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O Condomínio Edilício no Novo Código Civil
Pablo Stolze Gagliano
Juiz de Direito (BA); Professor de Direito Civil da UFBA, do JusPodivm (BA) e
do Instituto Luiz Flavio Gomes – SP; Co-autor do Novo Curso de Direito Civil, Ed. Saraiva;
Editor do site www.novodireitocivil.com.br
Um dos pontos mais controvertidos do novo Código Civil diz respeito à disciplina do condomínio horizontal ou edilício, popularmente conhecido como “condomínio em edifício”.
Com entrada em vigor do Código de 2002, vários artigos da Lei n. 4591/64 foram revogados, remanescendo poucos dispositivos, especialmente os referentes à incorporação imobiliária.
Conceitualmente, o condomínio edilício caracteriza-se pela coexistência de áreas de propriedade particular (unidades autônomas), e áreas comuns, titularizadas por mais de um co-proprietário, segundo uma convenção previamente estabelecida.
Nesse sentido, dispõe o art. 1331 do CC: “pode haver, em edificações, partes que são propriedade exclusiva, e partes que são propriedades comuns dos condôminos”.
Interessante notar, ainda, que instituição do condomínio dá-se por ato constitutivo inter vivos ou mortis causa (testamento), registrado no Cartório de Registro Imobiliário, com as seguintes disposições necessárias: a) discriminação e individualização das unidades de propriedade exclusiva, estremadas umas das outras e das partes comuns; b) a determinação da fração ideal atribuída a cada unidade, relativamente ao terreno e partes comuns; c) o fim a que as unidades se destinam (art. 1332).
Note-se, por outro lado, haver forte tendência jurisprudencial no sentido de se admitir a validade das convenções condominiais, ainda que não registradas, consoante se pode observar da leitura da Súmula 260 do STJ (“A convenção de condomínio aprovada, ainda que sem registro, é eficaz para regular as relações entre condôminos”).
Acreditamos, aliás, que este norte jurisprudencial deverá permanecer, mesmo após a entrada em vigor do novo Código, na medida em que não se afigura justa a desconsideração do condomínio pela ausência do seu registro civil, ato oficial que tem o mero propósito de imprimir eficácia erga omnes à convenção celebrada.
Outro não é o pensamento do culto LUIZ EDSON FACHIN: “a superação da formalidade registral tem eco na jurisprudência, especialmente agora em matéria de
convenção condominial, em face da Súmula 260 do STJ. O teor da Súmula torna eficaz a convenção, independentemente do registro, resolve pendências doutrinárias e aponta rumos de uma tendência”�.
Fixadas tais premissas, cuidaremos de analisar, em breves linhas, o impacto do novo Código Civil no que tange às obrigações pecuniárias impostas aos condôminos, especialmente a taxa condominial e a multa.
No que tange à taxa condominial - cuja natureza jurídica, como se sabe, é de obrigação “propter rem”� -, dispõe o art, 1336, I, do CC: “São deveres do condomínio: I - contribuir para as despesas do condomínio, na proporção de suas frações ideais”.
Trata-se de dispositivo de intelecção imediata, que não deixa margem a dúvidas: cada condômino participa das despesas do condomínio, na proporção de suas respectivas frações.
Na mesma linha, no que tange à imposição da multa, o Código é claro ao estabelecer que esta, sem prejuízo dos juros moratórios, será de, no máximo, 2% sobre o débito (art. 1336, § 1º).
Tal pena pecuniária, imposta em caso de retardamento culposo no cumprimento da obrigação de pagar a taxa mensal, não se confunde com outras sanções mais severas previstas no mesmo diploma para o caso de violação grave dos deveres de convivência (sossego, saúde, segurança etc.), ou prática de conduta anti-social, hipóteses em que o valor da multa poderá chegar ao quíntuplo ou, até mesmo, ao décuplo da contribuição mensal (art. 1336, §2º e art. 1337).
Tecidas tas considerações, importa indagar o seguinte: a fixação da contribuição mensal segundo a titularidade das frações ideais e o valor máximo da multa, referidos pelo novo Código Civil, incidem em convenções condominiais anteriores à sua entrada em vigor?
Em nosso sentir, o princípio constitucional do respeito ao ato jurídico perfeito deve prevalecer, de maneira que as convenções anteriores não seriam atingidas pelo novo diploma legal.
Ademais, não existe, no Livro Complementar do Código Civil, norma de transição que determine a condomínios anteriores a obrigatoriedade de se adaptarem ao novo diploma, a exemplo do art. 2031, que estipula o prazo de um ano para sociedades, associações, fundações e empresários individuais procederem às modificações devidas em seus atos constitutivos.
Da mesma forma, não consideramos possível, dada a sua peculiar natureza, que se subsuma a convenção condominial à previsão do art. 2035 do Código, referente a contratos de execução continuada.
Todavia, ainda que se sustente a incidência do novo diploma aos condomínios já constituídos, é bom lembrar que a Assembléia Geral tem poderes para disciplinar de forma diversa o quanto consignado em lei, alterando o valor da taxa ou da multa, bem como a técnica de rateio, uma vez que as normas legais pertinentes são, no caso, meramente supletivas, derrogáveis pela autonomia privada.
Nada impede, ademais, que, além da multa -cujo patamar de 2 % pode incentivar a inadimplência -seja cumulada cláusula penal moratória, para o caso do atraso no cumprimento da obrigação. O que não nos parece justo é que os condôminos pontuais arquem com o passivo dos maus pagadores, talvez incentivados pelo percentual mínimo previsto em lei.
Portanto, à luz do quanto exposto, entendemos que, antes de se instalar uma verdadeira “guerra civil” entre os condôminos, deve o aplicador da lei ter por certa a circunstância de que o Código de 2002 não atingiu os condomínios já existentes, ou, ainda que assim não pense, que, pelo menos, tenha o bom senso de reconhecer autonomia à Assembléia Geral para regular de forma diversa a matéria referente à contribuição pecuniária de cada condômino.
Afinal, apenas ao próprio condomínio, por seu órgão máximo, e a mais ninguém, interessa a forma pela qual as suas despesas são rateadas e o seu orçamento é administrado.
É o nosso pensamento.
� Comentários ao Código Civil, Saraiva, vol. 15, pág. 232. Tais argumentos, vale lembrar, não se aplicam aos condomínios formados por sociedades dedicadas à atividade de incorporação imobiliária, que obedecem a regramento específico.
� Sobre as obrigações “propter rem” ou “ob rem” já tivemos oportunidade de anotar que: “decorrem de um direito real sobre determinada coisa, aderindo a essa, e, por isso, acompanhando-a nas modificações de seu titular” (GAGLIANO, Pablo Stolze e PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil - vol. II - Obrigações. Ed. Saraiva, 2002).

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