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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI RAQUEL DA SILVA MARTINS ASSISTÊNCIA SOCIAL NO BRASIL: Beneficio de Prestação Continuada LOAS (Lei Orgânica de Assistência Social) Biguaçu 2010 i RAQUEL DA SILVA MARTINS ASSISTÊNCIA SOCIAL NO BRASIL: Benefício de Prestação Continuada Loas (Lei Orgânica de Assistência Social) Monografia apresentada como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito, na Universidade do Vale de Itajaí, Centro de Educação de Biguaçu. Orientador: Prof. Márcio Roberto Paulo Biguaçu 2010 ii AGRADECIMENTO Agradeço aos meus familiares, aos meus amigos e ao meu Mestre pelo apoio e compreensão no momento da elaboração deste trabalho. iii DEDICATÓRIA Dedico este trabalho aos meus pais, Joaquim Martins e Bernadete da Silva, por terem me dado meu bem maior: a vida! Dedico também aos meus irmãos, Fernando Joaquim Martins, Silvania da Silva Martins e Cristina da Silva Martins e ao meu companheiro Fabiano Schütz e em especial a minha grande amiga Simone Prosdossimi Stähelin responsáveis pelos melhores momentos da minha vida. iv TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo. Biguaçu, 2010 Raquel da Silva Martins Graduanda v RAQUEL DA SILVA MARTINS ASSISTÊNCIA SOCIAL NO BRASIL: Benefício de Prestação Continuada LOAS (Lei Orgânica de Assistência Social) Esta monografia foi julgada adequada para a obtenção do título de Bacharel em Direito e aprovada pelo Curso de Direito da Universidade do Vale de Itajaí, Centro de Educação de Biguaçu. Área de Concentração: Direito Previdenciário Biguaçu, junho de 2010. Prof. Márcio Roberto Paulo UNIVALI – CE de Biguaçu Orientador Prof. Fabiana Ávila UNIVALI – CE de Biguaçu Membro Prof. Carlos Alberto Godoy Ilha UNIVALI – CE de Biguaçu Membro vi ROL DE ABREVIATURAS OU DE SIGLAS BPC Beneficio de Prestação Continuada CF/88 Constituição Federal de 1988 CPF Cadastro de Pessoa Física CTPS Carteira de Trabalho e Previdência Social INSS Instituto Nacional de Seguridade Social LOAS Lei Orgânica de Assistência Social NIT Numero de Identificação do Trabalhador OIT Organização Internacional do Trabalho RGPS Regime Geral de Previdência Social SUS Sistema Único de Saúde TRF Tribunal Regional Federal x SUMÁRIO RESUMO....................................................................................................................XI ABSTRACT ..............................................................................................................XII INTRODUÇÃO.............................................................................................................1 1 SEGURIDADE SOCIAL............................................................................................3 1.1 HISTÓRICO DA PROTEÇÃO SOCIAL...................................................................3 1.2 HISTÓRICO CONSTITUCIONAL...........................................................................8 1.3 DENOMINAÇÃO DE SEGURIDADE SOCIAL......................................................11 1.4 CONCEITO DE SEGURIDADE SOCIAL..............................................................13 2 SEGURIDADE SOCIAL: SAUDE, ASSISTÊNCIA SOCIAL E PREVIDÊNCIA SOCIAL...................................17 2.1 A SAÚDE..............................................................................................................18 2.2 ASSISTÊNCIA SOCIAL........................................................................................24 2.3 PREVIDÊNCIA SOCIAL.......................................................................................25 3 ASSISTÊNCIA SOCIAL: BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA (LOAS) ........................................34 3.1 SOBRE O BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA....................................38 3.2 PARA QUEM?......................................................................................................42 3.3 DOCUMENTOS....................................................................................................45 3.4 VALOR..................................................................................................................47 3.5 REGRAS...............................................................................................................49 4 CONCLUSÃO.........................................................................................................53 5 REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS................................................................56 xi RESUMO Este trabalho apresenta inicialmente a seguridade social bem como o histórico da proteção social, onde este anseia a proteção do economicamente insuficiente, bem como os princípios norteadores da seguridade social, conhecendo os riscos de algumas atividades desenvolvidas no meio social oferecendo uma certa segurança ao carente. No ano de 1919, houve a necessidade de criar as Organizações Internacionais do Trabalho, que dispunha sobre a obrigação de um programa de previdência social. Em contra partida a Constituição de 1824, já versava sobre o tema da seguridade social, porem só com a Constituição Federal de 1934, inclui em seu texto a palavra previdência. Com o advento da Constituição Federal de 1988 positivou em seu texto a seguridade social visando proporcionar a sociedade à proteção a saúde, a previdência social e a assistência social. O beneficio de prestação continuada, está conexo ao pagamento mensal de um salário mínimo aos beneficiários, sendo eles, deficientes que sejam incapazes para atividade laboral e ao idoso com 65 anos ou mais que não tenham meio para se manter e nem família que os sustentem, sendo que este benefício é intransferível. Em pesquisa doutrinária não houve entre os doutrinadores divergências sobre o beneficio de prestação continuada, em contra partida na jurisprudencial há entendimentos diversos, pois, em cada caso a ser analisado possuem peculiaridades diferentes. Palavras chave: Previdência Social, Assistência Social e Benefício de Prestação Continuada. xii ABSTRACT This paper first presents the social security as well as the history of social protection, where it longs to protect the economically poor, and the guiding principle of social security, knowing the risks of some activities undertaken in the social environment offering some security to the needy. In 1919, there was a need to create the International Organization of Labor, which had about the obligation of a welfare program. By contrast the Constitution of Brazil of 1824, already was about the theme of social welfare, but only with the Constitution of 1934, includes in its text the word welfare. With the advent of the 1988 Federal Constitution in its text the positive social security company aiming to provide health protection, social security and social assistance. The benefit of continuous provision is related to the monthly payment of minimum wages to the beneficiaries, and they, the disabled who are unable to work activity and the elderly aged 65 or older who have no means to maintain and sustain the familyor, and this benefit is not transferable. In research there were no doctrinal differences between scholars about the benefits of providing continuous, in departure from the jurisprudential understandings different because in each case to be analyzed have different peculiarities. Keywords: Welfare, Social Welfare and Benefit Continued. 1 INTRODUÇÃO A presente monografia aborda a “Assistência Social no Brasil: Benefício de Prestação Continuada (LOAS)”. Tem-se como objeto da presente pesquisa, a análise doutrinária sobre a assistência social no Brasil, no que compete ao benefício de prestação continuada instituído pela lei orgânica da assistência social (LOAS). Desta feita, objetiva-se estudar o histórico da seguridade social para descobrir a origem do assistencialismo brasileiro; analisar os desdobramentos da seguridade social, ou seja, a saúde, a previdência social e a assistência social; observar as características para a concessão do benefício, bem como os beneficiários, o valor, as regras, entre outros fatores. Dentre tantos benefícios proporcionados pela seguridade social, o presente estudo teve como motivação saber quem podia receber o benefício de prestação continuada, e quais os requisitos exigidos pela lei brasileira para a sua concessão, abordando a doutrina cabível para esta temática. Desta forma, a delimitação do tema desta monografia ocorre com o estudo da assistência social, desvendando o benefício de prestação continuada inserido na Lei Orgânica da Assistência Social. Neste sentido, utilizar-se-á o método dedutivo, que se inicia do geral para o específico. Durante todo o estudo desta monografia foi utilizada uma metodologia baseada em pesquisa bibliográfica, partindo-se de trechos escritos por autores da área, usando a legislação relacionada ao tema, com intuito de garantir o bom desenvolvimento da pesquisa, bem como a finalização desta. Ademais, nas fases dessa pesquisa utilizou-se as Técnicas da Pesquisa Bibliográfica, conservando-se as palavras e idéias dos autores por meio da citação direta e da paráfrase. 2 Para seguir uma ordem na pesquisa foi dividindo o estudo em três capítulos: Seguridade Social, Seguridade Social: saúde, assistência social e previdência social, e para finalizar Assistência social: benefício de prestação continuada (LOAS). O capítulo inicial aborda a seguridade social, apresentando um breve estudo sobre o histórico da proteção social, como também o histórico constitucional, após isso demonstra a denominação de seguridade social, e por fim o conceito de seguridade social. O segundo capítulo explicita-se a seguridade social no que compete nos seus desdobramentos em saúde, assistência social e previdência social, apresentando rapidamente as características de cada elemento, como conceito, requisitos, custeio, sujeitos (beneficiários) entre outros. Faz-se isso, uma breve explanação por cada tópico conter material suficiente para escrever uma monografia, e como o presente estudo enfoca a assistência social, foram apresentadas algumas características da saúde, da previdência social e da assistência social. O terceiro e capítulo, mostra a assistência social, mais especificamente o benefício de prestação continuada. Para iniciar se voltou ao estudo mais detalhado sobre a assistência social, para complementar o que foi visto no capítulo anterior, para depois adentrar no benefício de prestação continuada, explicitando sua origem e conceito, bem como os beneficiários, os documentos necessários para a concessão deste benefício, o valor recebido pelos beneficiários, e por fim as regras ou os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada. Para finalizar a presente monografia, apresenta-se as Considerações Finais, onde são abordados os pontos conclusivos do estudo, com uma breve retrospectiva do que foi analisado. 3 1 SEGURIDADE SOCIAL Abordar-se-á neste capítulo o histórico da proteção social, sua denominação e seu conceito, para a posteriori explorar com mais clareza o instituto da assistência social. 1.1 HISTÓRICO DA PROTEÇÃO SOCIAL Em épocas remotas já se pode vislumbrar um esboço de medidas assistenciais e da previdência social, reconhecendo-se nelas um anseio protetivo ao economicamente insuficiente, como também nota-se o princípio norteador da solidariedade social, prevendo-se certos riscos de algumas atividades desenvolvidas na sociedade, proporcionando uma certa segurança ao carente. Observa-se que as medidas adotadas não tinham um intuito protetor, visando a proteção do cidadão, mas sim foram tidas como um passo inicial para a seguridade social.1 De acordo com Feijó Coimbra, sobre a proteção social na Antigüidade várias foram às tentativas em textos legais, de: [...] um gradual e constante predomínio do egoaltruísmo sobre o egoísmo, ou seja, a admissão, dia a dia aperfeiçoada, do sentido da responsabilidade social pelos danos que vulneram os membros da mesma coletividade, compreendendo-se que tais danos sempre na sociedade se refletirão. Como nos lembra Oscar Saraiva, as primeiras manifestações de proteção social se assinalam em épocas recuadas, pois em Teofrasto (228 a. C.) encontra-se referência à associação existente na Hélade, cujos membros contribuíram para um fundo, à conta do qual era prestado socorro aos contribuintes que viessem a ser atingidos pela adversidade. Em Roma existiram associações de finalidades similares, dedicadas à proteção de seus membros, como refere Jefferson Daiber, ao lado de instituições de caridade (Cód. De Teodósio – 1.15.17.19 e 22 – De Sacros Eccles) chamadas brephotrophium, orphanotrophium, gerontocomium, xenodochium, nosocomium. Mas também quanto ao trabalhador ativo é possível achar texto que cogitava da sua proteção. Senão no 1 COIMBRA, Feijó. Direito Previdenciário Brasileiro. 11. ed. Rio de Janeiro: Edições Trabalhistas, 2001. p. 1- 2. 4 direito de Roma, ao menos na Lei Lombarda, que incorporava a magnitude do edifício jurídico romano, o Édito de Rotário, vê-se a mais antiga concepção da responsabilidade patronal pelo acidente de trabalho, dando-se o primeiro passo para descartar a idéia de culpa do fundamento da reparação devida por dano decorrente de atividade laboral, como anota Litala.2 Desta feita, iniciar o estudo sobre as origens da seguridade social, compreendida pela proteção à Previdência Social é uma tarefa árdua. Vista em seu todo, a seguridade social teve como primeira normatização orgânica o Plano Beveridge. Assim, na Roma Antiga, têm-se as linhas iniciais sobre a proteção social: Desse modo, por exemplo, é conhecido de todos que as aposentadorias integram parte de um sistema em que se pretende a preservação da seguridade social. E as primeiras “aposentadorias”, no sentido como são conhecidas modernamente foram concedidas aos veteranos dos exércitos, nos antigos tempos romanos. Como forma de agradecimento pelos serviços prestados ao Império, era- lhes concedida uma propriedade, de onde poderiam tirar a sua subsistência. No entanto, quando se encontrava escassa a possibilidade de se oferecer propriedade, esta era substituída por uma renda em dinheiro, que subsistia enquanto vivesse o beneficiário. É claro que aqui encontramos uma origem bem ampla diante de um conceito mais restrito atualmente fornecido às aposentadorias. No entanto, embora estejamos diante de uma medida, dentre várias outras, de proteção social – ainda que contemplada apenas determinada categoria de pessoas - , não se pode dizer que, na Roma do Império.3 Nesta linha de raciocínio, não só Roma como também a Grécia traçaram as linhas mestras na proteção social em relação ao homem. Por meio das instituiçõesmutualista que objetivavam prestar assistência a sua coletividade, com a devida contribuição para ajudar os necessitados. Desta feita, a família romana prestava assistência aos seus membros, e mais a frente na Idade Média, surgiram as corporações profissionais que contribuíram para a criação dos seguros sociais.4 Corroborando com isso, ainda na Roma Antiga, a família romana tinha obrigação de dar assistência aos servos e clientes, através do pater famílias, prestando com a contribuição de seus membros socorro aos necessitados. Já os 2 COIMBRA, Feijó. Direito Previdenciário Brasileiro. 11. ed. Rio de Janeiro: Edições Trabalhistas, 2001. p. 2. 3 CORREIA, Marcus Orione Gonçalves; CORREIA, Érica Paula Barcha. Curso de Direito da Seguridade Social. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 2. 4 ARAÚJO, Francisco Carlos da Silva. Seguridade social . Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1272, 25 dez. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9311>. Acesso em: 11 nov. 2009. 5 soldados do exército romano, recolhia parte do seu salário para receberem em suas aposentadorias um pedaço de terra e as economias.5 Da Grécia para Roma surgiram as associações denominadas de collegia ou sadalitia formadas por pequenos produtores e artesãos livres, igualmente, com caráter mutualista, constituídas de no mínimo três indivíduos que contribuíram periodicamente para um fundo comum, cuja destinação principal estava voltada para os custos dos funerais dos seus associados. Na Idade Média, assistimos à proliferação de instituições de proteção social; mas, todas de cunho mutualista, ou seja, circunstanciadas a determinados grupos – em regra organizações profissionais – com o objetivo de prestar ajuda mútua a seus integrantes, razão pela qual ainda não podemos falar propriamente de esquemas de proteção social, de cunho universal.6 Ao longo da história da civilização tem-se o aparecimento da seguridade social, ocorrendo o conseqüente aprimoramento da previdência social e de serviços assistenciais. Neste sentido, a obrigatoriedade no custeio deste sistema foi a maneira mais adequada na operacionalização da seguridade social, ocorrendo desde os primórdios da história da sociedade. Destaca-se, para tanto, a obrigatoriedade da assistência aos pobres instituída por Carlos Magno durante a Idade Média.7 Tem-se como em 1344, a primeira notícia de preocupação com o infortúnio, acontecendo neste ano o primeiro contrato de seguro marítimo, e a posteriori a cobertura contra riscos de incêndio. Ainda sobre o histórico da seguridade social, tem-se as confrarias que: [...] eram as associações com fins religiosos, que envolviam sociedade de pessoas da mesma categoria ou profissão, tendo por finalidade objetivos comuns. Quando tinham características religiosas, também eram chamadas de guildas. Seus associados pagavam taxas anuais, visando ser utilizadas em caso de velhice, doença, pobreza. Em 1601, a Inglaterra editou a Poor Relief Act (lei de amparo aos pobres), que instituía a contribuição obrigatória para fins sociais, consolidando outras leis sobre assistência pública. O indigente tinha direito de ser auxiliado pela paróquia. Os juízes da Comarca tinham o poder de lançar um imposto de caridade, que seria pago por todos os 5 MARTINS, Sergio Pinto. Direito da Seguridade Social. 24. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p.3. 6 VIANNA, João Ernesto Aragonés. Curso de Direito Previdenciário. 2. Ed. São Paulo: LTr Editora, 2007. p. 23. 7 CORREIA, Marcus Orione Gonçalves; CORREIA, Érica Paula Barcha. Curso de Direito da Seguridade Social. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 2. 6 ocupantes e usuários de terras, e nomear inspetores em cada uma das paróquias, visando receber e aplicar o imposto arrecadado.8 Na linha da história, a assistência pública e a beneficência, tinham oscilações de amplitude, comandadas pelas políticas de cada país, até chegar a Revolução Francesa (1789) e a Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão, onde obtém a pedra fundamental da seguridade social moderna. Observa-se que o objetivo social continuava o mesmo: [...] a segurança do homem ante os riscos da vida. A diferença, entretanto, residia em que pela Declaração, o auxílio prometido passava a ser uma dívida da sociedade, do que decorria, limpidamente, ser proclamado “direito do cidadão”. Reconhecido que fosse tal direito pela legislação, instaurada estaria a era da seguridade social, pois se teria no rol dos direitos do homem, juridicamente protegidos, o de ser amparado pelo Estado em todas as situações de necessidade, derivadas de um risco social. Era evidente, entretanto, que ao legislador de então faltariam condições de empenhar-se a fundo nessa obra de redenção, pois que, caso o fizesse, colocar-se-ia às testilhas com os princípios fundamentais da economia liberal, vazada em profundo individualismo, que se acabava de implantar. Tudo o que, no anseio de amparar o economicamente débil, se viesse então a pretender, com base em uma ação estatal, valeria, aos olhos dos pregoeiros da economia liberal, por aumentar a área de ação do Estado, acrescendo as despesas públicas, criando novos encargos para fazer face aos gastos com as medidas de proteção. Uma ação dessa índole revelar- se-ia adversa ao pensamento dominante, de que o Estado deveria eximir-se de intervir na vida econômica, pois “em el mundo económico, como em el natural, todo marcha espontaneamente”.9 Neste sentido, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, teve como um dos objetivos demonstrar que a seguridade social é direito de todos, tornando universal o sistema. Várias outras leis traçam o mesmo espírito da universalização social, como em 1883 com Otto Von Bismarck na Alemanha: [...] surge o primeiro sistema de seguro social. Envolvia seguro- doença, seguro de acidentes do trabalho, seguro de invalidez e proteção à velhice, mediante contribuição do Estado, dos 8 MARTINS, Sergio Pinto. Direito da Seguridade Social. 24. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p.3-4. 9 COIMBRA, Feijó. Direito Previdenciário Brasileiro. 11. ed. Rio de Janeiro: Edições Trabalhistas, 2001. p. 5- 6. 7 empregados e dos empregadores, iniciando-se aí a tríplice forma de custeio, em prática até hoje.10 Com isso Instituiu-se o sistema tríplice de custeio da seguridade social, que se constitui de empregadores, empregados e Estado. Assim, no modelo bismarckiano os trabalhadores abrem mão de uma parte do seu salário para colocar num fundo, sendo este usado quando houvesse necessidade para arcar com saúde, renda para quem não pudesse mais trabalhar, e para desempregados. Destaca-se que quem usufruía desta proteção social deveria obrigatoriamente contribuir para tanto, pois sem contribuição não existia benefícios. Esse sistema: [...] irradiou para todo o continente europeu. Na França se criou, em 1898, norma de assistência à velhice e a acidentes do trabalho. Na Inglaterra, a proteção foi ampliada. Em 1907 se criou um seguro obrigatório contra acidentes de trabalho. Passou a viger o princípio da responsabilidade objetiva do empregador, no qual este era responsabilizado pelo infortúnio, independentemente de ter concorrido com culpa para o acidente, ficando obrigado ao pagamento da indenização ao obreiro. Em 1908, conceberam-se pensões aos maiores de 70 anos, independentemente de contribuição. Em 1911 foi instituído o National Insurance Act, iniciando-se na Inglaterra o sistema tríplice de custeio: empregador, empregado e Estado.11 Entretanto, com a extinção das corporações os trabalhadores economicamente desprovidos sofriam com a ganância dos empregadores. Em virtude disso, a SantaSé visando a proteção aos empregados, editou a encíclica Rerum Novarum, em 1891 pelo Papa Leão XIII, questionando a intervenção estatal. Sobre a encíclica destaca-se o trecho abaixo: Assim como por todos estes meios o Estado pode tornar-se útil às diversas classes, pode igualmente melhorar muitíssimo a sorte da classe operária e isto em todo o rigor do seu direito e sem ter a temer a censura de ingerência indébita, pois que, em virtude mesmo do seu ofício, o Estado deve servir o interesse comum. E é evidente que, quanto mais se multiplicarem as vantagens resultantes desta ação de ordem geral, tanto menos necessidade haverá de recorrer a outros expedientes para remediar a condição dos trabalhadores.12 10 VIANNA, João Ernesto Aragonés. Curso de Direito Previdenciário. 2. Ed. São Paulo: LTr Editora, 2007. p. 23. 11 TSUTIYA, Augusto Massayuki. Curso de Direito da Seguridade Social. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 6. 12 CORREIA, Marcus Orione Gonçalves; CORREIA, Érica Paula Barcha. Curso de Direito da Seguridade Social. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 6. 8 Na continuidade apresenta-se brevemente o histórico constitucional sobre a previdência social no mundo. 1.2 HISTÓRICO CONSTITUCIONAL A primeira Constituição a dispor sobre o seguro social foi a do México, em 1917. Depois em 1918 a Constituição soviética assegurava os direitos previdenciários aos cidadãos. Em 1919 a Constituição de Weimar da Alemanha, abordava direitos que o Estado tinha que proporcionar aos cidadãos, como o da subsistência. No mesmo ano foi criada a OIT (Organização Internacional do Trabalho), que dispunha sobre a necessidade de um programa de previdência social. Já os Estados Unidos com o New Deal, visava combater a miséria, além do desemprego e a velhice. E só em 1935 obteve-se o Social Security Act, com a aprovação no Congresso dos Estados Unidos, servindo como ajuda aos idosos e com o auxílio-desemprego aos temporariamente desempregados.13 A despeito de já existir um sistema de Seguridade Social, somente houve irradiação dessas idéias para outros continentes a partir do famoso Relatório Beveridge, em 1942, na Inglaterra. Em meio às agruras da ocupação de Londres, pelos nazistas, o Lord Beveridge idealizou um sistema universal de proteção social, tendo por como fundamento a proteção do berço ao túmulo. Uma proteção básica, suficiente para que o trabalhador e sua família pudessem sobreviver sem maiores desconforto, o período de desemprego, doença, morte etc. As idéias contidas no famoso Relatório Beveridge foram adotadas, em 1946, na Inglaterra. É necessário realçar neste momento a diferença entre modelo bismarckiano (1883) e o beveridgeano (1942), uma vez que esses dois sistemas foram adotados em todo o mundo. O beveridgeano é universal, protege todos os cidadãos. Por outro lado, o modelo bismarckiano nada mais é que um seguro social, protegendo somente aqueles que contribuem para o sistema. Quem não tem disponibilidade financeira fica excluído.14 13 MARTINS, Sergio Pinto. Direito da Seguridade Social. 24. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 4-5. 14 TSUTIYA, Augusto Massayuki. Curso de Direito da Seguridade Social. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 7. 9 Nesta linha de raciocínio, tem-se as palavras de Sergio Pinto Martins, discorrendo sobre os objetivos do Plano Beveridge: [...] (a) unificar os seguros sociais existentes; (b) estabelecer o princípio da universalidade, para que a proteção se estendesse a todos os cidadãos e não apenas aos trabalhadores; (c) igualdade de proteção; (d) tríplice forma de custeio, porém com predominância do custeio estatal. O Plano Beveridge era universal e uniforme. Visava ser aplicado a todas as pessoas e não apenas a quem tivesse contrato de trabalho, pois o sistema de então não atingia quem trabalhava por conta própria. Isso dava a idéia da universalidade do sistema. Objetivava proporcionar garantia de renda às pessoas, atacando a indigência. Assim, deveria ser adiada a idade da aposentadoria. Deveria haver amparo à infância e proteção à maternidade. Os princípios fundamentais do sistema eram: horizontalidade das taxas de benefícios de subsistência, horizontalidade das taxas de contribuição, unificação da responsabilidade administrativa, adequação dos benefícios, racionalização e classificação. Inspirado no Relatório Beveridge, o governo inglês apresentou, em 1944, um plano de previdência social, que deu ensejo à reforma do sistema inglês de proteção social, que foi implantado em 1946.15 Destarte, aconteceu um exagero do Estado sobre as políticas particulares, levando a várias despesas, ocorrendo um retrocesso em algumas situações, lembrando que o contexto neoliberal em que o Estado atuava como interventor como também patrocinador das políticas sociais.16 Sob esta perspectiva surgiram críticas, em virtude de problemas com a implementação das políticas sociais relacionadas ao “Estado de Bem-Estar”, pois se observou não alcançar-se tal estado em diversos países que o adotaram. Como reação, nota-se: [...] o modelo previdenciário vislumbrado na política do bem-estar social, o Welfare State, vem sendo substituído, em diversos países, por um outro, no qual o principal fundamento é a poupança individual, sem a centralização dos recursos das contribuições em órgãos estatais. Países da América Latina, como Chile – precursor desta nova modalidade de previdência -, Peru, Argentina, Colômbia, Uruguai, Venezuela, Equador e Bolívia, vêm adotando a privatização da gestão previdenciária, uns mantendo a presença estatal em níveis mínimos, outros deixando totalmente ao encargo da iniciativa privada a questão da poupança previdenciária. O México, um dos primeiros países da América a ter regras previdenciárias, acabou por sofrer 15 MARTINS, Sergio Pinto. Direito da Seguridade Social. 24. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 5. 16 PEREIRA, Cláudia Fernanda de Oliveira. Reforma da Previdência. Brasília: Brasília Jurídica, 1999. p. 23. 10 profundas alterações no seu regime previdenciário, por lei de dezembro de 1995, cuja vigência se deu em janeiro de 1997. Em alguns países do Leste Europeu também há notícia de que houve adoção de regimes mistos, à semelhança do modelo argentino, fundado em “dois pilares”: “um regime público compulsório baseado na repartição, financiado por empregadores e assalariados e, regime capitalizado como segundo pilar, constituído por fundos de pensão privados de capitalização individual a cargo dos assalariados”, estes últimos de natureza compulsória na Hungria, e parcialmente compulsória, na Polônia.17 No Brasil, várias foram as Constituições que abordaram o tema da seguridade social, iniciando-se com a Constituição de 1824, que constituía a instituição de socorros públicos. Já em 1835 criou-se o Montepio Geral dos Servidores do Estado, e no Código Comercial instituiu a remuneração aos comerciantes acidentados durantes três meses. A Constituição de 1891 apresentou a palavra aposentadoria em seu bojo, para os trabalhadores em caso de invalidez. E foi em 1923, com a Lei Eloy Chaves que se introduziu a Previdência Social, criando-se a caixa de aposentadoria e pensão dos ferroviários. Em 1934, a Constituição abarcou a palavra previdência, visando a proteção ao trabalhador, à gestante, ao idoso e ao inválido, surgindo também a tríplice forma de custeio social, com a contribuição obrigatória. A Constituição de 1937 modificou a palavra previdência por seguro social e não trouxe maiores novidades. Com a Constituição de 1946 tem-se a expressão previdência social, tendo agora o empregador de contribuir com o seguro contra acidentes de trabalho.A sexta Constituição dispôs que cada novo benefício criado deveria obrigatoriamente indicar a fonte do custeio. Por último a Constituição de 1988, que positivou a Seguridade Social, com intuito de proporcionar a todos a proteção à saúde, previdência social e assistência social.18 Desta feita, a Constituição Cidadã de 1988 aponta a estrutura da seguridade social, integrando o poder público e a sociedade.19 Neste afã, cita-se o trecho que segue: Pelo ângulo da legislação ordinária, vários progressos e regressos foram observados. (...) 17 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de, LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 7. ed. rev. São Paulo: LTr Editora, 2006. p. 47-48. 18 TSUTIYA, Augusto Massayuki. Curso de Direito da Seguridade Social. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 8-9. 19 VIANNA, João Ernesto Aragonés. Curso de Direito Previdenciário. 2. ed. São Paulo: LTr, 2007. p. 26. 11 em 1990, o Instituto Nacional de Previdência Social – INPS e o Instituto de Administração Financeira da Previdência Social – IAPAS fundiram-se num só instituto: o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS (Lei nº 8.029, de 12-4-90 e Decreto nº 99.350, de 27-6-90); (...) em 1991, foram sancionadas a Lei nº 8.212, de 24-7-91 (que dispõe sobre a organização da Seguridade Social e institui os Planos de Custeio) e a Lei nº 8.213, de 24-7-91 (que dispõe sobre planos de benefícios da Previdência Social), regulamentadas, respectivamente, pelos Decretos nº 356/91 e 357/91, publicados em Diário Oficial da União, de 9-12-91. (...) publicada a Emenda Constitucional nº 20, de 15-12-98, que modifica o sistema de previdência social, estabelece normas de transição e dá outras providencias; publicado, em 12-5-99, o Decreto nº 3.048, de 6-5-99, que aprova o regulamento da previdência social; publicada, em 29-11-99, a Lei nº 9.876, de 26-11-99, que criou o denominado “fator previdenciário”. (...) promulgada a Emenda Constitucional nº 41, de 19-12-03, que modificou normas do sistema previdenciário do servidor público; promulgada a Emenda Constitucional nº 45, de 31-12-04, que ratificou alteração de regras relativas à competência da Justiça do Trabalho e Justiça Federal; (...)20 A seguir explicita-se brevemente a denominação da expressão seguridade social. 1.3 DENOMINAÇÃO DE SEGURIDADE SOCIAL Antes de adentrar especificamente a denominação do título deste capítulo, convém explicar o significado da expressão seguridade social: “Conjunto integrado de ações e iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e a assistência social.”21 Na concepção de Sidou a Seguridade Social é o “[...] conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.”22 Já Dinis dá um conceito mais amplo sobre a seguridade social: 20 GONÇALVES, Odonel Urbano. Manual de Direito Previdenciário. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 6-8. 21 Dicionário Jurídico. Organizador Deocleciano Torriei Guimarães; coordenadora Sandra Julien Miranda. 3. ed. São Paulo: Rideel, 1999. p. 166. 22 Dicionário Jurídico. Planejado organizado e redigido por J.M. Othon Sidou. 10. ed. Rio de Janeiro: Forese universitária, 2009. 12 1. É o conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinado a assegurar o direito relativo à saúde, à previdência e à assistência social. A seguridade social obedece os seguintes princípios e diretrizes: a) universalidade da cobertura e do atendimento; b) uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços as populações urbanas e rurais; c) seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços; d) irredutibilidade do valor dos benefícios, de forma a preserva-lhe o poder aquisitivo; e) equidade na forma de participação no custeio; f) diversidade da base de financiamento; g) caráter democrático e descentralizado da gestão administrativa com participação da comunidade em especial de trabalhadores, empresários e aposentados.23 Como comentado no item anterior, a denominação aparece pela primeira vez na Constituição Brasileira de 1988, aonde acontece a distinção entre direito do trabalho e direito da seguridade social. Assim, este último abrange a saúde, a previdência e a assistência social. Assim a expressão seguridade social demonstra preocupação com o futuro, e ainda: É de se ressaltar que a atual Constituição, ao se referir à segurança, foi clara no sentido de se utilizar da expressão “segurança pública”, envolvendo a polícia, para a preservação da ordem pública (art. 144 da Lei Maior). Quando o Estatuto Supremo quis se referir à seguridade, e não à segurança, empregou a expressão “seguridade social”, tal qual se observa nos arts. 194 a 204. Lembre-se de que a idéia essencial da Seguridade Social é dar aos indivíduos e a suas famílias tranqüilidade no sentido de que, na ocorrência de uma contingência (invalidez, morte etc.), a qualidade de vida não seja significativamente diminuída, proporcionando meios para a manutenção das necessidades básicas dessas pessoas. Logo, a Seguridade Social deve garantir os meios de subsistência básicos do indivíduo, não só mas principalmente para o futuro, inclusive para o presente, independentemente de contribuições para tanto. Verifica-se, assim, que é uma forma de distribuição de renda aos mais necessitados, que não tenham condição de manter a própria subsistência.24 Para tanto, a Constituição Federal discrimina em seu art. 194 dispõe sobre o conceito de seguridade social e seus princípios, no que se cita: Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas 23 Dinis, Maria Helena. Dicionário Jurídico. 2. ed. rev., atual e aum. São Paulo: Saraiva, 2005. 24 MARTINS, Sergio Pinto. Direito da Seguridade Social. 24. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 19. 13 a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social. Parágrafo único. Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a seguridade social, com base nos seguintes objetivos: I - universalidade da cobertura e do atendimento; II - uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais; III - seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços; IV - irredutibilidade do valor dos benefícios; V - eqüidade na forma de participação no custeio; VI - diversidade da base de financiamento; VII - caráter democrático e descentralizado da administração, mediante gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados e do Governo nos órgãos colegiados.25 Na continuação, apresenta-se o conceito de seguridade social, com intuito de esclarecer o tema e iniciar os fundamentos para o próximo capítulo. 1.4 CONCEITO DE SEGURIDADE SOCIAL Conceituar a expressão seguridade social não é tarefa simples, pois o conteúdo jurídico mutável pelo decorrer dos anos e pelas diferentes perspectivas jurídicas e políticas torna-se difícil a conceituação. Sendo assim, sob a óptica das perspectivas política e jurídica tem-se: a) Perspectiva política – Sob essa perspectiva, a seguridade social tem em primeiro plano e como finalidade a proteção da necessidade social, ou seja, estende-se a toda a sociedade e tem como principal prestador o Estado, em missão fundamental. b) Perspectiva jurídica – Quanto à perspectiva jurídica, refere-se esta ao meio ou instrumento com que se pretende almejar a finalidade de proteção às necessidades sociais,por meio de uma organização normativa instrumental e das relações jurídicas decorrentes. c) Em face da sociedade atual – Dessarte, pode-se, hoje, afirmar que o conceito de seguridade social equivalente à Previdência Social (destinada, apenas, à prestação dos chamados seguros sociais) está ultrapassado, cedendo lugar a uma noção assistencial, que supera todas as deficiências contidas na estrutura da Previdência Social, inclusive o mecanismo clássico do seguro privado. Portanto, a 25Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm. Acessado em 11/11/2009. 14 seguridade social passa a ser concebida como “um instrumento protetor, garantindo o bem-estar material, moral e espiritual de todos os indivíduos da população, abolindo todo o estado de necessidade social em que possam se encontrar”. Trata-se, na nossa Constituição, de noção que inclui a previdência, a assistência e a saúde.26 De acordo com Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari, a seguridade social abrange um conjunto dos poderes públicos e da sociedade especificamente nas áreas da saúde, assistência social e previdência, conforme a Constituição Federal, organizada pelo Sistema Nacional que compreende os “[...] conselhos setoriais, com representantes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e da sociedade civil.”27 Neste sentido, a seguridade social também é entendida como um conjunto de princípios que integram um sistema de proteção social aos cidadãos contra as intempéries que impeçam-nos de prover seus próprios sustento, com o intuito de garantir os direitos em relação à saúde, à assistência social e à previdência. Contem a seguridade seus próprios princípios, sendo a maioria descrita no parágrafo único do artigo 194 da Constituição Federal. Sobre as regras a: [...] Seguridade Social inúmeras regras que versam sobre a matéria. A maioria delas está contida nas Leis n. 8.212/91 e 8.213/91 e suas alterações. O Poder Executivo ainda expede decretos, que são os regulamentos das leis, além de portarias, ordens de serviço, instruções normativas, circulares, etc. No Direito da Seguridade Social não existe um conjunto de princípios e normas, mas também de instituições, de entidades, que criam e aplicam o referido ramo do Direito. Nas mãos do Estado está centralizado todo o sistema de seguridade social, que organiza o custeio do sistema e concede os benefícios e os serviços. O órgão incumbido dessas determinações é o INSS, autarquia subordinada ao Ministério da Previdência e Assistência Social. No próprio Ministério da Previdência e Assistência Social há outras instituições, como o Conselho Nacional de Seguridade Social, o Conselho de Recursos da Previdência Social etc. Há, ainda, o Ministério da Saúde, que implementa a política de saúde no país. Assim, temos instituições, entidades, algo que perdura no tempo. Não se trata de institutos, que seriam o conjunto de regras referentes a uma mesma matéria.28 26 CORREIA, Marcus Orione Gonçalves; CORREIA, Érica Paula Barcha. Curso de Direito da Seguridade Social. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 15-16. 27 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 7. ed. rev. conforme as Emendas Constitucionais e a legislação em vigor até 10/1/2006. São Paulo: LTr, 2006. 141. 28 MARTINS, Sergio Pinto. Direito da Seguridade Social. 24. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 20. 15 Desta forma, reforça-se a idéia que a seguridade social corresponde a um conjunto de ações dos poderes públicos e da sociedade, visando assegurar saúde, previdência social e assistência social aos indivíduos. Este conceito no Brasil adveio com a Constituição Brasileira de 1988. Assim, todos os cidadãos têm direito aos benefícios que a seguridade social abarca, além de ter o dever de contribuição, mantendo a solidariedade entre gerações. Essa idéia: [...] que orientou as políticas sociais após a Segunda Guerra Mundial nos países mais desenvolvidos e transformou aquelas sociedades em Estados de Bem-Estar Social (welfare state). Importa consignar que esse resultado não foi conseqüência da ação do mercado, mas sim de uma atitude deliberada das sociedades através do apoio à intervenção do Estado. Foi essa sem dúvida a base sobre a qual se assentou o desenvolvimento econômico e social das sociedades mais evoluídas.29 Neste afã, amparar os necessitados e suas famílias quando estes não podem se sustentar por alguma intempérie é o objetivo primordial da seguridade social. Infelizmente, a remuneração e a assistência médica ambas vinculadas a seguridade dependem de contribuição social. A verdadeira idéia da seguridade social: [...] em que a pessoa tem direito a benefícios ou serviços, sem necessariamente ter contribuído para o sistema. No entanto, não é o que se observa na Constituição, pois em relação à Previdência Social é preciso contribuição por parte do próprio segurado (art. 201), mas em relação à Assistência Social é desnecessária tal contribuição (art. 203). Mostra-se, assim, um contra-senso dentro do sistema adotado pela nossa Lei Maior. É, portanto, bastante ampla a Seguridade Social, podendo até mesmo confundir-se com um programa de governo, um programa de política social. Na verdade, o interessado tem de suportar suas próprias necessidades, Apenas quando não possa suportá-las, é que subsidiariamente irá aparecer a Seguridade Social para ajudá-lo. O preâmbulo da Constituição francesa, de 27-9-1946, mostra, v. g., que todo ser humano que, em razão de sua idade, estado físico ou mental, esteja incapacitado para o trabalho, tem direito de obter da coletividade os meios convenientes de existência.30 Conforme Wladimir Novaes Martinez, ao criar as normas da seguridade social, o legislador esqueceu-se de explicitar sobre a sua efetivação: 29 ARAÚJO, Francisco Carlos da Silva. Seguridade social . Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1272, 25 dez. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9311>. Acesso em: 12 nov. 2009. 30 MARTINS, Sergio Pinto. Direito da Seguridade Social. 24. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 20-21. 16 [...] por falta de definição política e reconhecida incapacidade de efetivamente atender as diretrizes constitucionais da ambiciosa matéria. Seguridade social é uma técnica de proteção social avançada em relação à Previdência Social, capaz de integrá-la com a assistência social e incorporar as ações de saúde. Mas, mais ainda, é um esforço nacional extraordinário no sentido de um amplo atendimento à população, obreira ou não, empenho cujos objetivos estão a distância.31 No próximo capítulo tratar-se-á sobre um dos desmembramentos da seguridade social, a assistência social, observando seu conceito, objetivos e princípios. 31 MARTINEZ, Wladimir Novaes. CD – Comentários à Lei Básica da Previdência Social. Brasília: LTr, Rede Brasil, 1999. 17 2 SEGURIDADE SOCIAL: SAÚDE, ASSISTÊNCIA SOCIAL E PREVIDÊNCIA SOCIAL O capítulo inicial da presente monografia dentre outros aspectos aborda o conceito de seguridade social, sendo por vezes repetitivo na definição deste pela simplicidade apresentada no texto da Lei. Desta forma, após a apresentação prévia desse conceito, convém dispor sobre a organização da seguridade social: A Seguridade Social, segundo o conceito ditado pela ordem jurídica vigente, compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade nas áreas da saúde, previdência e assistência social, conforme previsto no Capítulo II do Título VIII da ConstituiçãoFederal, sendo organizada em Sistema Nacional, que é composto por conselhos setoriais, com representantes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e da sociedade civil.32 Neste afã, a seguridade social abarca o art. XXV da Declaração Universal dos Direitos Humanos quando dita que: Todo homem tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice, ou outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle. Assim, este segundo capítulo da monografia abordará a organização da seguridade social, no que compete a saúde, a assistência social e a previdência social, especificamente dispondo sobre os conceitos apresentados na doutrinas e legislação vigente. 32 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 7. ed. rev. Conforme as Emendas Constitucionais e a legislação em vigor até 10.1.2006. São Paulo: LTr, 2006. p.141. 18 2.1 A SAÚDE Primeiramente convém explicitar o conceito da palavra saúde, que advém do adjetivo latino saulus, e significa inteiro, já o verbo salueo tem como significado estar são. Para a Organização Mundial de Saúde o conceito expressa uma situação de inteiro bem-estar físico e mental do ser humano. Nesta linha: [...] o conceito de saúde depende de condicionamentos mais amplos do que o simples estado individual de estar são. São condicionamentos biológicos (sexo, idade, herança genética), o meio físico (ocupação territorial, alimentação), socioeconômico e cultural (níveis de emprego e renda, educação e lazer, liberdade etc). Dessa forma, a saúde não consiste no simples fornecimento de assistência médica e de medicamentos, como comumente se tem entendido. Envolve programas de medicina preventiva, o controle de doenças infecciosas e parasitárias, por meio do acesso aos programas de habitação e saneamento básico; o combate à desnutrição ou subnutrição, mediante o acesso a adequados níveis de renda.33 Diante deste conceito, a saúde deve compreender três categorias, quais sejam: prevenção; que tem como intuito de evitar doenças e abarca a vigilância sanitária e epidemiológica; proteção; recuperação, que visa reintegrar o trabalhador ao serviço e é feita pelos serviços sociais e pela reabilitação social.34 Ademais, a saúde foi o tema que possivelmente sofreu as maiores alterações no texto constitucional, uma vez que assegura a todos o direito à saúde sem privilégios em todo o território brasileiro em caso de contração de doenças. Tais serviços são dispostos em igualdade para todo e qualquer cidadão brasileiro, quando há necessidade deles. Assim, aborda-se a prevenção de doenças e restauração da saúde em uma rede hierarquizada e regionalizada de serviços prestados a população através de um sistema único.35 A Constituição Federal dispõe sobre a saúde nos arts. 196 e seguintes, indicando as diretrizes, atribuições entre outros, no que se cita: 33 TSUTIYA, Augusto Massayuki. Curso de Direito da Seguridade Social. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p.393. 34 MARTINS, Sergio Pinto. Direito da Seguridade Social. 24. ed. 2. reimpr. São Paulo: Atlas, 2007. p. 502. 35 COIMBRA, Feijó. Direito Previdenciário Brasileiro. 11. ed. Rio de Janeiro: Edições Trabalhistas, 2001. p.57-58. 19 Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado. Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes: I - descentralização, com direção única em cada esfera de governo; II - atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais; III - participação da comunidade. § 1º. O sistema único de saúde será financiado, nos termos do art. 195, com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes. § 2º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios aplicarão, anualmente, em ações e serviços públicos de saúde recursos mínimos derivados da aplicação de percentuais calculados sobre: I - no caso da União, na forma definida nos termos da lei complementar prevista no § 3º; II - no caso dos Estados e do Distrito Federal, o produto da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 155 e dos recursos de que tratam os arts. 157 e 159, inciso I, alínea a, e inciso II, deduzidas as parcelas que forem transferidas aos respectivos Municípios; III - no caso dos Municípios e do Distrito Federal, o produto da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 156 e dos recursos de que tratam os arts. 158 e 159, incisoI, alínea b e § 3º. § 3º Lei complementar, que será reavaliada pelo menos a cada cinco anos, estabelecerá: I - os percentuais de que trata o § 2º; II - os critérios de rateio dos recursos da União vinculados à saúde destinados aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, e dos Estados destinados a seus respectivos Municípios, objetivando a progressiva redução das disparidades regionais; III - as normas de fiscalização, avaliação e controle das despesas com saúde nas esferas federal, estadual, distrital e municipal; IV - as normas de cálculo do montante a ser aplicado pela União. § 4º Os gestores locais do sistema único de saúde poderão admitir agentes comunitários de saúde e agentes de combate às endemias por meio de processo seletivo público, de acordo com a natureza e complexidade de suas atribuições e requisitos específicos para sua atuação. § 5º Lei federal disporá sobre o regime jurídico e a regulamentação das atividades de agente comunitário de saúde e agente de combate às endemias. § 6º Além das hipóteses previstas no § 1º do art. 41 e no § 4º do art. 169 da Constituição Federal, o servidor que exerça funções equivalentes às de agente comunitário de saúde ou de agente de 20 combate às endemias poderá perder o cargo em caso de descumprimento dos requisitos específicos, fixados em lei, para o seu exercício. Art. 199. A assistência à saúde é livre à iniciativa privada. § 1º - As instituições privadas poderão participar de forma complementar do sistema único de saúde, segundo diretrizes deste, mediante contrato de direito público ou convênio, tendo preferência as entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos. § 2º - É vedada a destinação de recursos públicos para auxílios ou subvenções às instituições privadas com fins lucrativos. § 3º - É vedada a participação direta ou indireta de empresas ou capitais estrangeiros na assistência à saúde no País, salvo nos casos previstos em lei. § 4º - A lei disporá sobre as condições e os requisitos que facilitem a remoção de órgãos, tecidos e substâncias humanas para fins de transplante, pesquisa e tratamento, bem como a coleta, processamento e transfusão de sangue e seus derivados, sendo vedado todo tipo de comercialização. Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da lei: I - controlare fiscalizar procedimentos, produtos e substâncias de interesse para a saúde e participar da produção de medicamentos, equipamentos, imunobiológicos, hemoderivados e outros insumos; II - executar as ações de vigilância sanitária e epidemiológica, bem como as de saúde do trabalhador; III - ordenar a formação de recursos humanos na área de saúde; IV - participar da formulação da política e da execução das ações de saneamento básico; V - incrementar em sua área de atuação o desenvolvimento científico e tecnológico; VI - fiscalizar e inspecionar alimentos, compreendido o controle de seu teor nutricional, bem como bebidas e águas para consumo humano; VII - participar do controle e fiscalização da produção, transporte, guarda e utilização de substâncias e produtos psicoativos, tóxicos e radioativos; VIII - colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho.36 Desta forma, os arts. 196 a 200 da Constituição Federal foram regulamentados pela Lei n. 8.080/1990, que estabeleceu a Lei Orgânica da Saúde, ressaltando o já disposto no texto constitucional sobre a saúde ser um direito fundamental do ser humano. Neste caso, levanta-se a natureza securitária da saúde, já que: [...] dá-se proteção à pessoa pelo fato de ser pessoa, ausentes indagações de ordem social, jurídica etc. Considerando que a saúde, por definição legal, é “direito”, há de existir o correlato “dever” de 36 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal. 1988. 21 alguém. Esse “dever” é atribuído ao Estado (lato sensu). É o Estado quem tem o dever de prover condições indispensáveis ao exercício cabal do direito à saúde. Na área da saúde, a atividade estatal não se limita ao ataque às doenças. Antes, mais importante, é evitá-las. Por isso que, nos termos da lei, as ações sanitárias envolvem outros fatores e condicionantes, dentre os quais a alimentação, a moradia, o saneamento básico, a preservação do meio ambiente, a renda, a educação, o transporte, o lazer e o acesso a serviços e bens essenciais.37 Sobremais, a Constituição Federal tornou universal o acesso à saúde, independente de contribuição à seguridade social, transformando a saúde em um direito de todos e um dever do Estado. A prestação deste serviço ocorre diretamente através do poder público, ou por terceiros, por pessoa física ou jurídica de direito privado, já que a assistência a saúde é livre para a iniciativa privada, desde que cumpridos os requisitos constitucionais, quais sejam: [...] 1. acesso universal e igualitário; 2. provimento das ações e serviços através de rede regionalizada e hierarquizada, integrados em sistema único; 3. descentralização, com direção única em cada esfera de governo; 4. atendimento integral, com prioridade para as atividade preventivas; 5. participação da comunidade na gestão, fiscalização e acompanhamento das ações e serviços a saúde; 6. participação da iniciativa privada na assistência à saúde, obedecidos os preceitos constitucionais.38 Ainda sobre a Constituição Federal, o art. 196 esclarece que a saúde é um direito de todos e um dever do Estado, indicando assim os titulares de tal direito, tendo o Estado o dever de prestação de serviços relativos à saúde. Denota-se como objetivo o de: [...] reduzir os riscos com doenças. A saúde é garantida mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para sua promoção, proteção e recuperação. O dever do Estado não exclui das pessoas, da família, das empresas e da sociedade. O direito à saúde é um direito fundamental do ser humano. O art. 2º da Lei nº 8.212 dispõe que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao 37 GONÇALVES, Odonel Urbano. Manual de Direito Previdenciário. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 16. 38 VIANNA, João Ernesto Aragonês. Curso de Direito Previdenciário. 2. ed. São Paulo: LTr, 2007. p. 29. 22 acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para sua promoção, proteção e recuperação. A ação do Estado deve ser preventiva e curativa, de recuperar a pessoa.39 Sobre a competência em matéria da saúde, a Constituição Federal dita que é responsabilidade de todos os entes da Federação, União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Como competência tem-se a: [...] não legislativa (executiva) exclusiva da União (art. 21); a competência legislativa privativa da União (art. 22); a competência comum não legislativa da União, Estados, Distrito Federal e Municípios (art. 23); a competência legislativa concorrente da União, Estados e Distrito Federal (art. 24); a competência suplementar dos Estados e Municípios (arts. 24, § 2º, e 30, II, respectivamente). A competência não legislativa (executiva) privativa da União relaciona-se à organização, manutenção e execução da inspeção do trabalho (art. 21, XXIV). No tocante à competência legislativa privativa da União, cabe ao ente federativo legislar sobre Seguridade Social (at. 22, XXIII). A competência não legislativa (executiva) comum dos entes federados (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) na proteção da saúde e assistência pública encontra-se disposto no art. 23, III. A competência legislativa concorrente está prevista no art. 24, no qual se encontra disposto que compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar sobre “proteção do meio ambiente e controle da poluição” (art. 24, VI), “previdência social, proteção e defesa da saúde” (art. 24, XII). No âmbito da competência legislativa concorrente, cabe à União estabelecer normas gerais. No caso da saúde isso foi realizado por meio da Lei Orgânica da Saúde (Lei n. 8.080/90). A norma geral deve traçar diretrizes para todo o País. Traça a moldura, enquanto a legislação estadual suplementar serve para o preenchimento de lacunas, se existirem, de forma a amoldá-las às peculiaridades locais ou regionais.40 No que compete ao financiamento da saúde, como esta integra a seguridade social uma contribuíra para a outra, mas não com exclusividade. Desta forma, as ações e serviços públicos da saúde são geridos pelo SUS, que recebe verbas da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, pois como a competência é comum, todos devem contribuir para o financiamento. Assim a União contribui por meio do 39 MARTINS, Sergio Pinto. Direito da Seguridade Social. 24. ed. 2. reimpr. São Paulo: Atlas, 2007. p. 502. 40 TSUTIYA, Augusto Massayuki. Curso de Direito da Seguridade Social. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p.402-403. 23 orçamento da seguridade social e os outros entes pelos seus orçamentos respectivos. Há também outras fontes de financiamentos.41 Para tanto, o orçamento da seguridade social ficará destinado ao SUS, conforme renda estimada, bem como: [...] os recursos necessários à realização de suas finalidades, previstos em proposta elaborada pela sua direção nacional, com participação dos órgãos de Previdência Social e da Assistência Social, tendo em vista as metas e as prioridades estabelecidas na Lei de Diretrizes Orçamentárias. Outras fontes de recursos poderão servir para ajudar no financiamento do sistema, como: a. serviços que possam ser prestados sem prejuízo da assistência à saúde; b. ajuda, contribuições, doações e donativos; c. alienações patrimoniais e rendimentos de capital; d. taxas, multas, emolumentos e preços públicos arrecadados no âmbito do SUS; e. rendas eventuais, inclusive comerciais e industriais. [...] A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípiosaplicarão, anualmente, em ações e serviços públicos de saúde, recursos mínimos derivados da aplicação de porcentuais calculados sobre: a. no caso da União, na forma definida nos termos da lei complementar; b. no caso dos Estados e do Distrito Federal, o produto da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 155 da Lei Maior e dos recursos de que tratam os arts. 157 e 159, inciso I, alínea a, e inciso II, deduzidas as parcelas que forem transferidas aos respectivos Municípios; c. no caso dos Municípios e do Distrito Federal, o produto da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 156 e dos recursos de que tratam os arts. 158 e 159, inciso I, alínea b e § 3º da Constituição.42 Cabe destacar que, a Constituição Federal almeja colocar a disposição de toda a população os serviços médicos aos necessitados, vista agora como um direito e não mais como caridade. “Ponto de importância é o em que se determina ao legislador ordinário a elaboração de regras disciplinando o transplante de órgãos e a pesquisa, vedando, contudo, a comercialização.”43 No próximo tópico tratar-se-á brevemente da assistência social, no que compete ao seu conceito, custeio e competência. 41 VIANNA, João Ernesto Aragonês. Curso de Direito Previdenciário. 2. ed. São Paulo: LTr, 2007. p. 30. 42 MARTINS, Sergio Pinto. Direito da Seguridade Social. 24. ed. 2. reimpr. São Paulo: Atlas, 2007. p. 504- 505. 43 COIMBRA, Feijó. Direito Previdenciário Brasileiro. 11. ed. Rio de Janeiro: Edições Trabalhistas, 2001. p.58 24 2.2 ASSISTÊNCIA SOCIAL Convém iniciar a breve explanação sobre assistência social com seu conceito, sendo esta um conjunto de regras que visa estabelecer uma política social aos hipossuficientes, através das atividades estatais e particulares, que independem de contribuição e concede pequenos serviços e benefícios.44 Para tanto, convém citar o texto constitucional, no que compete ao assunto assistência social: Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos: I - a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice; II - o amparo às crianças e adolescentes carentes; III - a promoção da integração ao mercado de trabalho; IV - a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária; V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei. Art. 204. As ações governamentais na área da assistência social serão realizadas com recursos do orçamento da seguridade social, previstos no art. 195, além de outras fontes, e organizadas com base nas seguintes diretrizes: I - descentralização político-administrativa, cabendo a coordenação e as normas gerais à esfera federal e a coordenação e a execução dos respectivos programas às esferas estadual e municipal, bem como a entidades beneficentes e de assistência social; II - participação da população, por meio de organizações representativas, na formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis. Parágrafo único. É facultado aos Estados e ao Distrito Federal vincular a programa de apoio à inclusão e promoção social até cinco décimos por cento de sua receita tributária líquida, vedada a aplicação desses recursos no pagamento de: I - despesas com pessoal e encargos sociais; II - serviço da dívida; III - qualquer outra despesa corrente não vinculada diretamente aos investimentos ou ações apoiados.45 De acordo com o art. 203 da Constituição Federal, a assistência social está disponível a população independente de contribuição à seguridade social, tendo 44 MARTINS, Sergio Pinto. Direito da Seguridade Social. 24. ed. 2. reimpr. São Paulo: Atlas, 2007. p. 482. 45 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal. 1988. 25 como objetivos a proteção a família, a maternidade, a infância, a adolescência, a velhice, bem como as crianças e adolescentes carentes, entre outros. Assim, a iniciativa privada é chamada para contribuir na assistência social.46 No terceiro capítulo da presente monografia, abordar-se-á outras características da assistência social, especialmente o benefício de prestação continuada. Apresenta-se, na continuação, a última modalidade da Seguridade Social, a Previdência Social. 2.3 PREVIDÊNCIA SOCIAL Antes de adentrar a análise deste tópico, convém explicitar que se fará uma breve explanação sobre algumas características da previdência social, já que o tema é de vasta abrangência. Assim a previdência social é o terceiro e último tópico deste capítulo, cabendo destacar o significado desta expressão, que deriva do verbo prever e tem como sinônimo a palavra antever. Desta feita, independentemente do que se adote o que importa é ver antecipadamente a situação que pode acontecer a posteriori.47 Desta forma, tem-se a previdência social como um segmento da seguridade social, constituído de regras com intuito de estabelecer um sistema de proteção social, com caráter contributivo, contendo como objetivo proporcionar “[...] meios indispensáveis de subsistência ao segurado e a sua família, contra contingências de perda ou redução da sua remuneração, de forma temporária ou permanente, de acordo com a previsão legal.”48 Para Nair Lemos Gonçalves, sobre o conceito de previdência social tem-se “O evidente propósito de, antecipadamente, reunir recursos dos interessados e organizar mecanismos que pudessem e possam atender a contingências sociais prováveis e futuras.”49 46 VIANNA, João Ernesto Aragonês. Curso de Direito Previdenciário. 2. ed. São Paulo: LTr, 2007. p. 35. 47 GONÇALVES, Odonel Urbano. Manual de Direito Previdenciário. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 23-27. 48 MARTINS, Sergio Pinto. Direito da Seguridade Social. 24. ed. 2. reimpr. São Paulo: Atlas, 2007. p. 280. 49 GONÇALVES, Nair Lemos. Iniciação ao Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 1985. P. 431. 26 Segundo o art. 201 da Constituição Federal dispõe: Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: I - cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada; II - proteção à maternidade, especialmente à gestante; III - proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário; IV - salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda; V - pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes, observado o disposto no § 2º. § 1º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social, ressalvados os casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física e quando se tratar de segurados portadores de deficiência, nos termos definidos em lei complementar. § 2º Nenhum benefício que substitua o salário de contribuição ou o rendimento do trabalho do segurado terá valor mensal inferior ao salário mínimo. § 3º Todos os salários de contribuição considerados para o cálculo de benefício serão devidamente atualizados, na forma da lei. § 4º É assegurado o reajustamento dos benefícios para preservar- lhes, em caráter permanente, o valor real, conforme critérios definidos em lei. §5º É vedada a filiação ao regime geral de previdência social, na qualidade de segurado facultativo, de pessoa participante de regime próprio de previdência. § 6º A gratificação natalina dos aposentados e pensionistas terá por base o valor dos proventos do mês de dezembro de cada ano. § 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidas as seguintes condições: I - trinta e cinco anos de contribuição, se homem, e trinta anos de contribuição, se mulher; II - sessenta e cinco anos de idade, se homem, e sessenta anos de idade, se mulher, reduzido em cinco anos o limite para os trabalhadores rurais de ambos os sexos e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal. § 8º Os requisitos a que se refere o inciso I do parágrafo anterior serão reduzidos em cinco anos, para o professor que comprove exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio. § 9º Para efeito de aposentadoria, é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada, rural e urbana, hipótese em que os diversos regimes de previdência social se compensarão financeiramente, segundo critérios estabelecidos em lei. § 10. Lei disciplinará a cobertura do risco de acidente do trabalho, a ser atendida concorrentemente pelo regime geral de previdência social e pelo setor privado. 27 § 11. Os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serão incorporados ao salário para efeito de contribuição previdenciária e conseqüente repercussão em benefícios, nos casos e na forma da lei. § 12. Lei disporá sobre sistema especial de inclusão previdenciária para atender a trabalhadores de baixa renda e àqueles sem renda própria que se dediquem exclusivamente ao trabalho doméstico no âmbito de sua residência, desde que pertencentes a famílias de baixa renda, garantindo-lhes acesso a benefícios de valor igual a um salário-mínimo. § 13. O sistema especial de inclusão previdenciária de que trata o § 12 deste artigo terá alíquotas e carências inferiores às vigentes para os demais segurados do regime geral de previdência social.50 Da mesma forma, cita-se o art. 1º da Lei nº 8.213: A Previdência social, mediante contribuição, tem por fim assegurar aos seus beneficiários meios indispensáveis de manutenção, por motivo de incapacidade, desemprego involuntário, idade avançada, tempo de serviço, encargos familiares e prisão ou morte daqueles de quem dependiam economicamente.51 Assim, a previdência social é organizada na forma do regime geral, contendo caráter contributivo e filiação obrigatória, e dá cobertura aos elementos doença, morte, invalidez, idade avançada, maternidade, desemprego involuntário, salário- família, auxílio-doença e pensão por morte. Como visto anteriormente, a universalidade da cobertura só é aplicada no caso da previdência social, para o segurado que efetivamente contribui.52 Cabe destacar alguns benefícios que a previdência social oferece aos seus segurados, desde que cumpridos os requisitos legais, que são: salário-maternidade, salário-família, auxílio-reclusão e seguro desemprego. O primeiro teve no passado natureza trabalhista: [...] evidenciada pelo seu caráter salarial e ônus do empregador (vindo daí o nome salário-maternidade), tem, no atual ordenamento jurídico, natureza previdenciária, eis que seu encargo econômico é suportado pela Previdência Social. Trata-se, portanto, de benefício previdenciário substitutivo (porque seu valor não pode ser inferior ao salário-mínimo), embora atípico ou extravagante, já que, objetivando a proteção do mercado de trabalho da mulher, foge à função essencial de proteção contra os riscos sociais, na sua concepção 50 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal. 1988. 51 Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8213cons.htm acessado em 11/05/2010. 52 VIANNA, João Ernesto Aragonês. Curso de Direito Previdenciário. 2. ed. São Paulo: LTr, 2007. p. 31. 28 clássica. Outrossim, o salário-maternidade, de lege lata, é o único benefício previdenciário do RGPS sobre o qual incide contribuição previdenciária (art. 28, § 2º, Lei 8.212/91). [...] O salário-família, muito embora não tenha natureza substitutiva da remuneração do segurado (podendo, por isso mesmo, ter valor inferior ao salário mínimo), tem caráter nitidamente alimentar, evidenciado no auxílio à manutenção da família do segurado de baixa renda. A despeito disso, não se incorpora, para qualquer efeito, ao salário ou benefício (art. 70, Lei 8.213/91 – LBPS). [...] O auxílio-reclusão, como a pensão por morte, encontra-se na algibeira normativa dos benefícios destinados aos dependentes do segurado, de sorte que apenas estes possuem legitimidade para pleiteá-lo (art. 80, LBPS): o segurado recluso é parte ilegítima para requerer a concessão de auxílio-reclusão, devendo o processo ser extinto sem julgamento de mérito (art. 267, VI, do CPC). Nos termos do art. 201, IV, CF/88 (redação dada pela EC nº 20/98), a concessão do auxílio-reclusão é restrita aos dependentes do segurado de baixa renda. Entenda-se por baixa renda o segurado que não recebe salário mensal superior a R$ 360,00, limite este que será corrigido pelos mesmos índices aplicados aos benefícios do RGPS (art. 13, EC 20/98). A partir de maio de 2005, a remuneração mensal não pode ser superior a R$ 623,44 (art. 5º, Pt 822/05). Esse valor é auferido pelo último salário-de-contribuição do segurado existente antes de sua prisão e tem como parâmetro o limite vigente nessa data. Por exemplo, a prisão de segurado com renda mensal de R$ 450,00, ocorrida em março de 2000, quando estava em vigor a Pt 5.188/99, que definia o limite de R$ 376,60, não enseja direito algum ao benefício, nem mesmo a partir da Pt 727/03, que definiu o limite de R$ 560,00, pois o limite a ser considerado é aquele da data da prisão. [...] O Regime Geral de Previdência Social – RGPS não se esgota na Lei 8.213/91 – LBPS, nem no INSS. A situação de desemprego involuntário, que também é uma das modalidades dos denominados riscos sociais, prevista nos arts. 7º, II, e 201, II, CF/88, é objeto de legislação específica: principalmente a Lei 7.998/90, que regula o seguro-desemprego, o abono salarial e o Fundo de Amparo ao Trabalhador – FAT. O abono salarial (art. 9º) não tem natureza previdenciária, por que dispensamos sua análise neste trabalho. O seguro-desemprego, por outro lado, tem natureza de benefício previdenciário, sendo custeado pelo FAT, fundo contábil, de natureza financeira e vinculado ao Ministério do Trabalho (art. 10).53 Como dito anteriormente, o não segurado não tem direito aos benefícios da previdência social, não se aplicando nesse caso o princípio da universalidade de cobertura e atendimento. Para tanto, mesmo aqueles que não desempenham atividade remunerada podem contribuir para o sistema e usufruir dos benefícios previstos em lei. A partir disso, tem-se duas categorias de segurados, os segurados 53 SOMARIVA, Maria Salute; DEMO, Roberto Luis Luchi. Benefícios previdenciários e seu regime jurídico. Salário-família, salário-maternidade, auxílio-reclusão e seguro-desemprego. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1099, 5 jul. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8599>. Acesso em: 11 maio 2010. 29 obrigatórios, que percebem remuneração, e os segurados facultativos, que não exercem atividade economicamente remunerada.54 Encontra-se a classificação de beneficiários do regime geral da previdência social
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