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Jogos de Linguagem entre Surdos e Ouvintes na Educação Matemática

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Prévia do material em texto

1 
 
 
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO 
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ 
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO AMAZÔNAS 
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA 
REDE AMAZÔNICA DE EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA 
 
 
 
 
 
 
 
 
IVANETE MARIA BARROSO MOREIRA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
OS JOGOS DE LINGUAGEM ENTRE SURDOS E OUVINTES NA 
PRODUÇÃO DE SIGNIFICADOS DE CONCEITOS MATEMÁTICOS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
BELÉM-PA 
2015 
 
2 
 
IVANETE MARIA BARROSO MOREIRA 
 
 
 
 
 
 
 
 
OS JOGOS DE LINGUAGEM ENTRE SURDOS E OUVINTES NA 
PRODUÇÃO DE SIGNIFICADOS DE CONCEITOS MATEMÁTICOS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Tese apresentada ao Programa de Pós- 
Graduação em Educação em Ciências e 
Matemática da Rede Amazônica de 
Educação em Ciências e Matemática 
como requisito para a obtenção do título 
de Doutor em Educação em Matemática e 
Ciências. 
 
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Marisa Rosâni 
Abreu da Silveira. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
BELÉM-PA 
2015 
 
 
Dados Internacionais de Catalogação na Fonte.
 
 
Ficha catalográfica elaborada automaticamente de acordo com os dados fornecidos pelo(a)
autor(a).
 
Permitida a reprodução parcial ou total, desde que citada a fonte.
B277j BARROSO MOREIRA, IVANETE MARIA.
OS JOGOS DE LINGUAGEM ENTRE SURDOS E
OUVINTES NA PRODUÇÃO DE SIGNIFICADOS DE
CONCEITOS MATEMÁTICOS / IVANETE MARIA
BARROSO MOREIRA. -- 2015
vi, 40 f. : il. ; 30 cm.
Orientadora: Marisa Rosâni Abreu da Silveira.
Tese (doutorado) - Universidade Federal de Mato
Grosso, Rede Amazonica de Educação em Ciências e
Matemática, Programa de Pós-Graduação em Ensino de
Ciências e Matemática, Cuiabá, 2015.
Inclui bibliografia.
1. Educação Matemática. 2. Jogos de Linguagem. 3.
5 
 
A meus pais Rosi e José, e aos meus 
filhos Gleisy e Gabriel com todo o meu 
amor. 
 
6 
 
Agradecimentos 
 
 A Deus, fonte de criação e sabedoria; 
 
 A meu pai José e minha mãe Rosi, meus refúgios em todos os 
momentos de desespero; 
 
 A meus filhos Gleisy e Gabriel, minhas fontes de inspiração; 
 
 A professora Dr.ª Marisa Rôsani Abreu da Silveira, minha 
orientadora, pela persistência, incentivo, disponibilidade, 
competência e dedicação; 
 
 A todos os integrantes do Grupo de Pesquisa GELIM, pela 
ajuda nas interlocuções e no desenvolvimento das minhas 
ideias acerca da Linguagem Matemática. 
 
 A todos os profissionais da Educação Matemática que lutam 
por uma educação com compromisso. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
7 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
“Não desejaria, com minha obra, poupar 
aos outros o trabalho de pensar, mas sim, se 
for possível, estimular alguém a pensar por 
si próprio”. 
 
Ludwig Wittgenstein (1889-1951) 
 
 
8 
 
RESUMO 
 
Este trabalho apresenta o resultado de uma pesquisa que teve como objetivo 
analisar os jogos de linguagem entre sujeitos surdos e ouvintes e sua colaboração 
para a compreensão e ressignificação de conceitos matemáticos em uma sala de 
aula inclusiva. Essa compreensão está associada à tradução de textos matemáticos 
para a língua portuguesa, e desta para a língua de sinais, em uma ida e volta 
discursiva. Isto ocorre nas formas de vida dos sujeitos em sala de aula como: a 
leitura labial do aluno surdo; a explicação do professor; a função de interpretar da 
profissional intérprete quando intermedia os diálogos - do aluno surdo para o 
professor, do professor para o aluno surdo, dos alunos surdos para os alunos 
ouvintes e vice-versa. Essa tradução se confirma nas modalidades: oral, escrita e 
sinalizada, confirmando a tese de que “A relação entre a língua de sinais, a língua 
portuguesa e a linguagem matemática em ambiente de sala aula inclusiva produz 
jogos de linguagem entre sujeitos surdos e ouvintes na tentativa de compreender 
conceitos matemáticos”. A pesquisa está pautada nos estudos do filósofo Ludwig 
Wittgenstein, em sua segunda fase – pós mortem - e suas concepções sobre: os 
jogos de linguagem e uso de regras. O lócus da pesquisa foi uma sala de aula 
inclusiva do 3º ano do Ensino Médio de uma Escola do Município de Ananindeua e 
como sujeitos foram selecionados cinco alunos surdos, sete alunos ouvintes, uma 
intérprete de LIBRAS e um professor de Matemática. A coleta do material empírico 
para a investigação foi por meio de: observação; gravações (vídeo e áudio); 
questionários; entrevistas; anotações em diários de bordo; e atividades das aulas de 
Matemática. As análises dos dados estão dispostas em dois níveis: i) os jogos de 
linguagem entre sujeitos surdos e ouvintes na sala de aula inclusiva (professor, 
intérprete, alunos surdos e alunos ouvintes) e ii) o uso de regras de linguagem no 
ensino de conteúdos matemáticos (Equação da Circunferência e Números 
Complexos). As mostras das análises evidenciaram resultados como: a existência de 
‘regras particulares’ previamente estabelecidas entre as relações discursivas dos 
sujeitos surdos e ouvintes; os cuidados que os intérpretes devem ter na 
interpretação literal de palavras com vários sentidos, a polissemia das línguas 
portuguesa e de sinais; a dificuldade da tradução da linguagem matemática na 
língua de sinais, por causa da escassez de sinais matemáticos específicos em 
Libras e o interminável contrato feito entre intérpretes e alunos surdos com 
diferentes sinais diferenciados, o que dificulta a organização do ensino e da 
tradução; e também tivemos a confirmação de que a sala de aula inclusiva, como 
em qualquer ambiente, contexto, onde se tem relações, interações humanas, existe 
uma variedade e multiplicidade de jogos de linguagem. 
 
Palavras-chave: Educação Matemática; Jogos de linguagem; Regras; Formas de 
vida; Surdo. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
9 
 
ABSTRACT 
 
This work shows the result of a research that has the purpose to analyze the 
language games between the deaf and listener subjects and their collaboration to 
comprehension and ressignification of mathematic concepts in an inclusive 
classroom. This comprehension is associated to the translation of mathematic texts 
to the Portuguese language, and from this to the sign language, in a discursive round 
trip. This happens in the subjects’ way of life in the classroom like: the deaf student’s 
lip reading, the teacher’s explanation, the professional interpreter’s function of 
interpreting when it’s intermediating the dialogues – from the deaf student to the 
teacher, from the teacher to the deaf student, from the deaf students to the listener 
students and vice versa. This translation confirms itself in the modalities: oral, written 
and signed, confirming the theses of “The relation between sign, Portuguese and 
mathematic languages in an inclusive classroom environment produce language 
games between the deaf and listener subjects in attempt to understand the 
mathematic concepts.” The research is guided by the studies of the philosopher 
Ludwig Wittgenstein, on his second phase – postmortem – and his conceptions 
about: the language games and the use of rules. The research’s locus was an 
inclusive classroom of the 3rd year of the High School of an Ananideua’s Municipal 
School and as subjects were selected five deaf students, seven listener students, a 
LIBRAS interpreter and a math teacher. The collection of empirical material for the 
research was by the means of: observation; recording (video and audio); 
questionnaires; interviews; logbooks’ notes; and activities in the math’s classes. The 
data’s analyzes are disposed in two levels: i) the language games between the deaf 
and listener subjects in an inclusive classroom (teacher, interpreter,dead students 
and listener students) and ii) use of language rules in the teaching of mathematical 
content (Equation of Circle and Complex Numbers). The samples of analyzes 
revealed results such as: the existence of ‘particular rules’ previously established 
between the discursive relations of the deaf and the listener subjects; the care of the 
interpreters must have in the literal interpretation of the words with various meanings, 
the polysemy of the Portuguese and the sign languages; the difficulty in translate the 
mathematic language into the sign language, because the lack of specific 
mathematical signs in LIBRAS and the endless contract between interpreters and 
deaf students with different differential signals, which difficult to organize the teaching 
and the translation; and also we had the confirmation that the incursive classroom, as 
much in any environment, context, where there’s relations, humans interactions, exist 
a variety and a plurality of language games. 
 
Keywords: Math Education; Language games; Rules; Way of life; Deaf 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
10 
 
LISTA DE FIGURAS 
 
FIGURA 01 ALFABETO DATILOLÓGICO OU MANUAL 
 
63 
FIGURA 02 CONFIGURAÇÕES DE MÃOS DA LIBRAS 
 
66 
FIGURA 03 ESPAÇO DE LOCAÇÃO 
 
67 
FIGURA 04 SINAIS QUE SE OPÕEM AO MOVIMENTO 
 
68 
FIGURA 05 EXPRESSÃO NÃO-MANUAL DO SINAL TRABALHAR 
QUANTO AO GRAU DE INTENSIDADE 
 
70 
FIGURA 06 O ALFABETO EM SIGN WRITING 72 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
11 
 
SUMÁRIO 
 
I - INTRODUÇÃO 12 
1.1. DOIS MARCOS EM UMA HISTÓRIA 
 
12 
II - A CONSTRUÇÃO DAS IDEIAS 17 
2.1. QUESTÃO E OBJETIVO DA PESQUISA 17 
2.2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS 18 
2.3. INSTRUMENTOS DE PESQUISA 21 
2.4. O LOCAL ESCOLHIDO 24 
2.5. OS ATORES DA PESQUISA 
 
26 
III REVER, REFLETIR E ESCOLHER 32 
3.1. BASES EPISTEMOLÓGICAS DA EDUCAÇÃO DO SURDO 32 
3.2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 41 
3.3. WITTGENSTEIN: UMA ESCOLHA TEÓRICA 52 
3.3.1. JOGO DE LINGUAGEM EM WITTGENSTEIN 55 
3.3.2. FORMAS DE VIDA EM WITTGENSTEIN 57 
3.3.3. O USO DE REGRAS EM WITTGENSTEIN 
 
58 
IV - UMA MISCELÂNEA DE LINGUAGENS 61 
4.1. LÍNGUA DE SINAIS: UMA PROTAGONISTA ESPECIAL 61 
4.2. LINGUAGEM DE SINAIS, LINGUAGEM NATURAL E 
LINGUAGEM MATEMÁTICA: UMA MISTURA POSSÍVEL 
 
73 
V - UM MUNDO DE DESCOBERTAS 78 
5.1. PRIMEIRAS DESCOBERTAS 78 
5.2. ORGANIZAÇÃO DAS IDEIAS 81 
5.3. NÍVEIS DE ANÁLISE DOS JOGOS DE LINGUAGEM 82 
5.3.1. 
5.3.2. 
OS JOGOS DE LINGUAGEM ENTRE SURDOS E OUVINTES 
O USO DE REGRAS NO ENSINO DA EQUAÇÃO DA 
CIRCUNFERÊNCIA E NÚMEROS COMPLEXOS 
 
82 
102 
VI - CONSIDERAÇÕES FINAIS 
 
114 
 REFERÊNCIAS 
 
APÊNDICE 
 
 
 
 
 
 
 
 
12 
 
I – INTRODUÇÃO 
 
1.1. Dois ‘marcos’ em uma história 
Na caminhada do estudante, profissional ou pesquisador, surgem questões 
de todos os tipos e com elas a busca de respostas que sejam suficientemente 
plausíveis para que se aceite como uma verdade duradoura ou passageira. Umas, 
acabam sendo substituídas por outras de maior valor e outras, ainda, podem 
perdurar por anos sem que se consiga uma resposta aceitável. Assim como os 
estudantes, profissionais e pesquisadores iniciaram seus estudos e pesquisas com 
alguma questão inquietante, da mesma forma ocorreu comigo. Várias questões me 
acompanharam durante diversas etapas de minha formação e profissionalização nas 
áreas da Inclusão e Educação Matemática, dentre as quais destaco: 
- O aluno surdo consegue compreender a linguagem matemática utilizada 
pelo professor? 
- Somente a percepção visual dá suporte para o aprendizado de 
conhecimentos matemáticos? 
- A linguagem matemática, em uma relação positiva com a língua portuguesa, 
consegue ser suficiente para o ensino de conceitos matemáticos para alunos 
surdos? 
- Como utilizar a língua portuguesa escrita no ensino de conceitos 
matemáticos se o aluno surdo tem dificuldades no aprendizado da língua 
portuguesa? 
- Como ensinar Matemática por meio da língua de sinais para alunos surdos, 
se nesta língua os sinais específicos matemáticos ainda estão em construção? 
Estas ‘inquietações’ surgiram de reflexões e observações em sala de aula 
inclusiva e sala de recurso1, as quais perpassaram minha vida como professora de 
 
1 Sala de recursos, para o Conselho Nacional de Educação/Câmara de Ensino Básico (BRASIL, 
2001), é o serviço de natureza pedagógica, conduzido por professor especializado, que suplementa 
(no caso de superdotados) e complementa (para os demais alunos) o atendimento educacional 
realizado em classes comuns da rede regular de ensino. 
13 
 
apoio e intérprete de língua de sinais durante mais de duas décadas (1992 a 2013). 
Como profissional de apoio e intérprete, minha função sempre foi fazer a 
interpretação (simultânea da fala do professor para a língua de sinais), tradução (de 
textos escritos) e o apoio disciplinar para alunos com deficiência auditiva. Neste 
sentido, pude observar inúmeros obstáculos que se manifestavam em sala de aula, 
e ilustrarei dois episódios, entre inúmeros, que chamarei de ‘marcos’, como um 
destaque em relação à linguagem, que marcaram e contribuíram para esta pesquisa. 
O primeiro marco ocorreu quando iniciei na profissão, em 1992, em uma 
turma de 4ª série (hoje 5º ano). Percebi, pela primeira vez, a dificuldade dos alunos 
surdos em compreender o que outras pessoas falavam. Esta falta de comunicação 
para mim era um obstáculo gigantesco. Neste período, a Língua de Sinais (Libras) 
não era muito divulgada, tampouco conhecida ou utilizada pelos profissionais das 
instituições públicas de ensino em que eu atuava, nem mesmo nas instituições 
particulares. A Língua de Sinais na década de 90 não era considerada uma língua e 
não era reconhecida pelos alunos surdos, que ainda se encontravam em início de 
alfabetização na língua de sinais, pois o ensino da oralização2 ainda era priorizado 
pelas instituições de ensino, que relegavam a língua de sinais a um segundo plano, 
sem a obrigatoriedade de apresentá-la. Nesse contexto, o trabalho de professores 
intérpretes tornava-se deveras complexo. Os surdos adultos da Comunidade Surda 
de Belém/PA, conscientes de seus diretos à própria língua, nesta década já 
iniciavam uma luta para que este quadro fosse revertido. 
Nesta época, em um dos meus trabalhos, a professora de Matemática da 
turma, na qual eu era a professora intérprete, explicava as regras do conteúdo de 
potenciação de números naturais. Os alunos surdos apenas olhavam para ela e 
depois para mim, dando a entender que nada compreendiam e era frustrante, 
porque aqueles que estavam na sala não tinham completo domínio de leitura labial3, 
 
2 O ensino da oralização vem da Filosofia do Oralismo, paradigma educacional que perdurou no 
Brasil até a virada do milênio. Este paradigma “percebe a surdez como uma deficiência que deve ser 
minimizada pela estimulação auditiva. Essa estimulação possibilitaria a aprendizagem da língua 
portuguesa oral e levaria a criança surda a integrar-se na comunidade ouvinte e desenvolver uma 
personalidade como a de um ouvinte. Ou seja, o objetivo do Oralismo é fazer uma reabilitação da 
criança surda em direção à normalidade”. (GOLDFELD, 2002, p. 34). 
 
3 Condição que é uma característica do individuo surdo e que varia de surdo para surdo em relação a 
nascimento em famílias ouvintes ou surdas, ou mesmo em condições de perda auditiva nas fases pré 
ou pós-linguísticas, tornando-se uma necessidade de reconhecimento essencial para o surdo. 
14 
 
habilidade que varia de um indivíduo surdo para outro. Esse fator linguísticocitado 
dificultava o ensino e o meu trabalho como professora de apoio/intérprete, pois 
passei a suprir a falta de comunicação existente entre alunos e professora, ou seja, 
eu não apenas interpretava, mas tinha que reapresentar todos os conteúdos que a 
professora tentava ensinar. A leitura labial não era suficiente para a compreensão 
dos alunos surdos, assim como a escrita, pois tinham conhecimento fragmentado e 
insuficiente da gramática da língua portuguesa e não possuíam habilidade e fluência 
na língua de sinais. Assim, na maioria das vezes, era necessário o uso de vários 
outros recursos como imagens, material concreto manipulativo, dramatização etc. 
O segundo marco ocorreu depois que iniciei o trabalho de interpretação 
apenas para o ensino de Matemática, em 2000. Até então, eu tinha que interpretar 
todas as disciplinas das séries do Ensino Fundamental (1ª à 8ª séries, atualmente do 
2º ao 9º ano). Neste período, a língua de sinais já era divulgada em pequena escala 
na mídia, e nas ruas as pessoas já reconheciam seu uso, por mais que não 
conseguissem compreendê-la. Os alunos do centro urbano do Município de Belém, 
em sua maioria, já haviam sido instruídos na língua, e minha função de instrutora e 
professora intérprete passou a ser ‘facilitado’. Começou a mudar também o 
comportamento dos próprios alunos surdos, que faziam questão de conversar e 
aprender em sua própria língua. Neste período, fui designada para trabalhar com as 
turmas de 6ª, 7ª e 8ª séries e nas turmas dos três anos do Ensino Médio, onde 
verifiquei que a leitura labial desses alunos era boa e eles tinham um considerável 
vocabulário na língua de sinais e na língua portuguesa. 
Este marco deu-se em uma revisão de conteúdos da série anterior com 
alunos de 6ª série, sobre operações entre frações com denominadores diferentes. 
No inicio da revisão o professor explicou rapidamente a adição e subtração de 
frações, relembrando aos alunos as etapas do cálculo, ou seja, os alunos teriam que 
achar primeiramente o mínimo múltiplo comum (m.m.c.) entre os denominadores 
para poderem efetivar os cálculos e chegar ao resultado final. Durante a explicação, 
o professor falava muito rápido e mexia as mãos em demasia, atrapalhando a leitura 
labial dos alunos. Como não conseguiam compreender a explicação do professor, os 
alunos surdos se voltavam para mim, e esse comportamento não agradou o 
docente. 
15 
 
Após a minha interpretação, pedi que eles voltassem o olhar novamente para 
o professor que havia passado os exemplos no quadro, mas os cálculos expressos 
no quadro não demonstravam o que havia sido explicado, pois como o professor se 
expressou na época, ‘eles já deveriam saber todas as etapas deste cálculo, isto é 
apenas uma revisão’. O professor considerava uma ‘obrigação’ dos alunos já terem 
este conhecimento. O que esse profissional não compreendia era que existiam 
inúmeros fatores que poderiam ter ocasionado à ruptura no aprendizado desse 
conhecimento e que a explicação feita oralmente por ele e a interpretação em sinais, 
fiel, sobre a explicação dele, não daria conta dos ‘resíduos’4 deixados de ser 
mencionados. Os resíduos a que me refiro são as outras operações que estão 
implícitas na efetivação dos cálculos fracionários e que não foram devidamente 
esclarecidos, como as operações de multiplicação e divisão feitas entre o resultado 
do m.m.c. e os algoritmos das frações, conceitos básicos neste conteúdo. 
Além desses, muitos outros ‘marcos’ se apresentaram em minha vida 
profissional durante o ensino de Matemática para alunos surdos, e a relação destes 
com alunos e professores ouvintes, amadurece o meu anseio de colaborar com a 
educação deste alunado, se constituindo uma necessidade de reconhecer, analisar 
e compreender as relações linguísticas que ocorrem no ensino e na aprendizagem 
dos sujeitos envolvidos. 
A partir destes marcos foi crescendo uma angústia em mim quanto à relação 
da linguagem e comunicação dos alunos surdos. Com esta insatisfação latente, 
diante das situações que continuaram a aparecer, senti a necessidade de procurar 
subsídios teóricos que pudessem me apontar respostas. Encontrei, então, alguns 
estudos como os de Carvalho (1992), sobre as fases históricas da cultura surda; 
Fernandes (1990) e Ferreira Brito (1993), sobre as questões linguísticas e cognitivas 
do surdo; Skliar (1997, 1998) sobre a avaliação das políticas públicas na educação 
de surdos; e Souza (1998) e Góes (1999) sobre a prática pedagógica no processo 
de alfabetização da criança surda e suas relações com os pares ouvintes, entre 
outras. Estas leituras me elucidaram várias condições do ser surdo, como sua 
história, cultura, linguagem e educação. Como consequência destas aspirações e 
 
4 Granger (1974) denomina “resíduo” ou “resíduo de decodificação” para as leituras que se deve fazer 
além das regras, ou seja, aquilo que escapa ao registro na linguagem, mas que pode ser identificado 
e apropriado por aqueles que compartilham experiências. 
16 
 
necessidade de discutir esta trama linguística, trazemos este estudo, que tem como 
intento analisar os jogos de linguagem5 entre sujeitos surdos e ouvintes, e como 
estes jogos colaboram na compreensão e ressignificação de conteúdos matemáticos 
em uma sala de aula. 
Outras leituras foram necessárias para dar conta de um estudo coeso na área 
de linguagem, que se apresentaram durante o curso de Mestrado em Educação, 
onde participei de uma disciplina específica sobre Linguagem Matemática e neste 
âmbito, intensifiquei meus estudos na área da linguagem. Na disciplina, entrei em 
contato com a obra Investigações Filosóficas, do filósofo Ludwig Wittgenstein (1889 - 
1951), que dá um enfoque à ideia de jogo de linguagem, ideia que trago como 
principal fundamentação teórica para esta pesquisa. Após a leitura da obra foi 
inevitável à escolha por este filósofo, e suas ideias inovadoras sobre jogo de 
linguagem e regras, conceitos que pude tomar para o desenvolvimento das 
discussões neste estudo. Outros teóricos também foram trabalhados como Perlin 
(1998, 2002, 2004), Skliar (1997, 1998, 2001), Quadros (2004), Gottschalk (2008), 
entre vários outros, que colaboram com pesquisas nas áreas da linguagem e da 
surdez. 
O presente texto será subdividido em seções: 
Seção I - composta por esta introdução, que apresenta o interesse pela 
pesquisa; 
Seção II – traz a construção estrutural da pesquisa, desde os objetivos, 
lócus etc. até a descrição dos sujeitos; 
Seção III – esclarece inicialmente as bases epistemológicas que se 
apresentam durante o desenvolvimento educacional do surdo, e também 
focaliza as escolhas que trazemos quanto à fundamentação teórica; 
Seção IV – situa teoricamente a linguagem, e esclarece a miscelânea 
linguística que é trabalhada na pesquisa; 
A seção V – descreve o momento inicial da pesquisa, as escolhas de 
categorias e os níveis de análise; 
As seções VI e VII, trazem os pensamentos finais produzidos e os 
referenciais adotados. 
 
5 Este termo que será discutido no decorrer do texto. 
17 
 
II - A CONSTRUÇÃO DAS IDEIAS 
 
2.1. Questão e objetivos da Pesquisa 
A linguagem humana só é possível devido à sua regularidade, ou seja, a 
existência de critérios usuais. Sendo uma atividade pública, seus critérios usuais 
também são públicos, podendo ser ensinada, compreendida e aprovada pela 
comunidade linguística que a utiliza. Um autor que analisa a linguagem humana 
enquanto uso, instituição e prática, é Ludwig Wittgenstein em seu segundo 
momento, representado na obra póstuma Investigações Filosóficas. Este filósofo 
trata estas atividades linguísticashumanas como jogos, denominados por ele de 
jogos de linguagem. 
A linguagem como aspecto central em todas as atividades humanas tem 
variados jogos de linguagem inclusive nas relações de aprender e ensinar que 
ocorrem em salas de aula. Para compreendermos melhor a sala de aula inclusiva no 
ensino de matemática para alunos surdos e ouvintes, recorremos às ideias de jogo 
de linguagem de Wittgenstein. A língua de sinais, assim como a língua portuguesa 
(oral e escrita) e a linguagem matemática, no ambiente sala de aula, quando em uso 
por seus respectivos usuários, apresenta jogos de linguagem diferenciados. Com 
este pensar podemos, então, formular as nossas questões de pesquisa. 
 Que jogos de linguagem existem ou são construídos entre sujeitos 
surdos e ouvintes na sala de aula inclusiva no ensino de conteúdos 
matemáticos? 
 Como esses jogos de linguagem contribuem para a compreensão de 
conceitos matemáticos? 
Desta forma, este estudo analisa a trama entre a língua de sinais, a língua 
portuguesa e a linguagem matemática em dois níveis: i) os jogos de linguagem 
entre sujeitos surdos e ouvintes na sala de aula inclusiva; e ii) o uso de regras 
de linguagem no ensino de conteúdos matemáticos. 
A ligação entre a linguagem e a comunicação é óbvia, uma vez que esta 
última é a principal função da primeira. Com este pensamento, e tendo em conta a 
18 
 
linguagem existente em sala de aula, parece oportuno questionar: por um lado, o 
ensino e aprendizagem a partir da linguagem, que tem lugar numa aula de 
Matemática; por outro, a existência e contribuição do jogo de linguagem para o 
ensino e aprendizagem da Matemática em sala de aula. Assim, apresentamos a 
principal intenção que nos impulsiona e o que nos propomos alcançar neste estudo. 
 Analisar os jogos de linguagem entre sujeitos surdos e ouvintes e sua 
colaboração para a compreensão e ressignificação de conceitos matemáticos 
em uma sala de aula inclusiva. 
Partindo deste objetivo geral, temos como objetivos específicos: 
 Caracterizar os jogos de linguagem entre sujeitos surdos e ouvintes na sala 
de aula inclusiva; 
 Analisar como os jogos de linguagem entre sujeitos surdos e ouvintes podem 
colaborar para a compreensão de conceitos matemáticos na sala de aula 
inclusiva. 
Considerado um fenômeno social, a inclusão de alunos surdos tem sentidos e 
significados particulares forjados por sujeitos de uma comunidade minoritária, se 
comparada à comunidade ouvinte. Essa comunidade, quando em contato com o 
grupo majoritário, exige a necessidade de variados discursos em contextos 
multilinguísticos (orais, escritos, gesto-visuais, matemáticos etc.), de se misturarem, 
de se reorganizarem e produzirem jogos de linguagem para que o grupo como um 
todo possa coexistir. 
A relevância desta pesquisa se concentra na ideia da comunicação, a partir 
dos jogos de linguagem na sala de aula inclusiva, entre sujeitos surdos e ouvintes – 
dando condições a esses sujeitos, de ensino e aprendizagem, em relação a 
habilidades e competências sobre conhecimentos matemáticos. Esta relevância se 
refletiria também quanto ao aumento na literatura desta área e como contribuição 
aos profissionais que estudam e pesquisam sobre o sujeito surdo. 
2.2. Procedimentos Metodológicos 
O trabalho foi desenvolvido a partir de um estudo de caso em pesquisa 
qualitativa. Para Merriam (1988), o estudo de caso tem um carácter descritivo, 
19 
 
indutivo, particular e a sua natureza heurística pode levar à compreensão do próprio 
estudo, seja ele um programa, um acontecimento, uma pessoa, um processo, uma 
instituição ou um grupo social. Para Ludke e André (1986), o interesse desse tipo de 
estudo está exatamente naquilo que ele tem de único, de particular, mesmo que 
posteriormente possam ser evidentes certas semelhanças com outros casos ou 
situações. 
Este estudo de caso toma como sujeito de pesquisa, indivíduos surdos e 
ouvintes que estão presentes na sala de aula inclusiva e, a partir da leitura das 
informações recolhidas nas transcrições das aulas gravadas, bem como das 
anotações feitas durante as observações e entrevistas realizadas, procuramos 
identificar os jogos de linguagem e as regras de linguagem existentes neste 
universo. Mesmo reconhecendo a complexidade de relações existentes entre 
sujeitos e linguagens, posso relatar neste momento que, de todas as observações e 
conversas, como primeiro levantamento, em pequenos “diários de bordo”, durante os 
anos em que tive a função de professora intérprete, pude constatar que o maior 
percentual das situações problemas que se apresentavam, relacionado ao ensino e 
aprendizagem de Matemática, estava envolto em tramas linguísticas como: 
 Quanto às especificidades dos alunos surdos: dificuldade na leitura labial; 
falta de alfabetização na língua de sinais (uso de sinais “domésticos” ou 
“mímicos”); dificuldades na aprendizagem e uso da língua portuguesa nas 
modalidades escrita e oral; 
 Quanto aos alunos surdos e ouvintes: dificuldades na interpretação e 
compreensão da linguagem matemática; dificuldades no uso e interpretação 
da língua portuguesa; 
 Quanto ao docente: lacunas no uso da linguagem matemática 
(desconhecimento e emprego das regras); dificuldades com a língua 
portuguesa (confusões gramaticais) utilizada no ensino de conteúdos 
matemáticos; equívocos no ensino de matemática reproduzidos 
repetidamente em sala da aula por limitações trazidas das formações (inicial e 
continuada). 
Para todos os lados em que me direcionasse, as dificuldades eram aparentes 
e se revelavam sobre a interpretação, compreensão e uso das linguagens que 
20 
 
permeiam o ambiente da sala de aula no ensino e aprendizagem de conteúdos 
matemáticos, se reafirmando, a meu ver, como barreira. 
Estabelecida, então, esta meta inicial, coube a busca de meios, ferramentas, 
para esta empreitada, mesmo ciente que, de uma forma ou de outra, minha maneira 
de ver o mundo, durante experiências prévias, seguramente me influenciariam em 
futuras escolhas. A procura e escolha dos meios que me fizessem entender os 
fenômenos me levaram ao estudo de caso qualitativo, baseado nas ideias de Lüdke 
e André (1986, p. 17) que afirmam ser o estudo de caso aplicado, quando o 
pesquisador tiver o interesse em pesquisar uma situação singular, particular. O 
estudo deve apresentar as seguintes características: 
1 – Os estudos de caso visam à descoberta; 
2 – Os estudos de caso enfatizam a ‘interpretação em contexto’; 
3 – Os estudos de caso buscam retratar a realidade de forma completa e 
profunda; 
4 – Os estudos de caso usam uma variedade de fontes de informação; 
5 – Os estudos de caso revelam experiência vicária e permitem 
generalizações naturalísticas; 
6 – Estudos de caso procuram representar os diferentes e às vezes 
conflitantes pontos de vista presentes numa situação social; 
7 – Os relatos de estudo de caso utilizam uma linguagem e uma forma mais 
acessível do que os outros relatórios de pesquisa (LÜDKE E ANDRÉ, 1986, 
p. 18-20). 
Pautada neste pensar, vieram à tona preocupações quanto a diferentes 
explanações, mesmo reconhecendo que qualquer pesquisa oferece estas variantes 
de interpretação, trazendo à baila situações e compreensões diversas apresentadas 
pela pesquisa, ou dando possibilidade de resultados já divulgados por pesquisas 
anteriores. Para que esta pesquisa qualitativa permita ultrapassar os limites do 
excêntrico e também para que fiquem registradas as particularidades – inerentes a 
qualquer pesquisa – torna-se necessária a descrição do caminho adotado, 
esclarecendo as decisões tomadas, as mudanças de percurso e reconhecer as 
metas alcançadas. 
Ao reconhecer que certa etapa da pesquisa – ação dos sujeitosou de grupos 
de acordo com o ambiente ou contexto – somente será revelada no processo, ou 
mesmo, no contato de resultados de pesquisadores experientes, Alves (1991), 
Neves (1996), Goldenberg (1999) e Patton (2002), se atêm ao fato de que poderão 
emergir necessidades de aprofundamentos ou mudanças teóricas, provindos do 
contato direto e prolongado com o campo de estudo. Estes autores também 
acreditam que a discussão e compreensão dos fenômenos estudados e os 
21 
 
comportamentos dos sujeitos observados, sem a preocupação de generalizações 
estatísticas, se manifestam como características da pesquisa qualitativa. 
O pensar em uma pesquisa é um processo lento e demorado, se iniciando, na 
maioria das vezes, por um questionamento não muito elaborado que, em um 
primeiro momento, nos parece à chave do estudo, mas com o passar do tempo e 
após várias reflexões, individuais ou coletivas (colegas, bibliografias, orientadores 
etc.), transformam essa simples e pouco elaborada questão em outra ou outras 
melhor estruturadas. Não estou confabulando sobre este fato para justificar um dos 
atos do pesquisador, mas para apresentar a tese a ser defendida; 
 A relação entre a língua de sinais, a língua portuguesa e a linguagem 
matemática em ambiente de sala de aula inclusiva produzem jogos de 
linguagem entre sujeitos surdos e ouvintes na tentativa de compreender 
conceitos matemáticos. 
Deste momento em diante procuramos buscar meios, a partir da pesquisa de 
campo e coleta de dados, para acessar informações necessárias para dar conta 
desta tese definida. 
 
2.3. Instrumentos de Pesquisa 
Ao partilhar e estudar o ambiente complexo e dinâmico da aula inclusiva 
confirmou-se ser prioritário, como instrumento principal para registro dos dados, o 
uso de gravações (fotografia, filmagem e áudio) nas aulas, que foram revistos, 
catalogados, selecionados e transcritos na íntegra e fazem parte das análises deste 
texto, com o intento de disponibilizá-las como fonte para futuros leitores e 
pesquisadores. 
A opção por gravações/filmagens tornou-se necessária pela percepção da 
língua de sinais ser visuogestual, não existindo um registro escrito ou oral, 
necessitando então de uma posterior interpretação e tradução da língua de sinais 
para a língua portuguesa escrita. Com isso, evitamos prejudicar o desenrolar dos 
diálogos permeados por diferentes subjetividades, além de ter que dar conta das 
combinações linguísticas, com o acréscimo da linguagem matemática, presentes no 
22 
 
ambiente da sala de aula inclusiva. Optamos por este procedimento, por confiar nas 
filmagens (língua de sinais), fotografias (linguagem matemática) e o áudio (língua 
portuguesa) captados para favorecer as análises, dando possibilidades de ver e 
rever diálogos além das entonações verbais e expressões faciais entre o professor e 
alunos surdos, alunos surdos e alunos ouvintes e intérprete e alunos surdos. 
As filmagens e fotografias foram feitas pela pesquisadora e uma colaboradora 
intérprete, em uma câmera digital e uma filmadora portátil. O foco principal das 
fotografias eram os registros escritos das atividades matemáticas realizadas pelos 
alunos surdos e ouvintes e o foco das filmagens eram os jogos de linguagem entre 
os sujeitos de pesquisa para futura observação das nuances verbais (entonação de 
voz) e expressões faciais que não poderiam ser registradas apenas pela 
observação. Essas nuances verbais, no caso dos ouvintes, foi para registro de 
ironias e outras figuras de linguagem não perceptíveis em toda a sua amplitude 
pelos sujeitos surdos e, quanto às expressões faciais e corporais, para 
complementação frasal e de significado que na língua de sinais tem necessidade 
obrigatória. 
Outras formas de instrumentos de coleta de dados utilizados neste estudo 
foram: 
a. A entrevista informal (todos os sujeitos), com a finalidade de reconhecimento 
de afinidades, preferências, saberes de experiências anteriores, habilidades e 
competências existentes na área de matemática e qualquer outra informação 
relevante nesse sentido para a pesquisa; 
b. O questionário (professor e intérprete), com a intenção de reconhecer a 
escolarização, conhecimento sobre o alunado surdo e as escolhas 
metodológicas; 
c. As atividades matemáticas do apostilado produzido pelo professor que 
serviram para registro fotográfico, tinham a finalidade de reconhecimento da 
efetivação dos cálculos e produção de conhecimento matemático individual 
ou coletivo; 
d. O diário de campo, para organização e registro de todos os comentários 
(jogos de linguagem) relevantes antes do início das aulas, nas conversas 
23 
 
informais entre os sujeitos de pesquisa, durante a aula, conversas pelo 
corredor que fossem sobre as aulas e qualquer diálogo que estivesse, por 
algum motivo, relacionado aos jogos de linguagem ou que pudessem servir 
como continuação de comentários entre acontecimentos ocorridos em sala de 
aula. 
A construção dos dados relativa a presente investigação foi feita 
exclusivamente pela investigadora. A observação em campo, em sala de aula, foi no 
período de outubro a dezembro de 2012, mas a pesquisa propriamente dita foi 
efetivada no período de março a novembro de 2013. A observação teve o objetivo 
de conhecer a turma e verificar a forma de trabalho dos sujeitos investigados 
(professor, intérprete), além de possibilitar a familiarização da pesquisadora com os 
futuros atores da pesquisa (alunos surdos e ouvintes, professora e a intérprete). 
Os dados de cada um dos participantes foram obtidos a partir de 
questionários, entrevistas e relatos no diário de campo, além de gravações em áudio 
e vídeo. Os dados iniciais dos profissionais são referentes ao perfil e escolhas 
metodológicas, em seguida as observações foram direcionadas para a coleta de 
dados em relação ao tipo de interação discursiva estabelecida entre professor e 
alunos ouvintes (questionamentos e participação), dentro do contexto da sala de 
aula; a interação do professor com os alunos surdos (suas reações, dúvidas); a 
relação do professor com a intérprete; a análise das atividades matemáticas 
produzidas pelo professor e utilizados pelos alunos em sala. A utilização de tais 
recursos se fez necessária pelo tipo de investigação e análise que seriam 
desenvolvidos, visto que a melhor forma de investigar as linguagens, dos sujeitos 
envolvidos, e os possíveis problemas gerados pelas suas diferenças e organização 
não poderiam ser contemplados apenas por meio de uma simples observação ou 
registro das aulas. 
Diante das observações prévias efetuadas, constatamos que se fazia 
necessária a aplicação de questionário e realização de entrevista complementar com 
o professor e a intérprete, com os alunos ouvintes e surdos, para verificar de que 
forma a formação inicial, a formação continuada e os anos de experiência poderiam 
estar influenciando nas práticas em sala de aula e como se dava o relacionamento 
entre os alunos, respectivamente. Tal coleta foi realizada no mesmo período inicial 
24 
 
das observações em sala de aula. Para a aplicação do questionário e realização da 
entrevista, fizemos um roteiro de questões, pensando nos dados relacionados à 
formação, tempo de serviço, prática pedagógica, entre outros. 
As entrevistas do professor e da intérprete se realizaram na Sala de 
Professores, indicada pelo professor. Já as entrevistas dos alunos surdos e 
ouvintes, se deram na própria sala de aula, individualmente e em grupo, em 
conversas informais, com perguntas inicialmente direcionadas em relação aos seus 
conhecimentos prévios, aos colegas ouvintes, à disciplina Matemática e ao 
professor. 
Na seção a seguir, daremos atençãoao lócus da pesquisa, que mediante a 
legislação como a Constituição de 1988 (Art. 205 e Art. 206), e a lei de Diretrizes e 
Bases de 1996 (Art. 58, Art.59 e Art. 60), garantem a entrada e permanência de 
alunos com deficiência nas escolas da rede regular de ensino. 
 
2.4. O local escolhido 
A escolha do lócus deveu-se à condição existente na atualidade das 
instituições de ensino, em relação à Educação Especial, ou seja, a partir das 
normativas, no âmbito municipal, estadual e federal, as escolas devem receber 
alunos com deficiências. 
Na Capital Belém e nos Municípios vizinhos existem inúmeras escolas que 
cumprem as normativas quanto ao recebimento e permanência de alunos com 
deficiências. Neste sentido, o critério de escolha da escola foi quanto a dois fatores 
facilitadores da pesquisa: a aceitação do estudo pela gestão escolar e quantidade de 
alunos surdos inseridos por sala de aula no ambiente escolar. A partir desses 
critérios foi selecionado no Município de Ananindeua-Pará uma Escola Estadual de 
Ensino Fundamental e Médio. Esta instituição de ensino recebe alunos com 
Deficiência Visual, Deficiência Intelectual, Deficiência Fisica e Deficiência Auditiva, 
entre outras especificidades, com uma quantidade considerável de alunos surdos 
por série, em cada sala. Em 2010, foram matriculados do 5º ao 9º ano, dezesseis 
(16) alunos surdos e do 1º ao 3º ano do Ensino Médio, nove (9). Este número vem 
25 
 
crescendo6 a cada ano, com uma demanda em 2013, de vinte e dois (22) alunos 
surdos no Ensino Fundamental e dezesseis (16) no ensino Médio, sendo informado 
pela gestora que dos que iniciaram em 2010, cinco (5) foram remanejados para 
outra instituição, tendo como justificativa a proximidade das residências em relação 
às novas escolas. 
A escola tem seis turmas do Ensino Médio: três do 1º ano; duas do 2º ano e 
uma do 3º ano, sendo essas turmas atendidas por dois professores de Matemática e 
duas intérpretes. A escolha dos sujeitos deu-se quanto à turma, pela idade e 
competência ou habilidade dos alunos surdos na leitura labial e fluência na língua de 
sinais; o número de indivíduos concentrados na mesma sala. Neste sentido, a turma 
escolhida foi a do 3º ano, composta de 32 alunos ouvintes e 5 alunos surdos. Os 
profissionais que participaram da pesquisa tinham como características: 
1) O professor: com graduação em Matemática; sem fluência na língua de 
sinais; sem habilidade para lidar com os alunos surdos; 
2) A intérprete: com graduação em Matemática; com fluência na língua de 
sinais; com experiência na profissão de intérprete (mais de 10 anos). 
A seleção dos alunos ouvintes foi bem mais criteriosa, pois inicialmente 
pensamos em uma escolha por relação de afinidade (amizade) com os alunos 
surdos, porém esta opção de escolha trouxe um entrave: os alunos surdos que 
fariam parte da pesquisa mantinham uma relação amigável com todos da turma, o 
que tornaria nossa análise, inviável. Achamos melhor adentrar no campo de 
pesquisa e encontrar outro critério que provocasse uma seleção mais apropriada 
dos alunos ouvintes. 
Na seção seguinte apresentaremos de forma apropriada os sujeitos de 
pesquisa e esclareceremos sobre como aconteceu à seleção dos alunos ouvintes. 
 
 
6 De acordo com o MEC/SEESP “no Brasil, ampliou-se significativamente a educação de orientação 
inclusiva”. Na educação básica, a matrícula dos alunos com necessidades educacionais especiais 
nos sistemas de ensino, cresceu de 13% em 1998 para 41% em 2005. Alguns aspectos desse 
crescimento na área da deficiência auditiva é o reconhecimento da Língua Brasileira de Sinais – 
Libras, em 2002, e a sua regulamentação pelo Decreto 5.626/2005; na área da deficiência mental e 
deficiência múltipla com atendimento em larga medida em escolas especiais e em classes especiais, 
também um crescimento considerando os processos de definição de políticas para a educação 
inclusiva. (BLATTES, 2006: p. 12/13) 
 
26 
 
2.5. Os atores da Pesquisa7 
A descrição dos sujeitos será apresentada brevemente em forma de perfil 
pessoal e profissional com a intenção de situar os personagens em relação aos 
jogos de linguagem no ambiente sala de aula inclusiva do Ensino Médio. 
 O Professor (P) 
Iniciaremos com o perfil do Professor, que tinha trinta e nove anos de idade, 
dos quais os últimos quinze anos foram dedicados à prática docente. É formado em 
Matemática, tem o curso de Especialização em Fundamentos da Matemática 
Elementar, e pretendia cursar, no segundo semestre de 2013, uma formação 
continuada em Língua de Sinais, mas não conseguiu. Sua primeira experiência 
como docente ocorreu na Rede Privada por contrato. Hoje, leciona na Rede 
Estadual, Municipal e Privada de Ensino, sendo concursado na rede Pública. 
Atende, em suas turmas, crianças com Deficiência Física, Auditiva e com Visão 
Subnormal8 (subdivisão da Deficiência Visual). A escola não adota nenhum livro 
didático para as turmas do Ensino Médio, mas este professor utiliza o livro didático 
“Curso Prático de Matemática” do autor Paulo Bucchi, como seu referencial de 
pesquisa para suas aulas e para a produção do seu apostilado de atividades. 
O Professor (P) trabalhou os conteúdos matemáticos de duas formas 
distintas: na primeira, ele inicia com uma explanação das regras do conteúdo 
matemático passando em seguida para questões no quadro ou orais; na segunda, 
ele começa com uma questão-problema, no quadro ou em apostilados previamente 
construídos, até chegar às regras gerais dos conteúdos matemáticos. 
Os apostilados, produzidos pelo professor (P) em consonância com o 
referencial utilizado por ele, contêm conteúdos que são trabalhados bimestralmente. 
A forma de comunicação usada pelo professor (P), com os alunos surdos, são a 
oralidade e a escrita. Este profissional, mesmo tendo uma formação continuada, se 
 
7 Para preservarmos a identidade dos sujeitos pesquisados, os mesmos serão identificados por letras 
maiúsculas. O professor pela letra (P), a intérprete pela letra (I) e os alunos surdos pelas letras (A), 
(B), (C), (D) e (E). 
8 Os autores Sá, Campos e Silva (2007) explicam que a definição de visão subnormal (ambliopia, 
baixa visão ou visão residual) é complexa devido à variedade e à intensidade de comprometimentos 
das funções visuais. Essas funções englobam desde a simples percepção de luz até a redução da 
acuidade e do campo visual que interferem ou limitam a execução de tarefas e o desempenho geral. 
27 
 
mantém atrelado a práticas pedagógicas rígidas9 como a memorização – 
demonstrações de teoremas, e a mecanização de cálculos – listas extensas de 
exercício. Esta prática é apontada por Ponte (2004) como uma das características 
marcantes do “ensino tradicional”, muito difundido nas décadas de 40 e 50, do 
século passado. 
 
 A Intérprete (I) 
A intérprete (I) tem quarenta e oito anos de idade, dos quais os últimos vinte e 
dois foram dedicados ao trabalho com o Surdo. Na escola pesquisada, no horário 
matutino, esta profissional exerce a função de Tradutora/Intérprete Itinerante10, 
sendo responsável por três turmas do Ensino Médio. No horário vespertino, sua 
função passa para professora de sala de recurso, atuando com reforço disciplinar 
para turmas do Ensino Fundamental em uma escola especializada na Educação de 
Surdos. É formada inicialmente no Magistério, tem formação específica na área de 
Matemática e inúmeros cursos de formação continuada em Língua Brasileira de 
Sinais (Libras). Sua primeira experiência como docente foi na Rede Municipal de 
Educação, na qual lecionou contratada por cinco anos, em turmas de 1ª a 4ª séries. 
Atualmente é concursada naRede Estadual de Educação, onde atua como 
professora de Educação Especial, atendendo somente na itinerância11 e sala de 
recurso. 
Esta profissional considera sua experiência como professora do ensino 
especializado, bem como os conhecimentos adquiridos durante sua formação, 
 
9 Para Saviani (1988) a prática pedagógica rígida é hierarquizada com normas rígidas de disciplina e 
se caracteriza pelo conteudismo, exercícios de fixação e memorização. 
 
10 De acordo com Quadros (2007, p.7) o professor tradutor/intérprete itinerante de Libras é 
conceituado como “a pessoa que interpreta de uma dada língua de sinais para outra língua, ou desta 
outra língua para uma determinada língua de sinais”. O seu campo de trabalho é bastante amplo, pois 
corresponde a necessidade comunicativa dos surdos, dessa forma atende: as instituições de ensino, 
dando suporte aos professores e aos alunos surdos; quando solicitado participa de eventos 
(conferências, seminários, congressos, etc.); e na realização de traduções escritas e 
acompanhamento aos surdos em atividades extraclasse, quando necessário. 
11 Os autores Alves e Gotti (2006) consideram a itinerância ou ensino itinerante como um 
Atendimento Educacional Especializado (AEE), como um serviço educacional prestado pela 
Educação Especial para atender as necessidades educacionais dos alunos, devendo ser organizado 
para apoiar, complementar e suplementar os serviços educacionais comuns. Este apoio pedagógico, 
desenvolvido por profissional devidamente capacitado se caracteriza pela movimentação do 
professor, que se deslocará para as escolas do ensino regular onde existirem matriculados alunos 
com deficiência. 
28 
 
especialmente no curso de pós-graduação - no qual teve um contato amplo com 
referenciais que lhe deram novas perspectivas de trabalho, como os principais 
fatores que a levaram não só a trabalhar com alunos especiais, mas que 
contribuíram para sua formação e prática docente. 
A intérprete (I) trabalha no horário matutino como tradutora/intérprete de três 
turmas do Ensino Médio (duas do 2º ano e uma do 3º ano), compondo um quadro de 
profissionais da Educação Especial com outras três colegas intérpretes (duas que 
atendem o Ensino Fundamental – 6º ao 9º ano e uma que atende o Ensino Médio – 
três turmas do 1º ano). Seu planejamento de trabalho, orientado por sua 
coordenadora, se foca nas disciplinas de Língua Portuguesa e Matemática. A 
intérprete justifica essa orientação de sua Coordenadora com o seguinte argumento: 
“Língua Portuguesa e Matemática são as matérias-chave em avaliações de grande 
porte, como o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) e o Programa 
Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), provas de concurso e vestibular, 
necessitando dos alunos maior competência” (fala da intérprete em conversa 
informal). 
A intérprete (I) atende os sujeitos de pesquisa que estão inseridos na turma 
inclusiva do 3º ano, três vezes por semana em sala de aula, com o atendimento 
voltado diretamente para a interpretação na língua de sinais e tradução para a língua 
portuguesa. A metodologia que pauta a prática da intérprete é baseada no 
bilinguismo. 
 
 Os alunos 
 Alunos surdos 
A turma analisada – 3º ano – tinha um total de 37 alunos, dos quais, cinco 
eram surdos – A, B, C, D e E. Destes, os alunos A, C e E são do gênero feminino e 
B e D do gênero masculino. Esses alunos sentavam-se sempre nas primeiras 
carteiras das fileiras laterais, para terem uma boa visão do professor e com isso 
facilitar a leitura labial. A idade dos alunos surdos variava entre dezoito e vinte e dois 
anos. Veremos a seguir um breve perfil de cada sujeito surdo. 
29 
 
A aluna A tem 19 anos, reside próximo à escola, tem ótima leitura labial 
(capacidade de reconhecer visualmente palavras ou frases pela gesticulação dos 
lábios), reconhece a língua portuguesa como segunda língua, tem fluência na língua 
de sinais e mantém uma liderança em relação aos colegas. Esta aluna foi oralizada, 
possui uma fala compreensível, intermedia a comunicação entre os colegas surdos, 
ouvintes e professor. Entre os sujeitos surdos esta aluna é a que mais conseguia 
manter atenção e concentração durante as aulas, chamava a atenção dos colegas 
quando estão dispersos, esclarecia a eles o máximo possível do que acontece na 
aula, tirava as dúvidas deles quando pode, solicitava do professor repetição do que 
foi explanado, questionava com a intérprete ou os colegas ouvintes aquilo que não 
conseguia compreender, e tentava colaborar com todos na medida de suas 
possibilidades. 
 O aluno B tem 18 anos, morava em um bairro distante, sendo este o motivo 
que alegava para chegar constantemente atrasado, tinha uma leitura labial boa e 
fluência na língua de sinais. Este aluno tinha dificuldades em manter atenção e 
concentração nas aulas por qualquer motivo externo (pessoas transitam perto da 
porta e janela) ou interno (promove brincadeiras entre os surdos e os ouvintes, fica 
desenhando no caderno, observa os colegas ouvintes conversando etc.), e tinha um 
círculo de amizades extenso, com os colegas da sala e de outras turmas. 
 A aluna C tinha 19 anos tinha boa leitura labial, fluência na língua de sinais e 
tinha uma amizade forte com a aluna A, por vários fatores, como morar próximo, 
terem estudado juntas desde a Educação Infantil, participarem dos eventos da 
comunidade surda (reuniões da associação de surdos, fazer instrução da língua de 
sinais, eventos sociais entre os surdos e ouvintes - aniversários, casamentos, etc.); e 
andarem sempre juntas. A aluna C recebe grande influência da aluna A, aprovando 
todos os seus atos e a posição desta como líder do grupo. 
 O aluno D tinha 22 anos, tinha uma leitura labial deficitária por ter sido 
estimulado tardiamente, introvertido e tímido, foi alfabetizado na língua de sinais na 
fase adulta (18 anos), necessitava sempre da ajuda dos colegas para a 
compreensão de conceitos novos na língua de sinais. Este aluno não mantinha 
relação de amizade ou afinidade com nenhum aluno ouvinte, pois não conseguia se 
comunicar com eles, mesmo os alunos ouvintes que foram alfabetizados pela aluna 
30 
 
A e reconheciam sinais em Libras, não conseguiam sustentar um diálogo com ele, 
forçando-o a um isolamento com seu grupo. Quando a intérprete não se fazia 
presente em sala, a aluna A fazia o papel de intermediadora entre o aluno D, o 
professor e os alunos ouvintes. 
A aluna E tinha 20 anos, ótima leitura labial, fluência na língua de sinais, foi 
oralizada, mas não tinha uma boa produção de fala, era repetente desta série, 
porque teve problemas de saúde no ano anterior e foi obrigada a parar os estudos. 
Esta aluna tinha vantagens em relação aos colegas, por ter a compreensão de 
alguns conteúdos matemáticos vistos no ano anterior. A aluna A e a aluna E se 
desentendiam em alguns momentos em relação: à atenção dos colegas surdos, à 
escolha dos sinais que deviam ser ensinados aos alunos ouvintes, à disputa de 
atenção da intérprete e do professor. 
 
 Alunos ouvintes 
Os alunos ouvintes eram sete e suas idades variavam entre dezesseis e 
dezenove anos. Esses alunos foram escolhidos (recrutados) pelos alunos surdos 
para manter uma relação de colaboração e receber o ensino básico12 em língua de 
sinais, ou seja, o aluno foi considerado pelo(s) surdo(s) como um surdo honorário, 
com tempo de relação extenso ou curto, demonstrado por suas ações no novo grupo 
(de surdos) do qual passa a fazer parte. As ações dos alunos ouvintes estariam 
ligadas à relação extensa – competências e habilidades na disciplina Matemática, 
frequência nas aulas, paciência, afinidade; relação curta – pouca habilidade na 
disciplinaMatemática, ausências constantes nas aulas, impaciência, discordâncias 
em geral, falta de afinidade. 
Este recrutamento e o ensino básico de sinais matemáticos na língua de 
sinais, para os alunos ouvintes, foram considerados pela pesquisadora como uma 
preparação prévia, um hábito, para futuros jogos de linguagem matemáticos, ou 
seja, uma particularidade na forma de vida do sujeito surdo. 
 
12 Será considerado, neste estudo, um ‘ensino básico’ na língua de sinais, a alfabetização 
proporcionada pelo aluno surdo ao aluno ouvinte, dos sinais referentes a língua com priorização no 
ensino de sinais matemáticos, que servirão para intermediar ou complementar o ensino de conceitos 
matemáticos. 
31 
 
Os alunos ouvintes estão identificados a partir de números agregados às 
letras que identificam os alunos surdos, com os quais mantinham maior nível de 
relacionamento. Ver quadro abaixo. 
Quadro 1: Sujeitos da Pesquisa. 
 
 
 
 
Fonte: Moreira (2013) 
 Com as escolhas feitas e o campo de pesquisa promissor, nos mobilizamos 
para o reconhecimento dos dados que seriam analisados futuramente. Para que 
pudéssemos analisá-los, foi necessário antes rever, refletir e escolher, a partir de 
conhecimentos anteriores e do referencial teórico; para isso, no capítulo seguinte 
apresentaremos os paradigmas da educação dos surdos e a revisão literária que 
nos permitiram refletir sobre nossas análises. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
QUANTIDADE SUJEITOS DA PESQUISA 
01 Professor de Matemática (P) 
01 Intérprete (I) 
05 Alunos surdos - A, B, C, D, E 
07 Alunos ouvintes – A1, A2, B1, B2, C1, E1, E2 
32 
 
III – REVER, REFLETIR E ESCOLHER 
A Inclusão nas escolas brasileiras, como paradigma da educação, é uma 
novidade do período atual que exige da escola, da família, da sociedade, novas 
atitudes e um novo pensar, aludindo à necessidade de mudanças de paradigmas e 
concepções, arraigadas no imaginário social, sobre atitudes discriminatórias e 
excludentes com indivíduos marginalizados (analfabetos, ribeirinhos, deficientes, 
moradores de rua, etc.). Essas mudanças no agir e no pensar acarretam mudanças 
em ações como, por exemplo, o aperfeiçoamento de profissionais da área da 
Educação (professores, pedagogos, interpretes, tradutores etc.) e afins (psicólogos, 
assistentes sociais, médicos, fisioterapeutas etc.) e nas interlocuções entre setores 
variados de conhecimento; e realizações de novas pesquisas sobre especificidades, 
que possam propiciar possibilidades e progressos significativos não apenas para 
esses indivíduos, mas principalmente para a melhoria da sociedade da qual fazem 
parte. Neste sentido, é importante frisar que as pesquisas existentes foram pontos 
de partida para inúmeras outras que se descortinam na atualidade e que tiveram 
como bases epistemológicas as perspectivas existentes nas áreas médicas e 
psicológicas. Assim sendo, é necessário um reconhecimento dessas bases 
epistemológicas para compreendermos melhor como a educação dos surdos 
ocorreu historicamente e quais suas implicações para as pesquisas atuais. 
 
3.1. Bases Epistemológicas da Educação do Surdo 
As bases epistemológicas sobre o ensino e a aprendizagem de alunos surdos 
envolvem variadas teorias, filosofias, metodologias e enfoques contextuais, 
paradigmas, que foram concebidos e evidenciados em todo o espaço temporal 
durante o que reconhecemos como a Educação de Surdos. Apresentamos, a seguir, 
uma síntese destes diferentes paradigmas relacionados à comunicação e linguagem 
como ponto chave para o processo de educação (ensino e aprendizagem) e inclusão 
escolar do aluno surdo, e também como cenário que acarretaram os obstáculos 
existentes na atualidade. Eles serão descritos na seguinte ordem: Clínico-
terapêutica; Socioantropológica; Sociocultural; Sociolinguística; e 
Sociointeracionista. 
33 
 
No modelo Clínico-terapêutico a surdez é classificada por autores da área 
patológica a partir do exame de audiometria13, que demonstra os graus de perdas 
auditivas14. Neste modelo, surge a nomenclatura Deficiência Auditiva ou Deficiente 
Auditivo, que para Slomski (2000) é utilizada clinicamente, e trazem em seu bojo 
preconceitos e julgamentos preconcebidos pelo imaginário social, de incapacidade e 
doença. A surdez, neste modelo, é vista e reconhecida como uma patologia que 
deve ser tratada, para não ocasionar novas e inúmeras outras falhas ou inaptidões. 
Para Thoma (2004), o surdo, no modelo clínico-terapêutico, é entendido como 
um indivíduo incapacitado, por não ter a capacidade auditiva, devendo ser cuidado 
clinicamente para ter sua imperfeição removida ou minimizada por meio de terapias 
de fala, cirurgias reparadoras, sessões de oralização e outras formas de cuidados 
para que se assemelhe ao máximo com os indivíduos saudáveis (ouvintes). Esses 
cuidados apenas mascaram a falta de audição, com proibições de linguagem 
sinalizada, com a receita de vocalização e leitura labial. 
Este modelo alcançou seu auge após o Congresso de Milão, ocorrido no ano 
de 1880, na Itália, que foi um marco para a história dos surdos, pois neste congresso 
internacional, discutiu-se e foi avaliada a importância de três métodos de educação 
rivais no período - Língua de Sinais, Oralismo e Mista (linguagem de sinais e a 
linguagem oral, utilizadas conjuntamente). O Método Oralista, neste congresso, 
como método para a educação dos surdos, afirma Skliar (1997), saiu vencedor das 
discussões, em uma votação com 160 votos a favor e 4 contra. 
A partir do Congresso de Milão, a língua de sinais foi proibida oficialmente, 
sendo alegada, para isso, a deformação ou destruição da habilidade de oralização 
dos indivíduos surdos. A maioria dos países da Europa e América, após este evento, 
adotou rapidamente o método oral nas escolas para surdos, começando com este 
impacto, uma longa e sofrida batalha das comunidades surdas e familiares, para 
defender o seu direito linguístico cultural, que perdurou por décadas. 
 
13 A audiometria é um exame que avalia a audição. Geralmente, é realizado por um fonoaudiólogo ou 
otorrinolaringologista. O resultado é expresso em um audiograma, um gráfico, que revela as 
capacidades auditivas do paciente por meio de medidas audiométricas (medidas dos limiares 
mínimos de audição por via aérea - por meio de fones, e por via óssea - por meio de vibradores), 
realizada em cabine acústica. Esse teste permite determinar o grau e o tipo da perda auditiva. 
(DIÓGENES, 2005) 
14 Perda auditiva é a redução da audição em qualquer grau que reduza a inteligibilidade da 
mensagem falada para a interpretação apurada ou para a aprendizagem podendo comprometer a 
linguagem, o aprendizado, o desenvolvimento cognitivo e a inclusão social da criança. 
34 
 
Os surdos foram obrigados a práticas ouvintes, tendo que abdicar de sua 
identidade e língua, tornando-se sombras imitativas dos ouvintes. De acordo com 
Borne (2002), mesmo com variados temas propostos neste congresso como: 
Vantagens e desvantagens do internato; Tempo de instrução; Trabalhos mais 
apropriados aos surdos; Medidas curativas e preventivas; entre outros, as 
discussões se concentraram nas questões de Comunicação, entre o Método Oralista 
e o da Língua de Sinais. 
Segundo Machado (2002), a visão oralista e clínico-terapêutica ainda hoje 
aparece presente na educação de surdos, cujo objetivo é a “cura” da surdez, 
visando a uma melhor integração social e educacional do surdo. Concordando com 
este autor Skliar (1998) explica que, dentro dessa concepção, a inclusão do surdo 
no âmbito social e escolar só ocorre com a transformação daespécie surda por meio 
da prática da língua oral e do suposto, como denominou o autor, de ‘etnocentrismo 
ouvintista’15, copiando valores e arquétipos culturais dos que ouvem e falam. Strobel 
(2006) critica essas práticas ouvintistas afirmando que “durante cem, anos os 
sujeitos surdos ficaram subjugados as praticas ouvintista, tendo que abandonar sua 
cultura e sua identidade Surda, obrigados a se submeter a uma ‘etnocentria 
ouvintista’, sendo forçados a imitá-los e a se esforçarem em parecer ouvintes”. (p. 
247) 
Assim sendo, a filosofia de educação associada a esta perspectiva, firma a 
aprendizagem da língua oral da comunidade ouvinte, na qual o surdo se insere, 
argumentando que só com a oralidade o indivíduo surdo poderá integrar-se na 
sociedade ouvinte e caminhar para a normalização (FREIRE, 2006; MELRO, 2003; 
VALENTE, CORREIA e DIAS, 2005), ou mesmo se comunicar com os pais, quando 
estes são ouvintes (FREIRE, 2006). Para quem assume esta abordagem, a língua 
de sinais poderá ser aprendida na fase adulta do surdo por opção mas, até lá, a 
utilização de gestos é proibida (MELRO, 2003; VALENTE, CORREIA e DIAS, 2005), 
devendo a língua oral ser introduzida o mais cedo possível (FREIRE, 2006). 
Segundo Moura (2000), durante cerca de cem anos houve uma 
predominância do Oralismo (1880 - 1980), sem resultados satisfatórios quanto ao 
 
15 O “etnocentrismo ouvintista”, para Skliar (1998), a partir de uma evolução histórica, seria a ideia de 
sujeitos surdos tendo que se moldar nos padrões ouvintes, isto é, tendo que imitar os ouvintes no 
falar, agir e ouvir. 
35 
 
desenvolvimento da fala e da aprendizagem dos surdos. Durante esse tempo a 
flexibilidade do Método Oralista acontece quando os estudiosos começam a 
comparar o desempenho acadêmico entre alunos surdos e alunos ouvintes, com 
uma discrepância de aprendizagem se revelando persistente e acentuada 
(VALENTE, CORREIA e DIAS, 2005). Surge, então, o que ficou conhecido como 
Método Bimodal, proposta que permitia a utilização simultânea dos gestos e da fala, 
que tinha o objetivo de “facilitar a aprendizagem da língua oral, mas utilizando agora 
o gesto como ponto de partida” (FREIRE, 2006, p. 45), havendo uma 
correspondência entre o gesto e a palavra (língua oral). Com este novo método, o 
desempenho acadêmico e nível de desenvolvimento dos alunos surdos se tornaram 
superiores em relação aos indivíduos sujeitos ao método oral, aumentando as 
críticas a este último. 
Mesmo com a melhoria no aprendizado do surdo, houve controvérsias a este 
novo método, o qual Sacks (1998) criticou apontando para a impossibilidade de se 
fazer corresponder a cada sinal uma palavra da língua oral. Quadros (1999), 
linguista e estudiosa da língua de sinais, faz uma crítica a este novo método, e 
afirma sobre a impossibilidade de usar, em simultâneo, as duas línguas, sem que a 
estrutura de uma, ou de ambas, seja alterada. Para Valente, Correia e Dias (et 
al2005) a crítica incide no impedimento do surdo de usar sua língua materna, a 
língua de sinais com as características especificas que lhe são próprias, e não 
apenas de usar gestos como auxiliares na aprendizagem da língua materna de uma 
maioria ouvinte. A partir de todas estas controvérsias deu-se início a novas 
discussões sobre a educação do surdo, surgindo então o Modelo 
Socioantropológico. 
O Modelo Socioantropológico surgiu no início do século XX, com a 
insatisfação das comunidades surdas em relação ao método oralista. Neste período, 
as comunidades surdas lideraram vários movimentos sociais (AFONSO, 2007, p. 52) 
otimizando seu processo de surgimento. Segundo esta concepção, a surdez é 
valorizada, pois é vista como diferença e “o surdo como membro de uma 
comunidade linguística minoritária, na medida em que usa uma língua diferente 
daquela que é usada pela maioria ouvinte” (VALENTE, CORREIA e DIAS, 2005: p. 
84). 
36 
 
Nesta perspectiva, há uma ruptura com as conotações pejorativas e redutoras 
da deficiência e da patologia (AFONSO, 2007; FREIRE, 2006; VALENTE, CORREIA 
e DIAS, 2005). De acordo com a filosofia de educação associada a esta perspectiva, 
procura-se garantir que os surdos tenham, em primeiro lugar, acesso à língua de 
sinais, uma vez que essa é a língua materna adequada a quem faz parte da 
comunidade surda (CARVALHO, 2007; FREIRE, 2006; MELRO, 2003; VALENTE, 
CORREIA e DIAS, 2005). Para este modelo, a língua de sinais é considerada central 
no Bilinguismo16 e a língua oral (falada ou escrita) uma segunda língua 
(CARVALHO, 2007; FREIRE, 2006). 
O modelo socioantropológico, de acordo com Skliar (1997), diz respeito à 
outra forma, oposta, de entendimento da surdez e das pessoas surdas. O modelo 
enfatiza que os surdos constituem um grupo minoritário de pessoas que se agrupam 
para discutir e opinar sobre suas vidas, não apenas porque tem em comum o fato de 
não escutar, mas porque constituem um grupo social, cultural e necessita partilhar 
um entendimento e apreensão do mundo, o que se traduz pelo reconhecimento, 
legalização e utilização da língua de sinais pelas sociedades nacionais. 
Vários estudos na área da antropologia indicam que a comunidade surda 
passou a se organizar, produzir, desenvolver e autorizar as línguas de sinais em 
todo o mundo e mesmo após a proibição no século passado, os sinais eram usados 
pelos surdos como língua, pois para eles, ela já tinha um status de língua. Neste 
século e a partir deste modelo, se começa a pensar, discutir e pesquisar sobre uma 
educação bilíngue, que leva em conta a necessidade de socialização da criança 
surda o mais cedo possível na comunidade de seus pares e também na comunidade 
ouvinte, permitindo que ela encontre arquétipos com os quais possa se identificar, 
abandonando a ideia da ausência, dando relevância apenas para aquilo que faz com 
que os surdos sejam diferentes: na língua, cultura, identidade e socialmente 
(THOMA e LOPES, 1998). De acordo com Machado (2002), a visão 
socioantropológica da surdez, pelo seu caráter inovador e único, ainda está em 
construção. 
 
16 Bilinguismo para Quadros (2000), refere-se a proposta educacional bilíngue que reconhece a 
língua de sinais como primeira língua e mediadora da segunda: a língua portuguesa. “Quando me 
refiro ao bilinguismo, não estou estabelecendo uma dicotomia, mas sim reconhecendo as línguas 
envolvidas no cotidiano dos surdos, ou seja, a Língua Brasileira de Sinais e o Português no contexto 
mais comum do Brasil.” (2000, p.54). 
37 
 
A partir do modelo socioantropológico descortinou-se novos desdobramentos 
em relação à educação da pessoa surda. Para Thoma e Lopes (1998), é a partir 
desta diferenciação que se começa a pensar em uma educação voltada à língua 
gesto-visual fluente nos indivíduos surdos e à necessidade de apresentar à pessoa 
surda condições de apreender o mundo que a cerca por meio da construção, 
produção e identificação de sua própria identidade, cultura e linguagem. Deixa de 
lado a ideia da incapacidade e da deficiência e põe em pauta o que faz com que os 
surdos sejam diferentes linguística e socialmente, dando à sociedade um novo 
referencial, o Modelo Sociocultural. 
O Modelo Sociocultural da surdez considera os aspectos sociais, linguísticos 
e culturais dos surdos. Neste ponto de vista, a surdez não é identificada como uma 
deficiência, pois os aspectos legítimos do surdo são enaltecidos, ou seja, sua 
criatividade, atenção, interesse, habilidade e cognição. Também pelo uso de sua 
língua diferenciada e a sua capacidade de adaptação, ocorrendo em décadas de 
lutas ao favorecimento da inclusão. De acordo com essa concepção, a surdez se 
distinguepor experiências visuais com uma forma diferenciada e única de 
estabelecer a realidade histórica, política e social do indivíduo. (QUADROS, 2003: p. 
88) 
A partir de pesquisas científicas sobre a surdez, emergiram variados 
movimentos de grupos minoritários que buscavam, por meio de denúncias contra a 
discriminação, seus direitos. Direito a sua própria identidade, por serem diferentes 
em sua essência e natureza. Essas lutas formaram um intenso movimento 
multicultural que tomou forma e se alastrou, chamando a atenção da sociedade, 
fazendo com que esta transformasse o seu olhar para o social e o cultural desses 
grupos. Neste sentido, um novo grupo de surdos se constituiu mudando o conceito 
de “ser deficiente”, relacionado ao sentir-se deficiente, tendo total consciência do 
que lhe falta, ou seja, na concepção da palavra, como se isto as definisse e 
caracteriza-se. Dessa forma, o pensamento que se concretiza é de que todos os 
obstáculos residem no ambiente no qual estão inseridos e não em si como ser 
humano. O pesquisador Behares (1993, p. 20) define este novo indivíduo surdo 
como uma pessoa que “por portar um déficit auditivo, apresenta uma diferença em 
relação ao padrão de normalidade esperado” devendo estabelecer uma identidade 
38 
 
que lhe será própria de forma a “se integrar na sociedade e na cultura na qual 
nasceu”. 
A diferença entre o Modelo Clínico-terapêutico e o Modelo Sociocultural, é 
que no primeiro, o insucesso na aquisição e desenvolvimento da língua oral padrão, 
é conferido à deficiência do indivíduo, a qual restringe as capacidades de abstração, 
comunicação, socialização e cognição. No segundo, as dificuldades são remetidas 
aos fracassos dos métodos de educação, que se mostram inadequados em 
favorecer o desenvolvimento do sujeito, necessitando ser aprimorados. Para isto, 
tem-se a importância da língua de sinais como instrumento fundamental para que a 
educação do surdo se efetive, modificando não somente os preceitos filosóficos 
embutidos neste processo, como também as práticas educativas e o processo de 
relação e inter-relação dos indivíduos surdos com seus familiares (ALMEIDA, 2000), 
trazendo à tona concepções do Modelo Sociolinguístico. 
No Modelo Sociolinguístico, de acordo com Skliar (1997), a fundamentação 
teórica e cultural defende que a língua de sinais deve ser considerada como primeira 
língua, ocasionando competências comunicativas e cognitivas do indivíduo surdo, 
tendo como princípio que a deficiência auditiva não lhe impede adquirir 
competências linguísticas e cognitivas. Desta forma, a língua de sinais deve ser 
utilizada para transmissão de todo e qualquer conteúdo escolar para que o surdo se 
sinta respeitado em sua condição única, além de favorecer o aprendizado da 
segunda língua, neste caso a Língua Portuguesa, dando a oportunidade de 
aprendizado e conhecimento e lhe oportunizando a integração em um mundo 
bilíngue e bicultural que o cerca. Nas escolas regulares a entrada e permanência de 
surdos adultos mesclados com crianças surdas, tem papel relevante neste contexto, 
pois além dos adultos surdos tornarem-se modelos linguísticos para os que ainda 
não têm um desenvolvimento comunicativo com a língua de sinais, também são 
referências afetivas, sociais e culturais para os que ainda se sentem relegados por 
sua condição. 
Este modelo ainda traz um fator primordial que é retirar do canal oral-auditivo 
(membros constitutivos da fala e audição) a responsabilidade do indivíduo surdo não 
ter habilidades linguísticas, de comunicação e cognitivas. Em seu livro Slomski 
(2000) comenta que o modelo sociolinguístico tem o Bilinguismo como organizador 
39 
 
metodológico, considerando o indivíduo surdo possuidor de uma primeira língua 
(língua de sinais), que é o instrumento de acesso aos processos de aprendizagem 
de antigos e novos conhecimentos, à informação, à cultura e ao reconhecimento de 
uma segunda língua que lhe pode servir de apoio em qualquer contexto do qual 
participe na comunidade maior de ouvintes. 
Neste aspecto, a língua passa a ser a diferença no desenvolvimento do 
indivíduo surdo, em todos os aspectos (lazer, trabalho, escola etc.), pois possuindo 
uma língua própria, consegue uma integração à comunidade ouvinte, de forma a não 
acentuar sua deficiência, mas ressaltar sua diferença e diversidade nas áreas 
sociais, de comunicação e cultural. Almeida (2000) afirma que não há patologia ou 
mesmo uma diferença inferior entre o surdo e o ouvinte, apenas uma desigualdade a 
ser considerada, que é a língua de sinais como recurso próprio para interagir com o 
meio, o que permite aos surdos expressarem-se. 
Outros autores como: Behares (1997); Fernandes (1990) e Quadros (1997) 
acreditam que os surdos desenvolvem a visão como um canal sensorial para o 
processo de construção de conhecimento, pois são privados do sentido da audição, 
necessitando de uma língua diferenciada, na qual, alcancem um nível de 
comunicação tão eficiente quanto o dos ouvintes, que garanta o desempenho de 
todas as funções de uma língua reconhecida pela Linguística. Para esses autores, 
na perspectiva sociolinguística de surdez, devemos pensar uma educação para 
surdos que pondere suas características sociais, descartando a área clínica e a 
constante vontade de caracterizar a surdez como patologia clínica. A semelhança de 
aprendizagem e desenvolvimento do surdo com o ouvinte é tarefa que só muito 
recentemente vem sendo alcançada e está além de ser consonância entre a maioria 
dos envolvidos, pois a forma de pensar essa educação está atrelada a outras 
representações relacionadas aos surdos e à surdez. 
O Modelo Sociointeracionista, para Coll e Gillièron (1987, p. 30), tem como 
objetivo compreender como o sujeito se constitui enquanto sujeito cognitivo e 
produtor de conhecimentos. Em concordância com este pensamento, está De 
Lemos (1995, 1996), que compreende a linguagem humana como constitutiva do 
sujeito, focalizando então as interações entre os interlocutores e os modos como se 
desenvolvem as práticas discursivas. Este autor, ainda comenta que a língua, na 
40 
 
perspectiva sociointeracionista, não é um sistema de que o sujeito se apropria para 
usá-la, mas é reconstruída na atividade de linguagem. 
 No contexto linguístico, a perspectiva sociointeracionista, para Perlin (1998) é 
de que a língua existe constituída de signos e significados, para a comunidade 
ouvinte, a partir da condição auditiva, e que o sujeito surdo tem dificuldades de 
utilizar-se de todos os signos e significados dos vocábulos dos ouvintes, 
principalmente de variados conhecimentos e significados, mantendo uma 
compreensão limitada, pois as duas línguas têm na sua utilização signos visuais. O 
suporte linguístico para este modelo educacional é o de estabelecer um 
comportamento bilíngue para as crianças surdas, considerando a língua de sinais 
como primeira língua (L1) e a língua portuguesa como segunda língua (L2). 
O posicionamento aqui suscitado, sobre o modelo sociointeracionista, permite 
inferir que o ensino para o indivíduo surdo, baseado somente na oralização, pode 
limitá-lo à pronúncia de palavras isoladas, prejudicando o ensino das variadas áreas 
de conhecimentos, uma vez que a repetição de palavras isoladas e a aquisição de 
um número reduzido no vocabulário não constitui um aprendizado de uma língua, 
fala e comunicação, apenas desenvolve a produção de um ‘minidicionário’ deficitário 
de uma língua sem significado para o sujeito, tornando-se o obstáculo principal 
deste modelo. 
A explanação das bases epistemológicas que fundamentam a Educação de 
sujeitos surdos tornou-se necessária para a compreensão do que os estudiosos 
consideram

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