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EPISTEMOLOGIA DA GEOGRAFIA UNIVERSIDADE ESTADUAL DO MARANHÃO - UEMA NÚCLEO DE TECNOLOGIAS PARA EDUCAÇÃO - UEMAnet UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL - UAB CURSO DE LICENCIATURA EM GEOGRAFIA Edição Universidade Estadual do Maranhão - UEMA Núcleo de Tecnologias para Educação - UEMAnet Coordenadora do UEMAnet Profª. Ilka Márcia Ribeiro de Souza Serra Coordenadora Pedagógica de Design Educacional Profª. Maria das Graças Neri Ferreira Coordenadora Administrativa de Design Educacional Cristiane Costa Peixoto Professor Conteudista Ailson Barbosa da Silva Designer Educacional Clecia Assunção Silva Designer Pedagógica Adriana Araujo Coelho Revisora de Linguagem Lucirene Ferreira Lopes Editoração Digital Tonho Lemos Martins Governador do Estado do Maranhão Flávio Dino de Castro e Costa Reitor da UEMA Prof. Gustavo Pereira da Costa Vice-Reitor da UEMA Prof. Walter Canales Sant’ana Pró-Reitor de Administração Prof. Gilson Martins Mendonça Pró-Reitor de Extensão e Assuntos Estudantis Prof. Paulo Henrique Aragão Catunda Pró-Reitora de Graduação Profª. Andréa de Araújo Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-graduação Prof. Marcelo Cheche Galves Pró-Reitor de Planejamento Prof. Antonio Roberto Coelho Serra Universidade Estadual do Maranhão - UEMA Núcleo de Tecnologias para Educação - UEMAnet Campus Universitário Paulo VI - São Luís - MA Fone-fax: (98) 2106-8970 http://www.uema.br http://www.uemanet.uema.br Central de Atendimento http://ava.uemanet.uema.br Proibida a reprodução desta publicação, no todo ou em parte, sem a prévia autorização desta instituição. Silva, Ailson Barbosa da. Epistelogogia da geografia [livro eletrônico] / Ailson Barbosa da Silva. – São Luís: Uemanet, 2017. 28 p. 1. Geografia - Estudos. 2. Geografia – trajetória histórica. I.Título CDU: 911 5 5 5 7 8 9 10 13 14 14 15 16 17 18 18 18 19 21 22 23 25 25 26 28 1 OS PRIMÓRDIOS DA GEOGRAFIA: da antiguidade ao pensamento alemão 1.1 As bases da Geografia 1.2 O dilema sobre o objeto da Geografia 1.3 A ciência geográfica 1.4 Origem da Geografia 1.5 Sociedades de Geografia 1.6 A importância do pensamento alemão para a Geografia Referências 2 DO PENSAMENTO FRANCÊS AO MOVIMENTO DE RENOVAÇÃO DA GEOGRAFIA 2.1 Vidal de La BLache e o pensamento geográfico francês 2.2 Determinismo e possibilismo: duas concepções 2.3 Movimento de renovação da Geografia Referências 3 OS CONCEITOS-CHAVE DA DISCIPLINA E OS MÉTODOS DE PESQUISA EM GEOGRAFIA 3.1 Conceitos-chave da Geografia 3.2 Espaço 3.3 Região 3.4 Território 3.5 Escala 3.6 Paisagem 3.7 Lugar 3.8 O conhecimento científico e os métodos em Geografia 3.9 O método e os métodos em Geografia Referências SUMÁRIO C ur so d e Li ce nc ia tu ra e m G eo gr afi a 4 APRESENTAÇÃO Caro estudante, Olá, este é o e-Book da disciplina de Epistemologia da Geografia. Ele foi elaborado especialmente para você estudante do Curso de Geografia EaD da Universidade Estadual do Maranhão.Ao longo do e-Book você poderá conhecer a trajetória de desenvolvimento da Geografia, compreendendo as influências da filosofia sobre a disciplina e o processo de institucionalização. Também conhecerá os principais pensadores e suas contribuições, as transformações recentes da Geografia, o debate sobre o objeto da disciplina, as correntes do pensamento geográfico e os métodos de pesquisas em Geografia. O e-Book vai acompanhado de videoaulas e materiais complementares que você poderá utilizar para ampliar o conhecimento. Não esqueça de realizar as atividades no Ambiente Virtual de Aprendizagem e trocar ideias com seus colegas e tutores, são exercícios de reflexão teórica muito importantes no processo de estruturação do conhecimento. Agora é com você. Bons estudos! C ur so d e Li ce nc ia tu ra e m G eo gr afi a 5 1.1 As bases da Geografia Nesta Unidade você vai conhecer as raízes da Geografia, analisar a trajetória histórica da disciplina desde os seus primórdios, também conhecerá as influências filosóficas sobre o pensamento geográfico e as condições históricas que favoreceram sua organização. 1.2 O dilema sobre o objeto da Geografia Inicialmente, convidamos você a pensar sobre qual o objeto da Geografia, qual o eixo ou foco central de investigação dessa disciplina. Muitas pessoas, sobretudo estudantes, em muitos momentos devem parar e pensar: o que estuda, afinal, a Geografia? Essa é uma pergunta que vem sendo realizada por diferentes indivíduos ao longo do tempo. Longe de querer responder essa questão lhe apresentaremos algumas pistas trazidas pela literatura geográfica. A Geografia é uma ciência de enorme importância na atualidade. Sendo estudada nos níveis básico e universitário, a Geografia tem um papel fundamental de estudar as relações sociais e a natureza. Nesse sentido, a Geografia colabora para a compreensão do mundo, desvendando seu quadro social e natural. Logo, a disciplina estuda diferentes fenômenos – humanos e naturais – buscando explicar suas interações e relações. Possuindo um caráter científico que remonta pouco mais de cem anos, a disciplina tem na antiguidade as suas bases, já que naquela época se realizava ações que a literatura considera bases da Geografia. Observe, a seguir, a Figura 1: OBJETIVOS OS PRIMÓRDIOS DA GEOGRAFIA: da antiguidade ao pensamento alemão 1UNIDADE Conhecer as bases epistemológicas da Geografia; Compreender a importância do pensamento alemão para o desenvolvimento da disciplina. C ur so d e Li ce nc ia tu ra e m G eo gr afi a 6 Figura 1 – O planeta Terra: palco dos estudos da Geografia Fonte: http://worldconsciouspact.org/featured-2/a-war-that-should-be-lost/ Autores das mais diversas correntes e em diferentes épocas propuseram caminhos que nos ajudam a pensar a Geografia e seus objetivos. Cabe destacar que cada uma das proposições realizadas se relaciona a um contexto histórico de seus proponentes, logo devem ser compreendidos e assimilados segundo influências de cada momento. Na literatura geográfica vamos encontrar proposições que apontam para o objeto da Geografia como: i) o estudo da superfície terrestre; ii) o estudo da paisagem; iii) estudo da diferenciação de áreas; iv) estudo do espaço; v) estudo das relações homem e o meio. Como se pode constatar existem proposições variadas que, somadas à tantas outras propostas, formam um enorme cabedal de definições a respeito do objeto da Geografia. Não há uma proposição correta ou mais correta que a outra, mas proposições, segundo leituras de mundo e momentos históricos de cada um dos autores. Não se pretende aqui definir um objeto ou apontar uma definição a ser aceita e assimilada pela disciplina, mas apontar, como se pode perceber, uma ampla variedade de definições que podem ser aceitas, completa ou parcialmente, modificadas ou refutadas por cada estudante ou profissional. O importante é perceber que não existe uma definição única, ou seja, uma unanimidade, aceita pelo amplo leque de geógrafos existentes no mundo. Aliás, no campo das ciências humanas a divergência e a polêmica são atitudes importantes pois, colaboram para o processo de aprimoramento da ciência. C ur so d e Li ce nc ia tu ra e m G eo gr afi a 7 1.3 A ciência geográfica A Geografia é uma área do conhecimento científico amplamente influenciada pelo positivismo e pela filosofia. É no positivismo que a disciplina vai encontrar seus referenciais metodológicos que lhe darão um caráter científico. A Geografia é umaciência jovem que só ganhou uma sistematização científica a partir do século XIX. Para compreender o processo de organização científica da disciplina é fundamental percorrer a história indo da antiguidade aos dias atuais. Vale destacar, a influência da filosofia no processo de estruturação da Geografia. Por muito tempo foi a filosofia, a partir de um ramo do conhecimento filosófico conhecido como filosofia natural, que desenvolveu o conhecimento que hoje recebe rótulo de geográfico. Logo, a filosofia deu importantes contribuições para o desenvolvimento do campo geográfico, sobretudo na Antiguidade. A este respeito, ler Cavalcanti e Viadana (2010) que discutem o papel dos filósofos da antiguidade e suas contribuições para o desenvolvimento do conhecimento geográfico. Para reforçar as informações acessem o livro de Cavalcanti e Viadana, 2010 no site https://static.scielo.org/scielobooks/p5mw5/pdf/godoy-9788579831270.pdf. Por muito tempo a Geografia foi vista como uma ciência de síntese. Ou seja, como uma ciência que reuniria o conhecimento produzido pelas demais áreas científicas. Esse caráter amplo da Geografia foi, talvez, um problema para a disciplina. Pelo desejo de estudar e beber em diferentes fontes do conhecimento, a Geografia passou a ser vista como uma ciência muito ampla, sem objeto claramente definido. Logo, se criou uma polêmica, para não chamar de crise, da Geografia. A Geografia abarca diferentes fenômenos e articula variados conhecimentos. Logo, vai da economia à geologia; das cidades ao clima; da política aos fenômenos naturais; do quadro agrário à demografia; da cultura ao espaço. Figura 2 – O espaço geográfico: o natural e humano como foco de investigações da Geografia Fonte: http://escolakids.uol.com.br/o-que-e-espaco-geografico.htm O perfil de ciência de síntese da Geografia lhe conferiu um tão amplo campo de estudos que, hoje, são produzidos estudos geográficos sobre diferentes assuntos. Em verdade, como afirma o professor Robert Moraes no livro Geografia: pequena história crítica “a ideia de ciência de síntese serviu para encobrir a vaguidade e indefinição do objeto” da Geografia (1986, p.42). C ur so d e Li ce nc ia tu ra e m G eo gr afi a 8 Essa tão ampla síntese do conhecimento reuniu numa única disciplina o conhecimento sobre a sociedade e sobre a natureza. Desta forma, a disciplina está subdividida em duas grandes áreas: física e humana. A Geografia física corresponde à área do conhecimento focada nos estudos naturais. Nesse sentido são estudados fenômenos naturais como o clima, água, relevo, rochas etc. Por sua vez, a Geografia humana foca seus estudos nos fenômenos sociais, logo são observados fenômenos como economia, política, urbanização, quadro agrário etc. Estas duas grandes áreas estão subdivididas em diversas outras áreas da Geografia, vejamos algumas delas no Quadro 1. Quadro 1 – A Geografia e suas subdivisões GEOGRAFIA FÍSICA GEOGRAFIA HUMANA Geologia Estudo da estrutura da Terra Geografia urbana Estudo das cidades Biogeografia Estudo da distribuição das formas de vida Geografia econômica Estudo da economia e sua influência sobre o espaço Climatologia Estudo dos climas Geografia agrária Estudo das relações/produção no campo Hidrogeografia Estudo das águas Geografia política Estudo das relações territoriais Fonte: Ailson Barbosa, 2017 A variedade de temas e assuntos da Geografia lhe dão um caráter tão amplo, como se pode perceber, que em muitos casos se tem produzido verdadeiros dilemas. Muito do que a ciência geográfica tem pensado, também vem sendo pensado e estudado por outras áreas do conhecimento. Logo, as cidades vêm sendo estudadas pelos urbanistas, historiadores e arquitetos; a economia sendo estudada pelos economistas; as formas de vida pelos biólogos e as relações territoriais pelos cientistas políticos. 1.4 Origem da Geografia A Geografia é campo científico relativamente jovem, pelo menos enquanto ciência sistematizada, apesar de sua prática remontar a antiguidade clássica com grande importância no pensamento grego. Estrabão (64 a.C - 24 d.C) é considerado o pai da Geografia. Para ele, a Geografia teria o papel de nos familiarizar com os ocupantes da Terra e dos oceanos, com a vegetação e peculiaridades do planeta. Logo, interpretamos, cabe à Geografia revelar esse complexo onde, até os dias de hoje, a vida se faz presente de forma exclusiva. Após Estrabão diferentes pensadores, sobretudo do campo da filosofia, deram importantes contribuições para o desenvolvimento da Geografia. Até o século XVIII tudo o que se produzia, e se denominava como Geografia, Convidamos você a pensar outras áreas de estudo da Geografia e seus respectivos temas. Pesquise e participe do fórum, juntamente com seus colegas, ampliando o conhecimento sobre a ciência geográfica. C ur so d e Li ce nc ia tu ra e m G eo gr afi a 9 estava disperso e desorganizado. Para Moraes (2009, p.11) “muito do que hoje se entende por Geografia, não era apresentado com este rótulo. Este quadro vai se manter inalterado até final do século XVIII”. Assim, Moraes (2009) destaca que até o final de século XVIII não era possível pensar o conhecimento geográfico como algo organizado e sistematizado. Não havia, pois, unidade temática no campo dos estudos realizados até então. Nesse sentido, às diferentes elaborações eram dadas o nome de Geografia. Logo, relatos de viajantes, textos literários, curiosidades sobre lugares exóticos, obras sintéticas sobre conhecimentos diversos etc., eram denominados como Geografia. Muito dessa produção era realizada sem qualquer rigor científico, aliás, a Geografia não era considerada ainda uma ciência, assim não se pode desejar qualquer critério nessa relação. A sistematização do conhecimento científico só vai se realizar a partir do século XIX, quando um conjunto de fatores políticos e econômicos vão incentivar a organização da Geografia enquanto disciplina científica, em muito voltada para o atendimento de interesses políticos dos Estados nacionais. Dentre os fatores que vão favorecer a sistematização da Geografia no século XIX podem ser destacados: A necessidade de conhecer o planeta Terra - Era necessário dar uma unidade aos estudos da Terra e ampliar o conhecimento a respeito do planeta; Necessidade de organização do conhecimento acumulado até então - Muito já havia produzido, até meados daquele século, contudo, muita coisa ainda estava dispersa e desorganizada. Era necessário evitar retrabalho. O pensamento da época caminhava no sentido de que era preciso não apenas conhecer novas terras, mas apropriar-se. Para Moraes (2009, p.12), o desenvolvimento do comércio colonial vai demandar dos Estados europeus a organização de informações sobre os recursos naturais presentes em terras dominadas pelos países europeus. Cabe destacar que essa fase da história já experimentava os tentáculos do capitalismo com início de sua fase imperialista; Desenvolvimento das técnicas de cartografia - Era fundamental representar os fenômenos estudados por meios dos mapas - a linguagem fundamental da Geografia. Com o advento do capitalismo e o avanço para construção de uma economia de escala global era necessário a produção de mapas e cartas mais precisas que favorecessem uma melhor leitura de mundo; Tais fatores são fundamentalmente aqueles que favoreceram a sistematização da Geografia e seu avanço para um caráter científico após o século XVIII; Antes disso, porém, tudo o que havia sido acumulado possuía ampla influência da filosofia. Esta ciência, que antes se pautava pela fé, avança em busca de explicações sobre o real; No início do século XIX, o planeta já estava,a grosso modo, totalmente conhecido. As relações sociais se ampliavam em função do desenvolvimento do capitalismo e a sistematização da Geografia surgia como uma necessidade fundamental para compreensão do mundo. 1.5 Sociedades de Geografia É importante destacar que a Geografia realizada até o século XIX era realizada de forma autônoma, em muitos casos produzida por curiosos e profissionais de diversas áreas do conhecimento. Cabe dizer que a Geografia C ur so d e Li ce nc ia tu ra e m G eo gr afi a 10 ainda não era considerada uma ciência, fato que só vai se dar, em alguns países, a partir da segundo metade do século XIX. Até então, a Geografia era mais uma prática do que propriamente uma ciência. Verdadeiros curiosos viajantes se aventuravam pelo mundo produzindo relatos descritivos a respeito das paisagens encontradas. Esses relatos, como apontado anteriormente, correspondem ao que se considerava, até então, a Geografia. Essas sociedades eram instituições surgidas no início do século XIX. Segundo Moreira (2009), essas sociedades podem ter sua trajetória divida em duas fases distintas: entre 1820 e 1870, estarão marcadas pela ação de viajantes naturalistas interessados em cartografar, parcelas do mundo ainda não conhecidas ou pouco conhecidas pelos europeus; e entre 1870 e 1920, período auge do imperialismo, quando elas desempenham o papel de organização das informações até então produzidas. Vale dizer que, em muitos casos, essas sociedades eram financiadas por cotas de seus associados, por comerciantes interessados na ampliação de relações comerciais e até pelo Estado, a exemplo das sociedades de Geografia russas. Por meio das sociedades, se realizavam eventos onde se debatiam o conhecimento geográfico, a publicação de revistas e a divulgação de pesquisas realizadas por naturalistas. 1.6 A importância do pensamento alemão para a Geografia A história do pensamento geográfico, ao longo do século XIX, possui importantes bases na Alemanha. São alemães os denominados “pais da Geografia moderna”: Humboldt e Ritter. Contemporâneos, produziram uma importante sistematização da Geografia, elaborando quadros teóricos de fundamental importância para o desenvolvimento e consolidação da disciplina. Figura 3 - Alexander Von Humboldt: alemão, naturalista e um dos pais da Geografia moderna Fonte: http://brasilescola.uol.com.br/geografia/humboldt-ritter-os-pais-geografia.htm C ur so d e Li ce nc ia tu ra e m G eo gr afi a 11 Alexander Von Humboldt nasceu em 1769, era geólogo e botânico, logo um naturalista. É dele a tradição de estudos naturais dentro da Geografia. Ele entendia que caberia a Geografia sistematizar o conjunto de conhecimento relativos à Terra. Humboldt morreu em 1859 ocupando importantes cargos da vida universitária alemã. Figura 4 - Karl Ritter: historiador, filósofo e um dos pais da Geografia moderna Fonte: http://brasilescola.uol.com.br/geografia/humboldt-ritter-os-pais-geografia.htm Karl Ritter nasceu em 1779, dez anos depois de Humboldt, era filósofo e historiador. Ele traz para a Geografia o caráter social, ou humano, da disciplina. Ritter e Humboldt deixam importantes contribuições para o conhecimento geográfico, sobretudo no campo da sistematização do conhecimento. Seus seguidores dão amplo conhecimento às suas produções, mas é na Rússia onde suas ideias ganham mais eco. Após a morte deles, já no século XIX, o eixo de discussão da Geografia permanecerá na Alemanha, a partir da contribuição de um importante geógrafo: Friedrich Ratzel. Ratzel desenvolve uma importante produção geográfica, publicada no último quartel do século XIX. A Geografia de Ratzel é essencialmente política. Suas ideias surgem num quadro de tensões na Prússia. Ele vivencia a unificação alemã e a constituição do Estado Alemão, e suas ideias se voltam a legitimar as concepções políticas alemães da época. Cabe destacar que, a Alemanha nem sempre se constituiu como um país independente. O território alemão é resultado de um grande processo político empreendido por Bismark. O resultado foi a criação da Alemanha e sua consolidação como Estado independente. Para saber mais a respeito do quadro político prussiano e sobre a constituição do Estado alemão, assista ao vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=9f2RE6gJVt0 C ur so d e Li ce nc ia tu ra e m G eo gr afi a 12 A Alemanha demorou muito para romper com o feudalismo e permitir a penetração do capitalismo. O caráter tardio da unificação alemã não lhe conferiu o direito de participação na partilha dos territórios coloniais, lhe impedindo um amplo desenvolvimento. Contudo, eis que aparece Ratzel e sua Geografia. Ratzel é o criador da Geografia política. Sua obra se voltou a legitimar o expansionismo alemão bismarkiano. Logo, o discurso geográfico produzido por Ratzel elaborou amplos elogios ao imperialismo e reconheceu a necessidade de conquista de novos territórios (ainda que submetendo outros povos) como meio necessário para o desenvolvimento de qualquer nação. Como resultado e contraponto à Geografia alemã, até então principal eixo do pensamento geográfico internacional, surge outro importante pensador: Vidal de La Blache. Francês, La Blache vai desenvolver uma Geografia como resposta às formulações ratzelianas. O pensamento de La Blache e as contribuições francesas para o desenvolvimento do pensamento geográfico serão apresentados na próxima Unidade. ATIVIDADE Agora, como forma de exercitar o conhecimento responda as seguintes questões: 1) Por que a Geografia é considerada uma ciência de síntese? 2) Explique as divisões da Geografia, seus sub-ramos e áreas de estudos. 3) Discorra a respeito das características da Geografia até o século XVIII e os fatores que influenciaram a sistematização da Geografia a partir do século XIX. 4) Comente a respeito das contribuições de Humboldt, Ritter e Ratzel para o desenvolvimento do pensamento geográfico. Resumo Nesta Unidade, estudamos a respeito das bases da Geografia e a polêmica que envolve o seu objeto. Conhecemos a divisão da disciplina e a contribuição dada pelos alemães para o desenvolvimento do pensamento geográfico até o século XIX, além do papel desempenhado pelas sociedades de Geografia. C ur so d e Li ce nc ia tu ra e m G eo gr afi a 13 Referências CAVALCANTI, Agostinho Paula Brito; VIADANA, Adler Guilherme. Fundamentos históricos da geografia: contribuições do pensamento filosófico na Grécia antiga. In:______. História do pensamento geográfico e epistemologia em Geografia. GODOY, Paulo R. Teixeira de (Org.). São Paulo: Cultura Acadêmica, 2010. MORAES, Antonio Carlos Robert. Geografia: pequena história crítica. 20. ed. São Paulo: UCITEC, 1986. MOREIRA, Ruy. O que é geografia. 2. ed. O autor: 2009. C ur so d e Li ce nc ia tu ra e m G eo gr afi a 14 OBJETIVOS DO PENSAMENTO FRANCÊS AO MOVIMENTO DE RENOVAÇÃO DA GEOGRAFIA2UNIDADE Refletir a respeito das contribuições do pensamento francês para a Geografia; Compreender as condições que levaram ao processo de renovação da Geografia em meados do século XX. 2.1 Vidal de La BLache e o pensamento geográfico francês Durante boa parte do século XIX o principal eixo de debate geográfico estava concentrado na Alemanha. Ratzel era o grande expoente desse pensamento. Contudo, a partir da segunda metade daquele século surge um novo formulador do pensamento geográfico, e que entraria para a história da Geografia como um dos mais importantes: Vidal de La BLache. Francês, La Blache desenvolve importantescontribuições para o pensamento geográfico se contrapondo a tudo aquilo que havia sido produzido pela obra ratzeliana. Para compreender o processo de desenvolvimento do pensamento geográfico francês é fundamental pensar o contexto histórico. Não daremos conta de fazer aqui, mas você pode pesquisar para compreender as relações que se estabeleceram na França entre os séculos XVIII e XIX. Diferente da Alemanha, a França experimentou uma revolução burguesa. A burguesia elaborou um modelo de Estado que em muito atendia aos seus interesses. A Revolução Francesa - um verdadeiro movimento popular capitaneado pela burguesia - consolidou o desenvolvimento do capitalismo na França, eliminando todos os resquícios do período feudal. Diante de muitas transformações sociais, a França disputava, na segunda parte do século XIX, a hegemonia continental europeia. Era diretamente com a Prússia (atual Alemanha) que os franceses rivalizavam. Havia uma verdadeira disputa que envolvia interesses imperialistas. Nesse contexto, a Geografia francesa se desenvolve. A disciplina passa a ser trabalhada em todas as séries do ensino básico, havia, pois, um apoio direto do Estado francês para o desenvolvimento do pensamento geográfico. São criados cátedras e institutos de Geografia com o papel de desenvolver e organizar a Geografia francesa daquele período. Tal atitude se desenvolve num cenário de ampla disputa política, de guerra e do reconhecimento do próprio Estado de que era importante e fundamental conhecer a Geografia, sobretudo das colônias. C ur so d e Li ce nc ia tu ra e m G eo gr afi a 15 A França havia saído derrotada de uma guerra contra a Prússia - a guerra Franco-prussiana, em 1870. Um importante político francês reconheceu, naquele período, que a guerra havia sido vencida pelos instrutores prussianos, ou seja, por gente preparada e conhecedora da Geografia. A guerra impõe à França a necessidade de construção de um discurso geográfico que deslegitimasse a Geografia alemã e o desenvolvimento de uma Geografia que colaborasse para o expansionismo francês. O pensamento geográfico francês surge, portanto, para se contrapor aquele alemão, legitimador do imperialismo. O principal articulador dessa empreitada foi La BLache, que desenvolveu sua Geografia no final do século XIX e início do século XX. Fundador da escola francesa de Geografia, La Blache atrai para a França o eixo de discussão geográfica da época. Dentre as críticas produzidas por La Blache, à Geografia ratzeliana, estava o caráter político da Geografia daquele. Para ele, a ciência necessitava de um discurso neutro, enquanto a Geografia de Ratzel era explicitamente política, justificando posições do Estado alemão. Outra crítica dizia respeito ao fato de o homem aparecer como elemento passivo na Geografia de Ratzel. La BLache vai propor um discurso relativista nessa relação que vai ganhar o nome de possibilismo. Vale destacar que a França possui outros grandes nomes durante esse período, a exemplo de Elisée Reclus dentre outros, mas é com La Blache que a Geografia francesa ganha projeção. La Blache desenvolveu o que se reconhece como Geografia Humana e criou a corrente que se tornou majoritária no âmbito da Geografia: Geografia regional. 2.2 Determinismo e possibilismo: duas concepções Na Unidade 1, estudamos as contribuições do pensamento alemão e francês, com base nas propostas de Ratzel e La Blache. Estes autores desenvolveram importantes contribuições para o campo da Geografia, sobretudo aquelas que a literatura geográfica passou a chamar de determinismo e possibilismo. A concepção determinista, desenvolvida por Ratzel, se baseia numa leitura de mundo em que o meio seria capaz de influenciar a fisiologia e a psicologia humana. Desta forma, o homem seria resultado das interrelações dele com a natureza. “A teoria ratzeliana via o ser humano a partir do ponto de vista biológico (não social) e que, portanto, não poderia ser visto fora das relações de causa e efeito que determinam as condições de vida no meio ambiente”. (PENA, 2017, p.1). Para Moraes (1986, p.71), a Geografia proposta por Ratzel se configurava como “o estudo das influências, que as condições naturais exercem sobre a evolução das sociedades”. Logo, os grupos humanos seriam resultado da influência que a natureza exercia sobre o homem. Figura 1 - Ratzel: o criador da Geografia política Fonte: http://brasilescola.uol.com.br/geografia/ friedrich-ratzel.htm C ur so d e Li ce nc ia tu ra e m G eo gr afi a 16 A obra ratzeliana vai justificar, diretamente, o processo de dominação dos povos europeus sobre outros povos. A ideia de superioridade da raça produziu fatos históricos, tais como o nazismo. Tais movimentos promoveram situações em que determinados povos foram dominados e tiveram sua cultura, história e tradições suprimidas em nome daquela dos europeus. Ratzel foi o criador da geopolítica, ainda que nunca tenha utilizado-se do termo, que só foi cravado por seus seguidores. Uma segunda proposta, antagônica ao determinismo, foi o possibilismo. Desenvolvida por Vidal de la Blache, considerado o fundador da escola de Geografia francesa, a concepção possibilista de Geografia rejeitava aquela concepção proposta pelos alemães de que a natureza seria capaz de influenciar o comportamento humano. Para La Blache “o homem também transformava o meio onde vivia, de forma que para as ações humanas, diversas possibilidades eram possíveis, uma vez que essas não obedeceriam a uma relação entre causa e efeito”. (PENA,2017,p.1). Nesse sentido, ao contrário do determinismo que compreendia a natureza influenciando o homem, o possibilismo acreditava nas possibilidades de influências mútuas. A natureza sobre o homem e homem sobre a natureza. La BLache teve um importante papel no desenvolvimento da chamada Geografia regional. Segundo sua proposta, era impossível, ao menos naquelas condições históricas em que vivia, construir leituras totalizantes do mundo. Logo, a saída seria pensar as porções regionais, buscando descrever suas características particulares. Assim, se desenvolve a chamada geografia regional. 2.3 Movimento de renovação da Geografia A Geografia é uma disciplina marcada por muitas polêmicas. Ao longo do seu processo de estruturação a disciplina passou por muitos processos, dentre eles aquele que buscou renovar a forma de fazer Geografia. Até aqui vimos um pouco sobre a chamada Geografia tradicional. Essa fase da disciplina percorre dos primórdios da Geografia até meados do século XX. A Geografia tradicional foi marcada por um método particular: a descrição. Dizemos, pois, que o método utilizado ao longo dessa fase é o método descritivo. Contudo, em determinado momento da história a Geografia crítica e seu método passaram a ser questionados. O mundo vivia momentos de muitas transformações (a urbanização crescente, aumento populacional, revolução tecnológica, avanço do capitalismo etc.), logo era fundamental adaptar a Geografia para permitir fazer novas leituras de mundo para além da simples descrição. Figura 2 - Vidal de La Blache: o criador da Geografia regional Fonte: http://brasilescola.uol.com.br/geografia/ vidal-la-blache.htm C ur so d e Li ce nc ia tu ra e m G eo gr afi a 17 Nesse sentido tem início o chamado movimento de renovação da Geografia. Esse movimento teve duas importantes correntes: a pragmática e a crítica. A Geografia pragmática teve duas importantes vertentes: a quantitativa e a sistêmica. O fato é que os seguidores dessa vertente incluíramna prática geográfica o uso dos computadores, satélites e métodos matemáticos, como suporte para pesquisa geográfica. Para eles, tudo poderia ser traduzido em números, gráficos e índices. Os geógrafos adeptos da vertente sistêmica também elaboraram uma série de modelos, a exemplo dos modelos de Christaller. Diferentes autores apontam para o fato de a Geografia sistêmica ter atendido aos interesses estatais e ter sido uma arma poderosa para o Estado e para burguesia. Por sua vez, os geógrafos da corrente crítica adotaram uma posição diferente. Eles passaram a enxergar a Geografia como um instrumento de denúncia das desigualdades, sobretudo aquelas decorrentes do capitalismo. Para esses geógrafos a Geografia deveria ser instrumento político de transformação da realidade. Logo, pensam a prática geográfica como uma prática, sobretudo, militante! A Geografia crítica nasce nos anos 1970 e ganha força em diferentes partes do mundo. Ainda hoje, a Geografia brasileira é amplamente influenciada por essa perspectiva. Resumo Na Unidade 2, estudamos a contribuição do pensamento francês para o desenvolvimento da Geografia. Também estudamos as diferentes perspectivas da Geografia: possibilismo e determinismo. E, por fim, conhecemos o processo de renovação da disciplina e suas vertentes. Referências MORAES, Antonio Carlos Robert. Geografia: pequena história crítica. 20. ed. São Paulo: UCITEC, 1986. MOREIRA, Ruy. O que é Geografia? 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 2009. PENA, Rodolfo F. Alves. “Friedrich Ratzel”; Brasil Escola. Disponível em: <http://brasilescola.uol.com.br/ geografia/friedrich-ratzel.htm>. Acesso em: 24 set. 2017. Pesquise sobre determinismo e possibilismo geográfico. Debata com seus colegas as características dessas correntes de pensamento geográfico. Assista ao vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=DDwV8svqvhQ C ur so d e Li ce nc ia tu ra e m G eo gr afi a 18 OBJETIVOS OS CONCEITOS-CHAVE DA DISCIPLINA E OS MÉTODOS DE PESQUISA EM GEOGRAFIA3UNIDADE Refletir a respeito dos conceitos-chave da Geografia; Compreender os métodos utilizados na pesquisa Geográfica. 3.1 Conceitos-chave da Geografia Ao longo do curso muito será falado dos conceitos-chave da Geografia ou mesmo faremos referência a eles. Talvez, até aqui, já tenhamos tratados de alguns, nesse momento se pretende discorrer sobre os mesmos ainda que não se tenha a pretensão de esgotar o debate. Assim, os conceitos-chave da Geografia são: espaço, região, território, escala, paisagem e lugar. 3.2 Espaço Espaço é um conceito importantíssimo da ciência geográfica e de fundamental importância para a disciplina, já que a Geografia estuda o espaço. Contudo, nessas linhas iniciais cabem algumas considerações. Quando falamos de espaço, na perspectiva geográfica, estamos tratando do espaço geográfico. No senso comum a palavra espaço pode remeter a diferentes interpretações: área, espaço sideral, espaço econômico, topológico etc. (CORRÊA, 2000). Porém, o espaço de que trata a Geografia é o espaço geográfico. Para Corrêa (2000, p.15): A expressão espaço geográfico ou simplesmente espaço, por outro lado, aparece como vaga, ora estando associada a uma porção específica da superfície da Terra identificada seja pela natureza, seja por um modo particular como o homem ali imprimiu as suas marcas, seja como referência à simples localização. Adicionalmente a palavra espaço tem o seu uso associado indiscriminadamente a diferentes escalas, global, continental, regional, da cidade, do bairro, da rua, da casa e de um cômodo no seu interior. C ur so d e Li ce nc ia tu ra e m G eo gr afi a 19 Na perspectiva física, o espaço geográfico é formado pela interação da atmosfera-litosfera-hidrosfera. O homem, por sua vez, atua transformando-o, modificando, interferindo em sua organização. Figura 1 - Espaço geográfico: uma intervenção humana na natureza Fonte: http://brasilescola.uol.com.br/geografia/espaco-geografico.htm O fato é que não há um consenso dentre os geógrafos quanto ao conceito de espaço, sobretudo porque as tentativas de explicação estão influenciadas pelas correntes do pensamento geográfico, distintas entre si. Contudo, há indicativos que podem colaborar para sua compreensão. Para Hatshorne, o espaço geográfico é apenas uma construção intelectual, não existindo de fato na sociedade. Seria, pois, uma concepção da forma como nós enxergamos a realidade no sentido de apreender como acontece a espacialização da sociedade e tudo o que por ela foi construído. Já, para Milton Santos, o espaço geográfico é um conjunto de sistemas de objetos e ações, isto é, os itens e elementos artificiais e as ações humanas que manejam tais instrumentos no sentido de construir e transformar o meio, seja ele natural ou social. Para os geógrafos humanistas, porém, o conceito de espaço geográfico estaria atrelado à questão subjetiva, cultural e individual. Nesse sentido, o espaço é o local de morada dos seres humanos e, mais do que isso, é o meio de vivência onde as pessoas imprimem suas marcas cotidianamente, proporcionando novas leituras à medida que a compreensão do mundo se modifica. Em suma podemos compreender o espaço geográfico como palco das ações humanas, resultado da interferência do homem sobre a natureza, constituído pelo conjunto de objetos e relações estabelecidas entre si. 3.3 Região De forma cotidiana nos deparamos frequentemente com o termo região. Fala-se, pois, da região do comércio, da região rica, da região violenta etc. C ur so d e Li ce nc ia tu ra e m G eo gr afi a 20 Mas, afinal, o que é região? E o que é região do ponto de vista da Geografia? O termo região está associado a uma porção espacial marcada pela homogeneidade interna e sua distinção em relação ao externo. Ou seja, corresponde a uma porção espacial que possui identidade própria, características que a definem como diferenciada em relação ao conjunto. Segundo Gomes (2000, p.50), “Regione nos tempos do Império Romano era a denominação utilizada para designar área que, ainda que dispusessem de uma administração local, estava submetidas às regras gerais e hegemônicas das magistraturas sediadas em Roma”. O mesmo autor destaca o fato de o conceito de região estar presente no senso comum, tal como em outras áreas do conhecimento como na matemática, geologia, biologia etc. Na Geografia, o conceito de região é fundamental e fundante da disciplina. A Geografia moderna hipervalorizou este conceito criando, inclusive, uma importante perspectiva de análise espacial: a Geografia regional. A utilidade do conceito de região se realiza em diferentes escalas: no senso comum ou no campo científico, como já apontado. O conceito de região é muito útil para os estudos da Geografia, mas também para o planejamento. Nesse sentido se fala de planejamento regional. Ao longo da história do Brasil, por exemplo, já se experimentou diferentes regionalizações do território brasileiro. Ou seja, diferentes formas de agrupar porções territoriais, buscando a identidade interna de cada uma dessas porções. A regionalização mais recente do Brasil data de 1970, quando foram definidas cinco regiões: norte, nordeste, sul, sudeste e centro-oeste. Figura 2 – Regionalização brasileira Fonte: http://alunosonline.uol.com.br/geografia/regionalizacao-brasil.html Para delimitação dessa regionalização levou-se em conta características como questões naturais, históricas e econômicas, ainda que existam incongruências no resultado. Vale destacar que outras regionalizações já foram feitas no Brasil ao longo de sua história. Vale pesquisar e dividir com seus colegas! C urso d e Li ce nc ia tu ra e m G eo gr afi a 21 3.4 Território O conceito de território é outro conceito-chave da disciplina. Tão importante quanto os demais, esse conceito está diretamente associado à noção de poder e dominação do espaço. Quando falamos de território estamos tratando de uma porção do espaço marcado e delimitado por relações de poder. Nesse sentido, podemos pensar variados exemplos de territórios, tais como o território nacional (marcado pelo domínio do Estado brasileiro), o território do estado do Maranhão (submetido às regras do governo estadual), o território municipal, o território do tráfico, o quintal de sua casa etc. Figura 3 - O território do estado do Maranhão Fonte: http://www.ma10.com.br/2017/06/03/populacao-de-92-municipios-opina-em-melhorias-para-o-estado/ O fato é que na concepção de território sempre estará relacionada a condição de poder sobre o espaço. Alguém ou alguns sempre deterão o domínio daquela porção espacial tornando-o um território! Nesse sentido, Souza (2000, p.78) define o território como “espaço definido e delimitado por e a partir das relações de poder”. Para Souza (2000, p.81), territórios são construídos (e desconstruídos) nas mais diversas escalas, das mais acanhadas (p.ex., uma rua), à internacional (p. ex., a área formada pelo conjunto dos territórios dos países-membros da Organização do Tratado do Atlântico Norte – OTAN); territórios são construídos e desconstruídos dentro de escalas temporais as mais diferentes: séculos, décadas, anos, meses ou dias. No campo da Geografia tradicionalmente tem sido a geografia política aquela que se apropriou do debate sobre o território, sobretudo em função do conceito de território nacional. Contudo, vale destacar, o conceito de território é fundamental para analisar outras escalas e tem sido amplamente utilizado para fazê-lo. Assim, tem se falado, no campo das pesquisas geográficas, com frequência dos variados tipos de territórios, tais como o território do tráfico, da prostituição, do comércio informal etc. Vale destacar que alguns territórios se constituem em territórios temporários, ou seja, eles existem em determinados momentos do dia, da semana ou do ano, mas desaparecem posteriormente. Diferentemente de alguns territórios (tidos como permanentes) que ultrapassam escalas de tempos maiores, mas que também estão passíveis de serem modificados. C ur so d e Li ce nc ia tu ra e m G eo gr afi a 22 Enquanto escrevo este e-Book assisto um levante separatista na Espanha que propõe criar o Estado independente da Catalunha. Caso se concretize, ainda que os movimentos políticos internacionais apontem para sua não concretização, o mapa político internacional será modificado com a redução do território espanhol e a criação de um novo Estado Nacional no seio da Europa. ATIVIDADE 1) Desafio você, caro estudante, a pensar os territórios existentes em seu município e a dialogar com seus colegas sobre sua extensão, caraterísticas e temporalidades. 3.5 Escala O conceito de escala é mais um conceito de suma importância para a Geografia. Ela nos permite pensar diferentes níveis de realidade, realizando um exercício de compreensão do mundo a partir de distintas perspectivas. Nesse sentido, é possível pensar distintas escalas geográficas, tais como a escala global, nacional, regional ou local. Assim, podemos pensar questões como: O aquecimento global afeta o conjunto do planeta Terra – escala global; Figura 4 - Escala global ou internacional Fonte: https://dinamicaglobal.wordpress.com/2011/12/15/agora-com-24-satelites-sistema-de-navegacao-russo-pode-competir- com-o-gps-em-escala-global/ O Brasil é um país muito conhecido pelo samba e pelo futebol – escala nacional; O nordeste brasileiro possui belas praias – escala regional; O meu bairro se localiza na parte central de Timon – escala local . C ur so d e Li ce nc ia tu ra e m G eo gr afi a 23 A outra perspectiva da escala é a numérica ou gráfica. Ou seja, se constitui num recurso para a produção e leitura de mapas. Desta forma, é possível falar de escalas cartográficas que representam a relação entre a realidade e a representação cartográfica no mapa. Logo, fala- se, a partir dos mapas, de escalas de 1:1000, 1:1.000.000 etc., para dar conta da proporção entre o real e o representado, permitindo também medir distâncias. Todo mapa deve conter, obrigatoriamente, uma escala. Pesquise e identifique sua escala! 3.6 Paisagem O conceito de paisagem tem sido muito ressaltado no campo dos estudos geográficos. Nos princípios da Geografia os estudos geográficos se voltavam a descrever o conteúdo da paisagem. Esse conceito- chave permanece muito valorizado na pesquisa geográfica, sendo suporte para compreensão das transformações. Paisagem corresponde a um conceito que se volta a revelar o conteúdo do visível. Ou seja, a paisagem corresponde ao conjunto de elementos perceptíveis ao olho. Podemos falar, pois, de duas dimensões da paisagem: natural e cultural. A paisagem natural corresponde aquela que formada por um conjunto de elementos naturais pouco ou nada modificados ao longo do tempo. Assim, podemos pensar porções do espaço terrestre pouco transformadas ao longo do tempo: uma floresta, um rio, uma cachoeira etc. Figura 5 - Escala numérica Escala numérica Fonte: http://brasilescola.uol.com.br/ geografia/escalas.htm Figura 6 - Escala gráfica Escala gráfica Fonte: http://brasilescola.uol.com.br/ geografia/escalas.htm Figura 7 - Paisagem natural Fonte: http://www.visaogeografica.com/siteantigo/images/deserto.jpg C ur so d e Li ce nc ia tu ra e m G eo gr afi a 24 A paisagem cultura – ou paisagem antrópica – é formada pelo conjunto de elementos presentes no espaço resultado da ação humana. Elas constroem-se a partir da utilização e transformação dos elementos da natureza pelas atividades realizadas pelo homem. Portanto, todas as edificações artificialmente construídas, bem como as intervenções não naturais sobre o espaço constituem paisagens culturais, como o espaço de uma cidade ou um campo de produção agrícola. (PENA, 2017). Disponível em: <http://m.brasilescola.uol.com.br/geografia/ paisagem-cultural-paisagem-natural.htm Figura 8 - Paisagem cultural: resultado da intervenção humana sobre o espaço Fonte: http://www.visaogeografica.com/siteantigo/images/rio.gif Para Pena (2017): Ao contrário do que muitos imaginam, a paisagem é uma categoria extremamente dinâmica. Ela, além de se portar como uma expressão das práticas humanas ou das ações da natureza, é capaz de narrar, através de suas manifestações aparentes ou ocultas, a história daquele espaço. É comum encontrarmos, nas manifestações de mundo, elementos referentes ao passado, recente ou remoto. Portanto, a principal característica da paisagem é, sem dúvida, o fato de ela agregar, em si, a sobreposição e confluência das ações do presente e do passado, que muitas vezes convivem lado a lado. Disponível em: <http://m.brasilescola. uol.com.br/geografia/paisagem-cultural-paisagem-natural.htm Assim, cabe destacar que a paisagem se altera ao longo do tempo e se torna testemunha dos processos naturais e sociais realizados ao longo da história. Sendo visível aos olhos, e em alguns casos, aos demais sentidos, a paisagem deve ser apreendida como parte da dinâmica espacial. A paisagem é, dessa forma, uma importante categoria que deve ser percebida e observada no cotidiano a fim de compreender os processos que se realizam diante de nossos olhos ao longo do tempo. C ur so d e Li ce nc ia tu ra em G eo gr afi a 25 3.7 Lugar O termo lugar tem diferentes definições, mas no campo da Geografia se refere à uma espacialidade marcada por referências afetivas, históricas e emocionais. Não há uma definição consensual dentre os geógrafos quanto ao conceito, mas ele vem sendo utilizado amplamente pelos geógrafos ligados à corrente fenomenológica e cultural. Segundo Holzer (1999), sobretudo pelas contribuições de autores como Yi-Fu Tuan e Anne Butiimer, a ideia de lugar passou a associar-se à corrente filosófica da fenomenologia que, basicamente, trata os fatos como únicos, partindo da compreensão do ser sobre a realidade e não da realidade em si, esta tida como inatingível. Por isso, o lugar ganhou a ideia de significação e, mais do que isso, de afeto e percepção. Logo, quando falamos de lugar nos referimos às porções espaciais que podem ser o bairro, a rua, uma comunidade, uma aldeia indígena etc. Contudo, para que se constitua num lugar é preciso que os indivíduos mantenham com essa porção do espaço relações de sentimento, história ou afetividade. Logo, o espaço se constituirá no lugar! Figura 9 - Indígenas da Amazônia: íntima relação com seu lugar Fonte: https://www.tripadvisor.com.br/LocationPhotoDirectLink-g303235-d2513270-i122878153- Amazon_Eco_Adventures_Day_Tours-Manaus_Amazon_River_State_of_Amazonas.html 3.8 O conhecimento científico e os métodos em Geografia Quando falamos de conhecimento científico estamos tratando de um tema fundamental no campo das ciências e que tem requerido muitos esforços e reflexões por amplas parcelas de pensadores. C ur so d e Li ce nc ia tu ra e m G eo gr afi a 26 Com o desenvolvimento da teoria do conhecimento a ciência buscou estruturar a atitude científica em busca da objetividade e das leis gerais. Logo, a ciência passou a se constituir como resultado de observações e experimentos elaborados segundo regras científicas. Tal atitude influenciou diversas áreas do conhecimento, inclusive a Geografia. Nesse sentido, o desenvolvimento do pensamento geográfico esteve diretamente relacionado ao paradigma unificador da perspectiva social e natural na ciência: o positivismo. O positivismo influenciou diretamente os geógrafos físicos, mas sem deixar de fazê-lo, também, sobre aqueles que trabalham com a perspectiva humana. 3.9 O método e os métodos em Geografia No campo científico muito se fala do método. Para muitos autores, a ciência se caracteriza pela existência de regras gerais (teorias), pela existência de um objeto e pelo método (ARAÚJO, 2003). A Geografia tem buscado elaborar teorias geográficas, possui um objeto (o espaço) e tem, ao longo de sua trajetória, buscado o seu método de análise. Durante muito tempo a Geografia permaneceu utilizando-se do método descritivo, ou seja, buscando a simples descrição da paisagem sem buscar estabelecer relações de causas e efeitos. O fato é que em determinado momento da história – como já visto na Unidade 2 – a Geografia foi provocada a repensar seu método, fato que a colocou em xeque absorvendo novas formas de interpretação da realidade. O método corresponde a um conjunto de princípios sistematizados que leva o pesquisador a um determinado resultado. Diferentes explicativas buscam traduzir o conceito de método, vejamos algumas delas.Observe: Para Batista (2013, p.20), “o método é um instrumento organizado que procura atingir resultados estando diretamente ligado a teoria que o fundamenta. É ainda um conjunto de procedimentos baseados em regras gerais, que visam atingir um objetivo determinado”; Segundo Moreira (2009, p.29), “O método veste a roupa que lhe dá a teoria”, ou seja, para cada teoria se tem um método específico que leva a um específico resultado. Outro conceito Na história da ciência, o primeiro a suscitar a problemática do método foi Galileu. Para Batista (2013, p.20), o método de Galileu pode ser denominado de indução experimental “chegando-se a uma lei geral por intermédio da observação de certo número de casos particulares”;Para Lakatos (2008), os principais passos do método de Galileu foram a observação, análise do fenômeno, indução de algumas hipóteses, verificação, generalização e confirmação das hipóteses, obtendo-se leis gerais; Lakatos (1991, p.51) afirma que: “com o passar do tempo muitas modificações foram sendo feitas nos métodos existentes” tendo como consequência o surgimento de outros métodos. O fato é que no campo da Geografia alguns métodos são utilizados, a saber: indutivo, dedutivo, hipotético- dedutivo, positivismo, estruturalismo, funcionalismo, materialismo histórico-dialético e fenomenologia. C ur so d e Li ce nc ia tu ra e m G eo gr afi a 27 O método indutivo se constrói a partir de um processo mental que parte de dados particulares para determinar uma verdade geral. Se diz, pois, que parte do particular para o geral. Para Lakatos (2008, p.63), um exemplo pode ser dado por meio da seguinte proposição: “todos os cães que foram observados tinham um coração. Logo, todos os cães têm coração”. O método dedutivo parte do geral para explicar o particular. O exemplo dado por Lakatos (2008, p.63) é o seguinte: “Todos os mamíferos têm um coração. Ora, todo cão é um mamífero. Logo, todos os cães têm um coração”. O método hipotético-dedutivo parte da premissa de que as teorias devem ser testadas por meio da observação e experimentação. Como etapas deste método, Araújo (2003) defende: a criação de uma nova teoria na forma de proposição passível de teste. Daí, considera-se o processo de falseamento por meio de tentativas de refutação. O método positivista ou positivismo está diretamente relacionado às ideias de Augusto Comte. Se constitui num método que se preocupa com a expressão lógica dos discursos científicos. Logo, busca a explicação dos fenômenos por meio de suas relações. São derivações desse método, os métodos funcionalista e estruturalista. O funcionalismo é um método muito utilizado pelas ciências humanas. Busca conhecer as relações estabelecidas entre as partes de um conjunto. Para Batista (2003, p.23), o objetivo desse método é a explicação do social no sentido de corpo sistemático de explicações a serem tratados empiricamente. O funcionalismo representa os fenômenos do modo como eles se dão, dinamicamente, procurando ressaltar as conexões necessárias que digam respeito ao padrão de interação estrutural-funcional das unidades investigadas. O estruturalismo se constitui num método que compreende que a sociedade é formada por partes componentes interdependentes. Assim, busca estudar a função de cada parte dessa estrutura complexa. Para os estruturalistas, a sociedade é “um grupo de indivíduos reunidos numa trama de ações e reações sociais”. O método estrutural assume o empirismo, ou seja, o contato e observação do objeto, como metodologia de investigação. A fenomenologia se orienta pelos sentidos e não pela realidade. Não busca saber sob quais condições uma realidade é construída, pergunta apenas qual é o significado daquilo que julgamos, afirmamos, sonhamos, vivemos. A Fenomenologia não se orienta para fatos externos ou internos, e, sim para a realidade da consciência, para os objetos enquanto intencionados pela consciência, isto é, para as essências ideais. Dessa forma, a fenomenologia tem uma tradição subjetiva e questiona a enorme valorização do objeto do método positivista. Por fim, o método histórico e dialético: Fundamenta-se na dialética proposta por Hegel, na qual as contradições se transcendem dando origem a novas contradições que passam a requerer solução. É um método de interpretação dinâmica e totalizante da realidade. Considera que os fatos não podem ser considerados fora de um contexto social,político, econômico etc. Empregado em pesquisa qualitativa (SILVA, 2001, p.25). C ur so d e Li ce nc ia tu ra e m G eo gr afi a 28 Resumo Na Unidade 3, você conheceu os conceitos-chave da Geografia e sua aplicabilidade nos estudos geográficos. Conheceu também, um pouco sobre os métodos de pesquisa, utilizados nas pesquisas geográficas. Agora é ampliar o conhecimento lendo os materiais de apoio e pesquisando sobre cada um dos conteúdos! Referências ARAÚJO, Inês Lacerda. Introdução à Filosofia da Ciência.3. ed. Curitiba: Ed. UFPR. 2003. BATISTA, Rosana de Oliveira Santos. As afinidades seletivas do pensamento reclusiano: na trilha da confluência das ideias de Rousseau , 2013. (Tese de Doutorado 2013 no Núcleo de Pós -Graduação em Geografia na Universidade Federal de Sergipe). CORRÊA, Roberto Lobato. Espaço: um conceito-chave da geografia. In:______. Geografia: conceitos e temas .CASTRO,Iná Elias de G298; GOMES,Paulo Cesar da Costa;CORRÊA, Roberto Lobato (Orgs.). 2. ed. – Bertrand: Rio de Janeiro, 2000. GOMES, Geografia: conceitos e temas .CASTRO, Iná Elias de G298 Castro; GOMES, Paulo Cesar da Costa; CORRÊA, Roberto Lobato (Orgs.). 2. ed. Bertrand: Rio de Janeiro, 2000. HOLZER, W. O lugar na Geografia Humanista. Revista Território. Rio de Janeiro. Ano IV, n° 7. p.67-78, 1999. LAKATOS, E.M., M., M. de A. Fundamentos de metodologia científica. 3.ed. S. P.: Atlas, 1991. LAKATOS, Eva Maria. Metodologia Científica. 5. ed. SP: ATLAS, 2008. MOREIRA, Ruy. O que é geografia? 2. ed. Editora Brasiliense, 2009. PENA, Rodolfo F. Alves. “Paisagem Cultural e Paisagem Natural”; Brasil Escola. Disponível em: <http:// brasilescola.uol.com.br/geografia/paisagem-cultural-paisagem-natural.htm>. Acesso em: 26 nov. 2017. SILVA, Edna Lúcia;MENEZES,Estera Muszkat. Metodologia da pesquisa e elaboração de dissertação. 3. ed. rev. atual. – Florianópolis: Laboratório de Ensino a Distância da UFSC, 2001. SOUZA, Marcelo José Lopes. O território: sobre espaço, poder, autonomia e desenvolvimento. In:_______. Geografia: conceitos e temas. CASTRO,Iná Elias de G298; GOMES, Paulo Cesar da Costa ; CORRÊA, Roberto Lobato Corrêa. 2. ed. Bertrand: Rio de Janeiro, 2000. Noções Básicas de Sociologia e Antropologia _GoBack _GoBack
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