Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Toxicologia I Metais tóxicos: Mercúrio O mercúrio metálico é um metal inodoro, líquido à temperatura ambiente e de cor prateada. O vapor de Mercúrio (Hg0) é muito mais perigoso que a forma metálica (líquida). É capaz de se ligar a outros elementos, como cloro, enxofre ou oxigênio, para formar sais inorgânicos mercurosos (Hg1+) ou mercúricos (Hg2+). Pode formar compostos orgânicos estáveis quando ligado a um ou dois átomos de carbono, sendo o metilmercúrico (CH3Hg +) o mais importante toxicologicamente. As características toxicocinéticas e os efeitos tóxicos dos compostos de mercúrio sobre a saúde variam dependendo do estado de oxidação e espécie orgânica associada. FONTES DE EMISSÃO E TRANSFORMAÇÕES NO AMBIENTE O mercúrio na forma de vapor (Hg0) presente na atmosfera é derivado tanto de fontes naturais (desgaseificação da crosta terrestre através de erupções vulcânicas e evaporação de oceanos e solos) quanto de fontes antropogênicas, que contribuem de forma significativa. O vapor de mercúrio atua com gás nono atômico quimicamente estável e permanece na atmosfera por cerca de 1 ano, se distribuindo globalmente a partir de suas fontes de emissão. Ocasionalmente, sofre oxidação a mercúrio mercúrico (Hg2+), a forma inorgânica solúvel em água, que retorna à superfície da terra com a água da chuva. Uma vez oxidado à forma mercúrica, o metal pode ser transformado por duas maneiras: redução, onde o vapor de mercúrio retorna para a atmosfera, ou metilação por microorganismos nos sedimentos de água doce ou salgada, formando o metilmercúrio. O metilmercúrio entra e se acumula na cadeia alimentar aquática, afetando plânctons, peixes herbívoros e carnívoros e mamíferos marinhos, que estão no topo da cadeia alimentar aquática. Os níveis de mercúrio nos tecidos são de 1800 a 18000 vezes maiores nesses mamíferos que na água circundante. FONTES DE EXPOSIÇÃO HUMANA Os humanos são expostos através dos alimentos da dieta, principalmente o metilmercúrio presente em peixes, que se acumula nos tecidos adiposos. O cozimento não reduz o conteúdo de mercúrio. Outros compostos inorgânicos presentes nos alimentos em quantidades muito pequenas tem pouca importância sob o ponto de vista toxicológico. O mercúrio pode ainda estar presente na atmosfera e na água de consumo humano em níveis baixos que não são importantes fontes de exposição da população em geral. O composto pode também ser usado na odontologia, no uso de amalgama (mercúrio + prata + limalha de ferro) na restauração de dentes. A exposição ocupacional, principalmente por inalação de vapor de mercúrio, acontece nas industrias de cloro-alcali, na fabricação de lâmpadas a vapor de mercúrio e dispositivos de controle elétrico (interruptores de corrente e termostatos automáticos) e na fabricação de instrumentos científicos de precisão (termômetros, nanômetros e barômetros). Em países em desenvolvimento, a extração de outro e prata também é uma fonte de exposição, por meio de amalgama com mercúrio utilizado para separar o ouro ou a prata de seus minérios, posterior aquecimento da amalgama para retirada do mercúrio e liberação de grande quantidade na atmosfera. O mercúrio já foi também utilizado na medicina por muito tempo como diurético, antisséptico, laxante e outros usos, sendo substituído posteriormente por outros fármacos menos tóxicos. Há também casos de exposição ambiental acidental, como em Minamata, no Japão, e no Iraque. TOXICOCINÉTICA O mercúrio liquido, como o liberado de termômetro quebrado, é absorvido pobremente no TGI (0,01%), não é biologicamente reativo e possui pouca ou nenhuma consequência toxicológica. O vapor de mercúrio, porém, tem pronta absorção os pulmões (cerca de 80%), alcançando a corrente sanguínea, tem ampla distribuição no organismo, atuando como um gás mono atômico altamente difusível através das membranas celulares. Nas células (eritrócitos e diversos tecidos), ocorre oxidação a mercúrio mercúrico por catalase. Uma expressiva porção do vapor de mercúrio atravessa a barreira hematoencefálica e placenta sem sofrer oxidação nos eritrócitos, por isso exerce maior neurotoxicidade e toxicidade no desenvolvimento do feto que os sais orgânicos (que atravessam as membranas mais lentamente). Após a oxidação, seu comportamento é semelhante ao mercúrio inorgânico. Sua excreção pelos pulmões se dá na forma de vapor de mercúrio (10%) no prazo de 1 semana após a exposição, enquanto que a maior porção é convertida em mercúrio inorgânico e eliminado principalmente na urina e fezes, possuindo meia vida de 1 a 2 meses. O mercúrio inorgânico, após a ingestão, tem pobre absorção no TGI (de 7 a 15%) e uma pequena porção é reduzida nos tecidos a vapor de mercúrio e exalada. As mais altas concentrações estão presentes nos rins (principal órgão alvo). A captação (transporte ativo) renal dos sais de mercúrio acontecem por duas vias: conjugado com o enxofre em grupamento tiol de resíduos de cisteína (cis-S-Hg-S-cis), mimetizando a metionina e usando transportador de aminoácido neutro, ou ainda por transportador de ânion orgânico. Os sais de mercúrio inorgânico atravessam com mais dificuldade a barreira hematoencefálica ou placenta, e são excretados principalmente pela urina e fezes, possuindo tempo de meia vida de cerca de 2 meses. O metilmercúrio é eficientemente absorvido no TGI (95%) através da ingestão de peixes. É distribuído por todos os teci- dos do organismo em cerca de 30h, sendo 10% distribuído para o cérebro e 5% permanecendo no sangue, em concentração nos eritrócitos 20x maior que no plasma. Ele liga-se a moléculas contendo tiol, como em cisteína, mimetizando a metionina para poder atravessar a barreira hematoencefálica e placenta, através de transportador de aminoácido neutro. Pode também se acumular no cabelo em concentração cerca de 250x maior que no sangue, o que pode ser usado como indicador biológico de exposição. Além disso, o composto sofre circulação enterohepática, sendo vagarosamente biotransformado a mercúrio inorgânico pela microflora do intestino. Sua excreção ocorre principalmente nas fezes (90%), mas também pode ser visto na urina (<10%). Possui tempo de meia vida de 45 a 70 dias. TOXICIDADE O mecanismo básico de ação do mercúrio é devido a alta afinidade do mercúrio mercúrico com grupos sulfidrila (-SH) de proteínas nas células, produzindo danos celulares não específicos e até mesmo morte celular. Na intoxicação aguda por concentrações extremamente altas de vapor de mercúrio, pode haver ação irritante (cáustica), levando a bronquite e pneumonite, podendo ser fatal ou não, acompanhada de efeitos sobre o sistema nervoso central, com excitabilidade aumentada ou tremores. Na intoxicação crônica, também chama de micromercurialismo, há efeitos mais importantes sobre o SNC. Inicialmente, aparecem sinais e sintomas não específicos, como neurastenia (condição mental caracterizada por astenia física e mental) e pelo menos mais três dos seguintes sinais e sintomas: tremor, aumento da tireoide e da captação de iodo radioativo, pulso instável, taquicardia, dermografismo, gengivite, alterações hematológicas ou aumento da excreção urinaria de mercúrio. Se a exposição progride, sinais e sintomas mais característicos começam a ser observados, como tremores em músculos altamente inervados (dedos, pálpebras e lábios), seguido de tremor generalizado e espasmos crônicos violentos nas extremidades, alterações da personalidade e no comportamento, perda de memoria, excitabilidade aumentada, depressão, delírio e alucinações, além de salivação excessiva e gengivite. Historicamente reconhecida como principal manifestação da intoxicação crônica ao mercúrio, a tríade (eretismo, tremores e gengivite) ocorre devido a inalação de vapor de mercúrio ou exposição a nitrato de mercúrio em industrias de chapéu, feltro e peles. Na intoxicação por mercúrio inorgânico, o composto mais estudadoé o cloreto de mercúrio (HgCl2). Na intoxicação aguda após ingestão acidental, há dor abdominal intensa, diarreia sanguinolenta e supressão da urina, ulceração, hemorragia e necrose no TGI, usualmente acompanhados de choque e colapso circulatório. Se o paciente sobreviver ao dano gastrointestinal, pode sofrer de insuficiência renal em 24h, devido à necrose do epitélio tubular proximal (oligúria, anúria e uremia), e deve ser mantido por diálise até a regeneração das lesões das células tubulares renais. Enquanto que na intoxicação crônica por baixas doses de sais mercúricos ou vapor de mercúrio, causa doença glomerular imunológica, com manifestação de proteinúria reversível, se interrompida a exposição. Sais mercurosos são menos tóxicos que os sais mecúricos, sendo usados até como diuréticos (como é o caso do coleto mercuroso Hg2Cl2). Já a forma de metilmercúrio, em situação de exposição humana ambiental, é a forma mais importante devido sua toxicidade e feitos sobre a saúde. Na Baia de Minamata, no Japão, entre 1953 e 1956, houveram casos de intoxicação acidental em uma comunidade de pescadores devido ao consumo de peixes contaminados com organomercuriais produzidos por bactérias a partir de despejos industriais contendo cloreto e óxido de mercúrio. Foram mais de 200 mortes, centenas de casos de invalidez, abortos e crianças com deficiências físicas e mentais. No Iraque, entre 1971 e 1972, relata-se 6 mil casos de intoxicação e 500 mortes por consumo de pães contaminados com organomercuriais advindos da desinfecção das semestres de trigo,.. Em humanos, nessas circunstancias de exposição, observa-se efeitos neurotóxicos em adultos e comprometimento do desenvolvimento cerebral de fetos de mães expostas durante a gravidez. As manifestações clinicas agudas dos efeitos neurotóxicos incluem parestesia, com sensação de dormência e formigamento ao redor da boca, lábios e extremidades, especialmente mãos e pés, ataxia, com passo desajeitado e tropeços, além de dificuldade ao engolir e articular palavras, neurastenia com fadiga e fraqueza generalizada e dificuldade de concentrar-se, visão e audição diminuídas, tremor, convulsões e, por fim, coma e morte. TRATAMENTO A terapia é feita com o proposito de diminuir a concentração de mercúrio nos sítios alvo de ação. Em intoxicações por compostos inorgânicos, em casos graves com insuficiência renal aguda, é recomendada hemodiálose associada à infusão de agentes quelantes. E em casos menos graves, quelação com BAL. Em intoxicação por organomercuriais, o uso de quelantes não tem utilidade, e a reabsorção no intestino e circulação entero-hepática deve ser interrompida pela administração oral de resina tiol não absorvível, que se liga ao mercúrio e aumenta sua excreção nas fezes. AVALIAÇÃO E CONTROLE DA EXPOSIÇÃO OCUPACIONAL Com objetivo de prevenir intoxicações, é feito o monitoramento ambiental, definindo-se limites de tolerância, e monitoramento biológico, por determinação qualitativa e quantitativa de mercúrio no sangue ou urina.
Compartilhar