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AULA 4 GAMES E GAMIFICAÇÃO Prof. João Mattar 2 TEMA 1 – DEFINIÇÃO DE GAMIFICAÇÃO Deterding et al. (2011, p. 10), em um artigo bastante citado, definem gamificação como “o uso de elementos de design de games em contextos que não são de games”. Sheldon (2012, p. 75), por sua vez, propõe uma definição similar: “gamificação é a aplicação de mecânicas de games a atividades que não são de games”. Há pelo menos dois pontos importantes a destacar nessas definições: a. Gamificação não é sinônimo de uso de games, mas de uso de elementos e mecânicas de design de games; b. Diferentes atividades podem ser gamificadas, como educação, marketing, administração, turismo etc. Gamificar, portanto, não significa criar ou utilizar um game. No entanto, as fronteiras entre o que é um game e o que é um artefato gamificado podem não ser muito claras. Para determinar se um sistema é um game ou um aplicativo gamificado, pode ser necessário recorrer às intenções do designer ou às experiências dos usuários (Deterding et al., 2011). Deterding et al. (2011) acreditam também que a gamificação demarca um conjunto de fenômenos distintos, mas previamente não especificados: o complexo da gamefulness, interação e design relacionados aos games, o que é diferente dos conceitos mais estabelecidos de playfulness, interação e design relacionados ao brincar. Games têm regras e objetivos, diferentemente de brinquedos e brincadeiras. A definição de gamificação de Deterding et al. (2011), portanto, engloba: o uso de elementos (não games) de design (não tecnologias baseadas em games ou práticas relacionadas aos games) de games (não brinquedos ou brincadeiras) em contextos que não são de games. TEMA 2 – ELEMENTOS DE DESIGN DE GAMES O que são elementos de design de games? Quais desses elementos são característicos e encontrados na maioria dos games, imediatamente associados a eles e que desempenham um papel significativo na jogabilidade (gameplay)? Deterding et al. (2011) identificam esses elementos na literatura em variados níveis de abstração, que classificam, do mais concreto ao mais abstrato, em: 3 a. padrões de design de interface de games; b. padrões e mecânicas de design de games; c. princípios e heurísticas de design de games; d. modelos conceituais de unidades de design de games; e. métodos e processos de design de games. O Quadro 1 descreve e exemplifica cada um desses níveis. Quadro 1 — Níveis de elementos de design de games Nível Descrição Exemplo Padrões de design de interface de games Componentes e soluções de design de interação comuns e bem-sucedidos para um problema conhecido em um contexto, incluindo implementações de protótipos Badges, placar, fases Padrões e mecânicas de design de games Partes em geral recorrentes no design de um game relacionadas à jogabilidade Limitação de tempo, recursos limitados, rodadas Princípios e heurísticas de design de games Orientações avaliativas para abordar um problema de design ou analisar uma dada solução de design Duração do jogo, objetivos claros, variedade de estilos de jogos Modelos conceituais de unidades de design de games Modelos conceituais dos componentes dos jogos ou da experiência de jogar Modelo MDA (Mechanics– Dynamics–Aesthetic); desafio, fantasia, curiosidade; átomos de design de games; teoria CEGE (Core Elements of the Gaming Experience) Métodos e processos de design de games Processos e práticas específicas do design de games Testes antes do lançamento, design centrado no jogador, game design com consciência de valores Fonte: Deterding et al. (2011, p. 12, tradução nossa) Bedwell et al. (2012) desenvolveram uma taxonomia dos elementos de games educacionais, propondo nove categorias com atributos distintos, relacionadas a resultados de aprendizagem, que estariam presentes em todos os games, variando em intensidade: a. Linguagem de ação – interface e comunicação entre o jogador e o sistema, para traduzir os comandos do jogador; b. Avaliação – feedback e informações sobre o progresso do jogador, incluindo placares; c. Conflito/desafio – incluindo o nível de dificuldade e surpresa; d. Controle – interação com o equipamento; e. Ambiente – “local” em que o game é jogado; f. Ficção do game – envolvendo história, fantasia e mistério; 4 g. Interação humana – interpessoal (no espaço e tempo reais) e social (mediada por tecnologia); h. Imersão – percepção do jogador no jogo, incluindo estímulos sensoriais, como os visuais e sonoros, objetos e pessoas; regras/objetivos. Landers (2014), no desenvolvimento de uma teoria psicológica da aprendizagem gamificada, adaptou as nove categorias de Bedwell et al. (2012), defendendo que os mesmos atributos podem ser aplicados fora do contexto de um game, para afetar atitudes ou comportamentos relacionados à aprendizagem. Entretanto, enquanto os games educacionais em geral utilizariam todas essas categorias, a gamificação poderia utilizar uma ou apenas algumas delas. Ao contrário dos games, a gamificação não visaria em geral influenciar diretamente a aprendizagem; em vez disso, seu objetivo seria alterar o comportamento ou a atitude contextual de um aprendiz (por exemplo, o envolvimento), o que, por sua vez, poderia melhorar o ensino já existente, como uma consequência daquela mudança comportamental ou atitudinal. Assim, os praticantes de gamificação na aprendizagem esperam que os atributos de game afetem um comportamento relacionado à aprendizagem, que, por sua vez, afetará de alguma forma a aprendizagem. Ou seja, embora se possa afirmar que os alunos aprenderam com um jogo, geralmente não será válido dizer que eles aprenderam com a gamificação. O objetivo da gamificação, portanto, não pode ser substituir o material de ensino, mas melhorá-lo, pois os elementos de games provocam mudanças no comportamento e em atitudes, e não diretamente no material de ensino. Em suma, o uso de um elemento de game aumenta o engajamento, que modera a relação entre o conteúdo instrucional e os resultados de aprendizagem. Uma implicação importante de um processo de moderação é que o moderador não influencia a construção do resultado, independentemente da construção causal. Nesse caso, a inclusão de um elemento de jogo não teria qualquer efeito sobre o aprendizado se o design da instrução já não fosse sólido. Se um curso for de baixa qualidade (por exemplo, se esse curso não incorporar técnicas pedagógicas adequadas), a adição de gamificação não terá efeito sobre a aprendizagem. Este é, portanto, um vetor potencial para os esforços de gamificação fracassados: se um instrutor não vê ganhos esperados de aprendizagem entre os alunos devido à má concepção instrucional e, em seguida, incorpora a gamificação, é improvável que a aprendizagem melhore. Nesse caso, 5 a verdadeira causa do problema (má eficácia do design instrucional) permanece, e elementos de jogo do curso não farão nada para melhorar a aprendizagem. Ou seja, a relação entre elementos de games e resultados de aprendizagem é mediada por comportamentos/atitudes. As características de games afetam os resultados de aprendizagem, mas apenas porque afetam um comportamento/atitude, e o comportamento/atitude, por sua vez, afeta os resultados de aprendizagem. Portanto, a gamificação pode não ter êxito em melhorar o aprendizado se qualquer uma das duas relações causais da mediação não se sustentar: o professor deve assegurar que os elementos do jogo levam ao comportamento e, por sua vez, que o comportamento leva à aprendizagem. Se qualquer uma dessas relações for falsa, a gamificação não produzirá os resultados pretendidos. De maneira geral, esse modelo indica que a gamificação pode afetar a aprendizagem por meio de um entre dois processos. Emambos os processos, a gamificação pretende influenciar um comportamento ou uma atitude relacionada à aprendizagem. No entanto, a relação entre esse comportamento e os resultados difere dependendo da natureza dessa construção. De um lado, a gamificação afeta o aprendizado pela moderação quando um designer instrucional pretende incentivar um comportamento ou uma atitude que aumentará os resultados da aprendizagem, tornando a instrução preexistente melhor de alguma forma. Por exemplo, uma narrativa pode ser incorporada a um plano de aula existente para aumentar a motivação dos alunos. O efeito final desse aumento motivacional é então contingente à presença de instrução efetiva. De outro lado, a gamificação afeta o aprendizado pela mediação quando um designer instrucional pretende incentivar um comportamento ou uma atitude que, por sua vez, melhore os resultados da aprendizagem. Por exemplo, essa mesma narrativa pode ser usada para aumentar a quantidade de tempo que os alunos gastam em casa com o material do curso; esse aumento do tempo deve causar diretamente maior aprendizado. Um ou ambos os processos podem estar presentes em qualquer exemplo particular de aprendizagem gamificada eficaz e, criticamente, cada um exige diferentes designs de investigação e estratégias analíticas para os suportar. Esse modelo foi testado empiricamente em Landers e Landers (2014), que relacionam elementos de jogo específicos comuns a placares (conflito/desafio, regras/objetivos e avaliação) com um comportamento focal do aprendiz, o tempo 6 na tarefa, explorando pesquisas educacionais sobre competição e pesquisas psicológicas sobre a teoria de estabelecimento de objetivos. O processo de mediação da teoria da aprendizagem gamificada foi testado experimentalmente ao solicitar aos alunos a conclusão de um projeto baseado em um wiki online, sendo que um grupo utilizou uma versão gamificada com um placar, enquanto outro utilizou uma versão de controle sem placar. A atribuição aleatória a placares suportou um efeito causal. Os alunos com placares interagiram com seu projeto 29,61 mais vezes, em média, do que aqueles em uma condição de controle. O método estatístico de bootstrapping foi usado para apoiar a mediação do efeito da gamificação sobre os resultados acadêmicos por essa quantidade de tempo. O processo mediador da teoria da instrução gamificada mostrou-se suportado. A conclusão da pesquisa foi que os placares podem ser usados para melhorar o desempenho no curso em determinadas circunstâncias. TEMA 3 – APLICAÇÕES DA GAMIFICAÇÃO A gamificação vem sendo aplicada a diversas áreas do conhecimento. Os exemplos seguintes, excluindo-se educação e administração, que serão tratados separadamente, deixam isso claro. Em Ciências Exatas e da Terra, há trabalhos com gamificação, por exemplo, em: a. Matemática (Attali; Arieli-Attali, 2015); b. Física (Studart, 2015); c. Química (Fernandes; Castro, 2015); d. Biologia (Alves, 2014); e. Engenharia (Radhakrishnan; Subramanya, 2015). Em ciências da saúde há pesquisas com gamificação nas seguintes áreas, dentre outras: a. Nutrição (Berger; Schrader, 2016); b. Medicina (Carvalho et al., 2013); c. Enfermagem (Day-Black, 2015); d. Educação Física (Cruz Junior, 2014; Van Der Host, 2016). Em ciências sociais aplicadas há literatura sobre gamificação em: 7 a. Turismo (Lourisela, 2015); b. Arquitetura (Aydin, 2014); c. Direito (Kimbro, 2015); d. Economia (Hamari; Huotari; Tolvanen, 2015). Em ciências humanas há também trabalhos em diversas áreas, como: a. História (Janiec, 2015); b. Política (Mahnic, 2014); c. Letras (Flores, 2015). Figura 1 – Gamificação Fonte: Shutterstock/Bimbim TEMA 4 – CRÍTICAS À GAMIFICAÇÃO É importante reconhecer que diversas críticas são também feitas à gamificação. Lawley, (citado por Deterding, 2012, p. 16, tradução nossa) por exemplo, reconhece que a tendência recente de aplicativos gamificados em geral reduz a complexidade de games bem projetados e balanceados para seus componentes mais simples, como badges, fases, pontos e placares: “Não que a gamificação não funcione. Porém, para ter sucesso, deve envolver o design de games, não apenas componentes de games. Games não são um substituto para experiências profundas e design de interações; são uma perspectiva alternativa para enquadrar esse processo”. 8 Whitson (2014) denuncia que o automonitoramento (self-tracking) e a gamificação seriam mecanismos de governança dos estados-nação liberais modernos, em que os indivíduos voluntariamente monitoram, governam, regulam e otimizam a si próprios. A gamificação ajudaria assim a transformar sujeitos em “indivíduos” informacionais, conjuntos de dados que seriam facilmente mobilizados, agregados, abstraídos e automaticamente governados. Figura 2 – Automonitoramento Fonte: Shutterstock/Sudowoodo. Rey (2014), por sua vez, lança uma pergunta: quem se beneficiaria? A gamificação apresentaria uma apropriação dos games e do jogar por instituições capitalistas contemporâneas para a acumulação de riqueza pela implosão pós- fordista das diferenças entre produção e consumo, jogo e trabalho. De um lado, produziria hipercommodities simbólicas e indivíduos que as desejam, depois que necessidades de sustento tivessem sido atingidas. De outro lado, permitiria a exploração continuada do trabalho, ao aliená-lo. Para Bogost (2014), a gamificação teria sido inventada por consultores de marketing como um meio de domesticar o poder misterioso e mágico dos videogames para seu uso no universo enganador dos negócios: o milagre do marketing. O poder retórico da palavra seria imenso, trazendo confiança de que se está no caminho certo, com foco em pontos e fases. Apelaria para a facilidade, buscando tornar o desafio das vendas o mais simples possível. Bogost sugere o termo exploitationware, envolvendo a noção de exploração. A gamificação seria 9 basicamente uma prática de marqueteiros e consultores que procuram construir e explorar uma oportunidade visando benefícios; existira para beneficiar os fornecedores de suas soluções, não as pessoas ou as organizações. Dewinter, Kocurek e Nichols (2014) fazem uma crítica próxima à de Bogost, mas por uma perspectiva diferente, da teoria da administração científica de Frederick Taylor. Para os autores, treinamentos gamificados funcionariam como uma expansão da administração científica para novos espaços. A gamificação colapsaria perigosamente os domínios do trabalho e do lazer, combinando os espaços do mundo real e do jogo. Além de estender a microgestão taylorista para incorporar as práticas do tempo de lazer, na tentativa de tornar o trabalho parecer divertido, a gamificação também abre o potencial para forçar o tempo de lazer a se tornar produtivo. Essa prática pressuporia ideologicamente que tudo o que as pessoas fazem está sujeito a forças produtivas e produção controlável. O entrelaçamento de jogos e trabalho sugere explicitamente que o trabalho deveria ser mais parecido com o jogo, mas procura implicitamente inserir o jogar no trabalho produtivo por meio dos games. Em última análise, Dewinter, Kocurek e Nichols (2014) enxergam a gamificação e sua intersecção com a administração científica como um processo que leva a um colapso de valores — os valores do local de trabalho e os valores do jogo se tornam os mesmos. Haveria, portanto, uma aproximação entre taylorismo e gamificação em relação à criação e ao controle das regras. A administração científica baseada em Taylor, de um lado, e a gamificação, de outro, compartilham um foco na racionalização dos processos de trabalho. Em ambas, o trabalho é dividido em partes ou componentes que podem ser otimizados e padronizados, e, em ambas, essa análise é concluída por um processo de coleta de dados que influencia o design e a implementaçãode processos de trabalho e de treinamento. Os processos pelos quais o trabalho é racionalizado e avaliado – nas práticas convencionais de administração baseadas em Taylor e na gamificação – também seriam potencialmente problemáticos. A observação necessária para completar a análise do trabalho pode facilmente descarrilhar para a vigilância de longo prazo, um recurso simples o suficiente para se integrar à maioria dos tipos de jogos eletrônicos. Embora essa vigilância possa, em princípio, ser benigna, utilizada somente como dados agregados ou tratada anonimamente, nem sempre pode estar claro para os usuários quais dados serão coletados e como serão 10 utilizados. Devido a isso, a vigilância potencial, em qualquer momento no futuro, torna-se uma ameaça invisível constante, de forma similar ao filme 1984, de George Orwell e ao panóptico, a penitenciária ideal proposta por Jeremy Bentham, que permite que um único vigilante observe todos os prisioneiros ao mesmo tempo, sem que possam saber se estão ou não sendo observados, explorada por exemplo por Foucault (2013). Um dos aspectos mais preocupantes da gamificação implantada como uma forma de administração científica seria então a medida pela qual pode facilitar o colapso de valores entre jogo e trabalho, e entre jogador e trabalhador. Nesse colapso, os processos e os prazeres de trabalhar e jogar não só são emaranhados, mas na verdade se tornam – ou pelo menos tendem a se tornar – indistinguíveis. Da mesma forma, trabalhadores/jogadores são recompensados no jogo e no trabalho pelos mesmos tipos de comportamentos, habilidades e práticas. A gamificação tornaria o tempo de lazer produtivo. Fundamentalmente, a combinação da gamificação com essas tecnologias tornaria cada ato de comunicação um momento potencial de lucro, embora raramente para o produtor da própria comunicação. Em tais casos, exemplificaria os perigos criados pelo capitalismo comunicativo, raramente discutido pelos proponentes da gamificação. Dean (2010, p. 4, tradução nossa) define o capitalismo comunicativo da seguinte maneira: “afirmo que os meios de comunicação contemporâneos capturam seus usuários em redes intensivas e extensivas de diversão, produção e vigilância”. Em essência, o capitalismo comunicativo é a exploração de comunicação para o ganho capitalista. Na verdade, a gamificação poderia ser considerada o capitalismo comunicativo por excelência, prometendo que o jogador apreciará o processo de agir e produzir nesses espaços simulados, sendo que esses processos fornecem várias métricas para a vigilância. E essas formas de capitalismo comunicativo, esses jogos para treinamento prometem uma transferência para o capitalismo industrial – ir bem no jogo garante que os melhores jogadores se tornem os melhores trabalhadores nas forças de trabalho intelectual e manual. Além disso, o jogar torna-se subserviente ao trabalho; o próprio ato de codificar o jogo em métricas observáveis garante que jogar perca o poder da motivação e imaginação intrínsecas. A hierarquia dos jogos de treinamento de negócios seria então: jogar pertence a jogos, jogos pertencem a algoritmos e 11 algoritmos representam os processos de trabalho intelectual e manual da economia de risco. Esses são apenas alguns dos autores que realizam críticas ao conceito de gamificação. TEMA 5 – ÉTICA DA GAMIFICAÇÃO Independente da sua aplicação potencial a praticamente todas as áreas do conhecimento e das críticas possíveis, como a gamificação é uma estratégia persuasiva que, portanto, tende a influenciar o comportamento dos alunos, usuários e consumidores, possui, por consequência, uma dimensão moral, o que obriga os designers da gamificação a incorporar a ética em seus processos. Diversos autores discutem essas questões, propondo modelos normativos baseados em teorias éticas diversas, para servirem de fundamento para uma metodologia de design da gamificação que inclua essa dimensão moral. Versteeg (2013), por exemplo, reconhece a gamificação como uma tecnologia persuasiva que pode influenciar o comportamento do usuário. Devido a essa dimensão moral, os designers de gamificação precisariam considerar a incorporação da ética em seu processo de design. O autor propõe então uma estrutura ética normativa, consistindo de teorias utilitaristas, deontológicas e ético- virtuosas, para servir de base ao projeto de gamificação moral. Diversas metodologias éticas são examinadas e consideradas para formular uma metodologia de design moral de gamificação que permita aos designers descobrir e abordar sistematicamente questões éticas potenciais no design da gamificação. Para Shahri (2014), a gamificação seria uma técnica emergente que utiliza a “teoria do divertimento” principalmente para motivar as pessoas a mudar sua percepção e atitude em relação a determinados assuntos. Dentro das empresas, a gamificação seria usada para motivar os funcionários a realizarem suas tarefas de maneira mais eficiente e mais divertida e, às vezes, para aumentar o sentimento de serem membros da empresa como uma comunidade. Embora a literatura tenha enfatizado com frequência o lado positivo da gamificação, principalmente das perspectivas econômica e de negócios, pouca ênfase teria sido dada ao uso ético da gamificação nas empresas. Shahri apresenta então uma pesquisa empírica para explorar os aspectos éticos do uso da gamificação, que segue uma abordagem de métodos mistos envolvendo participantes especialistas em gamificação, funcionários e gerentes. Os resultados mostram que há uma 12 linha tênue entre ser uma ferramenta positiva para motivar os funcionários e ser uma fonte de tensão e pressão que poderia afetar o bem-estar social e mental no local de trabalho. Seu trabalho avalia esse duplo efeito e essa linha tênue. Kim (2015) reconhece que duas acusações principais são feitas contra a gamificação: exploração e manipulação. Explica então sob que circunstâncias a gamificação pode ser exploradora ou manipuladora. Mantém que a gamificação é caracteristicamente vulnerável a uma forma expressiva de exploração e a uma forma de manipulação sem raciocínio, sugerindo soluções. Na mesma linha, para Kim e Werbach (2016), a gamificação é o uso de elementos e técnicas do design de videogames em contextos não relacionados a jogos. Em meio ao rápido crescimento dessa prática, questões normativas foram subexploradas. Seu principal objetivo é desenvolver uma explicação normativamente sofisticada e descritivamente rica para abordar apropriadamente as principais considerações éticas associadas à gamificação. O modelo proposto sugere que os profissionais e designers devem ser principalmente cautelosos (mas não limitados a) se suas práticas de gamificação: 1. Tiram vantagem injusta dos trabalhadores (por exemplo, exploração); 2. Infringem a autonomia dos trabalhadores ou clientes envolvidos (por exemplo, manipulação); 3. Prejudicam, intencionalmente ou não, os trabalhadores e outras partes envolvidas; ou 4. Têm efeito negativo sobre o caráter moral das partes envolvidas. 13 REFERÊNCIAS ALVES, G. et al. ControlHarvest: ensino de ecologia por meio de gamificação do controle biológico. Simpósio Brasileiro de Informática na Educação, 3, Dourado, MS. 2014, p. 342–351. ATTALI, Y.; ARIELI-ATTALI, M. Gamification in assessment: do points affect test performance? Computers & Education, v. 83, p. 57–63, 2015. 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