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Origem Com a vitória da democracia escravista, no século V a.C., surgem na Grécia, particularmente em Atenas, os primeiros problemas éticos referentes à vida pública na pólis (cidade) ocasionados pelo novo regime político. É nesse sentido que a Ética relaciona-se de maneira primordial com a Política, isto é, com o comportamento humano na vida em sociedade. Ou, como será definida mais tarde, como a práxis do bem comum. Originalmente, a pólis grega é a fortaleza dos homens livres, capazes de se defenderem, incluindo aí a defesa à propriedade da terra, porque o direito à cidadania, naquele momento histórico, é inseparável da posse da terra. A partir do século V a.C., a cidade-fortaleza se transforma na pólis democrá- tica, na qual a nobreza, ligada à propriedade de terras, terá de repartir o poder com a aristocracia surgida do comércio. A pólis se constitui como o Estado (cidade-estado) dos homens livres, que possuem o direito à cidadania, à proteção das leis e à participação nos destinos sociais (políticos, econômicos e militares) da cidade. Dessa sociedade estão excluídos, portanto, os não livres: estrangeiros, mulheres, crianças e os escravos, que são considerados como instrumentos de trabalho (“mercadorias”: drapodon, que significa criatura vivente com pés humanos), equivalentes a um bem móvel do proprietário de terras. Nesse período, a virtude objetiva – que fundamenta as relações humanas na polis – é a justiça. Ela é a síntese de todas as virtudes morais subjetivas, pelo fato de conferir-lhes um sentido social. É por ela que o homem virtuoso torna-se um bom cidadão. Assim sendo a justiça é a virtude da sociedade e da cidadania. É nesse contexto que os jovens aristocratas devem ser preparados para a vida política, ou seja, para participarem das assembleias (agôn) em praça pú- blica (ágora) sobre o destino da pólis. Com Sócrates tem-se o ensino da virtude através da dialética; teve participação ativa na vida da cidade, dominada pela desordem intelectual e social, submetida à demagogia dos que sabiam falar bem. Convidado a fazer parte do Conselho dos 500, manifesta sua liberdade de espírito combatendo as medidas que julgava injustas, mantendo-se independente em relação às lutas travadas entre os partidos da democracia e da aristocracia. Acreditando em uma voz interior, realiza a tarefa de educador público e gratuito. “O homem mais justo de seu tempo”, diz Platão, foi condenado à morte sob acusação de impiedade e de corrupção da juventude. Seria sua morte o fracasso da filosofia diante da violência dos homens? Ou não, indicaria ela que o filósofo é um servidor da razão, e não da violência, acreditando mais na força das ideias do que na força das armas? (JAPIASSÚ, 2001, p. 251-252). Em Platão, a educação, tem uma finalidade claramente política: conduzir o cidadão pelo caminho da luz, da virtude e da justiça, para desempenhar com adequação o seu papel na polis. Para Platão, conhecer o Bem, significa tornar-se virtuoso. Aquele que conhece a justiça não pode deixar de agir de modo justo. Dois pontos fundamentais emergem da discussão platônica sobre questões éticas. O indivíduo que age de modo ético é aquele que é capaz de autocontrole, de “governar a si mesmo”. Entretanto, a possibilidade de agir corretamente e de tomar decisões éticas depende de um conhecimento do bem, que é obtido pelo indivíduo por meio de um longo e lento processo de amadurecimento. Finalmente, em Aristóteles, aponta-se para uma educação sistemática, que enaltece os valores intelectuais e éticos subordinando os valores materiais e sensíveis. A Ética a Nicômaco, de Aristóteles foi o primeiro tratado de ética da tradição ocidental e também pioneiro no uso do termo “ética” no sentido em que empregamos até hoje, como um estudo sistemático sobre as normas e os princípios que regem a ação humana e com base nos quais essa ação é avaliada em relação a seus fins. Na concepção aristotélica, a felicidade está relacionada à realização humana e ao sucesso naquilo que se pretende obter, o que dá se aquilo que se faz é bem-feito, ou seja, corresponde à excelência humana e depende de uma virtude (areté) ou qualidade de caráter que torna possível essa realização. Algum tempo depois, a destruição da autonomia das cidades-estado, causada pela ascensão dos grandes impérios (macedônio e romano), leva os filósofos estóicos e epicuristas a não mais relacionar a Ética com a pólis, mas sim com o kósmos (universo) e assim, não depender mais de uma determinada comunidade, caracterizada por sua organização social. Compreende-se educação como atribuição do Estado a fim de dar condições para o cidadão (animal político) desenvolver suas potencialidades, participando da vida política e, com isso, atingir a felicidade. Sua concepção é de que o homem, é um “animal político” submetido ao Estado que, pela educação, obriga-o a realizar a vida moral, pela prática das virtudes: a vida social é um meio, não o fim da vida moral. A felicidade suprema consiste na contemplação da realização de nossa forma essencial (JAPIASSU, 2001). A passagem do mundo antigo para o mundo medieval ocorre por volta do sé- culo IV, quando o cristianismo torna-se a religião oficial, e o modelo escravista é substituído pelo regime de servidão. A fragmentação econômica e política é característica do mundo feudal, no qual a religião cristã desponta como a única fonte de unidade social. A Ética, nesse contexto, aparece profundamente impregnada por um sentimento religioso. A natureza humana, que anteriormente achava sua realização na pólis, agora a encontra na transcendência do mundo, na cidade celeste. O cristão, além de ser cidadão do mundo, exercitar as qualidades e virtudes morais e defender uma ordem social justa, é, também, aquele que crê em Deus, criador de tudo e doador da vida, e, pela virtude da fé, espera que a vida histórica, pessoal e social tenha uma dimensão eterna. Surge, então, uma norma moral baseada na revelação de Deus. Essa acaba estabelecendo a Filosofia como serva da Teologia (philosophia ancilla theologiae). Sendo assim, a Ética, no mundo medieval, é compreendida como uma doutrina moral, e a Justiça se aproxima da piedade e da santidade, condicionada pelas formulações sacras do Direito Canônico. Para os primeiros pensadores cristãos, como Agostinho de Hipona (354-430 d.C.), o Direito Natural, que por razão do pecado original vinculou-se à corrupção, parece, muitas vezes, não se conformar com a vontade divina. Essa constatação leva a Igreja a refletir sobre a relação entre a lei divina e a lei do mundo, concluindo sobre a necessidade de se restaurar o Direito Natural, o qual deveria ser entendido como a imagem da lei divina na alma humana. O Direito Canônico, no qual a lei humana, como as necessidades e atividades jurídicas dos fiéis, estava subordinada à autoridade da Igreja, que tinha o dever de zelar por uma ordenação justa e santa da vida social. Outra concepção filosófica importante na idade média é o tomismo. Os princípios fundamentais da metafísica tomista giram em torno da noção de essência e existência de SER Supremo que é Deus, enquanto criador de tudo o que existe, é a expressão da perfeição e da bondade, bem como é o responsável por todas as leis que regem o movimento do universo – sua criação. Dentro dessa perspectiva, o homem é um ser racional, social e político (concepção aristotélica) que participa da essência de seu criador e tem nele a causa suficiente para a sua existência (concepção tomista). A existência do mal no mundo é fruto da capacidade de liberdade, inerente ao homem, e que o torna capaz de optar entre o bem e o mal, servindo-se dos atributos da vontade e darazão que são os fundamentos do agir humano e, portanto, de seu comportamento ético/moral. Mas essa maneira de pensar ultrapassou os muros dos conventos e os monastérios e foi além da idade moderna. A questão social, sob a ótica da Igreja Católica, perde sua conotação clássica e transformase numa questão de ordem moral: a única forma de salvar a humanidade das sequelas da questão social e das propostas comunistas e liberais estava na cristianização dos indivíduos, da família e da sociedade. Assim, a questão social se transforma numa questão de moralismo. Embora os primeiros problemas éticos do Ocidente tenham surgido com os gregos, o problema da distinção entre Ética, Moral e Direito só aparece na modernidade, com a autonomia das ciências e a passagem do teocentrismo para o antropocentrismo (VASQUEZ, 2000, p. 279-281). Verifica-se, então, uma separação entre o bem (ideal) e o que é bom (real), entre o legal (jurídico) e o legítimo (justo). Enquanto na Idade Média, a Filosofia está subordinada à Teologia, e ética e religião estão estreitamente ligadas; a Igreja se torna guardiã da moral exercendo um controle rigoroso sobre a conduta dos cidadãos, associada ao poder civil, na modernidade (séc. XVI-XIX), começa a se desenvolver uma nova tendência que desvincula definitivamente o agir do homem de uma concepção teocêntrica de mundo. As guerras de religião dos séculos XVI e XVII acentuam as divergências entre as Igrejas cristãs e contribuem para despertar a busca de uma moral “natural” ou “puramente racional”, que esteja acima das diferenças confessionais. Há uma ruptura entre Metafísica e Ética e, consequentemente, com a tutela religiosa. A Ética, originada dessa tendência, atingirá seu ponto culminante no pensamento do filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804), para quem o homem, e não mais Deus, apresenta-se como legislador supremo. De acordo com Immanuel Kant, o faktum moral é sempre constituído da mesma forma: pelo dever e pela liberdade. O dever é incondicionado, expressando uma necessidade que se pronuncia, não pela natureza, mas pela razão, através de uma norma e de um fim. Em outras palavras, espera-se que o dever tenha seu fundamento, não na sensibilidade empírica ou na contingência das circunstâncias, mas unicamente nas leis racionais, válidas para todos os homens em todas as condições. A liberdade, por sua vez, deve ser entendida como capacidade de eleger uma ação possível. Trata-se, tal como o dever, de um faktum a priori da razão que enfrenta, como algo absoluto, a realidade espaço-temporal. Nesse sentido, dever e liberdade estão incorporados na essência do homem. O projeto moderno, sintetizado no lema da Revolução Francesa (liberdade, igualdade e fraternidade), não ficou isento de críticas, na tentativa de enquadrar tudo na razão e na ciência, a modernidade acabou identificando a razão com o poder. Ética Grécia Antiga Segundo Valls (1986), a reflexão grega sobre a ética se deu como uma pesquisa sobre a natureza do bem moral, na busca de um princípio absoluto da conduta procede do contexto religioso, onde pode-se encontrar o início de muitas ideias éticas, tendo como formulações mais conhecidas: “nada em excesso” e “conhece-te a ti mesmo”. Sócrates usava o método da maiêutica que consistia em interrogar o interlocutor até que este chegue por si mesmo à verdade, sendo o filósofo uma espé- cie de “parteiro das ideias”. Há uma procura da verdade no interior do próprio homem, através do questionamento busca-se fazer um “parto” desta verdade interior. Tal ato era realizado em duas partes: 1. No primeiro momento levava seus interlocutores a duvidarem de seu próprio conhecimento a respeito de determinado assunto. 2. Em um segundo momento os leva a conceber de si mesmos uma nova ideia, uma nova opinião sobre o assunto em questão. Nome: Sócrates (Σωκράτης) Escola/Tradição: Filosofia grega Data de nascimento: c. 469 / 470 a.C. Local: Atenas Data de falecimento 399 a.C. Local: Atenas Principais interesses: Epistemologia, ética Influenciado por: Parmênides Influências: Filosofia ocidental, mais especificamente Platão, Aristóteles, Aristipo, Antístenes Sócrates acreditava que o conhecimento poderia ser encontrado pelas respostas a perguntas propostas de forma perspicaz. [...] Sócrates foi chamado, muitos séculos depois, “o fundador da moral”, porque a sua ética (e a palavra moral é sinônimo de ética, acentuando talvez apenas o aspecto de interiorização das normas) não se baseava simplesmente nos costumes do povo e dos ancestrais, assim como nas leis exteriores, mas sim na convicção pessoal, adquirida através de um processo de consulta ao seu “demônio interior” (como ele dizia), na tentativa de compreender a justiça das leis. (VALLS, 1986, p. 19) Assim, Sócrates, passou a ser considerado como o primeiro grande pensador da subjetividade. Platão parte das ideias de que todos os homens buscam a felicidade, sendo que a maioria das doutrinas gregas colocava a busca de felicidade no centro das preocupações éticas. Ao pesquisar as noções de prazer, sabedoria prática e virtude, colocava-se sempre a questão: onde está o Sumo Bem? Parece acreditar numa vida após a morte e por isso prefere uma vida de virtudes ao prazer terreno. Dessa forma os homens deveriam procurar a contemplação das ideias, tendo como o conceito mais importante a ideia do Bem. O sábio não é, então, um cientista teórico, mas um homem virtuoso ou que busca a vida virtuosa e que assim consegue estabelecer, em sua vida, a ordem, a harmonia e o equilíbrio que todos desejam. O sábio faz penetrar em sua vida e em seu ser a harmonia que vem do hábito de submeter-se à razão. Dialética e virtude devem andar juntas, pois a dialética é o caminho da contemplação das ideias e a virtude é esta adequação da vida pessoal às ideias supremas. (VALLS, 1986, p.26) Aristóteles foi discípulo de Platão e este de Sócrates; Aristóteles foi um escritor enciclopédico e sistematizador, sua produção revelou seu vasto conhecimento nos mais variados campos. Para Aristóteles, Platão escreveu a República não só com intenções metafísicas, mas com intenções de levantar questões NIKOS PAVLAKIS | DREAMSTIME.COM 30 • capítulo 1 como política e consequentemente ética, esta última como sendo a conduta coletiva e individual dos homens. Partindo da correlação entre o Ser e o Bem, Aristóteles insiste sobre a variedade dos seres e daí conclui que os bens devem variar, pois para cada ser deve haver um bem, conforme a natureza ou essência deste ser. O homem se diferencia das outras espécies por ser uma entidade racional, capaz de tecer ideias próprias, portanto, pode-se considerar o pensamento como algo extremamente especial, divino, assim quem o valoriza e pratica esse exercício racional é sábio, não necessitando de muitas outras coisas. De acordo com Valls (1986), para Aristóteles, a função do homem era fazer com que sua alma encontrasse o equilíbrio entre a virtude e a razão. As virtudes humanas se dividiam em duas: a intelectual ligada à busca pela sabedoria e a virtude moral enfatizando a ação ponderada, atitudes moderadas, prudentes. Esse movimento de interiorização da reflexão e de valorização da subjetividade ou da personalidade se inicia com Sócrates e parece culminar com Kant, já no final do século XVIII. Ética de Kant Kant buscava uma ética de validade universal que se apoiasse apenas na igualdade fundamental entre os homens, sua filosofia se volta sempre, em primeiro lugar, para o homem, e se chama filosofia transcendental porque busca encontrar no homem as condições de possibilidade de conhecimento verdadeiro e do agirlivre. No centro das questões éticas, aparece o dever, ou obrigação moral, uma necessidade diferente da natural, ou da matemática, pois necessidade para uma liberdade. O dever obriga moralmente a consciência moral livre, e a vontade verdadeiramente boa deve agir sempre conforme o dever e por respeito ao dever. (VALLS, 1986). Kant por influência do movimento iluminista1 acredita na igualdade básica entre os homens, desse modo, precisa chegar a uma moral igual para todos, uma moral racional, a única possível para todo e qualquer ser racional. Esta moral não se interessa essencialmente pelos aspectos exteriores, empíricos e históricos, tais como leis positivas, costumes, tradições, convenções e inclinações pessoais. Se a moral é a racionalidade do sujeito, este deve agir de acordo com o dever e somente por respeito ao dever: porque é dever, eis o único motivo válido da ação moral. (VALLS, 1986, p. 20) De acordo com Valls (1986), Kant considera que os conteúdos éticos nunca são dados do exterior, assim cada um de nós tem uma forma de dever, essa fórmula se expressa em várias formulações, no chamado imperativo categórico, desta forma “devo proceder sempre de maneira que eu possa querer também que minha máxima se torne uma lei universal”.
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