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Autor: Prof. José Aparecido Batista Júnior Colaboradores: Profa. Amarilis Tudella Nanias Profa. Maria Francisca S. Vignoli Profa. Ronilda Ribeiro Serviço Social em Equipe Multidisciplinar SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /1 4 Professor conteudista: José Aparecido Batista Júnior José Aparecido Batista Júnior é de Sorocaba/SP. É assistente social graduado pelo Instituto Manchester Paulista de Ensino Superior. Atuou como coordenador de projetos sociais em uma ONG de São Paulo e como educador social da Guarda Mirim em cidades próximas a Sorocaba. Tem MBA em Gestão de Projetos e é mestre em Políticas Sociais. © Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Universidade Paulista. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) B333s Batista Junior, José Aparecido. Serviço social em equipe multidisciplinar. / José Aparecido Batista Junior. – São Paulo: Editora Sol, 2014. 160 p. il. Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e Pesquisas da UNIP, Série Didática, ano XIX, n. 2-032/14, ISSN 1517-9230. 1. Serviço social. 2. Equipe multidisciplinar. 3. Gerência científica. I. Título. CDU 36 SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /1 4 Prof. Dr. João Carlos Di Genio Reitor Prof. Fábio Romeu de Carvalho Vice-Reitor de Planejamento, Administração e Finanças Profa. Melânia Dalla Torre Vice-Reitora de Unidades Universitárias Prof. Dr. Yugo Okida Vice-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa Profa. Dra. Marília Ancona-Lopez Vice-Reitora de Graduação Unip Interativa – EaD Profa. Elisabete Brihy Prof. Marcelo Souza Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar Prof. Ivan Daliberto Frugoli Material Didático – EaD Comissão editorial: Dra. Angélica L. Carlini (UNIP) Dra. Divane Alves da Silva (UNIP) Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR) Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT) Dra. Valéria de Carvalho (UNIP) Apoio: Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos Projeto gráfico: Prof. Alexandre Ponzetto Revisão: Virgínia Bilatto Valéria Nagy SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /1 4 Sumário Serviço Social em Equipe Multidisciplinar APRESENTAçãO ......................................................................................................................................................7 INTRODUçãO ...........................................................................................................................................................7 Unidade I 1 GERÊNCIA CIENTÍFICA E PRESTAçãO DE SERVIçOS.............................................................................9 1.1 A gerência científica ........................................................................................................................... 11 1.2 Mudanças nos processos de trabalho .......................................................................................... 22 2 A EXPLORAçãO DOS SERVIçOS NA SOCIEDADE CAPITALISTA ..................................................... 37 3 TRABALHO E SERVIçO SOCIAL ................................................................................................................... 54 3.1 Processo de trabalho e Serviço Social .......................................................................................... 54 3.2 A prática como trabalho e a inserção do assistente social em processos de trabalho ............................................................................................................ 59 4 POR QUE SERVIçO SOCIAL É TRABALHO ............................................................................................... 64 4.1 Objeto e produto do Serviço Social .............................................................................................. 74 Unidade II 5 A REESTRUTURAçãO PRODUTIVA E AS NOVAS MODALIDADES DE SUBORDINAçãO DO TRABALHO ............................................................................................................ 84 5.1 Reestruturação do capital, fragmentação do trabalho e Serviço Social ....................... 86 5.2 Os serviços na contemporaneidade: o trabalho nos espaços ocupacionais................. 92 6 REESTRUTURAçãO NOS BANCOS E AçãO DO SERVIçO SOCIAL ................................................. 99 7 O SERVIçO SOCIAL E A SAúDE DO TRABALHADOR NAS ORGANIzAçõES PúBLICAS E PRIVADAS .................................................................................................112 8 A INSERçãO DO SERVIçO SOCIAL COMO ESPECIALIzAçãO DO TRABALHO COLETIVO DO ASSISTENTE SOCIAL .............................................................................123 8.1 As estratégias profissionais ............................................................................................................126 8.2 O instrumental técnico-operativo e o produto do seu trabalho ....................................133 7 SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /1 4 APrESEntAção Objetivos da disciplina A disciplina Serviço Social em Equipe Multidisciplinar tem como objetivo levar você, aluno(a), à reflexão sobre o trabalho e a cooperação, entendendo o trabalhador como um meio de interação coletiva; e, neste sentido, contextualizar a especificidade do trabalho na sociedade burguesa e a inserção do Serviço Social como especialização do trabalho em equipe. A identificação dos elementos constitutivos do processo de trabalho do assistente social engloba a análise dos fenômenos, das políticas sociais, das dinâmicas institucionais, bem como o estudo dos espaços sócio-ocupacionais do bacharel em Serviço Social no primeiro, segundo ou terceiro setor. Com isso, vamos trazer à discussão as contradições existentes no cotidiano do assistente social como trabalhador coletivo e especializado, suas estratégias profissionais e o produto do seu trabalho e atuação nos processos frente às mudanças no padrão de acumulação capitalista e regulação social. Objetivo geral Discutir a particularidade e singularidade da inserção do Serviço Social nos processos de trabalho; analisar e refletir sobre o trabalho concreto do assistente social; refletir sobre os principais desafios enfrentados pela profissão a partir da reestruturação produtiva, assim como discutir a inserção do profissional neste contexto. Objetivos específicos • Identificar os espaços sócio-ocupacionais nos quais se insere o assistente social. • Refletir sobre o contexto socioeconômico e o trabalho do assistente social. • Desenvolver a leitura crítica sobre a realidade do mundo do trabalho na qual o assistente social está inserido. • Compreender a inserção do assistente social nos processos de trabalho. Introdução O profissional formado em Serviço Social é um técnico liberal, ou seja, tem uma possibilidade ampla de espaço de trabalho, pois pode desenvolver trabalhos pontuais ou contínuos, com contratação formal ou prestação de serviços sem vínculo empregatício para diferentes organizações. De maneira generalista, o profissional liberal quer representar: De acordo com o presidente da Confederação Nacional das Profissões Liberais (CNPL), Francisco Antonio Feijó, [...] o liberal é designado para8 SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /1 4 aquele profissional que tem total liberdade para exercer a sua profissão. “Ele pode constituir empresa ou ser empregado, no entanto”. Feijó lembra que o profissional liberal é sempre de nível universitário ou técnico. Também está registrado em uma ordem ou conselho profissional e é o único que pode exercer determinada atividade, o que o deixa com uma responsabilidade maior pelo produto de seu trabalho. Entram na lista médicos, advogados, jornalistas, dentistas, psicólogos, entre outras categorias (GAzETA DO POVO, 2007). É importante não perdermos esse referencial, que pode potencializar novo mercado e trazer maior envolvimento das organizações com a utilização dos serviços do assistente social. Entretanto, para que seja possível desenvolver tal realidade, o técnico precisa dispor de todos os instrumentos necessários (financeiro, técnico, humano e estrutural) para o desenvolvimento do trabalho liberal. A graduação norteia o aluno, no entanto é na prática que os desafios se instalam, pois é nesse momento que todo o embasamento teórico que foi adquirido precisa ser estabelecido pelo profissional; os fatores históricos que influenciaram a construção da profissão ainda estão presentes nos espaços sócio-ocupacionais, ou seja, a forte influência do pensamento conservador – em especial o religioso, benevolente, caritativo – entendendo a profissão como associada ao dom, ao amor e à compaixão. É nesse conflito apresentado que a formação teórica potencializa o olhar crítico do aluno, possibilitando a interpretação construída pela categoria profissional quanto à aplicabilidade do assistente social e instruindo-o para que seja um técnico, e não um “cuidador” do ser humano. A base da profissionalização, em termos interventivos e reflexivos, dá-se por meio do Código de Ética Profissional dos Assistentes Sociais, aprovado em 13 de março de 1993, e das devidas alterações contidas nas Resoluções CFESS nºs 290/94, 293/94, 333/96 e 594/11, pois trazem consigo os princípios fundamentais, reconhecendo a liberdade como valor ético central das demandas políticas a ela inerentes. O objetivo principal desta disciplina é a capacitação do profissional para o desenvolvimento de sua ação em equipes multidisciplinares nos diferentes campos de atuação, com liberdade, ética e profissionalismo. 9 SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /1 4 Serviço Social em equipe multidiSciplinar Unidade I 1 GErÊnCIA CIEntÍFICA E PrEStAção dE SErVIçoS Nesta primeira unidade, trataremos da análise da industrialização no cotidiano da sociedade, bem como dos resultados promovidos pelo modo econômico capitalista, que concentra a riqueza socialmente produzida. Em seguida, trataremos de um tema que merece destaque nas reflexões sobre a contextualização e intervenção profissional: ética. Abordaremos também os fundamentos que operam na intervenção do assistente social na promoção de ações previamente planejadas. Reportamo-nos à definição mais ampla da palavra gerência, que se refere a: “1 Ação de gerir, dirigir ou administrar. 2 Funções de gerente” (MICHAELIS, 2009). Ou seja, a palavra está associada ao ato de administrar e dirigir. Nesse sentido, é preciso que o técnico detenha o conhecimento científico para fazer a interlocução de teoria e prática – práxis. Marx, em Manuscritos (1844), analisa a relação entre a práxis e o conhecimento e estabelece que a prática fundamenta a relação entre o homem e a natureza, ou seja, unidade sujeito-objeto. Nessa troca, saber e prática-homem e natureza, o assistente social e os demais técnicos que compõem a equipe de trabalho precisam compreender seus papéis na prestação de serviços, seja de forma individual ou coletiva, em prol de um objetivo comum. Como ferramenta facilitadora, há o plano de trabalho de cada profissional, ou seja, o projeto interventivo. Projeto não está relacionado apenas à área administrativa, já que significa: 1 Plano para a realização de um ato; desígnio, intenção. 2 Cometimento, empreendimento, empresa. 3 Redação provisória de qualquer medida (estatuto, lei etc.). 4 Constr Representação gráfica e escrita com orçamento de uma obra que se vai realizar. P. de lei: proposição escrita apresentada a uma câmara legislativa sobre qualquer assunto, para, depois de discutida em plenário, ser convertida em lei; propositura. P.-tipo: projeto padronizado que deve ser seguido em diversas obras ou instalações da mesma natureza. Pl: projetos-tipos e projetos-tipo (MICHAELIS, 2009). O significado que mais se aproxima da disciplina é o que mostra o projeto como um “plano para a realização de um ato; desígnio, intenção”. Identificamos, então, que projeto é um conjunto de intenções elaboradas com o intuito de realizar algo (fato/intenção), seja por um técnico ou pelo coletivo. Não há ação crítica (se não houver o projeto para sua realização) associada à intencionalidade de realizar alguma coisa, não importando qual seja o fato gerador. 10 SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /1 4 Unidade I Segundo Heloísa Lück (2003, p. 27), projeto é: [...] o conjunto organizado e encadeado de ações de abrangência e escopo definidos, que focaliza aspectos específicos a serem abordados num período de tempo, por pessoas associadas e articuladoras das condições promotoras de resultados, com um determinado custo. Ela coloca com ênfase a necessidade de um projeto ser desenvolvido por pessoas pró-ativas, ou seja, com atitude e que saibam visualizar os resultados e custos para essa obtenção, sendo planejado com peculiaridade, com o fim de alcançar o objetivo central desse. Um projeto pode ser definido como uma série de serviços relacionados, normalmente voltados para alguma produção importante, e que necessita de um período significativo de tempo para ser realizado; pode- se destacar nesta interpretação que para haver a elaboração de qualquer projeto é preciso tempo, assim, nenhum é feito “da noite para o dia” (CHASE, 2006, p. 78). De acordo com Chase (2006), é preciso haver preparo metodológico para o início do projeto e conversa entre os envolvidos sobre as intervenções a serem desenvolvidas. Há outros autores que defendem a ideia de que não há nenhuma definição universalmente reconhecida para projeto, visto que seu significado pode mudar de acordo com a linha de pensamento de quem o faz. Entretanto, há pontos que todos os projetos devem adotar, como discursa Fusco (2007, p. 59): [...] não existe nenhuma definição de “projeto” reconhecida universalmente. Assim, diferentes especialistas usam, às vezes, definições bastante diferentes. No entanto alguns pontos importantes devem ser considerados para balizar a definição de projeto: o objetivo da atividade de projeto deve ser buscar a satisfação das necessidades dos consumidores; a atividade de projeto pode ser aplicada tanto a produtos (ou serviços) como a sistemas (que chamamos processos); a atividade de projeto é, em si mesma, um processo de transformação. O projeto começa com um conceito e termina na tradução desse conceito, em uma especificação de algo que é viável e passível de ser produzido. Como se percebe, para este autor, não é de grande importância a caracterização/o significado do projeto (como palavra), mas sim os objetivos que devem ser alcançados para que este esteja de acordo com o objetivo da ação e da equipe. 11 SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /14 Serviço Social em equipe multidiSciplinar observação Não haverá trabalho em equipe se o próprio técnico não se reconhecer como tal, identificando suas atribuições e competências, limites e possibilidades e conflitos existentes na relação com os demais profissionais, em virtude da diferenciação do processo formativo pessoal e profissional. 1.1 A gerência científica Neste item objetivaremos entender a relação entre o técnico, o conhecimento, a ciência e a aplicabilidade, pois é preciso compreender que, ao ser absorvido um saber, por meio de pesquisas de base documental, empírica, identificação da realidade (observação) etc., é preciso que essa ciência seja utilizada pelos demais profissionais ou pela população, já que nenhum conhecimento é válido se deixado retido. Temos o significado da palavra “ciência”: s.f. Conjunto organizado de conhecimentos relativos a certas categorias de fatos ou fenômenos. (Toda ciência, para definir-se como tal, deve necessariamente recortar, no real, seu objeto próprio, assim como definir as bases de uma metodologia específica: ciências físicas e naturais.) / Conjunto de conhecimentos humanos a respeito da natureza, da sociedade e do pensamento, adquiridos através do desvendamento das leis objetivas que regem os fenômenos e sua explicação: o progresso da ciência. / Ciência pura, ciência praticada independentemente de qualquer preocupação de aplicação técnica. / Ciência política, politicologia (HOLANDA, 2010). São saberes relativos a um determinado objeto. A ciência é parte de um conjunto existente na realidade apresentada ao pesquisador, seja de maneira direta ou indireta. Neste ponto é preciso ter clareza de que todo conhecimento não é uma verdade absoluta, pois apresenta um recorte da conjuntura totalitária de algo. Para fins de exemplificação, podemos nos remeter ao conhecimento do que é questão social, entretanto, para ampliação deste, é necessária a compreensão da conjuntura sócio-histórica, em especial, a industrial, inserida no modo econômico capitalista; percepções que nos farão entender a gênese da expressão, bem como relativizar com a realidade, concomitante à sua materialização ou suas expressões. Então, a ciência está direcionada à produção do conhecimento, e este é influenciado pela informação. Mas qual o significado de “informação”? 1 Ato ou efeito de informar. 2 Transmissão de notícias. 3 Comunicação. 4 Ação de informar-se. 5 Instrução, ensinamento. 6 Transmissão de conhecimentos. 12 SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /1 4 Unidade I 7 Indagação. 8 Opinião sobre o procedimento de alguém. 9 Parecer técnico dado por uma repartição ou funcionário. 10 Investigação. 11 Inquérito. 12 Miner Presença de quartzo hialino e outros satélites denunciadores do diamante. I. privilegiada: informação que não é tornada pública, mas é utilizada por pessoas que a conhecem, para negociar na bolsa, a fim de obter vantagens (MICHAELIS, 2009). Então, informação, segundo o dicionário, é “[...] Transmissão de notícias [...] instrução, ensinamento [...] indagação [...] investigação”. Para gerar uma ciência é preciso fazer um questionamento e, a partir deste, remeter às pesquisas que direcionarão à possível resposta, sem esquecer que o conhecimento gerado é um segmento da totalidade e das relações cotidianas. O que pretendemos é identificar primeiro os pormenores que norteiam uma interpretação crítica da realidade, bem como a autoanálise do técnico em relação à sua atuação profissional, seja individualmente ou coletivamente, neste caso. Entender quais os limites profissionais, institucionais, legais ou outros faz que tenhamos meios para o desenvolvimento de ações diferenciadas, com o intuito de não prejudicar a ação profissional. É fato que muitos profissionais, de diferentes categorias, atuam apenas com intervenções imediatistas, ou seja, não refletindo, na sua totalidade, historicidade e construção do objeto.1 Para fundamentação teórica, é possível recorrer à discussão sobre a metodologia empregada pelos profissionais envolvidos; para tanto, remeteremos ao texto de José Paulo Netto (2009), o qual trata os conceitos de Marx. Para composição do debate nos remeteremos às questões históricas e contemporâneas, ou seja, faremos uma contraposição da atualidade com o passado, vislumbrando deixar nossos momentos de estudos o mais instigantes possível. José Paulo Netto (2001) discursa sobre o fato de como era difícil ser marxista, uma vez que esse estudioso vivia para analisar e produzir escritos que relatavam o cotidiano, o mais real possível, dos trabalhadores e do socialismo. Mas, em contraposição, questionamos: será que nos dias atuais também não somos pressionados pelo modo de consumo, acúmulo da riqueza socialmente produzida, ou seja, pelo modo econômico capitalista? Compreender algo cientificamente implica fazer interpretações profundas, nos distanciando de práticas imediatistas, generalistas, pouco propositivas, voltadas ao “achismo”, e ações que ainda acontecem no cotidiano profissional, compreendendo, assim, a teoria para melhorar a prática. O conhecimento científico não pode ser associado a rótulos, nem por práticas simplificadas para o técnico, ou seja, aplicar o que já foi aplicado com outras pessoas; o correto seria construir intervenções novas, pois os envolvidos são outros sujeitos; assim, deteremos um conhecimento técnico voltado ao público a que realmente se destina. 1 Para matéria de compreensão, entenda objeto como situação a ser trabalhada; esta é uma forma de utilizarmos vocábulos menos cotidianos ao reproduzir uma ação profissional. 13 SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /1 4 Serviço Social em equipe multidiSciplinar O assistente social deve ter a clareza de que o saber é uma construção, e precisa, com frequência, realizar a interlocução de teoria e prática, desta forma: • a realidade não é padronizada; • a sociedade não é homogênea; • incluir o público-alvo da ação é necessário para um resultado efetivo, eficaz e eficiente. Logo, o conhecimento deve ser utilizado como subsídio para que seja possível, em seu cotidiano profissional, respeitar o público a quem se destina a ação. Respeito, aqui, é ouvir, incluir e compartilhar o saber. Todos os envolvidos estão em uma mesma posição: há interação dos técnicos com o público da ação, e não há perspectiva de hierarquização decorrente de diversas intervenções, visto que é ponto favorável para a adesão dos envolvidos, tão certo que nenhum conhecimento e respectiva aplicabilidade terão a confiabilidade e participação do público-alvo ou da equipe, se não tiver ocorrido a escuta e real participação destes. Nesse sentido, não podemos deter o conhecimento apenas para a área econômica do sujeito, pois é preciso envolver a análise da forma mais totalitária possível, para que não compactuemos com o que Netto (2009, p. 669-70) diz: [...] o conhecimento da realidade não demandaria os sempre árduos esforços investigativos, substituídos pela simples “aplicação” do método de Marx, que haveria de “solucionar” todos os problemas: uma análise “econômica” da sociedade forneceria a “explicação” do sistema político, das formas culturais etc. Não observamos também essa conduta sendo aplicada? Então, proporcionar renda ao sujeito é suficiente para melhorar a situação de vulnerabilidade que enfrenta? Em um primeiro momento, tal fator pode contribuir para a situação; porém, a longo prazo, não terá efeitos duradouros, visto que a situação só foi observada sob uma ótica; e precisamos, como técnicos, ir além do que está posto, ou seja, obter informações que direcionem ao caso paraposteriores intervenções mais politizadas e críticas, com base estrutural. Não é possível desconsiderar a apreensão da realidade como realmente é para o estudo teórico e técnico, sem haver distorções de quem observa, e, para isso, é preciso disponibilidade para tal intervenção. Mas são todos os profissionais que atuam dessa maneira? Não cabe aqui quantificar questões, mas provocar em você momentos para refletir sobre sua futura atuação como colega de profissão. Karl Marx, ao pesquisar a sociedade moderna (burguesa), fundamentou-se no modo de produção, certamente pelo motivo de um não existir sem o outro. Com isso, temos a divisão de classes sociais: de 14 SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /1 4 Unidade I um lado, os detentores do meio de produção e concentradores da riqueza socialmente produzida, e, de outro, um grande número de pessoas que têm, da venda da força de trabalho, meios para a sobrevivência. Cabe insistir na perspectiva crítica de Marx em face da herança cultural de um legatário. Não se trata, como pode parecer a uma visão vulgar, de “crítica”, de se posicionar frente ao conhecimento existente para recusá-lo ou, na melhor das hipóteses, distinguir nele o “bom” do “mau”. Em Marx, a crítica do conhecimento acumulado consiste em trazer ao exame racional, tornando-os conscientes, os seus fundamentos, os seus condicionamentos e os seus limites – ao mesmo tempo que se faz a verificação dos conteúdos desse conhecimento a partir dos processos históricos reais (NETTO, 2009, p. 672). A crítica não está associada a dizer se algo é ruim ou bom, mas a investigar (estudar) o objeto (situação do problema), trazendo para o campo reflexivo como se construiu e quais são seus limites. É muito importante esse momento para se reconhecer o objeto como ele é em si mesmo e em comunidade, pois fazemos parte de um grupo. Assim, não é possível efetuar uma crítica sem abstrair de todos os condicionantes de que tal participa e é influenciado, seja em equipe ou individualmente. Conforme Netto (2009) revela, o método era resultado de uma complexa investigação, e não há como criar maneiras de intervenção sem prévio e intenso contato com o objeto. Esse princípio reforça a ideia de que não é possível construir um saber e uma ação “da noite para o dia”. Algumas reflexões são pertinentes: • ao trabalharmos na perspectiva de autonomia, não precisamos ordenar ninguém a fazer algo; • a aplicabilidade deve ser algo nivelado com a equipe e o público-alvo, e realizável; • o técnico torna-se um facilitador, um gerenciador, e não “mandante” e “dono da verdade”. Ao construirmos o saber até o presente momento, é válido refletirmos sobre o que é uma teoria, já que tal nos é cobrada no cotidiano profissional em diversos aspectos, como mostra Netto (2009, p. 673): [...] teoria é uma modalidade peculiar de conhecimento (outras modalidades são, por exemplo, a arte, o conhecimento prático da vida cotidiana, o conhecimento mágico-religioso) [...] Mas a teoria se distingue de todas essas modalidades e tem especificidade: o conhecimento teórico é “o conhecimento do objeto tal como ele é em si mesmo, na sua existência real e efetiva, independentemente dos desejos, das aspirações e das representações do pesquisador”. O autor trata de maneira objetiva o assunto: teoria é o conhecimento da situação como realmente é, e não conforme a vontade do pesquisador, porque não é profissional transpassar o seu “achar“ para o objeto, pois este será corrompido, e, assim, não conseguiremos chegar a uma teoria. 15 SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /1 4 Serviço Social em equipe multidiSciplinar Essa situação pode causar certo conflito, já que, ao fazer uma investigação, é preciso entender que o objeto existe independentemente da intencionalidade do pesquisador. Porém, tal característica não coloca o técnico como um sujeito passivo; pelo contrário, este deve ter papel ativo no processo da busca de conhecimento que chamamos de teoria, mas o reiterando, não o influenciando. Está conseguindo acompanhar nossas reflexões? É de suma importância que leia o texto, alvo dos nossos estudos até o momento, de José Paulo Netto (2009) na íntegra. Para isso, recorra às referências bibliográficas para uma busca textual. Paralelamente à ciência, temos os instrumentais utilizados pelo pesquisador como ferramenta facilitadora; assim, Netto (2009) coloca que há inúmeros instrumentais que podem ser utilizados pelo técnico, porém devem ser formas para “apoderar-se da matéria”. Ou seja, o conhecimento está inserido em um processo dinâmico, na medida em que há contradições que resultam em sua superação e conduzem a outros níveis, provocando outras contradições, fazendo um movimento em “espiral”. Pensando em uma perspectiva macro, podemos trazer esse pensamento de processos ao mundo em que vivemos, composto por um conjunto de transformações. É bom enfatizar que o fato de algo mudar não está associado a uma mudança para melhor ou pior, mas que é ou está diferente. Devemos entender que o indivíduo se relaciona conforme desenvolve as atividades de produção e faz a interação com o meio; logo, não estamos falando de algo homogêneo e estático; pelo contrário, reforçamos a ideia de que não se podem padronizar nossas ações. O conhecimento deve partir, na perspectiva de Marx, do concreto e real, com grande valia para nossas reflexões, visto que alguns profissionais imediatistas e não técnicos partem do “achismo” para realizarem uma teoria. É preciso que haja abstração, que, segundo Netto (2009. p. 684), é: [...] a capacidade intelectiva que permite extrair, da sua contextualidade determinada (de uma totalidade), um elemento e isolá-lo, examiná-lo; é um procedimento intelectual sem o qual a análise é inviável – aliás, no domínio do estudo da sociedade, o próprio Marx insistiu com força que a abstração é um recurso indispensável para o pesquisador. A abstração, possibilitando a análise, retira de elemento abstraído as suas determinações mais concretas, até atingir “determinações das mais simples”. Neste nível, o elemento de que foi extraído: nela, ele se concretiza, porquanto está saturado de “muitas determinações. Podemos notar que não há abstração sem a presença da intelectualidade, ou seja, do saber, sendo necessário compreender o todo que envolve o objeto, para que seja distanciado de ações imediatistas e pouco comprometidas com a realidade. Para tanto, é importante sabermos identificar a realidade, certo? Como interventores de uma determinada situação, temos de fazer teoria a partir dela, e, assim, “a realidade é concreta exatamente 16 SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /1 4 Unidade I por isto, por ser ‘a síntese de muitas determinações’, a ‘unidade do diverso’ que é própria de toda totalidade” (NETTO, 2009, p. 685). Com isso, estamos realizando o conhecimento teórico, que é: [...] nesta medida, para Marx, o conhecimento do concreto, que constitui a realidade, mas que não se oferece imediatamente ao pensamento, deve ser reproduzido por este e só “a viagem de modo inverso” permite esta reprodução. Já salientamos que, em Marx, há uma contínua preocupação em distinguir a esfera do ser da esfera do pensamento; o concreto a que chega o pensamento pelo método que Marx considera “cientificamente exato” (o “concreto pensado”) é um produto do pensamento que realiza “a viagem de modo inverso”. Marx não hesita em qualificar este método como aquele “que consiste em elevar-se do abstrato ao concreto”, “único modo” pelo qual“o cérebro pensante” “se apropria do mundo” (NETTO, 2009, p. 685). Embora o trecho utilizado seja autoexplicativo, vale acrescentar que, para Marx, não há conhecimento concreto sem análise concreta; o que reforça a necessidade de buscar a realidade como ela realmente é, partindo de algo que existe. Se pensarmos em nosso cotidiano e na elaboração de projetos de intervenções, trataremos de conhecer diversas realidades, até mesmo de uma mesma comunidade ou grupo de pessoas, uma vez que cada parte analisada representa uma unidade do todo. Assim, a abstração é algo que não se pode dissociar do pesquisador. Para melhorar as identificações da realidade, podemos elencar categorias, que são: [...] formas de modos de ser, determinações de existência, frequentemente aspectos isolados de [uma] sociedade determinada – ou seja: elas são objetivas, reais (pertencem à ordem do ser – são categorias ontológicas); mediante procedimentos intelectivos (basicamente, mediante a abstração), o pesquisador as reproduz teoricamente (e, assim, também pertencem à ordem do pensamento – são categorias reflexivas). Por isto mesmo, tanto real quanto teoricamente, as categorias são históricas e transitórias: as categorias próprias da sociedade burguesa só têm validez plena no seu marco (um exemplo: trabalho assalariado) (NETTO, 2009, p. 685-6). As categorias fazem parte do todo, mas não deixam de possuir sua historicidade e complexidade; assim, também devem partir do real e concreto, que, por sua vez, farão uma teoria (reflexão). É preciso trazê-la para a compreensão da parte em relação ao todo de que faz parte e, com isso, ter uma reprodução ideal, chamada de categoria, que implicará a apreensão intelectual dessa riqueza. Ao reproduzirmos a desconfiguração do pensamento de Marx, possivelmente estejamos sendo influenciados pelo pensamento positivista que diz que “o mais simples explica o mais complexo” (NETTO, 2009, p. 686), e Marx vem dizer o contrário, que o momento vivido discursa sobre o passado, e é importante conhecer o seu início. 17 SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /1 4 Serviço Social em equipe multidiSciplinar Obviamente, entender a realidade concreta (hoje) traz a necessidade, ao pesquisador comprometido, de entender sua construção até chegar à gênese e, com isso, entender a dinâmica do objeto atual, foco da intervenção do profissional ou da equipe. Para Marx, o método: [...] não é um conjunto de regras formais que se “aplicam” a um objeto que foi recortado para uma investigação determinada nem, menos ainda, um conjunto de regras que o sujeito que pesquisa escolhe, conforme a sua vontade, para “enquadrar” o seu objeto de investigação. [...] O método implica, pois, para Marx, uma determinada posição (perspectiva) do sujeito que pesquisa: aquela em que se põe o pesquisador para, na sua relação com o objeto, extrair dele as suas múltiplas determinações (NETTO, 2009, p. 689). É importante salientarmos que em todas as profissões é necessária a presença de pessoas que se dediquem à pesquisa, ou seja, que subsidiem no campo teórico a profissão, e outra parcela que atue na prática; porém, esta não está dispensada da necessidade de fazer pesquisa, associando uma atividade à outra. Assim, Netto (2009) coloca de forma mais direcionada aos assistentes sociais alguns caminhos que precisam ser seguidos para que consigamos efetuar uma pesquisa consistente: Em primeiro lugar, o profissional necessita possuir uma visão global da dinâmica social concreta. Para isto, precisa conjugar o conhecimento do modo de produção capitalista com a sua particularização na nossa sociedade (ou seja, na formação social brasileira). O/a assistente social não é (nem pode ser) um/a economista nem um/a especialista em história, mas não compreenderá de forma adequada nem mesmo os problemas mais imediatos que se põem diariamente à sua atuação profissional, se não tiver aquela visão que demanda o estudo atento de uns poucos textos de introdução à economia política e de alguns historiadores brasileiros sempre com a preocupação de trazer à atualidade os resultados aos quais assim tiver acesso. Bem-conduzido e atualizado, esse estudo propiciará ao profissional também o conhecimento da natureza de classe do Estado brasileiro e da nossa estrutura social, e é supérfluo observar que o curso de graduação deve oferecer os conteúdos mais essenciais desse estudo. Em segundo lugar, o profissional precisa encontrar as principais mediações que vinculam o problema específico com o que se ocupa, com as expressões gerais assumidas pela “questão social” no Brasil contemporâneo e com as várias políticas sociais (públicas e privadas) que se propõem a enfrentá-las. O conhecimento dessas políticas sociais (que implicam, antes de tudo, o conhecimento das suas fontes e formas de financiamento) é indispensável para o profissional contextualizar a sua intervenção; e a determinação daquelas mediações possibilita apreender o alcance e os limites da sua própria atividade profissional. Estas exigências põem-se a todo profissional 18 SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /1 4 Unidade I interessado na compreensão da sua atividade para além do seu dia a dia: dada a sua alocação socioprofissional – seja no planejamento, na gestão, na execução –, nenhum/a assistente social pode pretender qualquer nível de competência profissional se prender exclusivamente aos aspectos imediatamente instrumentais e operativos da sua atividade. Em terceiro lugar, ao profissional cabe apropriar-se criticamente do conhecimento existente sobre o problema específico com o qual se ocupa. É necessário dominar a bibliografia teórica (em suas diversas tendências e correntes, as suas principais polêmicas), a documentação legal, a sistematização de experiências, as modalidades das intervenções institucionais e instituintes, as formas e organizações de controle social, o papel e o interesse dos usuários e dos sujeitos coletivos envolvidos etc. Também é importante, neste passo, ampliar o conhecimento sobre a instituição/organização na qual o próprio profissional se insere (NETTO, 2009, p. 694-95). Como se pode perceber, o autor e pesquisador da profissão coloca alguns passos que precisamos trilhar para não poluirmos as pesquisas, as ações profissionais e os resultados em relação aos sujeitos da intervenção (cabe ao técnico querer ir além do que está posto no seu cotidiano de trabalho e atuação). Vale acrescentar que também é preciso fazer a interação dos saberes de outras profissões, visto que há outros pesquisadores que podem contribuir para a interpretação e plano de ação do objeto destinado, bem como é importante que o assistente social não seja limitado, pois é pouco provável que haja uma prática eficiente e inovadora sem existir uma base de conhecimentos sólidos e verdadeiros. Saiba mais Para maior conhecimento e inter-relação com o discutido até este momento, leia o seguinte texto na íntegra: NETTO, J. P. Serviço Social: direitos sociais e competências profissionais. Introdução ao método da teoria social. Brasília: CFESS/ ABEPSS, 2009. p. 760. Com frequência são utilizados os termos eficiente, eficaz e efetivo, expressões voltadas à área administrativa, mas que contribuem para outros saberes, em especial, em equipe multidisciplinar. Nesta vertente, o profissional precisar ter clareza de seu conhecimento, pois suas ações refletirão em determinada realidade; para tanto, faremos uma discussão sobre tais palavras e respectivos conceitos. Eficiente refere-se a “1 Ação, capacidade de produzir um efeito; eficácia. 2 Mec Rendimento” (MICHAELIS, 2009). Pode-se observarque eficiência é a capacidade de fazer alguma coisa importante 19 SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /1 4 Serviço Social em equipe multidiSciplinar no que tange ao trabalho profissional. Dessa forma, o profissional precisa saber (ter competência) para desenvolver determinada ação considerada eficiente. Chiavenato e Sapiro (2009, p. 30) colocam como eficiência os atos de: • fazer as coisas da maneira certa; • resolver problemas; • salvaguardar os recursos aplicados; • cumprir o dever; • reduzir custos. De acordo com os autores citados, não há como ser eficiente se não houver clareza na meta, bem como estratégia em situações futuras e na absorção de responsabilidades. Como realizar ações ou estudos corretos sem saber quais serão executados e objetivados? Como resolver os problemas, se não há a absorção das responsabilidades? Como cumprir o dever, se não é sabido qual executar? É possível perceber, então, como é complexo o conhecimento e as intervenções. Na medida em que temos acesso a essa realidade, é possível o fortalecimento do técnico, de forma individual ou coletiva, já que a equipe trabalha com o mesmo objetivo. É pertinente visarmos a atitudes eficientes, pois: [...] relaciona-se com a maneira pela qual fazemos a coisa. É o como fazemos, o caminho, o método. No projeto anterior (aprovação em um certame), se escolhermos corretamente o melhor material, a melhor equipe docente e estudarmos de forma pró-ativa, bem provavelmente seremos aprovados em menos tempo. Aí está a eficiência: a economia de meios, o menor consumo de recursos dado um determinado grau de eficácia (CHIAVENATO, 2006, p. 181). O assistente social, ao tratar de um conhecimento, deve fazer a interlocução com a prática, já que se trata de uma profissão interventiva, uma vez que é preciso escolher os meios corretos para alcançarmos o objetivo e, consequentemente, desenvolver ações pró-ativas. Já a palavra “eficaz”, no dicionário, significa: “1 Qualidade daquilo que é eficaz. 2 Qualidade daquilo que produz o resultado esperado [...] (MICHAELIS, 2009). Ou seja, está associada a fazer corretamente aquilo que está no objetivo. Chiavenato e Sapiro (2009, p. 30) discursam que ser eficaz é: • fazer as coisas certas; 20 SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /1 4 Unidade I • produzir alternativas criativas; • maximizar a utilização dos recursos; • obter resultados; • aumentar o lucro. O conceito utilizado para eficaz associa-se ao fazer o que deve ser, de fato, feito; à realização das metas e propósitos; a diminuir desperdícios e não tê-los com ações criativas visando aos resultados. Chiavenato (2009) acrescenta que eficácia: [...] consiste em fazer a coisa certa (não necessariamente da maneira certa). Assim, está relacionada ao grau de atingimento do objetivo. Se desejamos fazer algo [...] e logramos êxito nesse projeto, somos eficazes. Dessa forma, se evidencia o cumprimento da missão, chegar ao resultado desejado (CHIAVENATO, 2006, p. 181). Ao nos direcionarmos ao vocábulo efetivo, temos: “1 Real, verdadeiro. 2 Que produz efeito; que tem efeito; eficaz. 3 Que não tem interrupção; permanente: Serviço efetivo. [...]” (MICHAELIS, 2009). Para nossos estudos serem efetivos, é preciso estar concentrado no ato de proporcionar a continuidade das ações, ou seja, ter a permanência da ação para se atingir as metas. A efetividade do técnico está direcionada ao fato de este conseguir manter-se no meio ao qual foi proposto, com resultados bem-sucedidos durante o percurso do trabalho, para o qual teve uma coordenação de esforços e “quereres” de maneira ordenada, para que o público envolvido, interno e externo, ficasse satisfeito. Chiavenato (2006, p. 181) discursa sobre o conceito de efetividade com um breve exemplo prático e lúdico: [...] por fim, a efetividade ressalta o impacto, à medida que o resultado almejado (e concretizado) mudou determinado panorama, cenário. Considerando a construção de escolas e o incremento no número de professores contratados, a efetividade evidenciará, por exemplo, de que maneira isso contribuiu para a redução do índice de analfabetismo (impacto). Nesse diapasão, há autores que defendem que a efetividade decorre do alcance da eficácia e da eficiência, simultaneamente. Numa outra acepção, pode ser entendida, também, como satisfação do usuário. Na “ponta da linha”, a efetividade ocorre quando um produto ou serviço foi percebido pelo usuário como satisfatório. O autor nos direciona a entender que a efetividade é o impacto que o resultado das ações desenvolvidas pelos profissionais causou em determinada realidade; se está associada ao objetivo 21 SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /1 4 Serviço Social em equipe multidiSciplinar do trabalho; e se o resultado foi satisfatório, não somente para os realizadores, mas também para o público-alvo. Para o assistente social, é de grande valia essa preocupação com o índice de satisfação dos sujeitos da ação desenvolvida, pois não haverá resultado com excelência se o profissional não atingir as expectativas das pessoas que foram o foco da construção do trabalho. Neste sentido, é pertinente criar mecanismos de interlocução com os demais técnicos, caso seja foco do trabalho da instituição (nos remeteremos a exemplos de ações desenvolvidas com outros profissionais, já que é o objetivo desta disciplina). O assistente social, de maneira ampla, estuda e age em prol do desenvolvimento humano de forma igualitária. Mas o que significa “desenvolvimento”? 1 Ato ou efeito de desenvolver. 2 Crescimento ou expansão gradual. 3 Passagem gradual de um estádio inferior a um estádio mais aperfeiçoado. 4 Adiantamento, progresso. 5 Extensão, prolongamento, amplitude [...] (MICHAELIS, 2009). Independentemente da área, nenhuma atitude que vise ao desenvolvimento deve ser entendida como forma de elevar algo a um nível melhor; é preciso trabalhar com a autonomia dos envolvidos, pois “o que pode ser bom para você, pode não ser para o outro”; logo, a questão “colocar em nível melhor” é muito relativa, já que cada técnico e cada indivíduo possui seu entendimento de bom e ruim. O conceito de desenvolvimento estava associado à industrialização, ao acúmulo da riqueza socialmente produzida, emprego e renda para todos, sob “responsabilidade” do mercado e de empresas privadas (visão neoliberal), porém houve o incremento do desenvolvimento social para tratar dos problemas crescentes no que tangia à desigualdade e à exclusão social em diversos aspectos. O tema Desenvolvimento desperta tanto interesse que há um conjunto de ações que a Organização das Nações Unidas (ONU) propõe ao mundo, os chamados Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) promovidos na Assembleia do Milênio. Trata-se de um debate entre os chefes de Estado e de governos do planeta. Das 191 delegações presentes, 147 foram lideradas por suas autoridades de mais alto escalão, ou seja, um evento com uma magnitude jamais realizada, resultando na aprovação da Declaração do Milênio, ocorrida em setembro de 2000, tendo como objetivos: • erradicar a extrema pobreza e a fome; • atingir o ensino básico universal; • promover a igualdade de gênero e a autonomia das mulheres; • reduzir a mortalidade infantil; • melhorar a saúde materna; 22 SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /1 4 Unidade I • combater o HIV/Aids, a malária e outras doenças;• garantir a sustentabilidade ambiental; • estabelecer uma parceria mundial para o desenvolvimento. Soares (2008, p. 49) é enfático e relata que o desenvolvimento social é diferente do econômico e possui duas vertentes: [...] a primeira deriva da ênfase em níveis mínimos, necessidades básicas e conceitos relacionados. Está associada com a noção humanitária [...] de que deve ser uma prioridade mundial não deixar ninguém abaixo de certo nível de qualidade de vida; esse conceito se integra a outro importante na ciência política, que é o da cidadania, [...] que inclui direitos sociais. A segunda vertente é distributiva. Tem também origem valorativa, no sentido de que ideologias ou quase-ideologias sociais consideram que a concentração de benefícios numa sociedade acima de certo nível é ética e moralmente inaceitável. Talvez a mais fácil de medir seja a concentração de renda [...], porém, conceitualmente, ela se aplica a todos os benefícios sociais. Conceituar a expressão “desenvolvimento social” é algo complexo, mas não valerá nada saber a definição se não houver uma reflexão teórica sobre o tema, que deve ser analisado de acordo com o processo vivenciado; assim, seu significado se redefine na medida em que a realidade se faz presente, levando a uma percepção maior: o mundo não é estático e previsível. 1.2 Mudanças nos processos de trabalho O assistente social não é diferente de outros técnicos e precisa ter claro para si que os processos de trabalho estão em constante transformação, sobretudo para atender aos interesses do empresariado. Saiba mais Indicamos a leitura, na íntegra, e a interpretação do texto de Maria Carmelita Yazbek (doutora em Serviço Social, professora do programa de pós-graduação em Serviço Social da PUC/SP, representante de área do Serviço Social na Capes), intitulado “Pobreza e Exclusão Social: Expressões da Questão Social no Brasil” (Revista Temporalis, n. 3. Brasília: ABEPSS, 2001), pois a apropriação do conhecimento é reforçada com a busca de novos saberes de forma totalitária. 23 SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /1 4 Serviço Social em equipe multidiSciplinar Lembrete Não se pode caracterizar o sujeito com vulnerabilidade econômica como pobre, pois esta expressão não o define, já que é uma situação (e não um estado concreto) não passível de mudanças. É interessante começarmos contextualizando as reconfigurações do capitalismo que traz em seu bojo consequências marcantes e significativas aos trabalhadores que estão no processo de “mudança social regressiva” (YAzBEK, 2001, p. 33). Mas por quê? O modo de divisão capitalista por si só é desigual, ou seja, “cuja apropriação da riqueza socialmente gerada é extremamente diferenciada” (YAzBEK, 2001, p. 33). Nossa sociedade, como dito, é separada por classes, que são: • empresariado: capitalistas detentores dos meios de produção e da riqueza socialmente produzida; • trabalhadores: proletários que trabalham como empregados nesses meios de produção, ou seja, vendem sua força de trabalho para suprir as necessidades cotidianas e gerar rendimentos aos empresários. É com os detentores dos meios de produção que está concentrado o maior número dos resultados da produção em relação aos trabalhadores, enquanto estes possuem apenas o salário como forma de custear as despesas básicas para si e sua família. Como é de conhecimento público, os trabalhadores que têm mão de obra pouco qualificada ou que estão no mercado informal de trabalho têm baixos salários ou rendimentos, acarretando desigualdade cotidiana no acesso e na permanência à situação de sujeitos de direitos. Não será possível a criação de nenhuma intervenção se não tivermos uma aproximação desse conhecimento diante das diferenciações entre os tecidos socialmente estabelecidos, pois os interesses são antagônicos. Dessa maneira, o termo “mudança social regressiva” (YAzBEK, 2001, p. 33) representa as mudanças que são realizadas para beneficiar apenas o empresariado; assim, nos trabalhadores e na sociedade em geral, é refletida uma sensação de retrocesso na questão das conquistas. A contradição das classes sociais é dada pela estrutura econômica, pois é preciso intensificar o trabalho na tangente da apropriação dessa riqueza social, que deveria ser distribuída a todos; mas, como já discursado, não é. Yazbek (2001, p. 33-4) explana que a contraditória conjuntura atual assume novas configurações e expressões como: [...] as transformações das relações de trabalho; [...] a perda dos padrões de proteção social dos trabalhadores e dos setores mais vulnerabilizados da sociedade que veem seus apoios, suas conquistas e direitos ameaçados. 24 SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /1 4 Unidade I Então, o modo econômico atual gera diversos problemas de natureza social, sobretudo, aos trabalhos que, por estarem nessa condição, já se apresentam em grande parte como vulnerabilizados. Para complemento dos estudos é preciso remeter a alguns significados das expressões: • pobreza; • exclusão; • subalternidade. Ao trabalharmos, na perspectiva teórica ou prática, com a pobreza, não abordamos essa perspectiva associada somente à questão econômica e/ou de renda, mas como “um fenômeno multidimensional, categoria política que implica carecimentos no plano espiritual, no campo dos direitos das possibilidades e esperanças” (YAzBEK, 2001, p. 34). Há diferentes formas de se viver em situação de pobreza e são interessantes essas observações, para não fecharmos nossos olhares e reduzi-los a apenas um direcionamento. O termo “exclusão” pode ser entendido como “modalidade de inserção que se define paradoxalmente pela não participação e pelo mínimo usufruto da riqueza socialmente construída” (YAzBEK, 2001, p. 34). Ao indivíduo ou grupo que presencia a exclusão são negados os direitos, bem como o exercício da cidadania em detrimento dos interesses dos empresários. Já a subalternidade é uma palavra complexa associada às desigualdades, injustiças e opressões. Assim, “diz respeito à ausência de protagonismo, de poder, expressando a dominação e a exploração” (YAzBEK, 2001, p. 34). Muitas vezes enxergamos o público-alvo de nossas intervenções como uma pessoa errada, que não quer ser auxiliada, mas não refletimos sobre a construção da sociedade capitalista, bem como suas influências no cotidiano. A expansão capitalista, por sua vez, intensifica a desigualdade, visto que faz parte de sua característica a existência da diferenciação, e, com o aumento do número de trabalhadores, a pobreza é intensificada, pois “a pobreza é uma face do descarte de mão de obra barata, que faz parte da expansão capitalista” (YAzBEK, 2001, p. 35). A geração da pobreza cria o ser necessitado, que é desamparado em diversos aspectos e vive com tensão, em virtude da sua instabilidade no trabalho (YAzBEK, 2001), pois a venda de sua mão de obra é a única forma de promover rendimento. Para fins de exemplificação, é só observarmos as filas de candidatos a alguma vaga de emprego: o número é muito maior do que a quantidade de oportunidades oferecidas e, com isso, os que as ofertam podem reduzir os salários e outros benefícios. Com a falta do trabalho formal, intensifica-se a necessidade de o ser humano (proletário) flexibilizar sua forma de obtenção de renda, aumentando o número de trabalhadores informais, trazendo em seu bojo a falta das proteções que teriam se estivessem em um trabalho formal, o que reflete diretamente em seus direitos sociais, e não só trabalhistas. É certo que a sociedade contemporânea é desigual, sobretudo, por ser resultado do modo econômico capitalista, com dificuldadesde acesso a serviços e produtos essenciais à manutenção da 25 SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /1 4 Serviço Social em equipe multidiSciplinar vida, principalmente aos trabalhadores que estão na posição de subalternizados e excluídos, para quem tais questões deveriam ser tratadas com a perspectiva dos direitos, e não sendo repassadas na forma de ajuda. Tal “ajuda” não é prestada com a interpretação de que as pessoas são excluídas pelo modo desigual de distribuição da riqueza social, mas na perspectiva de que estas não conseguiram se adaptar ao modo de vida e as regras do capitalismo, fortalecendo a política neoliberal; assim, tal caridade é validada como uma obrigação moral, e não um direito passível de pleito. Ao tratar da questão do pensamento dos liberais, Yazbek (2001, p. 36) diz que estes “entendem como necessária a filantropia revisitada, a ação humanitária, o dever moral de assistir aos pobres, desde que este não se transforme em direito ou em políticas públicas dirigidas à justiça e à igualdade”. A partir deste momento, é preciso que se redobre a atenção frente às suas ações como futuro profissional, para não compactuar com esse pensamento nem reproduzi-lo. Em linhas gerais, é interessante refletir sobre a questão social no Brasil e sobre como ela não é analisada e combatida como deveria, com ações politizadas, não sendo vista como “expressão de relações de classe e, neste sentido, desqualificá-la como questão pública, questão política, questão nacional, numa sociedade privatizada que desloca a pobreza para o ‘lugar da não política’” (YAzBEK, 2001, p. 36). É entendido que essas problemáticas são resolvidas com ações filantrópicas e de forma individualizada, mas é na realidade que todas as necessidades são aparentes. observação O que acontecerá se promovermos a despolitização das ações de enfrentamento da questão social? Promoveremos o afastamento de ações públicas de maneira eficiente, eficaz e efetiva, desqualificando as políticas sociais e reforçando o “não direito” e a benevolência. Nesta perspectiva, deve-se ter claro que as ações não são judicialmente reclamáveis. Com esse modo de agir e de interpretar, é potencializado o crescimento do “abismo entre o país real e o país legal” (YAzBEK, 2001, p. 37), já que as ações não são realizadas em meio às questões legalmente instituídas, contemplando um modelo de Estado reducionista em relação às intervenções no campo social, e apelativo quanto à solidariedade social. As ações não condizem com o que a “realidade pede”, provocando o aumento das ações do terceiro setor, ou seja, ações privadas para fins públicos, mas não na perspectiva do direito legalmente instituído. Não pensem que o autor é contra as iniciativas do terceiro setor, pelo contrário, mas é preciso refletir sobre essas questões, para amplificarmos nosso senso crítico e não termos uma interpretação fragmentada; assim, na medida em que as instituições agem em campos que deveriam ser do Estado, este fica em situação cada vez mais confortável, deixando de preocupar-se com seus deveres. A proposta neoliberal visa a ações reducionistas; possuem “visão de política social apenas para complementar o que não se conseguiu via trabalho, família ou comunidade” (YAzBEK, 2001, p. 37), ou seja, as ações estatais são realizadas em última instância. 26 SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /1 4 Unidade I O Estado brasileiro contemporâneo não atua em áreas em que a sociedade possa assumir tal responsabilidade, portanto as políticas públicas tendenciosamente assumem perfil de improvisação e inoperância, não sendo universais nos acessos. “Décadas de clientelismo consolidaram uma cultura tuteladora que não tem favorecido o protagonismo nem a emancipação dessas classes em nossa sociedade” (YAzBEK, 2001, p. 37). Quando refletimos sobre mudarmos nossas ações, é para tentarmos (e conseguirmos) intervir de forma renovadora na cultura promotora da desigualdade tutelada e subalternizada. O que se pretende com a troca do direito? “[...] uma maneira de construir a lealdade dos subalternos” (YAzBEK, 2001). Assim é reforçada a ideia de perda do protagonismo, troca de favores e do afastamento de ações entendidas como direito do cidadão e dever do Estado. Tal conduta intensificada pela maneira como somos criados, ou seja, com condutas individuais, torna difícil uma ação politizada, já que a sociedade em situação de pobreza tem suas dificuldades como certezas de vida, não conseguindo analisar e solicitar seus direitos. Sabemos que as sequelas da questão social permeiam a vida das classes subalternas destituídas de poder, trabalho e informação. Sabemos também que em nossa prática cotidiana a relação com o real é uma relação com a singularidade expressa nas diferentes situações que trabalhamos. E aí se colocam nossos limites e nossas possibilidades. Limites de várias ordens, mas, sobretudo, limites de ordem estrutural (YAzBEK, 2001, p. 39). Ou seja, as dificuldades sociais não são problemas contemporâneos, mas fazem parte de um processo em favor de uma minoria denominada empresários, e é preciso que haja envolvimento na rede de serviço, para que possamos trabalhar de maneira coletiva com as expressões da questão social vivenciadas pelos vulnerabilizados. É preciso entender que a assistência social é um direito legalmente constituído e não contributivo, que faz parte do tripé seguridade social-saúde-previdência social, avanço apresentado na redação da Constituição Federal de 1988. Porém, presenciamos a diminuição com os gastos sociais, o que não torna possível o investimento na proteção social de maneira plena. Para maior compreensão das transformações nos processos de trabalho, é pertinente remetermos à Revolução Industrial, pois, com ela, houve a mudança do cotidiano do trabalho, o qual foi sendo reconfigurado até chegar à contemporaneidade. A Revolução Industrial teve início no século XVIII, na Inglaterra, com a mecanização dos sistemas de produção, já que, anteriormente a esse sistema, eram utilizados a manufatura e o artesanato como forma de obtenção dos produtos para o cotidiano; tem como berço a Inglaterra, por motivos que a favoreciam, como intensas reservas de carvão mineral que eram utilizadas como fonte de energia para conduzir as locomotivas a vapor e máquinas, o número de habitantes e as condições para o financiamento das ferramentas necessárias para a instalação (humanas ou não). Para satisfazer aos interesses do capital, havia mercado consumidor para comprar os produtos fabricados. 27 SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /1 4 Serviço Social em equipe multidiSciplinar Vale destacar que as fábricas, nesse período, não proporcionavam condições de trabalho adequadas. Os operários tinham ambientes de trabalho precários, com iluminação prejudicada, insalubres, sem ventilação, salários insuficientes para a manutenção dos gastos cotidianos, jornadas de trabalho exaustivas (mais de 15 horas de trabalho diárias), utilização de mão de obra infantil. Nesse momento da história, eram desconhecidos os direitos trabalhistas, fazendo os que estavam na condição de “mercadoria” ficarem coagidos e não reclamarem dos problemas vividos, pois aos desempregados não restava nenhum auxílio. No decorrer dessa triste realidade, os trabalhadores começaram a reconhecer-se como um grupo. As primeiras representações em relação às manifestações foram as trade unions, espaços reservados para que os operários pudessem se unir para pleitear melhores condições de trabalho em âmbitogeral, podendo ser comparados a um sindicato. Outra tentativa para conseguirem direitos e melhor qualidade de vida no trabalho foi o ludismo, o qual teve como característica a violência. Por muito tempo não havia leis que assegurassem direitos aos trabalhadores. Mas estes sempre lutaram. Uma das primeiras manifestações foi o ‘ludismo’, movimento em que os trabalhadores destruíram as máquinas das fábricas. Equivocadamente a elas eram atribuídas as péssimas condições de sua existência. Não possuíam ainda consciência política para compreender que o sistema capitalista e a burguesia eram os responsáveis pela exploração que lhes era imposta. Foi com a organização de sindicatos, denominados trade unions, nos países anglo-saxônicos, que a luta ganhou maior consistência, desde os primórdios do século XIX. O movimento operário inglês foi o primeiro a existir, porque foi na Inglaterra onde primeiro se implantou o capitalismo. Greves e passeatas, embora duramente reprimidas, ocorriam sob a direção de sindicatos e associações operárias (GIANOTTI, 2007, p. 11-2). Com a industrialização, houve aumento da fabricação de produtos, diminuindo os gastos de produção, o que tornava os preços mais atrativos aos consumidores; todavia, gradativamente, os trabalhadores eram substituídos pelas máquinas, movimento que ocorre até os dias atuais. A poluição ambiental, o aumento da poluição sonora, o êxodo rural e o crescimento desordenado das cidades também foram consequências nocivas para a sociedade. Até os dias de hoje, o desemprego é um dos grandes problemas nos países em desenvolvimento. Gerar empregos tem se tornado um dos maiores desafios de governos no mundo todo. Os empregos repetitivos e pouco qualificados foram substituídos por máquinas e robôs. 28 SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /1 4 Unidade I As empresas procuram profissionais bem-qualificados para ocuparem empregos que exigem cada vez mais criatividade e múltiplas capacidades. Mesmo nos países desenvolvidos têm faltado empregos para a população (SOARES, 2008). A Inglaterra pressionava os países que ainda possuíam escravos, pois queriam o aumento do mercado consumidor e trabalhadores mais “domáveis”; assim, o Brasil, parceiro comercial, também estava nessa perspectiva e precisava atender aos interesses do processo de industrialização, pois grandes latifundiários das colônias inglesas estavam se sentindo lesados, já que, devido ao aparecimento, nessas regiões, do trabalho assalariado, aumentou o custo de produção, e, como o Brasil não tinha esse custo, os produtos brasileiros eram mais baratos, e os ingleses donos de terras pressionavam o parlamento para que fosse tratado o fim da escravidão de maneira mais direta, proporcionando, em 1845, a aprovação da lei Aberdeen Act (Lei Bill Aberdeen), que autorizava a Marinha Real Britânica a apreender qualquer navio envolvido no tráfico negreiro. Como consequência, cinco anos mais tarde, em solo brasileiro, foi criada a Lei Eusébio de Queirós, que proporcionou a diminuição substancial do tráfico, que era a forma mais usada para conseguir escravos, embora alguns senhores contrabandeassem ilegalmente escravos africanos, mas ainda assim a medida proporcionou aumento significativo do preço a ser pago para a obtenção de escravos. Após essa observação é visível que o trabalho esteve e está presente em toda a vida cotidiana, pois, com o resultado, ou seja, com o salário, é possível comprar os bens necessários para a manutenção da vida; entretanto, como já analisado, ele se torna insuficiente, e esta condição coloca o trabalhador em situação vulnerável, que pode ser potencializada por outras questões, pois: O trabalho humano se encontra na base de toda a vida social. Os homens, impulsionados pelas necessidades vitais, apropriam-se da natureza e produzem os bens necessários à sua manutenção, que lhes dão condições de existir, de se reproduzir e de “fazer história”, salientaram Marx e Engels (1982, p. 19). Satisfeitas as primeiras necessidades, surgem outras exigindo novas soluções que direcionam o homem nas relações com os outros homens. Enredado nesse conjunto de relações sociais, como um ser social e histórico, este desenvolve sua práxis, atividade material pela qual ele “faz o mundo humano” e transforma-se a si mesmo (VAzQUEz, 1977, p. 9). Assim, através de contínuas transformações das condições sociais realizadas pela práxis humana, foram sendo gerados os progressos econômicos e sociais, bem como toda uma cultura. Na teoria marxista, o modo de produção oferece elementos para caracterizar as sociedades e analisar as suas transformações (BULLA, 2003, p. 2). As relações partem das necessidades construídas pelo homem. As atividades são desenvolvidas para atender a uma determinada necessidade humana e, ao mesmo tempo, comercial. Nesse sentido, o modo 29 SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /1 4 Serviço Social em equipe multidiSciplinar de produção oferece ferramentas para atender a tais exigências na mesma proporção em que faz o desenvolvimento da práxis. O homem tem a diferenciação com os demais animais em razão da capacidade de planejar as ações executadas, ou seja, caso precise de uma cadeira, detém a inteligência para tal transformação da natureza para seu benefício, diferentemente dos outros animais, que agem apenas por instinto. Sob esse prisma, a sociedade não é homogênea, pois apresenta necessidades diferenciadas entre os grupos que a formam (relações de produção e forças produtivas); consequentemente, tais relações “modelam” a sociedade em classes e estrutura; o modo de produção utilizado influenciará diretamente os que pertencem ao mesmo tecido social (trabalhador ou empresário), assim: [...] no processo de trabalho, os homens criam determinadas relações entre eles (relações de produção), que, juntamente com a capacidade de produzir (forças produtivas), constituem o modo de produção. O nível de desenvolvimento dessas forças produtivas materiais e as relações de produção correspondentes determinam, segundo Marx e Engels (1982), os diferentes tipos de sociedade. As relações de produção modelam, portanto, a estrutura social e a repartição da sociedade em classes. Quando as condições materiais de produção mudam também, se alteram as relações entre os homens que ocupam a mesma posição na sociedade de classes (BULLA, 2003, p. 2). Na década de 1930, tem início a instalação, de forma intensa, das indústrias no Brasil, pois, anteriormente a esse momento, o ritmo não justificava a concentração dos proletários nos centros urbanos. “[...] Antes de 1930, um parque industrial ainda incipiente não permitira a concentração do proletariado, mas a questão social já se fazia perceber localizadamente” (BULLA, 2003, p. 5). A década em questão foi importante para as transformações sociais nacionais, em virtude da Revolução de 1930, que fez uma divisão no modo de produção do Brasil, migrando da cultura rural e manual para a urbanizada e industrial: [...] na realidade, a referida revolução pode ser considerada como um ponto divisório entre dois períodos distintos da história da sociedade brasileira: a época de vigência do sistema agrário-comercial, amplamente vinculado ao capitalismo internacional, e a do sistema urbano-industrial, voltado para o mercado interno que emergia paulatinamente, encontrando bases cada vez mais sólidas de expansão (BULLA, 2003, p. 5). Nesse mesmo momento da história do país, houve crescimento significativo da industrialização, dos salários, do mercado consumidor, das pessoas nos centros urbanos, da renda individual, mas também ascenderam, na mesmaproporção, os problemas de cunho social, como: • concentração de renda; 30 SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /1 4 Unidade I • diferenciação das classes sociais; • problemas urbanos: saneamento básico, falta de moradia, infraestrutura; • acesso à educação; • tensões na relação entre capital e trabalho. Como podemos constatar a seguir: A partir de 1930, o Brasil entrou num período de maior desenvolvimento econômico, que se refletiu no aumento da renda per capita, dos salários reais e do consumo. Simultaneamente, registrou-se um incremento da taxa de crescimento da população e de urbanização. A concentração da população nas áreas urbanas trouxe consigo problemas de assistência, educação, habitação, saneamento básico, de infraestrutura e tantos outros. Na medida em que a industrialização avançava, crescia a concentração da renda, ampliando-se as desigualdades sociais, aumentando as tensões nas relações de trabalho e agravando-se a questão social (BULLA, 2003, p. 5). O Estado, com a visão liberal, não atuava nesses problemas de forma direta, deixando a liberdade de intervenção aos envolvidos, trabalhadores e empregadores, relação desigual devido à ocupação que cada ator possui na dinâmica industrial que fica nítida na Constituição Federal de 1891 (a ausência do Estado na economia), bem como na intervenção diante desses problemas emergentes. O Estado, com sua concepção liberal, expressa mais manifestamente na Constituição Brasileira de 1891, negava-se a intervir nos conflitos entre patrões e empregados e se opunha a realizações sociais distributivas de caráter obrigatório (FISCHLOWITz, 1964). De acordo com as concepções vigentes, não se admitia a intervenção direta do Estado na economia. Ele atuava como um simples “regulador do livre jogo das forças econômicas, administrando, cobrando impostos, fornecendo meios de comunicações e transportes baratos para a circulação de mercadorias” (FLORES, 1986, p. 98). Ao contrário do que acontecera em governos anteriores, entretanto, o governo populista, que assumiu o poder logo após a Revolução de 1930, reconheceu a existência da questão social, que passou a ser uma questão política a ser enfrentada e resolvida pelo Estado (BULLA, 2003, p. 5). Com o início avassalador da industrialização no Brasil, os detentores do poder começam a ficar coagidos com as manifestações dos trabalhadores, pois dependiam diretamente de sua força de trabalho, motivo que levou o então presidente, Getúlio Vargas, a criar diversas políticas sociais em detrimento dos 31 SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /1 4 Serviço Social em equipe multidiSciplinar interesses dessa classe, ficando à margem os desempregados, situação analisada como uma forma de punição por não “ajudarem” o país a se desenvolver; porém, é fator para o crescimento do capitalismo ter o exército de mão de obra de reserva, conforme Marx expõe. Nessa mesma dinâmica, os proletários começam a se enxergar como um grupo que possui problemas parecidos. Têm início, então, as manifestações em prol de melhores condições de trabalho e de vida, movimento igual ao europeu. Apenas nessa década e durante o governo Vargas (1930-1945) foram instituídas duas Constituições Federais, em 1934 e 1937. O presidente tinha como uma das principais características o populismo.2 Art. 115 – A ordem econômica deve ser organizada conforme os princípios da Justiça e as necessidades da vida nacional, de modo que possibilite a todos existência digna. Dentro desses limites é garantida a liberdade econômica. [...] Art. 121 – A lei promoverá o amparo da produção e estabelecerá as condições do trabalho, na cidade e nos campos, tendo em vista a proteção social do trabalhador e os interesses econômicos do País. [...] b) salário mínimo, capaz de satisfazer, conforme as condições de cada região, às necessidades normais do trabalhador; [...] Art. 138 – Incumbe à União, aos Estados e aos Municípios, nos termos das leis respectivas: a) assegurar amparo aos desvalidos, criando serviços especializados e animando os serviços sociais, cuja orientação procurarão coordenar; [...] c) amparar a maternidade e a infância; [...] e) proteger a juventude contra toda exploração, bem como contra o abandono físico, moral e intelectual; f) adotar medidas legislativas e administrativas tendentes a restringir a moralidade e a morbidade infantis; e de higiene social, que impeçam a propagação das doenças transmissíveis; g) cuidar da higiene mental e incentivar a luta contra os venenos sociais (BRASIL, 1934). 2 “O populismo pode ser definido, em síntese, como a política estatal de controle das classes trabalhadoras urbanas (operariado, classes médias assalariadas, pequena burguesia proprietária). Em outras palavras, no populismo, os grupos burgueses que exercem o poder, incapacitados de controlar as camadas populares, recorrem ao Estado para que este intermedeie os conflitos de classes” (SILVA, 1992, p. 53). 32 SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 3/ 02 /1 4 Unidade I Como podemos verificar, aos trabalhadores formais foi instituído o salário mínimo, um primeiro indício de proteção para uma vida mais digna para o proletariado. São estabelecidas, via salário mínimo, garantias primárias de sobrevivência, a partir da venda e compra de sua força de trabalho, único meio para viabilizar seu sustento. Contudo, o art. 115 responsabiliza a economia para basear-se nos “princípios da justiça e as necessidades da vida nacional, de modo que possibilite a todos existência digna”; entretanto, não eram todos que possuíam meios para serem trabalhadores, sobretudo, pela falta de oportunidades. No art. 138, torna-se evidente a preocupação do Estado em relação aos movimentos reivindicatórios; há a intenção de agir a fim de distanciar o trabalhador dessa prática, sendo um sujeito submisso ao governo. No Título IV da Constituição de 1934 (“Da Ordem Econômica e Social”), são priorizadas ações para melhoria na vida do trabalhador, porém o número de pessoas sem trabalho era tão grande que, em 1931, havia em torno de 2 milhões de desempregados e subempregados no país, principalmente, em São Paulo e no Rio de Janeiro, devido: • ao deslocamento da classe trabalhadora rural para o meio urbano; • à politização da questão social, que passa a ser tratada como problema social; • ao desemprego causado pela crise econômica de 1929; • ao desabastecimento decorrente da Segunda Guerra Mundial; • à expansão do assistencialismo que norteava as medidas trabalhistas. Na Constituição Federal de 1937, da qual este estudo destacou o capítulo que trata da família, estão estabelecidas garantias no âmbito social: Art. 124 – A família, constituída pelo casamento indissolúvel, está sob a proteção especial do Estado. Às famílias numerosas serão atribuídas compensações na proporção dos seus encargos. Art. 125 – A educação integral da prole é o primeiro dever e o direito natural dos pais. O Estado não será estranho a esse dever, colaborando, de maneira principal ou subsidiária, para facilitar a sua execução ou suprir as deficiências e lacunas da educação particular. [...] Art. 127 – A infância e a juventude devem ser objeto de cuidados e garantias especiais por parte do Estado, que tomará todas as medidas destinadas a assegurar-lhes condições físicas e morais de vida sã e de harmonioso desenvolvimento das suas faculdades. O abandono moral, 33 SS OC - R ev isã o: Vi rg in ia /V al er ia - D ia
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