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CAPÍTULO 1
Libras: Educação E cuLtura surda 
A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes 
objetivos de aprendizagem:
 3 Conhecer aspectos da história da educação de surdos de modo a criar 
subsídios para produção de práticas educativas na atualidade. 
 3 Conhecer aspectos da LIBRAS visando o desenvolvimento dos alunos e seu 
processo de aprendizagem. 
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 Práticas de Ensino em Deficiência Auditiva
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Libras: Educação E cuLtura surda Capítulo 1 
Embora a luta dos 
surdos pela educação 
seja de longa data, 
a maior parte dessa 
luta nem ao menos é 
reconhecida.
contExtuaLização
Este capítulo aborda questões sobre a história e a língua dos surdos, de 
maneira a apresentar aspectos importantes da constituição da cultura surda, 
assinalando assim sob qual perspectiva estaremos trabalhando durante toda 
esta unidade. Na impossibilidade de formá-los de maneira mais completa, 
pretendemos, com este capítulo, dar-lhes instrumentos para buscar novos 
conhecimentos e uma base que sustente suas escolhas no percurso da 
educação de surdos.
História da Educação dE surdos: 
Em busca dE caminHos 
Figura 1 – Charge 
Fonte: Disponível em: <http://idc.mdaigletoons.com/
comic2.html>. Acesso em: 12 ago. 2012. 
Somos seres históricos, constituídos pelo que vivemos no dia a dia, pelo 
que já vivemos e até mesmo pelo que se espera que sejamos no futuro. Da 
mesma forma, os modos de pensar a educação de surdos na atualidade são 
resultado de várias formas de pensar e produzir a educação de surdos ao 
longo da história e trazem marcados os olhares sobre a surdez produzidos 
dentro e fora das escolas. 
Novos conceitos surgiram e foram desconstruídos ao longo da história, 
seguindo questões sociais, filosóficas e políticas. Embora a luta dos surdos 
pela educação seja de longa data, a maior parte dessa luta nem ao menos 
é reconhecida. 
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 Práticas de Ensino em Deficiência Auditiva
Observe que, no passado, os surdos eram considerados castigos para 
suas famílias, seres anormais, loucos e até enfeitiçados, incapazes de 
aprender e conviver em sociedade, portanto estavam destinados à morte ou 
ao abandono. De acordo com Sá (2002), o cristianismo defendeu que o surdo 
era um ser humano igual aos outros, portanto, também precisava de Deus. Já 
o Iluminismo, priorizando a ciência, olhou para o surdo com o objetivo de tratá-
lo, reabilitá-lo clinicamente. Se avaliarmos a linha do tempo da história da 
educação de surdos, evidenciamos a importância de estudos que primem pela 
língua de sinais e pela qualidade e evolução da educação dos surdos. 
Acreditamos ser importante conhecer de modo geral as concepções de 
educação existentes ao longo da história para que se possa pensar novos 
caminhos a partir de tais experiências. 
Como já dissemos, a história dos olhares sobre a surdez é muito anterior 
à história da educação de surdos, pois por anos os surdos sequer foram vistos 
como educáveis (STROBEL, 2006), excluídos da sociedade assim como os 
deficientes físicos e mentais. Os discursos sobre a surdez vêm se constituindo 
desde a necessidade de eliminação entre os espartanos e 
gregos, passando pelo conformismo piedoso do Cristianismo, 
pela segregação e marginalização operadas pelos ‘exorcistas’ 
e ‘esconjuradores’ da Idade Média, pelo paradigma da 
institucionalização do século XVIII em diante e o paradigma de 
serviços do século XX, até as políticas de inclusão escolar e 
social no século XXI (THOMA, 2006, p.11).
 
Salientamos que não há como separar as concepções de educação 
ou sobre a surdez em períodos históricos específicos, pois os movimentos 
educativos são fluidos e se cruzam, influenciando práticas atuais que podem 
ser encontradas em diferentes contextos. De maneira didática, mostraremos 
os períodos divididos, mas na prática nem tudo é tão delimitado. Vamos a eles.
A primeira perspectiva que iremos tratar aqui é oralismo. No impasse do 
que fazer com os alunos surdos, as escolas buscavam formas de dissimular a 
deficiência (LOPES, 2010). Na tentativa de tornar os surdos o mais semelhante 
possível aos ouvintes, esta perspectiva focava terapias de fala e leitura labial, 
vinculadas ao uso de aparelhos auditivos. 
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Libras: Educação E cuLtura surda Capítulo 1 
a) Oralismo 
Figura 2 - Oralismo
Fonte: Disponível em: <http://fabiosellani.blogspot.com/>. Acesso em: 13 ago. 2012. 
No Brasil, no período em que surge o primeiro instituto para a educação 
de surdos, o Instituto Nacional dos Surdos Mudos (que mais tarde se tornaria 
o atual Instituto Nacional de Educação de Surdos - INES), com o professor 
Eduard Huet, não havia uma preocupação em ensinar aos surdos a escrita ou 
a leitura, uma vez que grande parte da população brasileira era analfabeta. 
Assim, a educação dos surdos se baseava no ensino da fala e na socialização. 
Tratava-se de uma perspectiva bastante clínica, e há registros críticos a 
respeito desta perspectiva. Há alguns surdos que dizem, por exemplo, que 
aprendiam a falar as palavras de modo mecânico, mas não tinham ciência dos 
significados do que diziam. 
O indivíduo surdo, nessa corrente teórico-metodológica, 
trata-se de um “sujeito a ser corrigido”, que pode falar para 
se integrar na sociedade. Todas as práticas terapêuticas 
são voltadas para a cura do “ouvido deficiente”. Mesmo que 
essas práticas na época representassem algo do divino, algo 
caritativo, até hoje influenciam nas decisões políticas em 
relação à educação desses sujeitos (VIEIRA-MACHADO, 
2010,p.48-49).
Tal perspectiva inferiorizava o surdo em relação ao ouvinte, pois nem 
todos surdos mostravam-se capazes de desenvolver a fala, sua articulação 
não era equivalente a dos ouvintes e as terapias eram vistas pelos surdos 
como cansativas e pouco eficientes.
O velho oralismo obrigou e obriga a uma situação de perda 
diante da superioridade ouvinte, ou seja, sendo incapaz de 
oralizar, de alfabetizar-se, sobra ao surdo uma situação de 
isolamento, de incapacidade, de desinteresse pela vida. 
A outros, resta a migração para o encontro com surdos 
(MIRANDA, 2001, p.28).
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 Práticas de Ensino em Deficiência Auditiva
Ainda existem 
terapeutas da fala, 
mas como a língua 
de sinais hoje é 
permitida e difundida, 
muitos surdos optam 
pelo aprendizado 
da fala através de 
fonoterapias, mesmo 
que na escola utilizem 
a Libras.
Ainda existem terapeutas da fala, mas como a língua de sinais hoje é 
permitida e difundida, muitos surdos optam pelo aprendizado da fala através 
de fonoterapias, mesmo que na escola utilizem a Libras. 
Ironicamente, os espaços de formação oral, que proibiam o uso da língua 
de sinais nas aulas por acreditarem que atrapalhariam o aprendizado da fala, 
se constituíram em espaços de encontro entre os surdos e, assim, de produção 
e desenvolvimento da língua de sinais que, natural ao surdo, permanecia, 
mesmo que proibida, sendo utilizada na “marginalidade”.
A segunda fase da educação dos surdos surgiu decorrente do fracasso 
da proposta oralista. Na impossibilidade de banir a língua de sinais, ela volta 
novamente para o cenário escolar na perspectiva da Comunicação Total, 
que pretendia utilizar a língua de sinais e o método oral ao mesmo tempo na 
mesma sala de aula. 
De acordo com Silva e Nembri (2008), a comunicação total nasceu nos anos 
70 e caracteriza-se por aceitar a existência de outro canal de comunicação: 
a comunicação por sinais. Também conhecida por português sinalizado, 
na comunicação total era permitido qualquer recurso para a comunicação, 
desde que fosse possível a compreensão. Esta proposta objetivava facilitar 
a aquisição da linguagem e, consequentemente, melhor atuação na leitura 
e na escrita. As autoras afirmam também que talproposta fora questionada, 
pois, mesmo sendo uma evolução em relação ao oralismo, não eliminou as 
dificuldades apresentadas pelos surdos: os sinais serviram apenas de suporte 
para o uso da língua oral, mas não oportunizaram uma comunicação eficiente. 
Em 1880, foi realizado um Congresso Internacional em Milão 
e, com 160 votos contra quatro, aprovou-se o método oralista 
como futuro para a educação de surdos, as línguas de sinais 
passaram a ser perseguidas na tentativa de serem eliminadas 
(STROBEL, 2006).
A língua de sinais, nesta perspectiva, era vista como um recurso para o 
aprendizado da escrita e da fala, mas ao ser usada concomitantemente ao 
português, não era utilizada dentro da sua estrutura natural, tornando-se um 
português sinalizado. 
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Libras: Educação E cuLtura surda Capítulo 1 
Iremos ver mais a respeito da estrutura da língua de sinais no 
capítulo específico sobre a Libras.
b) Comunicação Total
Figura 3 - Comunicação Total
Fonte: Disponível em: <http:// replicaecontrareplica.
blogspot.com//>. Acesso em: 13 ago. 2012. 
Outra crítica que também é feita a esta perspectiva é o fato de que 
muitas vezes havia a primazia de uma língua em relação à outra, ou seja, 
grande parte dos professores, embora julgasse utilizar as duas línguas ao 
mesmo tempo, não as transmitia na mesma qualidade. Como, em geral, 
os professores eram ouvintes, quase sempre a língua que era tratada com 
inferioridade era a língua de sinais.
Portanto, a comunicação total foi considerada imprópria por muitos 
autores. Para Brito (1990), a proposta desconsidera a riqueza da estrutura 
da LIBRAS. Quadros (1997) acredita ser impossível usar duas línguas ao 
mesmo tempo. A autora acredita que falar, sinalizar e usar expressões 
faciais é impraticável.
A perspectiva educacional que mais vem sendo defendida na atualidade é 
a bilíngue, na qual o português escrito e a língua de sinais habitam o mesmo 
espaço na sala de aula, mas não ao mesmo tempo. A língua de sinais é vista 
como a primeira língua do surdo e o português escrito como segunda língua. 
A proposta bilíngue deve oportunizar ao surdo construir sua cultura e 
sua identidade enquanto sujeito surdo, permitindo também integração com a 
sociedade e a cultura ouvinte, construindo, assim, um novo olhar sobre a surdez. 
A proposta bilíngue 
deve oportunizar 
ao surdo construir 
sua cultura e sua 
identidade enquanto 
sujeito surdo, 
permitindo também 
integração com a 
sociedade e a cultura 
ouvinte, construindo, 
assim, um novo olhar 
sobre a surdez.
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 Práticas de Ensino em Deficiência Auditiva
c) Bilinguismo 
 
Figura 4 – Bilinguismo
Fonte: Disponível em: <http://www.radiojovemhits.com.
br/blog/index.php>. Acesso em: 13 ago. 2012. 
Nesta visão, a língua de sinais é utilizada para o ensino de todos conteúdos 
escolares, sendo considerada a língua mais acessível a todos os surdos, 
independentemente do grau de perda de audição; e o português escrito é 
valorizado devido à sua importância social para fora do ambiente escolar e 
familiar (POKORSKI, 2010), possibilitando um maior acesso às informações 
através de leituras de livros, legendas e atualmente de maneira especial na 
internet (POKORSKI, 2011). Thoma & Klein (2010, 116) afirmam que o acesso 
a graus elevados de ensino “só é possível na medida em que os estudantes 
surdos tenham tido respeitada a sua condição bilíngue”, uma vez que através 
da língua de sinais seria dada a oportunidade de conhecer os conceitos de 
maneira mais profunda.
“Seu nome é Jonas” é um bom filme para ilustrar 
as perspectivas oralistas e de comunicação total. É um 
filme um pouco antigo, mas é uma boa dica para quem 
se interessar em se aprofundar nesse assunto.
Assista trechos do filme em http://www.youtube.
com/watch?v=HXdWGwSjfJo.
Diante dessas reflexões, verificamos que as diferentes propostas 
apresentadas, são essencialmente propostas diferentes com o mesmo 
objetivo: criar caminhos para o desenvolvimento do sujeito surdo.
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Libras: Educação E cuLtura surda Capítulo 1 
A proposta educacional do bilinguismo espera oportunizar o quanto antes 
o contato da criança com duas línguas, estabelecendo a educação no contexto 
social e cultural de uma comunidade específica, a comunidade surda. 
Frente ao exposto, podemos dizer que o trajeto histórico da educação dos 
surdos está interligado com a compreensão social e cultural do ouvinte, pois as 
concepções destes refletem-se no desenvolvimento das práticas pedagógicas 
para os surdos.
 
Atividade de Estudos: 
1) Relacione as perspectivas estudadas às imagens abaixo, 
justificando sua resposta.
Figura 5 - A maior ironia: bebê surdo e bebê ouvinte
Fonte: Disponível em: <http://ensinodeportuguesparasurdos.
blogspot.com.br/>. Acesso em: 13 ago. 2012. 
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 Práticas de Ensino em Deficiência Auditiva
Figura 6 – Crianças brincando 
Fonte: Disponível em: <http://ensinodeportuguesparasurdos.
blogspot.com.br/>. Acesso em: 13 ago. 2012. 
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A próxima seção ocupa-se de refletir um pouco sobre duas diferentes 
formas de constituir o sujeito surdo. Nos debruçaremos sobre a perspectiva 
cultural, quando a surdez é assumida como uma diferença particular, que não 
caracteriza incapacidade, e a visão clínica, encarada pela área da saúde como 
algo a ser corrigido, tratado, seja através do implante coclear ou de terapias 
da fala, buscando a “normalização” do sujeito surdo, aproximando-o o máximo 
possível ao sujeito ouvinte.
oLHarEs sobrE a surdEz: dEficiência E/ou 
cuLtura
Refletir sobre os aspectos propostos nessa seção não é tarefa fácil. Portanto, 
não vamos nos posicionar a favor de uma terminologia ou de outra. Apenas vamos 
tentar apresentar conceitos acerca delas e deixar para você, leitor, a tarefa de 
eleger a que mais se adequa às suas concepções acerca da surdez.
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Libras: Educação E cuLtura surda Capítulo 1 
Primeiramente vamos definir deficiência, respeitando simplesmente a 
sequência apresentada pelo título. De acordo com o Mini-Dicionário Aurélio, 
deficiência significa: 1. falta, carência; 2. insuficiência.
Após pesquisar diferentes autores que tratam sobre a surdez e diversas 
fontes na internet, podemos definir deficiência auditiva como um termo clínico, 
utilizado principalmente por profissionais da área da saúde, para indicar perda 
de audiçãoou dificuldade de ouvir e identificar sons. Qualquer problema que 
aconteça com alguma das partes do ouvido pode desencadear uma deficiência 
auditiva. A tabela abaixo demonstra a classificação dos níveis de surdez 
conforme o Decreto nº 3.298, de 20 de dezembro de 1999.
 
NÍVEIS DE SURDEZ DECIBÉIS
LEVE 25 a 40
MODERADA 41 a 55
ACENTUADA 56 a 70
SEVERA 71 a 90
PROFUNDA Acima de 91
Atividade de Estudos: 
1) Qual a sua concepção para deficiente auditivo? Justifique.
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 Práticas de Ensino em Deficiência Auditiva
Para além do olhar sobre a surdez em relação à falta de audição, existem 
linhas teóricas que observam os surdos pelo viés cultural. Tais linhas não 
negam a existência da questão da falta de audição, mas não focam nela seu 
olhar. Ao perceber cultura como um conjunto de práticas de determinado grupo, 
e acreditar que a cultura determina modos de ver, de ser, de experienciar o 
mundo (HALL, 1997), torna-se mais fácil compreender a existência da cultura 
surda não como algo hegemônico, existente a todos os surdos apenas pelo 
fato de não ouvir, mas como algo que surge da utilização de uma outra língua 
e de uma experiência visual com o mundo.
A imagem abaixo ilustra alguns dos aspectos desta cultura, quando 
mostra os surdos (ou ouvintes fluentes em sinais) em grupo, animados em sua 
conversa quando todos os demais já haviam deixado o espaço. 
Figura 7 – Espaços de cultura 
 
Fonte: Disponível em: <http://liliacamposmartins.blogspot.com.br/2012/06/
conhecendo-um-pouco-da-cultura-surda.html> Acesso em: 16 ago. 2012. 
Essa imagem, de maneira simples, mostra alguns pontos importantes: são 
poucos os surdos que vivem em ambientes em que podem utilizar a língua 
de sinais de maneira fluente, grande parte dos surdos adultos trabalha em 
espaços nos quais são os únicos surdos, se comunicando com sinais básicos, 
com a presença de intérpretes ou através da escrita. Momentos em que são 
compreendidos, em que podem conversar livremente sobre assuntos do 
cotidiano geralmente são raros, por isso o encontro com a comunidade surda 
é tão valorizado.
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Libras: Educação E cuLtura surda Capítulo 1 
Ser surdo deixa de 
ser uma deficiência 
e passa a ser uma 
cultura, uma identidade 
que o sujeito surdo 
constrói. A produção 
de identidades através 
da representação 
que pais, escola e o 
próprio sujeito surdo 
têm acerca da surdez 
constitui a cultura 
surda.
Em várias cidades há as associações, ou sociedades de surdos, que 
se constituem em muito mais do que pontos de encontro, são espaços de 
discussão, de festa, de organização política, de produção e circulação da 
língua e cultura surda. 
Ao olhar para a surdez como uma forma de cultura, também observamos 
diferentes e complexas concepções e definições, em suma, podemos afirmar 
que a surdez, sob o ponto de vista cultural, relata o surdo como um sujeito 
que constrói sua identidade cultural de maneira distinta dos sujeitos ouvintes. 
Ser surdo deixa de ser uma deficiência e passa a ser uma cultura, uma 
identidade que o sujeito surdo constrói. A produção de identidades através da 
representação que pais, escola e o próprio sujeito surdo têm acerca da surdez 
constitui a cultura surda. 
Existem grupos de surdos que lutam pela segurança, pelo respeito a 
sua cultura por verem que os surdos historicamente foram “silenciados” pela 
cultura hegemônica ouvinte, outras minorias também vêm buscando este 
reconhecimento, como grupos étnicos, homossexuais, entre outros. De modo 
geral, tivemos anos na história em que apenas o grupo de homens brancos, 
heterossexuais, europeus eram considerados sob o olhar cultural e histórico. 
Isto tem mudado ao longo dos anos, mas devido à pressão das lutas dos 
grupos pormenorizados. Gládis Perlin (2005, p 79), a primeira surda do Brasil a 
fazer mestrado, tem diferentes pesquisas sobre a cultura e identidades surdas 
e também apresenta a importância histórica da valorização destas questões:
A violência contra a cultura surda foi marcada através da 
história. Constatamos, na história, eliminação vital dos surdos, 
a proibição do uso de língua de sinais, a ridicularização da 
língua, a imposição do oralismo, a inclusão do surdo entre os 
deficientes, a inclusão dos surdos entre os ouvintes. 
Atividade de Estudos: 
1) Qual a sua concepção para cultura surda? Justifique.
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 Práticas de Ensino em Deficiência Auditiva
De acordo com Skliar (1997), existe uma grande diferença entre 
compreender a surdez como uma deficiência e entender como uma diferença. 
Nesse momento, segundo o autor, é estabelecida a linha que separa a visão 
clínica da surdez e a visão antropológica. 
Sob essa ótica, a visão clínica basicamente busca o tratamento, 
a medicalização, normalizar o sujeito surdo, diferente da concepção 
socioantropológica, que entende a surdez como uma experiência visual, uma 
maneira particular de estabelecer a realidade histórica, social e política de 
perceber o mundo.
Não há apenas uma forma de ser surdo ou de viver a surdez, há grupos 
de surdos oralizados, surdos implantados (atualmente tem se percebido 
com força o movimento clínico em relação aos implantes cocleares), e 
os surdos sinalizantes, sendo que nos referimos a estes últimos quando 
tratamos do assunto da cultura surda. Em vários espaços é possível ver a 
disputa entre esses grupos, pela busca de poder ou no sentido de dizer qual 
seria a “verdadeira” forma de ser surdo. No entanto, há certa fluidez nessas 
identidades, e existem surdos que escapam dessas “paredes” e participam de 
mais de um grupo.
O sujeito surdo sinalizante, este tido como culturalmente surdo, não 
tem dúvidas em relação à sua identidade, que se distingue culturalmente 
da identidade dos ouvintes, o surdo não se vê como deficiente, mas como 
diferente baseado na sua percepção visual, que oportuniza processos culturais 
específicos, identidades culturais diferentes.
O documentário “Som e Fúria” trata 
sobre a discussão de fazer ou não o 
implante coclear. Apresenta o olhar de 
uma família de surdos e de uma família 
de ouvintes. É bastante interessante para 
observar como existem diferentes pontos 
de vista sobre um mesmo tópico.
Assista trechos do documentário em 
http://www.youtube.com/watch?v=fhghGoIUzdw&feature=related .
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Libras: Educação E cuLtura surda Capítulo 1 
Atividade de Estudos: 
Assista o documentário “Ser é ver sentir”, disponível no link: 
http://www.youtube.com/watch?v=Ob4GCkm66EM&feature=player_embedded# ou http://culturasurda.wordpress.com/2012/07/08/
ser-e-ver-sentir/. 
1) A partir do visto e do trabalhado nesta subseção, relate o que 
você aprendeu, o que mais lhe chamou atenção e de que 
forma as visões apresentadas a respeito da surdez vão de ou 
ao encontro as concepções prévias que você possuía sobre os 
sujeitos surdos.
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Libras – a Língua brasiLEira dE sinais
A Libras é uma língua natural, surgiu de forma espontânea, da necessidade 
da comunicação entre os surdos, assim como as línguas orais. No entanto, 
somente em 2002 a língua de sinais foi oficializada como língua brasileira, 
após anos de luta da comunidade surda. Esta lei, regulamentada através do 
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 Práticas de Ensino em Deficiência Auditiva
É importante 
evidenciar que a 
perspectiva do 
bilinguismo enfatiza 
o direito dos surdos de 
serem alfabetizados/
letrados em Libras e 
considera a Língua 
Portuguesa como 
L2, ressaltando a 
importância da Língua 
Portuguesa escrita na 
vida dos surdos que 
interagem diariamente 
com um mundo ouvinte 
e escrito.
decreto 5626/2005, trouxe uma maior visibilidade para a Libras, presente hoje 
como disciplina obrigatória dos cursos de fonoaudiologia e licenciatura, sendo 
também oferecida como eletiva para outros cursos, ou em cursos de extensão. 
Tal lei também ampliou a presença de intérpretes em escolas, universidades e 
espaços públicos, qualificando a inclusão social dos surdos brasileiros.
 
Para Quadros (1997) e Karnopp (2004), a Libras é a língua materna 
dos surdos. Em vista disso, recomendam que as crianças adquiram, além 
da Libras, a escrita da língua de sinais, possibilitando ao sujeito surdo 
aprender a língua e a escrita de sua comunidade para só então iniciar 
o processo de aquisição de Língua Portuguesa como segunda língua. 
Assim, respeita-se o processo de aquisição de linguagem natural dos 
surdos. Entretanto, é curioso que a escrita da língua de sinais, com uma 
de suas propostas, o Sign Writing, não faz parte do cotidiano das escolas 
de surdos, conforme as autoras acima citadas. É importante evidenciar 
que a perspectiva do bilinguismo enfatiza o direito dos surdos de serem 
alfabetizados/letrados em Libras e considera a Língua Portuguesa como 
L2, ressaltando a importância da Língua Portuguesa escrita na vida dos 
surdos que interagem diariamente com um mundo ouvinte e escrito. 
 
Observe que, embora frequentemente tenha-se contato com surdos ou 
com a Libras, muitas vezes ocorrem alguns equívocos de entendimento sobre 
o que significa esta língua, ou como diria Quadros e Karnopp (2004), existem 
ainda alguns mitos a respeito disto:
1. As línguas de sinais não são mímicas, ou pantomimas, representando 
apenas objetos concretos, não sendo capaz de expressar questões 
abstratas. As línguas de sinais, como qualquer outra língua, estão 
sempre em construção, a todo o momento. Conforme a necessidade 
dos usuários, surgem novos verbetes no vocabulário, o que não significa 
que a língua seja pobre, mas que é uma língua viva, assim como todas 
as demais utilizadas no mundo. Este mito de que as línguas de sinais 
são icônicas pode dever-se ao fato de que alguns sinais remetem a 
objetos, mas isto não ocorre com todos os sinais. Veja nos exemplos 
abaixo que o verbo “sentar” representa dois dedos como que duas 
pernas flexionadas sobre um banco (dedos esticados), mas o adjetivo 
“legal” é um sinal convencionado, não é icônico.
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Libras: Educação E cuLtura surda Capítulo 1 
Figura 8- Sinais para “sentar” e “legal”
Fonte: Disponível em: <www.feneis.org.br/rs>. Acesso em: 13 ago. 2012. 
2. As línguas de sinais não são sistemas linguísticos universais, ou seja, 
cada país tem sua própria língua estruturada com sua própria semântica, 
sintaxe e morfologia. Todas as línguas vivas estão sempre em movimento, 
verbetes novos surgem e outros entram em desuso. Da mesma forma 
acontece com as línguas de sinais que, assim como as línguas orais, sofrem 
influência de outras línguas e possuem diferenças dialetais de região para 
região dentro de um mesmo país. No exemplo abaixo, o sinal para “mãe” 
utilizado em grande parte do nosso país, seguido do sinal “mãe” utilizado 
no Rio Grande do Sul e pelo sinal utilizado para a mesma palavra em ASL 
(Língua de sinais utilizada nos Estados Unidos):
Figura 9 - Sinal para “mãe”
Fonte: Disponível em: <www.feneis.org.br/rs>. Acesso em: 13 ago. 2012. 
3. As línguas de sinais, não possuem a mesma estrutura das línguas orais, 
ou seja, não há um sinal linearmente a cada palavra dita, o que não 
significa de forma alguma que a língua de sinais é inferior ou incompleta, 
mas somente que as frases se estruturam de outra maneira, possuem uma 
gramática, morfologia e fonologia próprias.
Para deixar mais claro, observe a diferença em relação à fonologia das 
duas línguas.
As palavras nas línguas orais são formadas por fonemas, unidades 
mínimas sonoras que não possuem significados em separado. Como na 
palavra “tóxico”, que é formada pelos fonemas /t/ó/k/s/i/c/o.
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 Práticas de Ensino em Deficiência Auditiva
São muitas as 
diferenças entre 
língua e linguagem, é 
importante enfatizar 
que a LIBRAS não é 
uma linguagem e sim 
uma língua constituída 
e estruturada.
Nas línguas de sinais, pesquisas (QUADROS & KARNOPP, 2004) também 
assinalam a presença de unidades mínimas da língua, ou seja, fonemas da 
língua de sinais que não possuem a questão sonora como central, mas a 
questão visual. Essas unidades mínimas seriam as configurações de mão, 
movimento, locação, orientação de mão e as expressões não manuais. 
Não aprofundaremos aqui essas questões 
linguísticas da Língua de sinais, pois seriam 
várias questões a tratar, e o objetivo desta 
unidade é “dar uma notícia” sobre o que seria a 
Libras. A quem interessar, recomendamos a obra: 
QUADROS, Ronice Müller de; KARNOPP, 
Lodenir Becker. Língua de sinais brasileira: 
estudos lingüísticos. Porto Alegre : Artmed, 2004. 
Quadro 1 – Língua oral e língua de sinais
LÍNGUA ORAL LÍNGUA DE SINAIS
MODALIDADE ORAL-AUDITIVA ESPAÇO-VISUAL
VARIAÇÃO LINGUÍSTICA SIM SIM
ESTRUTURA SEMÂNTICA SIM SIM
ESTRUTURA MORFOLÓGICA SIM SIM
Fonte: As autoras. 
Observe a citação seguinte, pois permite uma definição mais completa da 
LIBRAS:
[...] a LIBRAS é a língua materna dos surdos brasileiros 
e, como tal, poderá ser aprendida por qualquer pessoa 
interessada pela comunicação com essa comunidade. 
Como língua, esta é composta de todos os componentes 
pertinentes às línguas orais, como gramática, semântica, 
pragmática, sintaxe e outros elementos, preenchendo, 
assim, os requisitos científicos para ser considerada 
instrumento linguístico de poder e força. Possui todos os 
elementos classificatórios identificáveis de uma língua e 
demanda de prática para seu aprendizado, como qualquer 
outra língua (cfe. siteda FENEIS). 
São muitas as diferenças entre língua e linguagem, é importante enfatizar 
que a LIBRAS não é uma linguagem e sim uma língua constituída e estruturada. 
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Libras: Educação E cuLtura surda Capítulo 1 
Ressaltamos a necessidade de as crianças surdas dominarem primeiramente 
sua língua materna, a LIBRAS, pois esta é a língua que o surdo é capaz de adquirir 
de forma natural e espontânea, utilizando o meio espaço-visual.
Abaixo, o alfabeto da LIBRAS que, vale lembrar, não é a base da língua, 
esta é constituída de sinais. O alfabeto é utilizado para nomes próprios que 
ainda não possuem sinais ou quando alguma palavra não é conhecida pelo 
usuário da LIBRAS, normalmente um usuário ouvinte. 
Existem alguns dicionários de libras on-line que podem ser 
úteis, mas sugerimos que caso queira se aprofundar nesta área 
busque cursos específicos de língua de sinais, pois como qualquer 
língua é preciso estudo e tempo para a aprender, várias escolas de 
surdos disponibilizam cursos, mas a título de curiosidade segue 
abaixo alguns links:
http://www.faders.rs.gov.br/portal/uploads/Dicionario_Libras_CAS_
FADERS1.pdf
http://www.acessobrasil.org.br/libras/
a) Alfabeto Libras
Figura 10 - Alfabeto Libras
Fonte: Disponível em: <http://www.imdc.com.br/
projetos/libras>. Acesso em: 13 ago. 2012. 
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 Práticas de Ensino em Deficiência Auditiva
É preciso respeitar o aluno surdo e suas peculiaridades. Primeiramente, 
o aluno deve aprender sua língua materna, ao educar, em LIBRAS. Além 
de respeitar esse aluno, estaremos proporcionando um ensino de melhor 
qualidade, mas é preciso também compreender que o processo educacional 
deve ser estruturado com o apoio da família da criança surda.
Fernandes (1990) ressalta que não é suficiente apenas incluir LIBRAS 
e Língua Portuguesa na sala de aula, é preciso, antes de tudo, repensar a 
educação de surdos com a contribuição efetiva de educadores surdos. 
b) Crianças surdas desenvolvendo a linguagem
O desenvolvimento da linguagem, da mesma forma para surdos e 
ouvintes, significa desenvolver habilidades que permitem a comunicação, a 
interação familiar e social. 
Autores como Saussure, Chomsky, Vygotsky e outros refletem sobre 
processos da língua e da linguagem, abordando processos psicológicos, 
comportamentais, sociais etc. Nesta seção, sem desmerecer tais estudiosos, 
vamos focar na linguagem enquanto objeto de desenvolvimento para a criança 
surda. Podemos compreender, dessa forma, que nos encontramos frente a 
uma definição de linguagem cuja ênfase se encontra em uma visão da criança 
como um ser com a capacidade de produção e interação que evolui nas trocas 
do cotidiano. Portanto, o desenvolvimento da linguagem das crianças tem 
como base a relação social estabelecida com a família.
Atividade de Estudos: 
1) Em uma família de ouvintes, como acontece a comunicação 
com uma criança surda? 
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Libras: Educação E cuLtura surda Capítulo 1 
Através da linguagem 
e da interação com 
o outro, a criança 
aprende valores 
e constrói sua 
identidade.
Infelizmente, ainda hoje se verifica que as crianças chegam à escola com 
uma linguagem gestual “caseira”, ou seja, atingem a idade escolar sem ter 
desenvolvido uma linguagem apropriada e aprendem a que deveria ser sua 
língua materna na escola.
Considerando que o desenvolvimento de linguagem das crianças é 
dependente das relações sociais construídas no meio familiar, o contato com 
a linguagem se dá através do adulto, que por suas ações, suas significações, 
dará suporte para que a criança se constitua enquanto sujeito. Através da 
linguagem e da interação com o outro, a criança aprende valores e constrói 
sua identidade. 
A linguagem, para o surdo, também se constitui pela aquisição espontânea 
da sua língua materna, ampliando sua concepção de mundo. 
Figura 11- A importância da família
Fonte: Disponível em: <http://colorir-desenho.com/desenhos-
sobre-familia-para-colorir>. Acesso em: 13 ago. 2012. 
A família deve aprender Libras, pois as interações do cotidiano 
irão permitir que a criança adquira valores, desenvolva efetivamente 
aspectos cognitivos, emocionais, culturais, além da comunicação. 
Vale lembrar que a criança ouvinte tem estímulos desde a 
gestação, quando a mãe acaricia a barriga e “conversa” com seu 
bebê. Da mesma forma a mãe da criança surda deve interagir com 
seu filho desde muito cedo, através de um gesto, um sorriso ou um 
olhar. A família deve investir na aprendizagem da língua de sinais 
para que a comunicação ocorra desde muito cedo, assim como, 
deve incentivar a criança a participar da comunidade surda.
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 Práticas de Ensino em Deficiência Auditiva
Atualmente, existe o teste da orelhinha, que permite diagnosticar a surdez 
nos primeiros dias de vida. Quando há um caso de surdez na família, a família 
deverá se reorganizar e se preparar para proporcionar um desenvolvimento 
linguístico adequado para seu filho. 
De acordo com Didó (2009), as pesquisas de Petitto e 
Marantette (1991 apud Quadros, 1997) mostram que o processo 
de aquisição da língua de sinais é igual ao processo de aquisição 
de línguas oroauditivas, respeitando a maturidade da criança. Para 
os pesquisadores, a aquisição da linguagem ocorre em etapas. 
Observe as fases do desenvolvimento linguístico da criança surda:
Primeira fase: aproximadamente aos três meses de idade, 
no qual as crianças surdas (assim como as ouvintes) balbuciam 
e produzem gestos que se assemelham aos sinais, são apenas 
movimentos com as mãos.
Segunda fase: a criança surda começa a dar nomes para as 
coisas, por volta dos dois anos de idade usa os pronomes de forma 
inconsistente, aprende a unir o sinal ao objeto, formando suas 
primeiras palavras. Assim como as crianças ouvintes, as crianças 
surdas não fazem corretamente os sinais, podendo trocar o ponto 
de articulação ou a configuração das mãos, mas o adulto a entende. 
Nessa fase são produzidos dois tipos de sinais, os pronomes e 
os sinais congelados. Em relação aos pronomes, a partir dos dez 
meses de idade a criança surda pode apontar para si e para os 
outros. No entanto, no período dos 12 aos 18 meses ela para de 
apontar, recomeçando esta ação entre dois e três anos. Acredita-se 
que a partir desse momento a criança utiliza os pronomes de forma 
consciente. Costuma-se afirmar que nessa fase a criança utiliza 
sinais congelados porque usa os mesmos sinais dos adultos, mas 
não utiliza a flexão de número ou concordância verbal.
Terceira fase: as crianças usam os mesmos sinais dos 
adultos, mas não usam a flexão de número ou concordância verbal. 
Nessa etapa, elas iniciam o uso de frase de duas palavras. A partir 
disso, podemos observar que a natureza humana demonstra 
ser imprescindível a aquisição da língua nas fases naturais 
da maturação. Após a fase do balbucio, a criança está apta a 
desenvolver sua língua materna, mas, para tanto, é necessário 
estar exposta a ela. 
 
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Libras: Educação E cuLtura surda Capítulo 1 
A descoberta da 
surdez, inicialmente, 
desestabiliza a família, 
mas são necessários 
reação e envolvimento 
familiar para que a 
criança surda supere 
sentimentos como 
culpa, preconceito, 
insegurança, 
ansiedade e direcione 
esforçosem busca 
de uma educação 
adequada para 
seu filho.
O contato da criança surda com a língua de sinais depende, principalmente, 
do envolvimento da família em direção ao aprendizado da língua materna 
de seu filho. Primeiramente, os pais ou responsáveis devem se apropriar da 
língua de sinais e, aos poucos, amigos e demais familiares devem dominá-la 
também, oportunizando o pleno desenvolvimento da criança. 
Você, seu círculo de amigos ou algum membro da sua família 
sabe Libras?
A família é considerada como nosso porto seguro, é na família que 
compartilhamos alegrias e tristezas. Dos pais, espera-se que sejam fortes, 
superem e se posicionem de forma positiva diante da surdez de seu 
filho, além de aceitar, entender e conviver com dúvidas, preconceitos e 
sentimentos dos mais diversos referentes a si mesmos e a seu filho com 
pouca ou nenhuma orientação. 
A descoberta da surdez, inicialmente, desestabiliza a família, mas são 
necessários reação e envolvimento familiar para que a criança surda supere 
sentimentos como culpa, preconceito, insegurança, ansiedade e direcione 
esforços em busca de uma educação adequada para seu filho. 
 
Figura 12 - A descoberta da surdez
Fonte: Disponível em: <http://www.sempretops.com>. Acesso em: 15 ago. 2012. 
Segundo Didó (2009), ao refletir sobre os estudos de Skliar (1997), as 
interações entre pais e filhos surdos e pais e filhos ouvintes são parecidas 
e permitem que a criança tenha contato com a cultura e a comunidade à 
qual pertencem. O mesmo não acontece no caso de pais ouvintes e filhos 
surdos. Conforme Skliar (1997), a partir do momento em que a família 
diagnostica a surdez, as relações comunicativas podem mudar. O autor alerta 
32
 Práticas de Ensino em Deficiência Auditiva
para a necessidade de a família entrar em contato com a comunidade surda, 
oportunizando a interação entre crianças e adultos surdos, contando com um 
atendimento que assuma o bilinguismo.
A família é a fonte de desenvolvimento, a referência da criança. Envolver 
amigos e demais familiares no processo educacional do surdo facilita as 
relações internas e sociais, oportunizando conhecimento, integração e 
principalmente, permitindo que o surdo desenvolva-se com autonomia e 
competência na sociedade na qual está inserido.
o sujEito surdo E o biLinguismo
A educação do sujeito surdo já tem aproximadamente dois séculos de 
discussões, embates e pesquisas. Embora tenha ultrapassado o enfoque 
dado pela concepção oralista e pela comunicação total, processos que não 
obtiveram sucesso pleno do desenvolvimento do surdo, alfabetizar/letrar 
estudantes surdos ainda é um desafio para muitas escolas e educadores.
O bilinguismo, concepção atual aceita pela comunidade surda, utilizada 
por escolas e educadores, objetiva capacitar o sujeito surdo a utilizar duas 
línguas: a língua de sinais e a língua escrita, no caso de surdos brasileiros, a 
Libras e a Língua Portuguesa escrita. As práticas educacionais precisam de 
condições especiais para serem utilizadas, porém, nem sempre as escolas 
dispõem desses recursos. 
A escola de surdos parece estar sempre em transição, sempre buscando 
estratégias, metodologias, currículos, concepções, enfim, todo tipo de 
adequações, com uma única finalidade: a educação de alunos surdos de modo 
efetivo e competente.
Como destacado anteriormente, a terceira etapa no processo de educação 
dos surdos é identificada como bilinguismo, cuja perspectiva compreende 
basicamente que o surdo precisa adquirir a língua de sinais como língua 
materna - L1, e, a seguir, a língua escrita oficial de seu país como L2. De 
acordo com esta visão, Libras e a Língua Portuguesa são indispensáveis para 
a inserção dos alunos surdos brasileiros na sociedade.
De acordo com Quadros (1997), o bilinguismo é uma proposta de ensino 
utilizada pelas escolas com o objetivo de permitir às crianças contato com duas 
línguas no contexto escolar: a Língua Portuguesa e a Libras. Considerando 
sempre que a Libras é a língua materna do surdo, portanto, o sujeito surdo 
deve ser letrado primeiro na língua de sinais. 
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Libras: Educação E cuLtura surda Capítulo 1 
Figura 13 - Sinais Icônicos
Fonte: Disponível em: <http://alfabetizarlibras.blogspot.com/p/alfabetizacao-
e-letramento-em-libras.html>. Acesso em: 15 ago. 2012. 
De acordo com Didó (2009), a autora ainda destaca dois aspectos 
importantes a serem respeitados: o primeiro refere-se à cultura em que a 
criança está inserida, pois a comunidade surda possui também uma cultura 
própria. Em segundo lugar, a proposta precisa ser mais que bilíngue, 
precisa ser bilíngue e bicultural, pois o surdo está inserido em mais de uma 
cultura, a surda e a ouvinte. É, portanto, um sujeito bicultural e, como tal, 
simultaneamente exposto a ambas as culturas. Não podemos desconsiderar 
a existência da cultura surda, pois, segundo Sanchez (1993 apud QUADROS, 
1997, p. 36), “os surdos fazem parte de uma comunidade minoritária, com 
valores, cultura e língua natural próprios”. É necessário que utilizemos a Libras 
como referência nos processos de ensino e de aprendizagem, visto que é uma 
importante ferramenta para a comunicação e uma língua completa que o surdo 
deve aprender desde muito cedo, a fim de facilitar a comunicação e o seu 
desenvolvimento em muitos aspectos. 
Figura 14 - Bilinguismo
Fonte: Disponível em: <http://www.ufsm.br/edu.especial.pos/
unidadeB_seminario.html>. Acesso em: 16 ago. 2012. 
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 Práticas de Ensino em Deficiência Auditiva
Compreender a surdez 
como uma experiência 
visual e não como 
uma deficiência requer 
entender a língua 
que se constitui na 
comunidade surda, na 
experiência surda nas 
escolas, sociedades e 
demais ambientes de 
interação surda.
Escolher uma proposta bilíngue é reconhecer uma educação em que o 
surdo, além de possuir uma língua própria, possui uma língua com cultura 
própria traduzida visualmente. Compreender a surdez como uma experiência 
visual e não como uma deficiência requer entender a língua que se constitui 
na comunidade surda, na experiência surda nas escolas, sociedades e demais 
ambientes de interação surda. 
 
Segundo Vygotsky (2000), a criança adquire a linguagem de fora pra 
dentro, através da interação com o outro e com a cultura que o cerca, 
e a linguagem não exerce apenas a função comunicativa, constitui 
pensamentos, pois também permite ao sujeito interagir com e refletir sobre 
as ideias de sua comunidade. 
Figura 15 - Interação
Fonte: Disponível em: <http://profamilcarbernardi.
blogspot.com>. Acesso em: 16 ago. 2012. 
Através do bilinguismo, o surdo conseguirá interpretar o mundo ao seu 
redor, atuando como sujeito responsável pelo seu entendimento. Estas 
concepções permitem compreender que respeitar a individualidade do aluno e 
suas diferenças é importante em qualquer contexto. Para que haja qualidade 
no aprendizado, é fundamental que o aluno surdo seja alfabetizado/letrado na 
sua língua materna, para, posteriormente, reconhecer a Língua Portuguesa 
escrita como segunda língua. Esse é, certamente, um processo que requer 
a presença de profissionais com qualificação adequada e a constante 
preocupação de preservar e respeitar as diferenças das línguas envolvidas. 
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Libras: Educação E cuLtura surda Capítulo 1 
Atividade de Estudos: 
1) Qual sua representação sobre o surdo e a surdez?
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aLgumas considEraçõEs
Na medida do possível escolhemos textos que pudessem ser encontrados 
online, visando facilitar a busca por conhecimentos mais aprofundados. 
Enfatizamos que a qualidade da disciplina e do conhecimento adquirido ao 
longo do semestre, dependerá muito de você, caro aluno.
Baseado em nossa leitura até agora, você consegue organizar um plano 
de aula para uma classe de alunos surdos, ou uma classe que tenha um aluno 
surdo incluído? O próximo capítulo irá provocá-lo a pensar sobre questões 
mais práticas, oportunizando reflexões a cerca das abordagens utilizadas no 
processo de ensino e aprendizagem de alunos surdos.
36
 Práticas de Ensino em Deficiência Auditiva
rEfErências:
DIDÓ, Análise de atividades em língua portuguesa/libras desenvolvidas 
com crianças surdas no ensino fundamental (Trabalho de Conclusão) 
Letras-Universidade do Vale dos Sinos, 2009.
HALL, Stuart. A centralidade da cultura: notas sobre as revoluções de nosso 
tempo. Porto Alegre: Educação & Realidade, v.22, n.2, 1997.
LOPES, Maura Corcini. A natureza educável do surdo: a normalização surda 
no espaço da escola de surdos. Cadernos de Educação- UFPEL. Pelotas, 
ano 19, n.36, mai-ago. 2010.
PERLIN, Gládis. O lugar da cultura surda. In.: THOMA, Adriana da Silva; 
LOPES, Maura Corcini (orgs.). A invenção da surdez: cultura, alteridade, 
identidade e diferença no campo da educação. Santa Cruz do Sul: 
EDUNISC, 2004.
POKORSKI, Juliana de Oliveira. Minha vida duas línguas: um estudo 
sobre as experiências de surdos com a escrita acadêmica no Programa de 
Pós-Graduação em Educação/UFRGS. Porto Alegre: 2010. 33f. Trabalho 
de Conclusão de Curso – Curso de Pedagogia, Faculdade de Educação, 
Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: 2010. Disponível 
em: <http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/25213/000752520.
pdf?sequence=1>. Acesso em: 13 ago. 2012.
_____. O Movimento surdo na internet: os discursos circulantes no 
YouTube. Porto Alegre, 2011. 37f. Trabalho de Conclusão de Especialização 
– Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Faculdade de Educação. Pós 
Graduação em Educação – Lato sensu, Porto Alegre, 2011.
QUADROS, R. M. de. Educação de surdos: a aquisição da linguagem. Porto 
Alegre: Artmed, 1997.
QUADROS, Ronice Müller de; KARNOPP, Lodenir Becker. Língua de 
sinais brasileira: estudos linguísticos. Porto Alegre: Artmed, 2004. 
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SKLIAR, C. Um olhar sobre o nosso olhar acerca da surdez e das diferenças. 
In: SKLIAR, C. A surdez: um olhar sobre as diferenças. Porto Alegre: Editora 
Mediação, p. 7-32, 1997.
37
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STROBEL, Karin Lílian. A visão histórica da in(ex)clusão dos surdos nas 
escolas. ETD – Educação Temática Digital. Campinas, v.7, n.2, p.244-252, 
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THOMA, Adriana da Silva; KLEIN, Madalena. Experiências educacionais, 
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de surdos no Brasil. Cadernos de Educação- UFPEL. Pelotas, ano 19, n.36. 
Disponível em: <http://www.ufpel.edu.br/fae/caduc/downloads/n36/05.pdf>. 
Acesso em: 15 ago. 2012.
VIEIRA-MACHADO, Lucyenne Matos da Costa. Formação de professores 
de surdos: dispositivos para garantir práticas discursivas. Cadernos de 
Educação- UFPEL. Pelotas, ano 19, n.36, mai-ago.2010. Disponível em: 
<http://www.ufpel.edu.br/fae/caduc/downloads/n36/02.pdf>. Acesso em: 17 
ago. 2012.
VYGOTSKY, L. S. A construção do pensamento e da linguagem. São 
Paulo: Martins Fontes, 2000.
38
 Práticas de Ensino em Deficiência Auditiva

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