegócio), sobretudo, a soja, implementada através do desmatamento, da adoção de tecnologias intensivas em capital e em insumos físico-químicos e, particularmente, com baixa utilização de mão-de-obra. Essa expansão causou grandes pressões sobre os ecossistemas ao provocar desmatamentos e queimadas, erosão e compactação dos solos, contaminação da água por agrotóxicos, poluição dos recursos hídricos e redução do número de peixes dos rios e lagos. Nesse contexto, a economia de Mato Grosso vem se caracterizando pela predominância da produção agropecuária e, com maior abrangência, pela dinâmica do agronegócio, que opera com padrões internacionais de qualidade. O atrativo da economia do Estado não está no valor baixo da terra, mas sim nos elevados índices de produtividade, que já se igualam ou até ultrapassam os melhores do mundo, graças à combinação de solo, clima, disponibilidadede água e, naturalmente, tecnologias. Logo, em uma perspectiva estritamente econômica, a contribuição do agronegócio para o crescimento do PIB de Mato Grosso vem sendo acentuada. Esse fenômeno aconteceu fortemente na década de 90 e adentrou o Século XXI, sobretudo, conforme dito anteriormente, por meio da produção de soja. Entretanto, não contabilizado nos índices de crescimento, pode ser mostrado também o elevado e ascendente desmatamento no Estado. Onde a atividade agropecuária tem provocado grandes impactos socioambientais, como o processo de desmatamento da sua cobertura vegetal. Processo que na Amazônia legal como um todo, segundo a literatura especializada, Falesi e Veiga (1986), Castro (2004), 17 Margulis (2003), Young e Fausto (1998), e Barros et alli (2003), é causado principalmente por atividades como a pecuária extensiva e a agricultura em larga escala voltada à produção de grãos. Diante disso, surge uma grande preocupação que se desdobra num questionamento central para o desenvolvimento desta pesquisa, qual seja, saber se as atividades produtivas no agronegócio: Soja, Milho, Cana de Açúcar, Algodão e a criação de Bovinos estão correlacionadas direta e positiva com o processo de desmatamento em curso nos municípios que compõem o estado de Mato Grosso, que possui grandes áreas de terras incluídas no rol das áreas que apresentam maiores concentrações de focos de desmatamento, no denominado “arco do desmatamento” (IBGE, 2007). Sendo assim, a questão que se pretende analisar no decorrer desta pesquisa é: a variação da área de produção agropecuária (Cana de Açúcar, Algodão, milho, soja e pecuária) exerceu efeito positivo ou direto sobre o desmatamento? Com esse questionamento objetiva-se, de maneira geral, analisar os efeitos das atividades produtivas no agronegócio (produção de álcool, algodão, milho, soja e carne bovina) como uma nova face da expansão da frente pioneira, tem influenciado o desmatamento da região de Mato Grosso. E de maneira mais específica, objetiva-se analisar, se as variações das atividades produtivas do agronegócio exerceram efeito positivo ou direto sobre o desmatamento? E ainda, identificar qual foi à atividade ou atividades responsáveis pela expansão da fronteira agrícola nos municípios do estado de Mato Grosso no período de 2001 a 2007. Dessa forma, parte-se da hipótese que exista correlação positiva ou direta entre a produção de Algodão, cana de açúcar, milho, soja e pecuária sobre o desmatamento nos municípios de Mato Grosso, no período de 2001/2007 e ainda que a produção de Soja e criação de bovinos sejam as principais atividades do Agronegócio matogrossense, responsáveis pela expansão da fronteira agrícola. A presente pesquisa utilizou uma metodologia de caráter analítico-descritiva com uma abordagem qualitativa, pautada na utilização de procedimentos que buscaram coletar, minuciosamente, dados quantitativos e qualitativos acerca das atividades produtivas agrícolas e pecuárias realizadas nas 5 mesorregiões do estado de Mato Grosso, permitindo, com isso, a identificação do papel dessas atividades no processo de remoção da sua cobertura vegetal. Os procedimentos metodológicos foram adotados em quatro etapas complementares entre si. A primeira etapa, consistiu num levantamento e análise bibliográfica para conhecer a literatura sobre as principais atividades agropecuárias praticadas no estado de Mato Grosso, 18 identificando de que maneira elas vem sendo discutida. Além disso, buscando realizar uma atualização teórica que permita a execução de uma análise mais totalizante dos processos sociais que determinaram o surgimento dessa atividade, bem como, suas respectivas conseqüências socioambientais. A segunda etapa foi composta pelo levantamento dos dados secundários, junto ao INPE - DETER a fim de quantificar e identificar as áreas de desmatamento nos 141 municípios do estado de Mato Grosso no período de 2001 a 2007. Posteriormente, levando em consideração o relatório apresentado pelo IICA (2006), onde se apresentam os principais produtos do agronegócio Brasileiro em 2005, se encontrou que Mato Grosso é destacado pela produção de cinco das principais atividades (álcool (anidro e hidratado), algodão, milho, soja e carne bovina) resultando desta forma em crescimento econômico, tanto na produção interna, quanto na pauta de exportação. Para isto, se buscou junto ao IBGE – Sidra os dados da produção Agrícola e pecuária objeto deste trabalho, afim também de quantificar e identificar as áreas de produção agropecuária nos municípios matogrossense, no período em estudo. Ainda de forma complementar, foi realizada a coleta de dados junto aos anuários estatísticos da SEPLAN, devido a sua forma de apresentação agrupada em Microrregiões e Mesorregiões dos dados. A terceira etapa da utilização dos procedimentos metodológicos consistiu num momento de produção. A partir dos dados secundários obtidos Junto ao INPE, IBGE e SEPLAN, foram calculados os coeficientes de Pearson, afim de identificar a relação entre as atividades agropecuárias e o desmatamento nos 141 municípios de Mato Grosso. Na busca da confirmação dos resultados obtidos no primeiro teste, foi calculado o índice de Fator, e para tal foi utilizado o método multivariado de análise de Fator e em seguida foi realizada a análise de relação causal (método de cointegração) e para tal foi utilizado o método de Johansen. Por fim, a última etapa, foi constituída pela análise dos resultados obtidos ao longo da pesquisa, bem como, a sua sistematização no formato do presente trabalho. Esta pesquisa foi estruturada em sete capítulos. Neste primeiro capítulo é apresentado a introdução da pesquisa. O segundo capítulo consiste numa discussão teórica sobre o processo de ocupação do território matogrossense, que determinou o surgimento das atividades agrícolas e pecuária de forma empresarial nos municípios de Mato Grosso, que vem influenciando a remoção da sua cobertura vegetal através do desmatamento. Este capítulo foi construído a partir de um breve histórico da recente ocupação de Mato Grosso, para entender a produção e apropriação do 19 espaço pelo capital e ainda a partir de conceitos de desenvolvimento sustentável focando a economia ecológica. Utilizou-se, também, o conceito de Amazônia Legal enquanto um espaço de “fronteira” (SAWYER, 1983; BECKER, 1997), produzido, especificamente, pelas “frentes”(SAWYER, 1983), que tem causado grandes impactos socioambientais nos municípios do Estado de Mato Grosso, levando-o a se localizar entre as áreas que concentram maiores focos de desmatamento, que compõem o denominado “arco do desmatamento”. O terceiro capítulo refere-se à espacialização das atividades do cultivo do algodão herbáceo, cana-de-açúcar, milho, soja em grão e criação de bovinos nas mesorregiões de Mato Grosso, em que é mostrado a representação da produção agrícola e pecuária na economia do estado em relação à produção nacional. Além disso, mostra-se como está distribuída a produção agrícola e pecuária nas mesorregiões do estado de mato grosso. O quarto capítulo consiste em fazer uma breve reflexão sobre a problemática do desmatamento neste estado, diante da globalização e da crescente demanda de grãos e carnes, pelos mercados nacionais e internacionais. No quinto capítulo são apresentadas as metodologias do trabalho, inicialmente é apresentada a área de estudo composta pelos 141 municípios do estado de Mato Grosso, agrupados em 5 mesorregiões e ainda a fonte dos dados. Foi utilizada a pesquisa quantitativa e uma complementar qualitativa. No Sexto, são apurados os resultados com auxilio das ferramentas estatísticas eeconométricas tais como o software Excell, Minitab e do EVIEWS V. 5.1.0 e posteriormente é realizada a discussão dos resultados de forma quantitativa interpretando os resultados apurados pelo coeficiente de Pearson, método multivariado de análise de Fator e a análise de relação causal (método de cointegração) método de Johansen. Por fim, concluí-se trabalho ressaltando a importância de se considerar as atividades agrícolas e pecuária como sendo fator de determinação da intensa pressão sobre as áreas florestadas dos municípios, por meio do desmatamento voltado para a produção de grãos e carnes com fins comerciais. 20 2. MATO GROSSO E A EXPANSÃO DA FRONTEIRA AGRÍCOLA 2.1. Histórico de ocupação recente do estado de Mato Grosso Não obstante, o Estado de Mato Grosso ter uma história de ocupação complexa, pode-se dizer que este surge no cenário brasileiro a partir do avanço da frente pioneira paulista, em meados do século XX. Primeiro provocou a ocupação no norte do Paraná e depois extravasou para o sul do antigo estado do Mato Grosso com a pecuária de corte e em seguida, nos anos 60, com a entrada de gaúchos e paranaenses que se dedicavam à cultura do trigo e da soja (IPEA/KRONKA, 1997). Segundo o ISA (2003, p.05) a evolução do processo de ocupação do território matogrossense tem início nos anos de 1940: Essa história começou nos anos 1940, quando o presidente Getúlio Vargas criou a Marcha para Oeste. O objetivo era desbravar uma parte do Brasil, até então desconhecida e isolada do contexto nacional, e realizar obras de infra-estrutura para permitir sua ocupação por não-índios e integrar economicamente o Centro-Oeste ao Norte e Sul do país. Ainda o ISA (2003, p.05), complementa dizendo que o processo de ocupação de Mato Grosso se dá inicialmente pela região leste do Estado: A partir de 1946, a FBC começou a se instalar na região leste do Mato Grosso e iniciou-se o trabalho dos irmãos Villas Boas, indigenistas, integrantes da Expedição Roncador-Xingu. A missão dos Villas Boas era contatar grupos indígenas que vivessem nos locais onde seriam implementados os núcleos de desenvolvimento e levá-los para outros lugares. Essa missão se estendeu pela década de 1950 e início dos anos 1960 e foi acompanhada por uma forte campanha para demarcar e proteger as Terras Indígenas da região. Doze anos depois, em 1964, era criado o Parque Indígena do Xingu. No período 1950-1985, a evolução do processo de ocupação do território matogrossense foi intensa. A partir de uma ocupação extremamente rarefeita, vigente no início da década de 50, num período de 35 anos o número de estabelecimentos rurais cresceu mais de 15 vezes, com apropriação privada de novos 30,8 milhões de ha (mais de quatro vezes o estoque inicial). Com base em dados do IBGE pode-se verificar que a taxa de ocupação do território estadual elevou-se de 7,8%, em 1950, para 18,6%, em 1970, atingindo 42,9% da extensão territorial no final do período (1985). A intensificação do processo de ocupação, ocorrida pós anos 70, conforme analisado, deveu-se em grande parte pela intervenção governamental dirigida à Amazônia e ao Centro- 21 Oeste, que induziu o avanço da fronteira agrícola no Estado e nas regiões, bem como dos processos econômicos correlatos. No entanto, a forma e a dinâmica desse processo não podem ser atribuídas exclusivamente aos resultados da intervenção estatal, já que no avanço da fronteira agrícola estão envolvidos, em distintos momentos, diferentes agentes sociais sob relações sociais de produção também diferenciadas, interagindo com diferentes formas de apropriação do espaço e disponibilidade de recursos naturais. Além disso, o processo de apropriação de terras pelo capital privado, sendo sensível, com maior ou menor intensidade, aos estímulos derivados de decisões/intervenções governamentais explícitas, é também sobre determinado pela divisão inter-regional do trabalho do país e pelas condições vigentes no mercado mundial. Muitos estudos realizados sobre a expansão da fronteira agrícola nas regiões Norte e Centro-Oeste do país, revelam a complexidade das forças e interesses sociais envolvidos no processo. Ponto comum nestes estudos é a compreensão de que a fronteira é, basicamente, uma “área potencial”, considerada como um espaço que oferece condições à expansão de atividades econômicas e múltiplas possibilidades de desenvolvimento. Neste contexto SAWYER (1983), argumenta que a expansão das atividades agropecuárias ocorre num espaço onde os mercados de fatores, de terras e de produtos funcionam, pelo menos potencialmente. Já, BECKER (1997), destaca o caráter original do processo de expansão da fronteira no espaço da “Amazônia Legal” brasileira, ressaltando a dinâmica extremamente acelerada em que se sucedem as inovações neste espaço e a urbanização que acompanha o processo de interiorização das atividades produtivas. Sem recorrer a simplificações demasiadas de um processo que se manifesta extremamente complexo, com base nos diversos estudos realizados, algumas generalizações podem ser feitas sobre a expansão dessas áreas de fronteira, em relação aos movimentos que ocorrem a nível dos espaços incorporados. Muitos autores, dentre eles SAWYER (op.cit.), no interior desse espaço há surtos de atividades, denominadas frentes, que avançam ou se retraem, em resposta às mudanças de seus elementos determinantes. Essas frentes, segundo o autor referido, podem ser englobadas em quatro categorias: “frente de agricultura comercial, impulsionada por mercados do núcleo dinâmico da economia e afetadas por políticas de incentivo e pela expansão da infra-estrutura”; 22 ”frente de agricultura de subsistência ou camponesa moldada pela dinâmica demográfica e por fatores econômicos e sociais decorrentes do estilo de desenvolvimento prevalecente”; ”frente especulativa com atividades objetivando ganhos especulativos, tornados possíveis, em grande parte, por políticas de ocupação de áreas novas”; ”frentes de pecuária extensiva e rudimentar”. No âmbito do Estado de Mato Grosso e também da região Centro-Oeste, pode-se reconhecer as frentes apontadas por SAWYER, destacando-se que, em Mato Grosso, a diversidade de ecossistemas existentes foi também um elemento definidor das formas de apropriação estabelecidas, na medida em que induziu a adoção de determinados sistemas de produção, pelo lado das potencialidades ou das restrições do ambiente natural. Sob uma base natural diversificada, a organização das frentes de expansão fez surgir um conjunto variado de formas de apropriação do espaço agrário, tornando-se estas também responsáveis pela transformação da paisagem natural do Estado. Essa transformação implicou, não somente, na organização de um setor primário dinâmico, baseado numa gama variada de produtos (extrativos vegetais, agrícolas, pecuários etc.), mas também num leque de impactos sócio-econômicos e ambientais de natureza e intensidade diversas. A perda de posição da atividade pecuária em pastagem nativa para a atividade de lavoura e, ao mesmo tempo, a expansão das tecnologias modernas de produção - em especial, pastagens cultivadas - em detrimento dos sistemas extensivos tradicionais. A pecuária tradicional, ao longo dos anos, demonstrou ser uma atividade com elevada capacidade de inserção no contexto das potencialidades econômicas e ecológicas do Mato Grosso, embora sem promover o crescimento populacional e o surgimento de um mercado interno importante.A viabilização das frentes de expansão pecuária tradicional esteve atrelada, historicamente, à conjunção de três fatores básicos: especulação imobiliária,obtenção de créditos facilitados e boa rentabilidade face à baixa inversão de capital, necessária à manutenção da atividade. Embora esses fatores cumpram ainda um papel importante na viabilização desse modo de ocupação, ao longo da última década, a capitalização do setor tem diminuído a capacidade de sustentação econômica da exploração pecuária tradicional. Além disso, não dispondo mais dos recursos favorecidos de programas como os da SUDAM, a rentabilidade da atividade tende a ser mais dependente da intensificação do uso de capital, dados os ajustes necessários à inserção da pecuária no processo de modernização, imposto pela internacionalização dos mercados. 23 Diante desse quadro, é provável que a pecuária extensiva continue a sustentar um ritmo de crescimento significativo, apoiando-se nas áreas de expansão de fronteira e incorporando áreas anteriormente ocupadas por atividades agrícolas tradicionais, mas inviáveis do ponto de vista econômico, como se constata pelo processo de “pecuarização” ocorrido em muitas das áreas destinadas a assentamentos de agricultores no Estado. A expansão pecuária trazem consigo um rastro de profundas alterações no ambiente natural. Organizadas por grandes empreendedores, essas frentes, na maior parte das vezes, promovem extensos desmatamentos. Além disso, na medida que avança o processo de modernização da pecuária no meio rural, as atividades extensivas tendem a perder competitividade, o que as força a adotar processos produtivos mais intensivos e, portanto, mais agressivos ao meio ambiente. É o caso da melhoria da capacidade de suporte das pastagens, valendo-se da implantação de pastagens cultivadas, que substituem a riqueza da biodiversidade dos ecossistemas florestais e dos cerrados por paisagens homogêneas, onde dominam as pastagens do gênero Brachiária. Ressalte-se também a execução de obras para atenuar a influência “negativa” do regime hídrico dos rios (como exemplo a construção de diques em algumas fazendas do pantanal sul matogrossense). A pecuária extensiva dos pantanais tem uma feição diferenciada, constituindo-se numa atividade econômica tradicional do Estado desde o início de sua ocupação. Pouco alterou as condições primitivas onde se instalou, ou seja, manteve em grande parte a constituição original do meio natural e não adensou a população, via constituição de núcleos urbanos significativos ou geração de empregos no meio rural. Os pantanais, por possuírem pastagem nativa em abundância e estarem sujeitos a inundações freqüentes, oferecem fortes restrições a outros tipos de ocupação, sendo apropriados inteiramente pela pecuária extensiva. Cabe ressaltar que as pastagens naturais apresentam, no entanto, baixa capacidade de suporte animal (cabeças/ha), sendo necessárias grandes extensões de área para se efetivar a atividade de maneira rentável. Assim, a viabilização desse tipo de ocupação vem se apoiando na constituição de grandes fazendas, onde a disponibilidade do fator terra a baixo preço, é determinante, assim como a pouca utilização de capital na condução da atividade. Entretanto, na medida em que as condições de mercado passem a exigir da pecuária ganhos de produtividade, a estabilidade da pecuária extensiva de pantanal tende a ser afetada. A expansão da agricultura manifesta uma forma de apropriação do espaço mais diversificada, diferenciando-se entre agricultura tradicional, com base na unidade familiar e agricultura empresarial (principalmente soja/milho), que se estende até a implantação de 24 unidades agro-industriais voltadas para o processamento de matéria-prima local (basicamente cana-de-açúcar, soja, algodão, milho e carnes). No entanto, a diversificação das explorações é ainda pouco significativa, tendo ocorrido, num primeiro momento, o monocultivo da soja, com destaque para o uso intensivo de capital (pacotes tecnológicos). Paralelamente ao desenvolvimento da sojicultura, desenvolveu-se a pecuária de corte, conduzida por pecuaristas de médio e grande porte, com baixo uso de técnicas modernas. De maneira geral, a agricultura empresarial localizou-se nas áreas planas dos cerrados, cujos solos são potencialmente de boa qualidade. A pecuária, além de estar também neste tipo de ambiente, tende a ocupar áreas mais antigas, anteriormente exploradas pela agricultura tradicional, ou expande-se para a região de fronteira de ocupação, em áreas onde as condições ecológicas, e/ou o fator distância (fretes), são desfavoráveis à grande empresa de exploração agrícola. O desenvolvimento e a viabilização de apropriação sustentam-se, por um lado, nas próprias transformações derivadas do processo de internacionalização e modernização da agricultura matogrossense e por outro, na estabilização, em um certo patamar, das relações de interdependência e complementaridade entre os diversos tipos de agentes econômicos envolvidos. Isso não quer dizer que o processo de ajuste e estabilização seja necessariamente harmônico ou o mais “adequado”. Ao contrário, pressupõe relações de subordinação entre os agentes, gerando desequilíbrios sociais, por vezes significativos, podendo-se citar o exemplo do surgimento de “bóias frias” nas regiões produtoras de cana. Esse modelo de ocupação, na medida em que privilegia a agropecuária de caráter empresarial e as cadeias agro-industriais associadas aos produtos de mercado externo (soja, cana-de-açúcar e carnes) tende a adequar-se às normas e padrões determinados pelos mercados nacionais e internacionais, inclusive quanto à mitigação dos impactos ambientais derivados. Além disso, o monocultivo da soja tem se desenvolvido às expensas de grandes áreas de um ecossistema de extrema importância, os cerrados, cuja biodiversidade desaparece em ritmo acelerado. As regiões dos conhecidos chapadões são as que mais se deterioram. Providas de extensas áreas planas, facilmente mecanizáveis, com solos de bom potencial agrícola, essas áreas vêem suas paisagens ser totalmente homogeneizadas, com base em um único cultivo agrícola. Nessas áreas, são desrespeitados alguns princípios básicos da 25 preservação ambiental, como é o caso da manutenção das matas ciliares e a manutenção da integridade das áreas de cabeceira das drenagens (pode-se citar o exemplo da realização de obras de drenagem das áreas de cabeceira, situadas ao longo da BR-163, entre os municípios de Nova Mutum e Lucas do Rio Verde). Finalmente, como conseqüências do processo de modernização e agroindustrialização da agricultura, tem-se os riscos do surgimento de novas pragas e doenças nas lavouras (como exemplo o nematóide do cisto da soja) e o lançamento de efluentes contaminantes nos corpos d’água, pelos processos industriais. A agricultura familiar, por sua vez, predomina em áreas de colonização ou ocupação espontânea (assentamentos de trabalhadores rurais), organizando-se em torno da produção de culturas tradicionais (arroz, feijão, milho e mandioca), da pequena pecuária, da produção leiteira e secundariamente, de algumas poucas culturas comerciais (café, cacau, banana e algodão). Trata-se de uma agropecuária caracterizada pelo modesto uso de insumos e técnicas modernas, muitas vezes direcionadas praticamente à subsistência da unidade familiar. Desde o final da década de 1980, inúmeros projetos de assentamentos de trabalhadores sem-terra vêm sendo localizados nas áreas de florestas e de transição, ao norte do Estado. Além das condições de fertilidade dos solos não serem as mais adequadas, a ausência de uma infra-estrutura viária e de apoio à produção (armazenagem, crédito, escolas etc.), específicas para esse tipo de agricultura, somente faz aumentar os condicionantesdesfavoráveis à sua viabilização. Resultado disso é a forte tendência à descapitalização dos pequenos produtores, tendo como conseqüência última, a sua expropriação e a pecuarização da área e reconcentração fundiária. O MMA (2007, p.04) diagnostica que: Do ponto de vista ambiental, os sistemas de produção utilizados, baseados na exploração diversificada de pequenas extensões de terra, praticamente sem fazer uso de técnicas de manejo do solo, além do excessivo número de produtores instalados nessas áreas (em relação à sua capacidade de suporte), provocam degradação dos solos e intensos desmatamentos, com sérias conseqüências sobre os ecossistemas locais. E ainda o MMA (2007, p.04) conclui que: A exploração madeireira, por sua vez, acompanha as frentes de abertura de novas áreas, vinculadas a colonização/assentamentos ou a grandes empreendimentos pecuários, nas regiões florestais do extremo norte do Estado, no ambiente de transição para a Floresta Amazônica. As regiões florestais localizadas na porção sul do Estado já se encontram excessivamente exploradas, não se verificando atividade madeireira significativa. Em alguns casos, no entanto, a atividade madeireira assume o caráter principal, associada a um organizado setor agro-industrial (complexo de serrarias e unidades moveleiras). 26 O setor madeireiro confere forte dinamismo às regiões onde se instala, seja pela agregação de grandes contingentes populacionais (cidades e empregos) ou pela movimentação de um grande volume de recursos financeiros. No entanto, dado o próprio caráter do extrativismo florestal, a sustentabilidade da atividade madeireira tende a ser limitada pelo esgotamento do recurso florestal. Não se observa, pelo menos em escala significativa, resultados satisfatórios quanto a modelos não predatórios de exploração do potencial madeireiro do Estado. A exploração madeireira ainda se apóia em formas tradicionais, onde se destaca o corte puro e simples da vegetação, com aproveitamento apenas das espécies nobres e queima das demais, ou no corte seletivo de espécies nobres dentro do maciço florestal. Os impactos ambientais advindos da exploração madeireira são drásticos. No caso dos cortes sistemáticos da vegetação, o que se tem é a supressão total da biodiversidade, e no caso do corte seletivo, um grau de perturbação ambiental ainda não devidamente avaliado. Apesar de a soja ser o vetor mais recente da degradação ambiental no estado de Mato Grosso, o passivo ambiental da região já existia. Está associado à história de ocupação do estado de Mato Grosso, marcada pelos projetos da Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam), criada em 1966, pelos projetos de colonização do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) e de empresas particulares. O resultado foi a intensa especulação de terras, desencadeada com força na década de 1960, e o incentivo ao desenvolvimento agrícola e pecuário, sem qualquer tipo de cuidado ambiental, o que gerou um quadro de expressiva degradação ambiental. Para se ter uma idéia, dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) mostram que a área desmatada no Mato Grosso passou de 920 mil hectares em 1975 para 6 milhões de hectares, em 1983 e em 2000 para 146 milhões de hectares, já em 2007 esses números se elevaram para 201 milhões de hectares. 2.1.1 Os militares e o surto desenvolvimentista Logo após o golpe militar de 1964, o presidente Castelo Branco instituiu a Operação Amazônia, estratégia que visava introduzir um modelo de desenvolvimento econômico na região amazônica, com base em obras de infra-estrutura – como a abertura de rodovias - e em incentivos fiscais e créditos à iniciativa privada. Entre as diretrizes estabelecidas, merece destaque a criação da Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM), que seria a partir daquele momento e até o final dos anos 1980 o principal norteador da ocupação 27 da região a leste do Xingu por grandes projetos agropecuários. Extinta em fevereiro de 2001 sob uma enxurrada de denúncias de desvio de dinheiro público, acaba de ser recriada, em novas bases, pelo governo Lula. No relatório do MMA (2007, p.06) pode-se perceber que os ciclos de expansão e modernização da economia do Estado de Mato Grosso deve-se em parte ao “Programa de Colonização Dirigida” implementado na década de 70: A política de integração nacional adotada nos anos 70, num esforço para garantir mecanismos fiscais e financeiros que o capacitassem a abrir fronteiras de acumulação, a serem ocupadas através de ajustes negociados entre empresas estatais, multinacionais e nacionais ( “Programa de Colonização Dirigida”). Se até a década de 1950, grande parte das áreas de floresta amazônica e de cerrados no norte do estado do Mato Grosso estava bem preservada e praticamente intacta, já nos anos 1960 a estratégia do governo federal de intensificar a ocupação na região, gerou os primeiros desmatamentos no leste e norte do Estado. A ocupação da região das nascentes do Rio Xingu - e do norte do Mato Grosso – não se restringe, no entanto, aos grandes empreendimentos agropecuários. O outro eixo da estratégia de ocupação e desenvolvimento da região foi a política de colonização, que era dirigida pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) e contava com incentivos fiscais da Sudam para projetos privados de colonização. Essas iniciativas foram implementadas nas décadas de 1970 e 1980, destinadas ao assentamento de pequenos produtores do sul, à produção de lavouras alimentares (arroz, milho e mandioca) e ao desenvolvimento da pecuária bovina. Os projetos de colonização, principalmente os de caráter privado, tornaram-se marcos importantes na formação de cidades. 2.1.2 Os latifúndios agropecuários Apesar de todos os programas governamentais de desenvolvimento do Estado de Mato Grosso estarem de uma forma ou de outra associados ao estímulo ao latifúndio agropecuário, a política empreendida pela Sudam foi a principal responsável pelo avanço da fronteira agrícola e das grandes propriedades rurais nos municípios mato-grossenses. O FBOMS (2005, p.05) relata que uma das conseqüências do avanço da fronteira agrícola é o latifúndio: Uma das conseqüências do processo de expansão da fronteira agrícola na região Centro-Oeste e Norte é a concentração fundiária, de renda e dos sistemas produtivos - grandes fazendas de gado e monoculturas mecanizadas (caso da soja) - com a subordinação dos padrões culturais e produtivos das comunidades locais e regionais, ao padrão conduzido pelos novos atores sociais, de modo geral imigrantes de outras 28 regiões, com acesso a capital e tecnologia. Este processo tem levado ao aumento do deslocamento de pequenos colonos, em razão de conflitos sociais ou da compra de lotes, resultando em novas fronteiras locais e acrescido desmatamento. Os Programas de ocupação funcionavam basicamente por meio de financiamentos concedidos pelo governo para empresas que estavam dispostas a ocupar e produzir na região leste e norte do Mato Grosso, tendo como enfoque principal a criação de gado. Para se ter uma idéia, a Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável, uma ONG formada por empresas privadas, que presta serviços ao Funbio e à ONU, revela que até 1985 foram aprovados pela Sudam 950 projetos em toda a Amazônia. Desses, 631 eram de pecuária. Além disso, 44% dos créditos da Sudam eram destinados a essa atividade, somando US$ 700 milhões até 1985. Outra questão é o tamanho médio das fazendas beneficiadas pela Sudam que era de 24.000 hectares. No total, o governo financiou a compra de 8,4 milhões de hectares de terras em toda a Amazônia. A regiãoleste do Mato Grosso, que compreende as bacias dos rios do Xingu e do Araguaia foi a que recebeu os maiores incentivos concedidos. 2.1.3 A divisão do Mato Grosso De acordo com a FAMATO -Federação da Agricultura do Estado do Mato Grosso, a grande importância da Sudam como financiadora do desenvolvimento agropecuário no Estado se tornaria ainda maior a partir do ano de 1977, quando se iniciou a formação do pólo produtor de commodities agrícolas, no norte mato-grossense. Nessa ocasião aconteceu a divisão territorial e administrativa do antigo estado do Mato Grosso, dando origem ao estado de Mato Grosso do Sul. Diante da necessidade de ocupação das regiões do Médio-Norte e do Norte Mato-grossense estimula uma presença maior daquele órgão federal, bem como de outros programas federais, como o PoloAmazônia, o PoloCentro, o PoloNoroeste, o Programa de Integração Nacional (PIN), além da Sudam e da Supreintendência de Desenvolvimento do Centro-Oeste (Sudeco). O Governo Federal viabilizou ainda a construção da rodovia BR-163, fator decisivo para a formação de cidades como Nova Mutum, Lucas do Rio Verde, Sorriso e Sinop, localizadas no médio norte de Mato Grosso. 2.1.4 Os primeiros projetos de colonização 29 Segundo Suzuki(2002), o gaúcho Carlos Mazurek foi um dos pioneiros na ocupação do leste e norte matogrossense pelos projetos de colonização. Os primeiros colonizadores chegaram em Canarana, uma agrovila em 1976, para garantir o “futuro digno” que não poderia dar a seus filhos no Rio Grande do Sul, devido à pouca quantidade e ao alto preço da terra, à falta de crédito e à expansão dos grandes latifúndios sobre as pequenas propriedades. Ainda segundo Suzuki (2002), os pioneiros relatam que no início da vida no Mato Grosso foi bem mais difícil do que imaginavam. A infra-estrutura na região permaneceu extremamente precária de 1972, quando foi inaugurada a primeira agrovila do Projeto Canarana, até o início dos anos 1980, quando o governo do Mato Grosso asfaltou quase toda a estrada ligando Canarana a Barra do Garças. Essa situação se repetia em projetos de colonização da região, conforme revela o Suzuki(2002) em seu artigo Mato Grosso: na frente de ocupação, a determinação histórica do espaço. Segundo ele, de 1974 a 1980, duas mil famílias gaúchas foram para a região de Água Boa (MT). Destas, apenas 35% tiveram sucesso e permaneceram ali - o que é considerada uma boa média, acima dos 20% a 25% previstos para esse tipo de empreendimento. A organização dos trabalhadores rurais e pequenos proprietários do Rio Grande do Sul em torno das cooperativas era um padrão de colonização na região. O grande atrativo eram os lotes de 400 hectares que recebiam. No Rio Grande do Sul o tamanho médio da pequena propriedade era de 2,5 hectares. É o que a Federação da Agricultura do Mato Grosso classifica de “migração por reserva de valor”, ou seja, com o dinheiro obtido com a venda das terras no sul, os agricultores podiam comprar extensões até 100 vezes maiores no centro-oeste. 2.1.5 Propriedades de diferentes tamanhos Tendo em vista ao modelo de ocupação adotado no estado de Mato Grosso, verifica-se uma discrepância entre o tamanho das propriedades da região e o de domínios rurais existentes no Sul e Sudeste do país. Conforme estabelece a lei 8629/93, também chamada de Lei Agrária ou Noonon, a classificação de uma propriedade é feita de acordo com a quantidade de módulos fiscais de que dispõe, cujo tamanho mínimo varia em cada região do país. No norte do Mato Grosso, um módulo fiscal pode ser de até 90 hectares. De um até quatro módulos, a propriedade é pequena; superior a quatro módulos até quinze módulos, é classificada como média propriedade. A diferença é que um módulo fiscal no Sul e Sudeste gira em torno de 20 hectares. Ou seja, enquanto uma propriedade média em São Paulo ou no 30 Rio Grande do Sul não passa de 300 hectares, a propriedade pequena no Mato Grosso chega a quase 400 hectares. No nordeste Matogrossense, os projetos privados de colonização administrado pela Coopercol foram implementados inicialmente pelo projeto Canarana, e quase simultaneamente a Coopercol comprou mais cerca de 122 mil hectares de terras para a implementação dos projetos Água Boa I e II, Canarana II e III, Garapu, Vale Serra Azul e Areões. O sucesso obtido pelos colonos pioneiros não se repetiu com os que vieram depois, relata Suzuki(2002). É que não houve o apoio necessário por parte da colonizadora, que jogou para os novos colonos os custos da infra-estrutura básica dos projetos. Além disso, não se repetiu o incentivo expressivo do governo federal. Empobrecidos e com dívidas dos empréstimos, a maioria dos colonos desistiu do projeto, voltando para suas terras de origem ou tornando-se assalariados nas cidades e áreas próximas. Esses modelos de projeto estavam associados à colonização oficial. Contudo, logo após a implementação de Canarana, o governo fez concessões em grandes extensões de terra, na forma de glebas, para projetos de empresas privadas de colonização, que vendiam lotes de vários tamanhos. Isso acabou estimulando a concentração de terras, já que, muitas vezes, os pequenos produtores não conseguiam alavancar sua produção e acabavam vendendo seus lotes para os grandes proprietários. De acordo com o ISA(2003, p.07), um dos fatores que levaram alguns projetos de colonização a não darem certo, foi a questão do tamanho da propriedade rural. Este fator fica bem mais evidente no artigo “O Xingu na mira da Soja”, veja o relato: No final da década de 1970, os projetos de colonização, muitos deles mal sucedidos, já começavam a ser pressionados pelos grandes empreendimentos agropecuários da região, que buscavam comprar novas áreas para a sua expansão, contando ainda com os financiamentos concedidos pela Sudam. Segundo Carlos Mazurek, um dos pioneiros na região, os pequenos e médios produtores só conseguiram adquirir terras até 1977, pelo projeto governamental Pro-Terra. Depois disso, qualquer novo imigrante acabava se dedicando ao comércio, pela impossibilidade de comprar terras frente à expansão dos latifúndios. Mazurek afirma que até o financiamento na década de 1980 foi dificultado para os produtores menores, uma vez que os recursos eram direcionados Neste diapasão, vem todos os demais projetos de colonização implementado no norte do estado Mato Grosso. 31 2.2. Desenvolvimento sustentável segundo a economia ecológica Partindo do princípio que desenvolvimento seja o processo inicialmente concomitante à fase de crescimento (em um organismo, uma instituição, ...), que mesmo após haver cessado de crescer, caracteriza-se por: (a) ter capacidade permanente de articulações seletivas por meio de adaptações e adequações em relação aos meios (interno e externo) que lhe são pertinentes, (b) apresentar capacidade gradativa de sustentabilidade e ser capaz de favorecer o desenvolvimento do contexto em que está inserido, por meio de dinâmicas sinérgicas. Verifica-se que até o final dos anos 70, a questão ambiental no processo de crescimento econômico foi negligenciada tanto pelos formuladores da política econômica quanto pela academia. O grande desafio de conciliar crescimento econômico com sustentabilidade ambiental é a proposição do conceito de desenvolvimento sustentável, no entanto suas definições e interpretações sejam várias e desprovidas de consenso. O conceito de desenvolvimento sustentável foi lançado em 1987 pela World Commission on Environment and Development no Relatório Brundtland. Entretanto: O conceito de desenvolvimento sustentável é um conceito normativo que surgiu com o nome de ecodesenvolvimentono início da década de 1970, como cita Romeiro (2003). Esse conceito sugere a busca de um crescimento econômico eficiente e racional, que respeita as pessoas e os limites do meio ambiente. De acordo com Silva (2008, p.125) ecodesenvolvimento é definido como um: processo criativo de transformação do meio com a ajuda de técnicas ecologicamente prudentes, concebidas em função das potencialidades desse meio, impedindo o desperdício inconsiderado dos recursos, e cuidando para que estes sejam empregados na satisfação das necessidades de todos os membros da sociedade, dada a diversidade dos meios naturais e dos contextos culturais. Neste sentido, pode-se afirmar que as estratégias serão múltiplas e só poderão ser concebidas a partir de um espaço endógeno das populações consideradas. Mas, percebe-se que ele somente é alcançado por uma sociedade, mediante o planejamento de longo prazo e a conseqüente implementação de ações econômicas, políticas e sociais que garantam o atendimento das demandas das gerações presentes sem comprometer as das gerações futuras. Em outras palavras, para Silva(2008, p.132) o desenvolvimento sustentável: É o processo político, participativo que integra a sustentabilidade econômica, ambiental, espacial, social e cultural, sejam elas coletivas ou individuais, tendo em vista o alcance e a manutenção da qualidade de vida, seja nos momentos de disponibilização de recursos, seja nos períodos de escassez, tendo como perspectivas a cooperação e a solidariedade entre os povos e as gerações. 32 Portanto, o desenvolvimento sustentável exige uma equação que não permite a concentração ou o mau uso dos recursos naturais e humanos, uma vez que estes são imprescindíveis na busca de resultados eficientes e eficazes do crescimento econômico. 2.2.1 Sustentabilidade Forte vs. Fraca Do ponto de vista conceitual a produção visando o desenvolvimento sustentável é caracterizada pelas correntes da economia do meio ambiente e economia ecológica. Na abordagem da economia do meio ambiente, que tem raízes na economia neoclássica, o conceito de desenvolvimento sustentável é conhecido como sustentabilidade fraca, uma vez que os recursos naturais não representam um limite absoluto à expansão econômica, no longo prazo. À luz dessa visão, o consumo do capital natural pode ser irreversível e por isso não se pode basear em preços vigentes devido aos inúmeros impactos que o meio ambiente sofre. Uma saída para este impasse é a adoção principalmente de instrumentos de mercado através da eliminação do caráter público dos bens naturais e da definição do direito de propriedades sobre eles (Coase), da valoração ambiental da degradação ou poluição dos recursos naturais -e conseqüentemente a implementação da cobrança de taxas pela degradação praticada (Pigou)-, e a minimização dos custos totais dos agentes econômicos, incluindo os custos de controle de poluição e a quantia a ser gasta com o pagamento de taxas por poluir (“poluição ótima”) (MAY, LUSTOSA & VINHA, 2003). Neste contexto Romeiro(2003, p.01) diz que: “O que seria uma economia da sustentabilidade é visto como um problema, em última instância, de alocação intertemporal de recursos entre consumo e investimento por agentes econômicos racionais, cujas motivações são fundamentalmente maximizadoras de utilidade”. Por oportuno, a racionalidade dos agentes econômicos neoclássicos se fundamenta na presença de informação plena, por supor a existência de mercados que naturalmente se equilibram e, naturalmente, por explicar a conduta humana a partir das ações de indivíduo maximizador de satisfação, entre outras. Por outro lado, segundo a abordagem da economia ecológica, o conceito de desenvolvimento sustentável é conhecido como sustentabilidade forte, ou seja, o crescimento é limitado pela escassez dos recursos naturais, pois a economia internaliza os custos ambientais, e o processo científico e tecnológico é visto como fundamental para aumentar a eficiência na utilização dos recursos naturais, não podendo ser superado apenas por meio de 33 progresso tecnológico. Esta corrente faz uso do conceito termodinâmico de entropia. Mais especificamente, conforme Ferreira (2004, p. 36): 1. Função termodinâmica do estado, associada à organização espacial e energética das partículas de um sistema, e cuja variação, numa transformação desse sistema, é medida pela integral do quociente da quantidade infinitesimal do calor trocado reversivelmente entre o sistema e o exterior pela temperatura absoluta do sistema. 2. Medida da quantidade de desordem dum sistema. O trabalho de Nicholas Georgescu Roegen, por oportuno, foi o pioneiro na aplicação desse conceito na análise econômica (MAY, LUSTOSA & VINHA, 2003). Daly(1991) ressalta que, para a abordagem da economia ecológica, o desenvolvimento sustentável se realiza desde que, a escala da economia esteja dentro da capacidade de suporte dos ecossistemas. Diz ainda que, para os economistas ecológicos a economia do homem passou da fase em que o fator limitante para o crescimento econômico era o capital produzido pelo ser humano, para uma em que o fator limitante é o capital natural remanescente. Para Romeiro, Keydon & Leonardi (2001), referir-se ao desenvolvimento sustentável significa abandonar os supostos discutíveis do crescimento sem limites, tão caro à tradição de pensar dos economistas (e daqueles que os consultam). Portanto, qualificar o desenvolvimento sustentável significa reduzir os graus de liberdade do processo econômico, sujeitando-o a condicionamentos ecológicos, procurando simultaneamente torná-lo mais eqüitativo e socialmente justo. 2.2.2 Economia Ecológica vs Economia do Meio Ambiente Contrastando a economia ecológica e a economia do meio ambiente, Muller (2007) ressalta que, para a economia do meio ambiente a sustentabilidade envolve algum grau de conservação do capital natural, pois este tem fim e, de muitas formas é frágil. Já os ecologistas vêm argumentando que a preservação das condições de bem-estar das gerações futuras pode depender, de forma crucial, de tal conservação, visto que um uso inadequado do capital natural pode anular a possibilidade de que seja sustentável o desenvolvimento de uma sociedade. Sob esse entendimento, o desenvolvimento sustentável se pauta pela sustentabilidade forte. Nesse sentido, para Muller (2007), segundo abordagem do documento “Estratégia Mundial para a Conservação” (EMC), o desenvolvimento sustentável é basicamente conservacionista, uma vez que sua preocupação volta-se principalmente para os impactos antrópicos sobre todos os seres vivos. Em particular, o foco do EMC é basicamente o 34 ecossistema global, embora ressalte que está no funcionamento do sistema econômico a origem dos principais problemas que atualmente afetam o ecossistema global. Por outro lado, o enfoque do Our Common Future, não está voltado à preservação da natureza, mas sim ao funcionamento do sistema econômico. A economia é vista como dependendo fundamentalmente dos recursos naturais fornecidos pelo ecossistema global, bem como da capacidade deste de suportar a agressão promovida pela humanidade e de assimilar os resíduos e a poluição, resultantes dos processos de produção e de consumo. Portanto, a partir da discussão da necessidade de implementação do desenvolvimento sustentável enquanto política pública em Mato Grosso, analisar atividades produtivas como parte do modelo de desenvolvimento para o Estado se reveste de elevada importância, visto que, os aspectos sociais e ambientais também se constituem em importantes elementos a serem incorporados na dinâmica econômica. Para que isso se concretize, por lógico, é precisoque a produção esteja alicerçada nos preceitos do desenvolvimento sustentável. Segundo esse entendimento, o fluxo de recursos naturais de baixa entropia (inputs), experimenta transformações na produção, bem como no consumo, voltando à natureza sob a forma de resíduos (outputs) para a acumulação ou para ingresso em ciclos biogeoquímicos através da energia solar, e finalmente, retorna a fazer parte de estruturas de baixa entropia, podendo, dessa forma, novamente ser úteis à economia. Trata-se, portanto, de um conceito meramente físico, onde se constata o reconhecimento explícito do papel da entropia, visto que os materiais utilizados não podem ser totalmente reciclados e, além disso, nesse processo e à luz dessa compreensão, a energia não é reciclada (DALY, 1991). Sob esse prisma, é importante a discussão levantada pelos economistas ecológicos sobre o tamanho do subsistema econômico em relação ao ecossistema total, uma vez que há indícios que a atual escala é insustentável. A razão disso é que a economia é um subsistema aberto inserido em um sistema total finito e fechado, contradizendo o relatório Brundtland, assinalando que para o alcance do tal almejado desenvolvimento sustentável se necessitaria do crescimento da economia mundial da ordem de cinco a dez vezes. Em síntese, pode-se constatar que o tamanho da economia em relação ao ecossistema total é outro fator a ser considerado na busca do crescimento com sustentabilidade. Dessa forma, tudo está baseado numa escala ótima, mas definir qual seria esta escala ótima é a grande questão (DALY, 1991). Existem atualmente duas definições sobre a escala ótima: uma é puramente antropocêntrica, que entende que deve haver crescimento até o ponto em que os benefícios marginais (humanos) se igualem aos custos marginais, enquanto a outra é biocêntrica: o tamanho ótimo do nicho humano seria menor que o ótimo do ponto de vista antropocêntrico. 35 Ambas, contudo, concordam que esse “ótimo” busca a sustentabilidade, ou seja, buscam escalas de produção que respeitem os limites do ecossistema. Destarte, para se atingir a sustentabilidade é necessária uma “redução da escala da economia humana que não tem precedentes nos tempos modernos”, conforme menciona Daly (1991). A economia ecológica ressalta que há três políticas para se alcançar os seguintes objetivos, segundo Daly (1991): alocação ótima (enquanto instrumento dos preços relativos - objetivo de eficiência), a distribuição ótima (enquanto instrumentos de distribuição da renda e da riqueza atuam - objetivo da eqüidade), e a escala ótima (enquanto instrumento, atualmente inexistente, de controle do uso de throughputs, isto é, um instrumento de limitação de população e/ou limitação do uso per capta de recursos naturais - objetivo de sustentabilidade). De acordo com os preceitos da Economia Neoclássica, na visão do “Ótimo de Pareto” a população pode dobrar ou diminuir pela metade, ainda assim o mercado continuará alocando otimamente os recursos entre os seus usos alternativos, no entanto, não há quem argumente que em função do problema da eficiência os custos da injustiça deveriam ser internalizados nos preços. Ainda neste tocante, pode-se perceber que juntamente com outras razões, os preços certos e ajustados estão levando, por exemplo, ao desaparecimento da biodiversidade, dada a presente escala da economia, excessivamente grande e ainda crescente. Para os economistas ecológicos, conforme abordado, essa dimensão do subsistema em relação ao ecossistema total está na escala ótima, e a atividade humana em nível suficientemente baixo, de forma a não destruir o funcionamento automático dos sistemas que sustentam a vida, evitando forçá-los a ingressar no domínio da administração humana. Ainda que a “mão invisível” dos ecossistemas é auto-regulável, não acontece o mesmo com a mão invisível do mercado, uma vez que se realize a alocação, não se tem condição de determinar nem a escala, nem a distribuição ótima. Cabe à economia limitar a macroeconomia em escala tal que a “mão invisível” possa funcionar ao máximo em ambos os domínios. Para Daly (1991), a definição de sustentabilidade em termos biofísicos e tratá-los então, utilizando modelos neoclássicos, como uma restrição à maximização da utilidade, evidencia ser mais simples e concreto. No entanto, percebe-se que o grau de limitação dos ecossistemas dependerá do grau de substitutibilidade na produção entre capital produzido pelo homem e recursos naturais. A visão neoclássica acredita em uma substitutibilidade quase perfeita entre capital e recursos, enquanto a visão ecológica acredita que estes são basicamente complementares, com uma possibilidade muito restrita de substituição marginal. Neste sentido, a economia ecológica considera a restrição ao uso de recursos naturais como condição à manutenção da sustentabilidade como muito comprometedora, uma vez que 36 capitais e recursos naturais são fatores complementares e, desta forma, a falta de um (recursos naturais) limita radicalmente a produtividade do outro. Ao contrário, se os fatores podem ser substituídos mutuamente sem problemas, então a falta de um não diminui a produtividade do outro. Assim, no caso de substitutibilidade perfeita, não existe qualquer possibilidade de que algum dos fatores seja limitante. Já no caso de complementaridade, o fator em menor suprimento torna-se limitante, neste caso, o capital natural. Os ecologistas entendem ainda que, o capital natural é o estoque que permite o fluxo de recursos naturais: de que serve as produções agropecuárias sem o cerrado, a floresta amazônica, a qualidade do solo? Parece evidenciado que se entra em uma nova era na qual o capital natural remanescente é o fator limitante do crescimento. Diante disso: “A lógica econômica nos orienta no sentido de maximizar a produtividade e aumentar o suprimento do fator limitante. Uma das maneiras de maximizar a produtividade do capital é adotar tecnologias que utilizem intensamente os recursos naturais, sacrificando, assim, a produtividade desses recursos”, conforme observa Daly (1991, p.25), sendo os recursos naturais, o novo fator limitante. Baseando-se em Daly (1991), pode-se dizer que o desenvolvimento sustentável contempla uma lógica econômica (mercados, regulações e competitividade), uma lógica de equidade (moral, justiça e solidariedade) e uma lógica de sustentabilidade (ecossistemas, biosfera). Lógicas essas que na prática requerem negociações de ordem política, ou seja, acordos sobre como se pode viver juntos nessa diversidade de interesses, visões do presente e aspirações em relação ao futuro. 3 – O AGRONEGÓCIO EM MATO GROSSO A partir dos anos 50 o agronegócio brasileiro e em especial o matogrossense passou por diversas transformações orientadas pela modernização do campo. Neste viés Oliveira (2003) afirma que a industrialização deu-se no campo, formando uma unidade contraditória com a indústria, isso posto devido a transformação do capitalista em também latifundiário. A expansão da fronteira agrícola em direção ao oeste do território nacional, trouxe para Mato Grosso agricultores oriundos principalmente do Sul do Brasil. O agronegócio matogrossense, nas ultimas décadas tem se destacado na produção de algodão, soja, milho, cana de açúcar e na produção de Carne bovina, contribuindo desta forma para as exportações brasileiras. É bom frisar que a produção matogrossense assim como a nacional não cresceu apenas como resultado da expansão da área cultivada. Houve também um grande aumento na produtividade brasileira, devido a uma rápida e eficiente difusão de tecnologia, incluindo sementes, agroquímicos, fertilizantes e outros insumos para
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