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Curso de Pós-Graduação Lato Sensu a Distância Psicopedagogia Aprendizagem e Autoria Autor: Luciano Ferraz Servantes EAD – Educação a Distância Parceria Universidade Católica Dom Bosco e Portal Educação 2 www.eunapos.com.br SUMÁRIO INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 03 UNIDADE 1 – TEORIAS DA APRENDIZAGEM: CONCEPÇÕES E REPRESENTANTES .......................................................................................... 05 1.1 Paradigma Comportamental .............................................................................. 07 1.2 Paradigma Cognitivista...................................................................................... 13 1.3 Paradigma Humanista ....................................................................................... 18 UNIDADE 2 – O QUE SE APRENDE E COMO SE APRENDE .............................. 23 2.1 Relação entre informação, conhecimento e saber ............................................ 24 2.2 Aprendizagem e gestão do conhecimento ........................................................ 26 2.3 Capacidades, habilidades e estilos de aprendizagem ....................................... 29 UNIDADE 3 – CONCEITO DE APRENDER E DE SUJEITO AUTOR .................... 37 3.1 Aprendentes são muitos, autores nem sempre ................................................. 37 3.2 Modalidade de Aprendizagem e Ensinagem ..................................................... 39 UNIDADE 4 –METACOGNIÇÃO: APRENDER E ENSINAR .................................. 53 4.1 A autoria de pensamento e a autonomia da aprendizagem ............................. 53 4.2 Significado e estratégias metacognitivas .......................................................... 58 4.3 Dificuldades e/ou problemas de aprendizagem ................................................. 68 3 www.eunapos.com.br INTRODUÇÃO Neste módulo estaremos dialogando com o desenvolvimento da aprendizagem, seus percursos teóricos, as concepções e os paradigmas que norteiam esse comportamento inerentemente humano, pois todo ser humano é capaz de aprender e de desenvolver aprendizagens novas. Basta que você pare um momento e dialogue com suas experiências de vida e perceberá que está em constante aprendizado. Nesse sentido, é importante também que percebamos como aprendemos, qual é ou quais são os mecanimos cerebrais que movimentam nossas capacidades, habilidades e potencialidades de aprendizagem, então, o que e como se aprende? Ao nos colocarmos diante de algo que conhecemos, temos a possibilidade de explicar determinadas situações, condições e até fenômenos e, é nesse momento que nos tornamos autores, pois somos capazes de ir além do aprendido; somos capazes de gerar novas teorias e novas aprendizagens; somos capazes de organizar novos conhecimentos e gerar novos diálogos sobre a aprendizagem – assim, somos autores. Mas, esse processo implica: uma identidade: a do aprendiz; um método: individual e único; uma modalidade: pessoal e autodesenvolvida; uma certa liberdade de ações e de trocas: supranecessárias com o ensinante e com o conhecimento. Caso não haja essas implicações, temos um aprendiz, mas não autor. Em outras palavras, o aprendiz autor requer um ensinante, requer uma modalidade de aprendizagem e uma independência – ensinada e dirigida – para o aprender e, um desenvolvimento próprio – e responsável – para se tornar autor. Por isso a aprendizagem tem que ser significativa, no sentido de seu desenvolvimento, dentro e fora da sala de aula; no sentido da “provocação”. Ora, é preciso lembrar que a curiosidade é um movimento no sentido da aprendizagem, do conhecimento. Um aluno que é “provocado” no sentido de sua curiosidade, é um aluno que se dispõe a aprender. Aliás, você conhece alguém que não seja curioso? Alguém que quando criança não olhou pelo buraco da fechadura? Ou, ficou atrás da 4 www.eunapos.com.br porta para ouvir uma conversa entre adultos? Ou, ainda, que não passou pela fase dos porquês? Se parar para pensar descobrirá que todos nós somos curiosos e, isso, não é um comportamento anormal ou patológico, pois nossa curiosidade nos move a aprender constantemente, porque o conhecimento é infinito e, a aprendizagem também. Talvez, alguns professores tenham se esquecido dessa condição natural de todo ser humano, porque ensinam esperando que seus alunos aprendam pelo modo como ele – o professor – entende e esquece que seus alunos já possuem um modo de entender as coisas que os rodeiam, só não entendem o processo do desenvolvimento das mesmas porque seu modo de entender (interpretar a realidade) é imediato – por isso chamamos esse conhecimento de senso comum. Desse modo, o professor é um agente de transformação e um mediador da aprendizagem do aluno, sendo o responsável por desenvolver no aluno sua metacognição, ou seja, a condição de o aluno compreender-se como aprendiz capaz de lidar com seus progressos e dificuldades ante a aprendizagem – do senso comum ao conhecimento sistematizado (escolar). Mas, esse tema nos aprofundaremos mais adiante. Provoco, então, a todos adentrarem as unidades seguintes com bastante curiosidade e que nosso diálogo com a aprendizagem e a autoria nos permita crescer mais, e que ao final desse módulo sejamos mais aprendizes autores. 5 www.eunapos.com.br UNIDADE 1 – TEORIAS DA APRENDIZAGEM: CONCEPÇÕES E REPRESENTANTES As teorias da aprendizagem são muitas e todas elas possuem, em seu bojo, um modo muito peculiar ou, até mesmo, particular de apropriar-se do desenvolvimento da aprendizagem como um processo numa “via de mão única”. Porém, consegui observar nesses meus poucos anos como ensinante que há algumas teorias da aprendizagem que refletem práticas, ações e condutas – seja na escola ou fora dela. Para fazer nossas reflexões e diálogos possíveis com tais teorias estarei adotando como base as análises de Portilho, pois ao mesmo tempo em que esta autora trata, com muita pertinência, desse estudo, promove a reflexão, também pertinente, sobre tais teorias de modo leve e atual, crendo-se podermos aliar mais estudos e exemplos de modo que nossa incursão por este estudo não seja árido e cansativo. Pois, segundo Portilho, (2009, p.15): No processo de aprendizagem, encontramos diferentes concepções e teorias que evidenciam os valores e as crenças que norteiam a maneira de ser, pensar, sentir, agir e interagir, muitas vezes, de forma desordenada e confusa. Pela observação dessa autora, o processo de aprendizagem é marcado por diferentes concepções e teorias. Em verdade, que bom que foi assim, pois considerando que em cada época a escola sofreu (e sofre) suas transformações, o professor e o seu processo de ensinagem, bem como, o aluno e o seu processo de aprendizagem devem ser entendidos como situações também em transformação; o que exigiu diferentes olhares e práticas pedagógicas (re)organizadas. Por que a importância de (re)ver as teorias da aprendizagem? Não podemos nos esquecer que a prática pedagógica é organizada, mas totalmente intencional no sentido de que quem ensina deseja que o outro aprenda e, quem aprende deseja que o outro ensine – portanto, uma relação intencional recíproca; a prática pedagógica é um fato diário no ambiente escolar, mas não é uma rotina em que se podem depositar as mesmas intenções, pois cada dia o mesmo grupo de alunos não se comporta da mesma maneira, ao tempo, que o professor também não ensina, todos os dias, da mesma maneira. Portanto, não há rotina estabelecida e pré 6 www.eunapos.com.br determinada na escola; o ensino é planejado, organizado e estruturado, mas isso não é garantia, nem de qualidade nem de atraçãopara os alunos, portanto, não há uma relação de ensino garantida sem que haja, necessariamente, uma relação humana estável, permeada por ene situações comuns. Nesse sentido, Sacristán e Gómez (2000, p.47) afirmam que: Toda teoria sobre a aprendizagem deverá explicar tanto as peculiaridades que identificam e distinguem diversas classes, quanto as características comuns subjacentes a estas e que justificam sua denominação como “processo de aprendizagem”. É esta teoria, que integra sem simplificar, que distingue sem divorciar, que a prática pedagógica exige. Tanto para compreender como para orientar na escola os fenômenos de ensino-aprendizagem. Creio que a partir dessa citação torna-se claro que as teorias da aprendizagem não pretendem fixar um modelo, um paradigma, único e engessado, mas, no estudo de cada uma delas poderemos encontrar um pouco de cada aluno, de cada situação de ensino e de aprendizagem, um comportamento inexplicado do aluno ante o conhecimento e, até mesmo, dificuldades para entender a prática pedagógica que, ora se desvela tranquilamente e ora, parece estar totalmente deslocada das necessidades que o aluno possui. É aí que surgem questões de professores e alunos do tipo: “por que tenho que ensinar isso?”, e, “por que tenho que aprender isso?” Por isso repito: não há rotina no ambiente escolar, pois cada dia, aula, encontro nesse ambiente é um novo encontro, uma nova aula, um novo dia. Desse modo, as teorias da aprendizagem refletem, em determinadas sociedades, culturas e práticas escolares, o modus operandi do processo de desenvolvimento do conhecimento e, com certeza, as exigências sociais que marcam uma época. Por isso optei pela discussão dos paradigmas comportamental, cognitivista e humanista, levando em conta que ainda, nos dias atuais, a prática pedagógica e o desenvolvimento da aprendizagem são processos em transformação sob a exigência de novas demandas, novos fazeres e novos saberes. 7 www.eunapos.com.br 1.1 Paradigma Comportamental Este paradigma destaca o valor do ambiente que é marcadamente estimulador, no qual o indivíduo aprende pelo resultado da quantidade de associações realizadas entre estímulos e respostas. Nessa perspectiva, o aprendiz está sujeito apenas ao que o ambiente pode provocar, sendo que todo produto se resume em estímulo e resposta. Nesse caso, seria interessante refletirmos de quais ambientes se originam nossos alunos. Evidentemente, são diversos, com inúmeros aspectos que os marcam, com grupos familiares distintos. Nos dias atuais, dificilmente, encontraremos mães que se dedicam exclusivamente à educação de seus filhos, pois muitas precisam trabalhar fora de casa: são as que sustentam a família. Não vou citar o pai, porque culturalmente sempre foi talhado para ser o chefe que sustenta a casa e, assim, este sempre esteve mais ausente de casa do que as mães que, culturalmente também, até algumas décadas atrás, só cuidavam dos filhos, da casa e do marido. Bom, isso mudou... Mas, mãe continua sendo mãe quando retorna para sua casa e tudo continua à sua espera. O que quero dizer é que nos dias atuais, muitos dos nossos alunos estão sendo criados (formados, educados) por avós, colaboradoras do lar. As famílias, em sua maioria, deixarão de ser nucleares, nas quais os pais não são mais os únicos responsáveis e mais presentes na educação de seus filhos. Então, pergunto: de qual ambiente estamos falando? Quais estímulos e respostas podemos encontrar em alunos que, em certa medida, vivem em relações dispersas, conflituosas e, muitas vezes, instáveis.1 Precisamos refletir sobre isso antes de julgarmos algumas situações que a escola nos apresenta. Então, para essa teoria o que importa é o que está fora do indivíduo e tudo ao que este se pode associar em seu ambiente. Assim, segundo Portilho (2009, p.19): 1 Não se trata de uma crítica aos pais que precisam do trabalho como sustento, nem a familiares e outros que também possuem muita responsabilidade e zelo no cuidado com as crianças e adolescentes, mas é preciso analisar e dialogar com as mudanças sociais que ocorrem, já que estas, inevitavelmente, afetam muitas pessoas, seus modos de agir, pensar e sentir o mundo e, sobretudo, de aprender com ele. 8 www.eunapos.com.br Aprender para este enfoque significa que aquele que aprende está condicionado ao meio, e isto significa, por exemplo, que quando uma pessoa realiza uma avaliação escolar, ela expõe exatamente aquilo que lhe foi ensinado, incluindo vírgulas e pontos, porque assim e só assim é o “certo”. É preciso lembrar que esta visão se relaciona ao Condicionamento Clássico, no qual encontramos Ivan Pavlov como precursor da Teoria do Reflexo Condicionado. Nessa perspectiva, o aluno só aprende aquilo que lhe é ensinado – dentro dos limites convencionais de uma sala de aula –, o professor é o único responsável por fixar o saber do aluno, predeterminando o que deve saber, como transmiti-lo e como avaliá-lo. Desse modo, todos os alunos são levados a pensar, agir e proceder da mesma forma, tendo-se a mesma visão (entendimento e interpretação) da realidade. Fonte: http://migre.me/3VqY5 Nesse auge das ideias, vamos parar para pensar um pouco: se o ambiente é o principal condutor das condições de aprendizagem do aluno e, é na escola que deve aprender, o que faremos com os conhecimentos adquiridos nos demais ambientes que norteiam esse mesmo aluno? O que faremos com o senso comum do nosso aluno? Desprezaremos? Para Watson (2009, p.20 apud PORTILHO) “a aprendizagem é considerada como o estabelecimento de associações simples (respostas condicionadas), com base no sistema nervoso, isto é, toda conduta representa a aprendizagem de respostas e estímulos particulares.” Por esta acepção, o organismo do aprendiz passa a ser um agente da conduta que, só promoverá a aprendizagem daquilo que vir e constatar, desde que as emoções sejam portadoras de condições reflexas que podem promover o aprendizado do indivíduo. Não sendo raiva, ira e amor, para os Behavoristas, assim chamados os teóricos como Watson, acredita-se que as emoções são reflexos condicionados. 9 www.eunapos.com.br Por essa assertiva, então, podemos pensar que as crianças que chegam na pré-escola não estão emocionalmente prontas para enfrentar esse ambiente, já que não é o seu ambiente familiar, e não foram preparadas – emocionalmente - para enfrentá-lo. Isso explica o comportamento choroso, em certa medida revoltado, agitado que tais crianças apresentam. Nesse caso, como poderão aprender se suas emoções não estão objetivadas para esse fim? Aliás, quantas delas sabem a finalidade para adentrar o ambiente escolar? Por isso a necessidade de um processo inicial de conquista e estruturação de uma relação mais próxima do professor com o seu aluno, afinal ele precisa se sentir seguro para estar, emocionalmente, pronto para aprender. Dessa forma, as relações que a criança irá estabelecer com o ambiente escolar estão em função da relação que irá estabelecer com os outros que estão ao seu redor nesse ambiente. Nesse caso, suas emoções, já formadas através do ambiente familiar, irão se co-relacionar (ampliar) com as novas emoções que serão criadas no ambiente escolar, dando significado ao seu desenvolvimento como pessoa e como aprendiz. Segundo Camargo, “as motivações, as emoções e sentimentos devem grande parte de sua força e estrutura aos intercâmbios pessoais.” (2004, p.123) Mas, para Thorndike (apud PORTILHO, 2009), a repetição de uma ação deve ser privilegiada até que se encontre uma solução, porque sugere este behavorista a possibilidade de vínculos determinantes entre as “impressões sensoriais” e os “impulsos para a ação” (Teoria do Conexionismo ou Condicionamento Instrumental)2.Por esta acepção, o indivíduo aprende quando associa, ou articula, as ações repetidas com o que vê, sente, pensa, percebe, capta. Nesse caso, o sistema sensorial está em função do feedback que as repetidas ações formam no cérebro. Contudo, gostaria de fazer a seguinte reflexão: não seria a memória mecânica a auxiliar na formação gradual – por repetições – da informação e, de acordo com o número de repetições, as informações fossem – gradualmente – formando o conhecimento? 2 Esta teoria pressupõe que, por causa do condicionamento, respostas específicas podem unir-se a estímulos específicos. Estas uniões ou conexões são o produto de uma mudança biológica no sistema nervoso. (PORTILHO, 2009, p.22). 10 www.eunapos.com.br Vamos lembrar-nos da época em que o professor fazia seus alunos repetirem com ele, oralmente (e aos gritos) cada letra do alfabeto, cada operação da tabuada; depois, com o uso de uma régua, o professor só apontava no quadro e fazia os alunos repetirem oralmente (e aos gritos) o que ali estava escrito. Ao lembrar disso percebo, claramente, Thorndike, pois através da fala-voz do professor havia uma condução de som, dirigida aos alunos por seu sistema auditivo e, depois ao apontar no quadro o professor propunha a condução perceptiva, dirigida aos alunos através do sistema visual. A intimidação do aluno, através dessa pedagogia tradicional, provocava no aluno o medo e a satisfação, dificilmente a aprendizagem. Porque ao repetir as ações – ora verbalmente, ora visualmente, ora perceptivamente, esquecia o professor que os alunos não associavam este conhecimento a outros, mas “decorava” a lição mecanicamente. Então, por um lado, os alunos temiam não saber repetir o processo e, por outro se satisfaziam com a simples memorização do processo. Por mais que se tenham críticas quanto a esse processo pedagógico, é preciso lembrar que a memória mecânica é de grande importância para o processo de aprendizagem, que configura a necessidade de repetir algumas ações no processo de ensinagem.3 Porém, o grande salto para a aprendizagem real é fazer com que esse processo (sensorial e mecânico) se articule aos conhecimentos do aluno através da realidade que vive. Por esse estudo do Paradigma Comportamental, encontramos mais um teórico que compactua com os estudos comportamentais, mas que é opositor a esta linha teórica de Thorndike, discordando deste em alguns aspectos fundamentais, sendo Skinner o teórico que acreditou que o ensino é uma combinação de reforços contingentes que facilitam a aprendizagem, com ou sem o professor. Para Skinner, o comportamento humano não é manipulável, pois é resultante do reforço operante, pois uma vez que as pessoas são operavelmente reforçadas aprendem a andar, a falar, a escrever, a jogar, a utilizar instrumentos manuais, a movimentar, etc. e, mediante novos reforços, os repetem, melhorando a eficiência do 3 A proposta de Thorndike relativa à aprendizagem acadêmica parece um tanto restrita quando enfatiza a noção de aprendizagem por ensaio e erro, utilizando a repetição e a prática como metodologia pedagógica. Este autor faz referência mental como algo sentido e percebido, isto é, valoriza os sentidos em detrimento do pensamento. (PORTILHO, 2009, p.24). 11 www.eunapos.com.br seu comportamento. Todavia, essa premissa indica que quanto mais reforços são dados, mais possibilidades do indivíduo alterar suas condutas e mudar seu comportamento e, isso independe do professor. Nesse sentido, poderemos entender por que algumas instituições escolares, ainda nos dias atuais, assumem com rigor tanta disciplina, conteúdo, recursos e, por que os planejamentos das práticas docentes são tão extensos e engessados. Não pode ser diferente porque a lógica dessa realidade se situa na quantidade de reforços que devem ser dados aos alunos em detrimento da qualidade da formação de conhecimento que pode ser conquistado. Dessa forma, é preciso conteúdos que mantenham os alunos “presos” ao roteiro didático-pedagógico, desprezando qualquer possibilidade de diálogo deste com o que a escola ensina e a realidade lhe propõe. Assim, por exemplo, não é preciso de professor na sala de aula, desde que alguém – o próprio aluno – passe o conteúdo do livro didático na lousa, durante cinquenta minutos ininterruptos; ao final disso, descreva exercícios que tenham um único exemplo de como fazê-los (reforço) – basta que o exemplo seja seguido (operação) e, pronto, a lição foi feita. (consequência) Fonte: http://migre.me/3VrgY Segundo Portilho (2009, p.24): A teoria da aprendizagem, além de desconsiderar as informações que o sujeito já possui, descarta as características pessoais, as crenças, os desejos, as ideias e os pensamentos, reduzindo a aprendizagem ou a própria natureza humana a estímulos, respostas e reforços. Há, sem dúvida, nessa citação uma análise bastante crítica da teoria da aprendizagem, onde o aluno é reduzido a condicionamentos, os quais, por associações, reflexos e estímulos, podem dar respostas ao aprendizado. Sim, vamos chamar o resultado desses condicionamentos de aprendizado. Evidentemente, esta aprendizagem deixa muitas lacunas vazias e que, em certa medida, poderão ou não ser preenchidas de acordo com o interesse do indivíduo. 12 www.eunapos.com.br Vamos fazer uma incursão num passado, não muito distante, e lembrar como foi ser educado pela pedagogia tradicional. A alfabetização era realizada por meio da silabalização de forma progressiva, ou seja, se partir de uma letra, depois uma sílaba, depois uma palavra, a frase, o parágrafo, e, finalmente, o texto. Esse percurso era marcado por exercícios intermináveis e repetitivos; gastava-se muita borracha, lápis e caderno, mas, ao final de um ano, a grande maioria sabia ler e escrever habilmente. Claro, que sobrava puxões de orelha e outras humilhações que, na verdade, nunca matou ninguém. Se aprendia a ter habilidades, mas não se articulava nada – se aprendia por exemplo, escrever a palavra ovo, mas saber que isso era aquilo que a galinha botava, “eram outros quinhentos”, pois uma coisa nada tinha a ver com a outra quando o tempo era de aprendizado. Fonte: http://migre.me/3VroY Havia regras para estudar; havia horário certo para lições e hora certa para brincar. Realmente, o aprender a aprender e o saber-fazer não aconteciam na escola, isso é um fato. Mas, também não havia tantos problemas de aprendizagem como nos dias atuais se apresentam, porque os problemas eram discutidos (reprimidos) e, cada um, fazia sua parte com afinco, pois estudar era uma grande responsabilidade e a escola era o único ambiente possível para ensinar tudo. Onde quero chegar com toda essa fala? Ora, os condicionamentos propostos pelas teorias da aprendizagem demonstram que há sim necessidade de se criar rotinas nas quais nosso organismo e nossa cognição trabalhem os conhecimentos necessários praticados pelo ambiente escolar. É um erro afirmar que o uso da memória mecânica, para repetir, gravar, “decorar” que seja, um certo ensinamento, é não aprender. Pois, só guardamos em nossa memória aquilo que nos é usual, costumeiro, porque é repetido muitas vezes. Basta, por exemplo, querer lembrar e discar um número telefônico que não é usual – simplesmente não lembramos o número, então, por que não decoramos? Porque não nos é imediatamente útil; aquilo que nos é útil é armazenado por nosso cérebro. Então, ser útil está em função 13 www.eunapos.com.br de nossa necessidade – só posteriormente, fazemos relação dessa função e dessa necessidade com outras coisas. Então, somos condicionados e operantes sim; necessitamos dos estímulos e sabemos da necessidade das respostas porque estas provêmde necessidades diversas que, atendidas, nos remetem a aprender com o entorno, com o ambiente, com os fatos e as situações. E é com essa conjuntura que os teóricos comportamentais e/ou behavoristas4 se preocuparam e, em certa medida, não foram totalmente equivocados, pois do contrário, muitas instituições escolares não assumiriam suas indicações ainda nos dias atuais. 1.2 Paradigma Cognitivista O Paradigma Cognitivista nasce em oposição ao Paradigma Comportamentalista, sendo que sua maior atenção foi dada ao processo de aprendizagem em que o aprendiz está em construção contínua de seus conhecimentos, ampliando-os de forma a gerar novas estruturas articulando-as com o que já conhecia. Nesse sentido, o aprendiz organiza seu conhecimento, administrando as informações que recebe, processando-as de modo que alcance as relações possíveis entre elas, para a tomada de decisões. Sabendo-se que alguns dos principais precursores desse paradigma, tais como: Bandura, Jean Piaget, Jerome Bruner, David Ausubel, Lev Vygotsky e Jorge Visca, possuem teorias muito próximas ao que concerne ao comportamento cognitivista, minhas análises se centraram nas teorias de Robert Gagné, tratando-se também de um precursor importante desse paradigma. Para Gagné (1974), a aprendizagem ocorre mediante uma transformação do indivíduo, a qual ele chamava de aprendizagem ativa, passando pela aprendizagem de signos e sinais até atingir o processo de resolução de problemas. A aprendizagem assim requer do indivíduo uma leitura do seu entorno e das situações que possam formar o processo de transformação. 4 Alguns dos principais precursores: Ivan Pavlov; John B. Watson; Edward Lee Thorndike; Burrhus F. Skinner 14 www.eunapos.com.br Podemos pensar por esta acepção que todas as situações que ocorrem numa sala de aula podem, de forma diferente para cada aluno, influenciar no seu processo de aprendizagem, pois estas situações geram signos e sinais pelos quais o aluno se transforma e, consequentemente, aprende. Supondo que a professora grite com seus alunos na sala durante a aula, a ocorrência do grito (sinal) irá gerar um tipo de informação (signo) que provocará no aluno a transformação (processo) para aprender que sempre que a professora gritar, a mesma ou uma nova situação estará ocorrendo. Nesse sentido, segundo Portilho (2009, p.28-29): Para que este tipo de aprendizagem aconteça, devem ser apresentadas duas formas de estímulos de maneira simultânea: o estímulo que produz a resposta geral e o estímulo que se transforma em sinal. Este tipo de aprendizagem é comum na vida cotidiana. Para exemplificar, é o caso da criança que aprende que um grito de seus pais pode ser um sinal de dor, ou de medo. Este sinal pode originar-se de sujeitos que, quando crianças, tiveram-no acompanhado de estimulações doloridas ou assustadoras. Segundo a autora, na acepção de Gagné, podemos dizer, por exemplo, que ao assistir uma propaganda sobre um produto que nos interessa, automaticamente, somos provocados a buscar razões e condições para que obtenhamos o produto. Então, a propaganda é um estímulo que se transforma em sinal. Transferindo esta mesma situação para a nossa de sala de aula, podemos pensar que se o professor tiver em mãos meios, recursos, tecnologia ou, simplesmente, a criatividade para demonstrar o que ensina, a demonstração passa a ser o estímulo para que o aluno interprete a informação e a transforme em conhecimento. Mas, quais são as condições para que a criança aprenda a fazer esse processo em cadeia, considerando que sua mente se divide entre muitas aprendizagens, das quais muitas estão além dos muros da escola. Isso Gagné chama de aprendizagem por cadeia, que é a aprendizagem de uma determinada sequência ou ordem de ações. Porém, o oposto de estímulos positivos que provocam a aprender, a criança pode não ser provocada a aprender porque há situações em seu contexto que não permitem esse desenvolvimento para a aprendizagem em cadeia. 15 www.eunapos.com.br Apenas para exemplificar, gostaria de partilhar o “Caso Lincon”5, menino de 8 anos, aluno da terceira série de uma escola pública. Lincon, logo no início do ano escolar, se apresentou apático, desligado e até mesmo desinteressado. O oposto do aluno dos anos escolares anteriores, sendo alegre, dinâmico e expansivo. A professora de Lincon, uma profissional atenta e comprometida, se perguntava – “O que será que está acontecendo com Lincon?”. Resolveu perguntar a ele mesmo e, como resposta, recebeu um simples “nada” da criança. Fonte: http://migre.me/3VuuN A Coordenação Pedagógica foi informada e, na primeira reunião dos professores, o caso de Lincon foi apresentado – ninguém sabia dizer o que estava acontecendo. Assim, os pais de Lincon foram chamados – mas, Lincon não tinha pai, não o conhecera e a mãe estava sempre ausente, precisava trabalhar. Desse modo, Lincon residia com tios e quatro primos também menores, mas com mais idade que ele. Devido às condições, a casa era pequena para tanta gente. Assim, a própria mãe não sabia explicar o que estava acontecendo com o filho, admitindo que a criança, nos últimos tempos, estava muito calada e retraída, porém prometeu que ficaria atenta e comunicaria a escola sobre qualquer problema. O ano escolar foi passando, e Lincon não dava conta das tarefas, não atendia à professora, desligando-se até mesmo do barburilho tão comum às crianças; se lhe perguntasse alguma coisa, não ouvia de pronto e se assustava com facilidade se chamasse seu nome em voz alta. Enfim, Lincon estava no “mundo da lua” diziam seus colegas e, os outros já afirmavam que ele estava com déficit de atenção. A professora incomodada com a situação e vendo, notadamente, a perda de desenvolvimento da aprendizagem de Lincon, pediu à coordenação pedagógica que o encaminhasse a um profissional que tivesse condições de investigar o caso e ajudasse Lincon a encontrar a solução para seus problemas. Após, muitos processos – nos quais nem sempre a família colabora com escola – constatou-se que Lincon sofria abuso por parte dos primos maiores, pois 5 O nome é fictício, mas um caso clínico real. Qualquer semelhança é mera coincidência. 16 www.eunapos.com.br dormia no quarto com todos e, dividia a mesma cama com um primo maior que o ameaçava durante toda noite – nenhum adulto sabia, mas as crianças sim. O fim desse caso envolveu muitos processos, muitas pessoas e muitas situações, as quais nem sempre estão ao alcance da escola resolvê-las. Tomei esse caso apenas para mostrar que a partir de algumas condições, o processo de aprendizagem perpassa problemas que podem ou não provocar a transformação de um indivíduo, mas, a todo momento será capaz de retomar sua capacidade de aprender. Ao falarmos de aprendizagem por cadeia, precisamos saber em que cadeia de ideias estão nossos alunos, pois segundo o próprio Gagné a aprendizagem por associações verbais está relacionada à aprendizagem em cadeia e implica em processos simbólicos bastante complexos porque, com certeza, depende da relação cognitiva do sujeito, seu meio e as informações que recebe. (PORTILHO, 2009, p.30). Gagné aponta ainda outras formas de aprendizagens: Aprendizagem por discriminações múltiplas: implica a ação de separar e discriminar; A aprendizagem de conceitos: significa aprender a responder a estímulos em termos de propriedades abstratas, tais como: forma, cor, número ou posição; A aprendizagem de princípios: remete à ideia de que um princípio é uma relação entre dois ou mais conceitos; A aprendizagem por resolução de problemas: dominando os princípios, pode ser utilizada para finalidades diversas. Contudo, estas abordagens de Gagné estãomuito próximas de alguns estudos de Piaget quando afirma que a inteligência é uma adaptação ao meio exterior e, também, biológica. Afirma ainda que: Esta adaptação, no entanto, é fruto da adaptação do indivíduo com seu ambiente, onde os fatores fisiológicos da maturação, as experiências com os objetos do mundo físico e com o meio social, coordenadas por um mecanismo autorregulador (equilibração), são elementos absolutamente necessários para o desenvolvimento [...] a adaptação apresenta duas invariantes básicas: a assimilação e a acomodação (PIAGET, 1978). 17 www.eunapos.com.br Sendo assim, o aprendiz entendido por este paradigma cognitivista, deve ser capaz de associar, relacionar, interpretar o meio e seus sinais; equilibra-se diante da causalidade integrando ambiente, objeto e propriedade; contemplar suas emoções no sentido de colocá-lo à disposição da aprendizagem e, ainda transformar informação em conhecimento em consonância com a realidade em que se insere. Parece simples, mas tais condições se assemelham à exigência para a aprendizagem. É importante lembrar que não somos máquinas guiadas nem construídas em série, pois cada pessoa carrega consigo uma identidade genética única, sendo que para alguns, determinados processos de aprendizagem são semelhantes em percurso, mas diferem em intensidade e construção e, para outros tudo se difere em razão dos mecanismos de associação e interpretação da realidade, considerando suas vivências e experiências pessoais, bem como, fatores biológicos e sociais. Antes de seguirmos adiante, sugiro que faça os exercícios de passagem, para auxiliar nas nossas discussões futuras. Boa sorte! Exercício 1 1. Na Teoria do Reflexo Condicionado: a) O aluno só aprende se lhe der uma compensação, sendo que o professor é o único que pode fazê-la. b) O aluno só aprende aquilo que lhe é ensinado, dentro dos limites convencionais de uma sala de aula. c) O aluno tanto poderá aprender na sala de aula como fora dela, pois nessa teoria o que importa é a sua interação com o meio. d) O aluno aprende em interação com seus colegas, o professor é o menos importante no processo. 2. Para Skinner, o comportamento humano não é manipulável, pois é resultante: a) Do reforço operante, pois as pessoas são operavelmente reforçadas a aprender todo seu comportamento. b) Do reforço condicionante, pois as pessoas são condicionadas a aprender todo seu comportamento. c) Do reforço compensante, pois as pessoas são compensadas se aprender todo seu comportamento. 18 www.eunapos.com.br d) Do reforço operatório, pois as pessoas são lógicas no aprendizado de todo seu comportamento. 3. Para Gagné, a aprendizagem ocorre mediante uma transformação do indivíduo, o qual passa, respectivamente: a) A aprendizagem por discriminações múltiplas, de conceitos, por cadeia, de princípios e de resolução de problemas. b) A aprendizagem de princípios, por discriminações múltiplas, por cadeia, de conceitos, e de resolução de problemas. c) A aprendizagem de conceitos, de princípios e de resolução de problemas, por cadeia, e por discriminações múltiplas. d) A aprendizagem por cadeia, discriminações múltiplas, de conceitos, de princípios e de resolução de problemas. 1.3 Paradigma Humanista Nesse paradigma, concentrei meus estudos no seu principal precursor: Carl Rogers, para que não ficasse redundante a nossa proposta de estudo e, considerando outros módulos deste curso que abordam muitas outras teorias. A opção por esse teórico é a afinidade com suas ideias, pois segundo Goulart (2003, p.94): Para ele o ponto de partida é de que somente pessoas podem desenvolver pessoas. Logo, é necessário que administradores, professores, supervisores, etc., sejam, primeiramente, pessoas por sua própria conta. Para ele, uma pessoa expressa abertamente onde está e quem é, sem esconder-se atrás da aparência de ser o profissional x. Por essa assertiva, se percebe que não são as teorias da aprendizagem que podem afirmar quem é o aprendiz, ou mesmo quem é o ensinante, mas como cada pessoa se comporta ante seu aprendizado, respeitando-se assim a sua identidade, o que requer de cada sujeito um envolvimento pessoal explícito no processo de aprendizagem e, também, do ensino. Nesse sentido, vou me reportar a Perrenoud (2001), que diz que o professor é, antes de tudo, uma pessoa e, esta pessoa não está desvencilhada de si mesmo por ser um profissional. 19 www.eunapos.com.br Assim, os significados de aprender e ensinar estão em função dos valores que cada pessoa tem; lembrando que valores são um estado de ser, um modo de estar agora em construção no percurso da vida, e ainda, um modo de viver conforme o jeito de ser de cada um. Todavia, o que cada pessoa é e como ela aprende, deve possuir um significado, o qual reside na essência da aprendizagem. Mas, para Rogers esse processo de significação torna a aprendizagem um percurso que deve ser auto- iniciado tendo, sobretudo, o envolvimento pessoal do aluno.6 E, para que esse processo de significação aconteça, Rogers pontua que: a aprendizagem é facilitada quando o aluno participa responsavelmente do seu processo; opta por suas direções; ajuda a descobrir recursos próprios ao seu aprendizado; formula problemas que lhe interessam; escolhe a linha de ação a seguir; e, avalia as consequências de suas escolhas; o facilitador da aprendizagem é aquela pessoa que, consciente de suas limitações e de suas possibilidades, estabelece um clima de receptividade, no qual ele se torna, progressivamente, um aprendiz participante, um membro do grupo, uma pessoa que oferece uma participação que os alunos podem acolher ou recusar. A preocupação não é, pois, “o que ensinar”, mas “como” facilitar o aprender (GOULART, 2003, p. 95). Quanto ao primeiro item, é preciso refletir sobre a seguinte questão: Nos dias atuais, tendo as pessoas mais liberdade de expressão e linguagem, além das culturas de inclusão e exclusão e de vivência numa sociedade mais consumista e, portanto, capitalista, como tornar o aluno responsável por seu processo de aprendizagem que seja significativa? Numa brincadeira, creio eu, encontrei na Internet uma série de questões, em forma de slides, que se chama “dúvidas que nos perseguem”7. Nos slides são apresentadas perguntas que, com certeza, os alunos fazem e nós, professores, não sabemos responder. Como exemplo tomo as seguintes questões: - Por que a laranja chama-se laranja e, o limão não chama-se de verde? 6 Esta é a segunda razão por ter optado por Rogers na representatividade desse paradigma, pois suas concepções são as que mais se assemelham ao processo de autoria da aprendizagem. 7 Este material não tem uma referência, autoria, mas através do site de busca Google há vários endereços que o contém. 20 www.eunapos.com.br - Se quem trabalha no mar é marujo, então quem trabalha no ar deveria ser araújo? - Quando inventaram o relógio, como sabiam as horas para poder acertá-lo? Brincadeiras à parte, esse material nos leva a refletir o grande embate que vivemos hoje, quanto à educação que queremos e à educação que os alunos encontram no seu dia a dia. Pois, ao que parece o ensino está numa via de mão única e, algumas vezes, contraditória às informações que os alunos trazem para escola. Então, como torná-los partícipes responsáveis pelo processo de aprendizagem? Como fazer com que não sejam aprendizes fracassados? Sugiro que a prática pedagógica seja dialógica, ou seja, contemple como parte do processo o diálogo necessário que a relação escolar, entre alunos, professor e conteúdos, implica. A autoria nasce da oportunidade de dialogar o conhecimento e isso, por exemplo, é o mesmo que uma mãe ou pai permitir que seu filho conte o que aprendeu na escolanaquele dia. A criança revela o que sabe nesse momento, expressa e revela seu entendimento e as suas dificuldades. Isso é o começo da autoria. Todavia, não basta que alunos sejam partícipes responsáveis, precisam também ajudar a descobrir recursos próprios ao seu aprendizado, fazendo uma articulação entre um recurso concreto e o aprendizado. Além disso, segundo a premissa de Rogers, o aluno deve ser capaz de formular problemas que lhe interessam, porque é assim que a aprendizagem passa a ser significativa, no sentido de passar para o plano da intimidade do aluno, ou seja, no plano do interesse. Nesse processo, ainda deverá escolher a linha de ação a seguir e avaliar as consequências de suas escolhas. Particularmente, a legitimação da responsabilidade do aluno sobre seu aprendizado é confirmada com esse passo final que Rogers indica. Pois, ao estar consciente do que, para que, com que e o que fazer com a aprendizagem, o aluno está integralmente envolvido como aprendiz. No segundo aspecto da significação da aprendizagem, Rogers afirma que o facilitador da aprendizagem, que é o professor, deve ser aquela pessoa que, além de dominar o que ensina, se expõe consciente de suas limitações e de suas possibilidades, permitindo assim um diálogo com sua classe, estabelecendo um 21 www.eunapos.com.br clima de receptividade no qual ele, professor, se torna um aprendiz participante, um membro do grupo, uma pessoa que oferece uma participação que os alunos podem acolher ou recusar. A preocupação não é, pois, “o que ensinar”, mas “como” facilitar o aprender.8 Nesse caso, a ensinagem é tão relevante quanto a aprendizagem, pois toda relação de conhecimento só existe quando alguém ensina e o outro aprende. Desse modo, o professor é um facilitador no sentido de fazer com que os alunos dialoguem com seus conhecimentos, tornando-os possíveis de aplicação numa dada realidade. Aliás, que outro fim teriam os conhecimentos que os indivíduos adquirem em toda sua caminhada de aprendizagens – já que aprendemos a todo o momento, contínua e infinitamente? Portanto, é o professor o responsável por despertar e promover as articulações possíveis. Não vamos adentrar aqui em questões sanitárias9, acreditando que todos os professores são mais jogadores do que torcedores nesse processo. Em outras palavras, o “professor torcedor” é do tipo presente, amigo e fiel, mas só comparece para assistir à partida, nada sabe de sua escola e da comunidade em que está inserida; já, o “professor jogador” é aquele que está em campo administrando suas ações, acompanhando seus alunos, discutindo com sua equipe, atraindo a família para escola. Enfim, o “professor torcedor” só balança a bandeira da escola, enquanto que o “professor jogador” sua a camisa por ela. Então, o professor é a pessoa que facilita, ou melhor, media a aprendizagem tendo o processo de ensinagem como arma de transformação de pessoas e, consequentemente, de realidades. Nesse sentido, Cunha (2008, p.63), afirma que: O modelo de educação que funciona verdadeiramente é aquele que começa pela necessidade de quem aprende e não pelos conceitos de quem ensina. Ademais, a prática pedagógica para afetar o aprendente deve ser acompanhada por uma atitude vicária do professor. 8 O foco da aprendizagem é dirigido a quem aprende, e não a quem ensina; o professor não fica, contudo, marginalizado; ele tem a exata medida do interesse dos alunos pelo seu trabalho, na medida em que eles são livres para participar ou estar ausentes das atividades. (GOULART, 2003, p.96). 9 Questões relativas à defasagem na formação docente, ao desinteresse pelo trabalho por descobrir seu baixo lucro, por ter baixos salários, pela fraca atenção das políticas públicas e desvalorização social da profissão docentes... para não citar outras. 22 www.eunapos.com.br Assim, fica claro que a proposta de Rogers, no paradigma humanista, é fazer com que as relações estabelecidas na educação sejam permeadas por trocas recíprocas e, nas quais seus atores são aprendentes e ensinantes conscientes de seus processos, tanto de desenvolvimento da aprendizagem, quanto da aplicação das mesmas como meio de transformação. 23 www.eunapos.com.br UNIDADE 2 – O QUE SE APRENDE E COMO SE APRENDE Nesta unidade vamos analisar e fazer algumas reflexões sobre o que e como se aprende, iniciando a nossa análise pelos processos que margeiam a aprendizagem tanto do professor, quanto do aluno, pois não podemos discutir autoria por uma via de mão única, na qual transita apenas o aluno. A razão para não entendermos a autoria apenas pelo foco do aluno é que, primeiramente e como já dito, toda relação de conhecimento só existe quando alguém ensina e o outro aprende, do contrário, como aprender? Nossa reflexão sobre o que e como aprender também deve ser vista pelo entendimento das diferenças estabelecidas entre a aquisição da informação e a construção do conhecimento, consequentemente, do saber que se aplica no fazer humano. Nesse sentido, temos que reconhecer que nossa aprendizagem, em início de vida, é fruto da sociedade que nos rodeia, porque é a nossa família a primeira a praticar o processo de ensinagem e nos leva a aprender, primeiramente, sobre nossas próprias necessidades básicas, por isso é aceitável a premissa de Morin, (2002, p.15), quando afirma que: Fonte: http://migre.me/3Vw8h Nós somos indivíduos que estamos dentro da sociedade, mas a sociedade como um todo está presente em nós desde o nosso nascimento. Nós recebemos as proibições, as normas, a linguagem e, finalmente, a presença da sociedade entre nós. Assim, somos parte de um todo que reconhecemos como nosso desde que nascemos, porém, nosso processo de aprender nesse estado de consciência não é autônomo, mas essencialmente condicionado aos que nos ensinam de acordo com suas crenças e valores. Na verdade, os que ensinam, assim aprenderam com seus ancestrais; é comum a transferência da cultura, bem como, daquilo que acreditaram ser o melhor para cada um. Nesse sentido, para exemplificar, vale a pena lembrar de uma situação envolvendo um casal de jovens, recém-casados. Num dado dia, a esposa está 24 www.eunapos.com.br preparando o almoço e resolve fritar um peixe, cortando-lhe o rabo antes de colocá- lo no frigideira. O marido, que assistia à cena, pergunta: “- Por que você cortou o rabo do peixe?” Ela responde: “- Porque foi assim que minha mãe me ensinou, e foi minha avó que ensinou a ela!” Passada essa cena para outra, o jovem casal vai almoçar na casa da sogra – mãe da esposa. A mesma resolve fazer um peixe frito e a cena se repete. O genro intrigado pergunta à sogra: “ – Sogra, por que a senhora corta o rabo do peixe para fritá-lo, é tradição de família?” E a sogra, calmamente responde: “ – Não é tradição, é para o peixe caber na frigideira!”. Podemos não carregar a bagagem de tudo que, no princípio de nossa vida, nos ensinaram, mas ficam resquícios dos valores que acreditamos ser os mais corretos e, consequentemente, transferimos para nossos filhos. Porém, nesse segmento de ideia tanto poderemos acertar quanto errar, na medida em que esquecemos o que é valor e crença para cada um. Por exemplo, pense na mãe ou outro familiar serve os pratos para os filhos, todos os dias no horário das refeições – os quais já possuem idade para fazê-los acreditar que isso é um ato de amor. Tal ato exime a criança de sua autonomia, a mesma autonomia que precisará na escola para aprender.10 Como diz Fernández, “para chegar a ‘eu aprendi’, preciso partir de ‘ele me ensinou’, o que é diferente de dizer ‘quando eu aprendi”. (2001, p.29). Assim, com o tempo e maturidade, os indivíduos começam a perceber que é necessário separar a informação, do ensinado pela lógica da escola,do que é aprendido culturalmente no contexto que se insere. 2.1 Relação entre informação, conhecimento e saber Morin (2006, p. 23) afirma que “a racionalidade é a melhor proteção contra o erro e a ilusão”, porém, essa racionalidade se aplica ao que é dado como conhecimento, porque somente a informação não requer nenhuma racionalidade. Pois, todo conhecimento requer aprofundamento, uma lógica e uma organização, 10 Não há nenhuma intenção em generalizar, e essa questão familiar envolve muitos fatores respeitáveis, mas implica no comportamento da criança que sempre estará esperando que alguém a sirva. No caso da escola, o(a) professor(a). 25 www.eunapos.com.br condições essas que promovem a racionalidade. Então, já encontramos uma diferença clara sobre informação e conhecimento. Todos os dias os jornais, bancas de revistas, rádios, televisão e a Internet trazem um arsenal de notícias que bombardeiam o nosso dia, estando as informações acessíveis a todas as pessoas, estejam onde estiverem. As informações são imprescindíveis, pois informam as pessoas sobre o que está acontecendo em todos os lugares do mundo. Há um objetivo para que existam, pois são através delas que as pessoas desenvolvem e formam o senso crítico, a opinião e se projetam dentro de um cenário real e objetivo. As informações tratadas por notícias são produtos históricos e culturais, pois existem desde que as civilizações descobriram que não eram as únicas no planeta. Na Roma Antiga (44 a 52 a.C), por exemplo, as informações eram discursadas em praça pública por um mensageiro eleito para isso, já que não existiam jornais; assim, os cidadãos romanos ficavam informados sobre quais eram as últimas conquistas heróicas de Júlio César, após as guerras para a ampliação do Império. As pessoas se aglomeravam em torno do plenário público para ouvir e, depois, disseminavam as informações para os ausentes e, destes toda a sociedade romana acabava sendo informada. Evidentemente, um processo moroso e primitivo, mas já existente naquele período.11 Nos dias atuais, as informações alcançam todas as pessoas, portanto, estão informadas o tempo todo. Porém, que conhecimento detém sobre estas informações? O que elas sabem? Bem, se for a título de consciência do fato, estarei afirmando que possuem “conhecimento do fato”, mas não “conhecimento sobre o fato”, o que requer um tratamento mais apurado e, até científico, sobre a informação. Eu posso dizer, por exemplo, que gosto de nadar, o que não significa que eu saiba efetivamente nadar. Portanto, informação não é conhecimento, mas, sem ela não há conhecimento, porque ela é a base para a construção do conhecimento. Já, a informação, em relação ao saber12, é marcada pelo processo de aplicação do fazer. Enquanto a informação se distingue do 11 O seriado intitulado Roma (HBO, 2005), tendo como base as pesquisas que o originou, traz esta cena. 12 A questão da relação com o saber não é nova. Permeia as obras de Platão, Descartes, Kant, Hegel, Marx, Nietzsche, entre outros, e na época contemporânea se faz perceber na reflexão de Piaget, Barchelard, Foucault e de Certeau, bem como em Lacan (1966) e Bourdieu e Passeron (1970). 26 www.eunapos.com.br conhecimento porque este requer uma sistematização, o saber requer a operacionalização, pois o saber implica no desenvolver a ação pelo fazer. Um professor que domina o conteúdo que ensina, sabe operacionalizá-lo, ou seja, sabe transitar com o conteúdo no plano discursivo para fazê-lo concretamente. Mas, se o aluno não fizer o processo de aprofundamento e fixar o conteúdo de forma estática, estará no plano da aprendizagem superficial e mecânica, na qual a informação é a sua maior limitação. Nesse caso, não há avanços e, com certeza, muitos retrocessos, pois ao ser avaliado o aluno já nem se lembrará do que lhe foi apresentado, ficando a informação no arquivo morto. Fundamentando essa ideia, Charlot (2008, p.180)13, faz a seguinte reflexão - “na escola ensinam-se poucas coisas úteis e muitas coisas importantes. O que pode ser considerado importante?” E, acrescento: para quem é importante: para o professor ou para o aluno? Creio que ainda há muito professor ensinando por seu modo de ver e perceber o conhecimento, esquecendo-se que o aluno ainda não tem esse conhecimento, mas só poderá tê-lo se descobrir seu próprio modo de aprender. Assim, é preciso ressaltar que todo processo operacional do saber leva todo aprendiz, inevitavelmente, ao princípio do processo, ou seja, ao operacionalizar um conhecimento, encontraremos uma ou várias outras informações que, por sua vez, irão requerer o reinício dos aprofundamentos. Por isso, podemos chamar esse estágio de processual ou cíclico, onde o conhecimento humano não é estável, nem definitivo e parcialmente conclusivo, mas dinâmico e infinito. 2.2 Aprendizagem e gestão do conhecimento No item anterior desta unidade, foi dito que todo conhecimento requer aprofundamento, uma lógica e uma organização, condições essas que promovem a racionalidade. Então, já encontramos uma diferença clara entre informação e conhecimento. Mas, o conhecimento também se distingue da mera informação porque está associado a uma intencionalidade. Tanto o conhecimento como a informação consistem de declarações verdadeiras, mas o conhecimento pode ser considerado informação com um propósito ou uma utilidade. Veja a figura abaixo: 13 Cit Charlot, Fundamentos e usos do conceito de relação com o saber, p.173 a 181, in Dieb, 2008. 27 www.eunapos.com.br Figura 1 – Das crenças ao conhecimento Fonte: elaboração própria Observa-se que as crenças são um conjunto de informações que, são tomadas como verdadeiras e que se antecedem ao conhecimento formado, mesmo sobre elas. Como já dito, a sociedade se incumbe de ensinar as crenças e valores que toma como verdadeiras, quando a criança nela se insere. Mas, no decurso de nossa maturidade, somos provocados a aprender e formar um conhecimento. A definição clássica de conhecimento, originada em Platão, diz que ele consiste de crença verdadeira e justificada. Sem dúvida, entre as crenças que temos para aquilo que somos há necessidades de crescimento, significação e aprendizado. Em outras palavras, para desenvolver conhecimentos não há como desprezar as crenças, mas temos que validá-las e justificá-las para que sejam parte de conhecimentos que são verdadeiros e justificáveis. Contudo, para este processo se concretizar – num plano que chamo de sócio-cognitivo-intelectual – se faz necessário também organizá-lo dentro de seu contexto. O professor ou ensinante, que se reconhece aprendiz, deve ser um estrategista, porque não se podem ensinar conteúdos, seja quais forem, acreditando que seus alunos são apenas criaturas passíveis de se desfazer de suas crenças e valores. Ou seja, não há como desconstruir o aluno para criar um “ser pensante”. Então, devem-se somar condições, situações, experiências e vivências num diálogo com a aprendizagem, porque não há como desenvolver conhecimentos sem fazer sua gestão. Nesse sentido, segundo Sacristán e Gómez (2000, p.363), a educação numa perspectiva prática pressupõe: CRENÇAS VERDADE CONHECIMENTO verdadeira justificada 28 www.eunapos.com.br (...) que o ensino é uma atividade complexa, que se desenvolve em cenários singulares, claramente determinados pelo contexto, com resultados em grande parte imprevisíveis e carregados de conflitos de valor que requerem opções éticas e políticas. Por isso, o professor deve ser visto como artesão, artista ou profissional clínico que tem de desenvolver experencial e sua criatividade para enfrentar as situações únicas,ambíguas, incertas e conflitantes que configuram a vida da aula. Nessa assertiva, não há como se furtar da importância do professor como modelo na gestão do conhecimento, pois o processo de ensinagem requer que o “olhar” pouse sobre o aluno na busca de reconhecer suas habilidades para aprender. Isso implica na condução do aluno para fazê-lo pensar sobre o que aprende, para que assim encontre um sentido, primeiramente, singular – em que atrai a subjetividade do aluno – e, ao mesmo tempo, encontre um sentido plural – em que o aluno descobre que o aprender é parte de uma realidade que conhece. Assim, interage com sua aprendizagem e organiza os conhecimentos. Mas, nessa perspectiva o processo de ensinagem deverá incluir propostas de formação conceitual, atitudinal e de valores e, procedimental, pois para que esse aluno tenha condições de transformar-se e transformar sua realidade, o professor não poderá eximi-lo de sua responsabilidade na formação de uma postura crítica e política, considerando os enfrentamentos sociais. Teoricamente parece fácil esse processo, mas sei que na prática não é (e não será); porque o professor não pode fazer tudo sozinho, mas faz! Então, é preciso estar bem articulado à escola, aos alunos e à família, levando em conta que o aluno não está sozinho, mas contextualizado, não sendo apenas um ator solitário na sala de aula. Por outro lado, se é importante fazer com que o aluno seja autor de sua aprendizagem, como fazer com que ele seja integral nesse processo? A melhor resposta para esta questão pode ser encontrada num livro muito encantador chamado El Café de los Filósofos Muertos, de Nora K. e Vittorio Hösle, no qual afirmam: Pensar é aprender a ser livre, responsável e honrado. Pensar é esforço e inconformismo, para com o mundo e também para consigo mesmo. Pensar é duvidar e criticar, não de forma altiva ou presunçosamente, mas pelo desejo do bem comum. Pensar é ter o 29 www.eunapos.com.br tempo de poder fazê-lo. Pensar não é repetir ou reproduzir. Pensar é ativar o que de nobre há no ser humano, porque pensar também é sentir e intuir. A frase de Descartes não é de todo certa: não se trata de penso, logo existo, senão penso, logo vivo. Viver é encontrar seu próprio caminho e evitar permanentemente a tentação do fácil. O fácil é não pensar. Em outras palavras, é preciso que o professor faça seu aluno pensar, ou melhor, o eduque a pensar. Quando se pensa, a ideia se concretiza, a informação se objetiva, o cérebro faz suas articulações, o senso comum se soma ao que se pensa, e o que antes era um simples dado, passa agora a ser conhecimento. É preciso fazer com que o aluno pense sobre o ensinado, fazendo um diálogo com o contexto, como consequência, será inevitável passar pela subjetividade, ou seja, o aluno não terá, inicialmente, condições de fazer relações do ensinado com o aprendizado porque o desconhecido é um ser complexo. O que o professor pode fazer nesse caso? A exercitação do ensinado, sem objetivo de mecanização, pode ser uma boa estratégia, desde que se tenha um limite entre o fazer-fazer e o aprender-fazer. Em outras palavras, há limites para exercitar - do contrário, nosso cérebro é semelhante aos nossos músculos, fica fadigado, cansado e, nessas condições, tende a se afastar do ensinado, ou seja, compreende que é melhor não aprender. Por isso, o professor deve ter uma ótima condução das tarefas que pede aos alunos, privilegiando uma quantidade, uma progressividade e uma estrutura organizada. Fazer o aluno pensar, portanto, é promover uma aprendizagem que organiza o conhecimento, mas, se este pensar for restritivo não haverá o que pensar, assim, não há o que aprender. Para exemplificar essa teoria, me lembrei de um professor que tinha como metodologia apresentar/ensinar conteúdos fazendo perguntas, mas antes que pudesse pensar sobre o assunto, já tinha respondido, dando sequência à aula. O que aprendi? A ficar calado! 2.3 Capacidades, habilidades e estilos de aprendizagem Para prosseguirmos vamos conceituar capacidade e habilidade de modo que fiquem esclarecidos ante nossas análises e reflexões nessa parte de nosso estudo. 30 www.eunapos.com.br Considerando que estamos estudando a construção do sujeito autor, definimos capacidade entendida, para este estudo, como a disposição inata de todo ser humano para a aprendizagem. Pois, aprender é um comportamento inerentemente humano, e que o capacita a estar em contínuo aprendizado, comungando de conhecimentos que são sempre aplicáveis dentro sua realidade. Porém, ao afirmarmos que todo conhecimento é antes um processo, ao qual o indivíduo deve se sujeitar para aprender, vemos que habilidade é o saber fazer que está mais próximo da competência, já que nesse estudo estamos fazendo relações precisas entre as teorias, os processos e a formação da autoria como a autonomia da aprendizagem. Segundo Monereo Font (2000, apud PORTILHO, 2009, p.81): As habilidades são as capacidades que podem expressar-se mediante comportamento em qualquer momento, já que são desenvolvidas por meio da prática, isto é, por via procedimental, de maneira que, detrás de todo procedimento humano, existe uma habilidade que possibilita que tal procedimento seja realizado. As pessoas se sentem habilitadas para fazer algo quando já dominam, em certa medida, o conhecimento para tal. Assim, são muitas as habilidades que as pessoas possuem, pois para se movimentar, para ler, escrever, falar, pintar, recortar, costurar, construir, etc., são elas necessárias. Sendo assim, as habilidades vão sendo construídas no decurso da vida, sendo práticas comuns, nas quais não precisam mais do pensamento para que sejam realizadas. Assim como, por exemplo, andar, vestir, abotoar, correr e pular, cortar e colar, etc. uma vez registrada, a habilidade é uma ação voluntária sem necessidade da percepção do pensamento. Esse natural condicionamento é o que torna mais difícil a adaptação de uma pessoa que passa a ter algum tipo de deficiência física, por exemplo, pois terá que reaprender o movimento e reeducar-se. Por outro lado, cada pessoa possui um estilo próprio para aprender, sendo uma preferência pessoal, e que mesmo sendo semelhante nunca se manifesta de maneira igual em pessoas diferentes, pois o estilo é uma singularidade. Segundo, Rubinstein, (2003, p.129): É possível pensar que o sujeito da aprendizagem guarde um estilo, como os antigos guardavam seus documentos onde estavam 31 www.eunapos.com.br registradas as suas leis. Não serão os estilos de aprendizagem as leis que regem o aprendiz? Concordando com a autora e respondendo a sua questão, os estilos são identidades inatas, já que aprender é inerentemente humano, sendo que cada pessoa o possui como um código que regula como se processará a aprendizagem. Por um lado, é confortante saber que temos um estilo próprio de aprendizagem como um processo natural; por outro, é preocupante saber que cada pessoa possui o seu estilo, sobretudo, quando nos reportamos à sala de aula, frente a um grupo de alunos e, apenas um professor para identificar cada estilo em cada um de seus alunos. Então, quantos estilos estão manifestos numa sala de aula? E, quais são esses estilos e como poderão ser reconhecidos pelo professor ante o processo de ensinagem? A autora Portilho, em suas pesquisas sobre o assunto, trouxe muitas elucidações que seriam interessantes para esse estudo e, que agora vou expor como fundamento. Assim, esta autora retrata as experiências de Kolb (1984) quanto às quatro habilidades que têm lugar em um ciclo de quatro estádios, que formaram os estilos: experimentação concreta: o aprendiz, dispondo das habilidades necessárias deve colocar-se por inteiro na situação proposta, de forma aberta, e fazendo experiência nova. Em outras palavras, éimportante que ele queira aprender; observação reflexiva: é importante que o aprendiz seja hábil para refletir sobre as experiências e para observá-las a partir de diferentes perspectivas. Além de querer aprender, o sujeito deve considerar todas as possibilidades que uma única situação oferece; conceituação abstrata: este momento da aprendizagem supõe uma habilidade para criar conceitos e integrá-los a teorias sólidas. Exige que o sujeito vá além de seu processo habitual de aprendizagem, seja criativo e construa seus próprios conceitos. experimentação ativa: o sujeito deve desenvolver a habilidade de utilizar as teorias para tomar decisões e solucionar problemas que podem levar a novas experiências concretas. Depois de querer, refletir e conceituar, o sujeito 32 www.eunapos.com.br que aprende deve ser hábil para resolver situações problemáticas. (PORTILHO, 2009, p. 96). Por essa perspectiva, podemos perceber que o processo de aprendizagem é, sobretudo, uma construção que perpassa a subjetividade do aprendiz – querer, desejar, interessar-se a aprender – e, a objetividade quando este passa a aplicar seus conceitos e experiências para solucionar problemas, implicando numa interferência própria e intencional na realidade. Retomando as pesquisas de Portilho, quanto à formação dos estilos de aprendizagem, Kolb apresenta o seguinte: Estilo Convergente: são pessoas que se destacam por sua destreza no uso do raciocínio hipotético-dedutivo para chegar a uma única solução sobre uma determinada questão. A conceitualização abstrata e a experimentação ativa são dois aspectos importantes encontrados nos aprendizes que utilizam este estilo, uma vez que definam bem os problemas e a tomada de decisões. Podemos dizer que tecnólogos, economistas, engenheiros, médicos, físicos, informáticos, entre outros, são os que utilizam preferencialmente este estilo. Fonte: http://migre.me/3VxD9 Estilo Divergente: são pessoas que apresentam como ponto forte em sua aprendizagem a habilidade imaginativa e a atenção aos significados e aos valores. A habilidade para contemplar as situações a partir de muitos pontos de vista e para estabelecer relações dentro de um todo significativo, obtendo assim, novas ideias, é algo marcante na aprendizagem dos que têm predomínio neste estilo. As pessoas que podemos incluir nesse estilo de aprendizagem geralmente são planejadoras, orientadoras, terapeutas, assistentes sociais, enfermeiras, músicos, atores e artistas em geral. Fonte: http://migre.me/3VxH2 33 www.eunapos.com.br Estilo Assimilativo: são pessoas que utilizam preferencialmente o raciocínio indutivo, apresentam habilidade para criar modelos teóricos e assimilam observações diferentes, embasando-as em uma explicação racional integrada. É justamente por estas características que os que têm predomínio por este estilo na hora de aprender se preocupam menos com o uso prático das teorias que aqueles que se servem do estilo convergente. Em determinadas situações, parece que eles se interessam mais pelas ideias do que pelas pessoas. Geralmente, professores, escritores, matemáticos, financistas, biólogos, advogados, bibliotecários e outros. Fonte: http://migre.me/3VxJh Estilo Criativo: diferentemente do estilo assimilador, as pessoas que apresentam preferência neste estilo de aprendizagem tendem a adaptar-se muito bem a situações novas. Utilizam a experimentação ativa e a experiência concreta, aprendendo principalmente fazendo coisas, aceitando os riscos e atuando pelo que sentem mais do que pela lógica. São pessoas intuitivas, resolvem os problemas por ensaio e erro, apoiam-se nos outros para buscar informação. As que mais utilizam este estilo são geralmente banqueiros, políticos, administradores, vendedores, especialistas em relações públicas e outros (PORTILHO, 2009, p. 98-99). Fonte: http://migre.me/3VxNY Então, já sabe agora qual é o seu estilo de aprendizagem? Notou como são comportamentos que cada um expressa em função do como aprender e expor as habilidades no saber-fazer. Mas, é importante que se saiba que estes estilos não são aparentes em crianças em início de escolarização, pois se estruturam de acordo com formato da ensinagem à qual são expostas. Entende-se assim, que se buscará um estilo em função do como se ensina, porque o professor também tem um estilo – de aprender 34 www.eunapos.com.br e de ensinar – que reflete na sua prática pedagógica e interfere no modo como seus alunos reagem frente à aprendizagem. Portanto, o estilo passa a ficar mais evidente quando o aluno já estabeleceu uma forma de aprender em função de como foi ensinado. Acredita-se, então, que o estilo é manifesto no aluno de forma determinante quanto já possui a consciência de seu interesse no aprender, quando já identifica suas dificuldades e limitações sobre determinado conteúdo e quando se identifica mais com alguns conteúdos do que com outros. Mas, além de Kolb, Peter Honey (1986)14 também sugere uma proposta de quatro estilos de aprendizagem: Estilo Ativo: são as pessoas que se destacam por sua vivacidade, mente aberta e gosto por novas experiências; é quase impossível não percebermos sua presença; quando estão em grupo, sempre estão fazendo alguma coisa; e, em geral, são bem intempestivas; Estilo Reflexivo: são as pessoas que utilizam a observação e a análise antes de chegarem a alguma conclusão; gostam de valorizar todas as possibilidades da situação antes de tomar decisões; preferem escutar mais, para depois agir; e são mais ponderadas que os ativos; Estilo Teórico: são aqueles que integram as observações dentro das teorias lógicas e complexas; buscam a racionalidade, a objetividade e a lógica, assim como a análise e a síntese; tendem a ser perfeccionistas; Estilo Pragmático: são os que tendem a colocar em prática as ideias, mostram-se impacientes até poderem aplicar o que aprenderam; têm como objetivo a funcionalidade. (PORTILHO, 2009, p. 100-101). E agora... Encontrou-se em algum grupo? Contudo, os estilos de aprendizagem também podem ser adicionados quanto às suas características, pois uma pessoa pode ter mais ou menos alguns dos comportamentos apresentados em cada um dos estilos sendo que, às vezes, numa pessoa dois estilos se complementam, como por exemplo: uma pessoa pode ter o estilo ativo, porque é mais aberta e vivaz, mas não gosta de correr riscos, sendo 14 Nascido na Inglaterra, tornou-se administrador e em 1986 pressupõe a aprendizagem em quatro passos. Mas, como sua experiência está mais voltada ao campo empresarial lança um instrumento denominado “Learning Stilles Questionnaire” para avaliar os estilos de aprendizagem empresarial. 35 www.eunapos.com.br mais observadora e racional, do estilo reflexivo. Então, podemos dizer que ela possui dois estilos que se complementam, tendo um ou outro com mais ou menos intensidade. Em todo caso, sempre haverá um estilo predominante. Mas, Rubinstein (2003), traz a seguinte observação: Considerar o estilo do sujeito da aprendizagem poderá contribuir para questionar as causas da quantidade significativa de crianças com insucesso escolar, as quais, apesar de não serem reprovadas, sofrem pela condição de alunos tidos como medíocres ou desinteressados (RUBINSTEIN, 2003, p. 183). Todo professor deve ter um “olhar clínico” sobre seus alunos, para poder contemplar como cada um é no seu envolvimento com a aprendizagem, fazendo assim um diagnóstico do desenvolvimento do aluno, como sendo capaz de aprender e aprimorar-se em seus conhecimentos. Mas, este “olhar”, não tem o poder de definir padrões de comportamento e, não pode ser o meio pelo qual o professor se sente capaz de diagnosticar dificuldades dos alunosdando-lhes atributos que desconhece desde sua raiz. E, nesse caso, se o professor não pode se decidir por uma identificação de um estilo, que não pratique a exclusão por sua ignorância. Exercício 2 1. Para Rogers, a aprendizagem é significativa quando: a) O professor facilita para o aluno aprender, escolhendo as melhores formas de ensinar. b) O aluno é levado a pensar por que aprender e para que serve a aprendizagem. c) O professor regula os processos de aprendizagem e ensinagem em função das dificuldades do aluno. d) O aluno se torna responsável por sua aprendizagem, por suas escolhas e recursos. 2. A razão para não entendermos a autoria apenas pelo foco do aluno é que: a) Toda relação de conhecimento só existe quando alguém ensina. b) Toda relação de conhecimento só existe quando alguém aprende e o outro informa o conteúdo. c) Toda relação de conhecimento só existe quando alguém aprende. d) Toda relação de conhecimento só existe quando alguém ensina e o outro aprende. 3. A definição clássica de conhecimento, originada em Platão, diz que ele consiste: 36 www.eunapos.com.br a) Em conhecimentos verdadeiros e justificados. b) Em crenças verdadeiras e justificadas. c) Em crenças e valores verdadeiros e justificados. d) Em valores justificáveis e crenças verdadeiras. 37 www.eunapos.com.br UNIDADE 3 – CONCEITO DE APRENDER E DE SUJEITO AUTOR 3.1 Aprendentes são muitos, autores nem sempre Já vimos que aprender é um processo em constante construção, e é inerente ao sujeito, pois se aprende como parte da natureza humana, considerando desde suas necessidades básicas de alimentação, de movimento, de proteção e de sentimentos, até as necessidades sociais, de comunicação, de linguagem e de estruturação do meio em que está inserido. Aprende-se com o meio, com as pessoas, com a maturação biológica, com as situações – prováveis e improváveis; aprende- se pela vontade, pelo desejo e pela curiosidade sendo esta a primeira, mais simples e ingênua das manifestações de aprendizagem – aliás, você conhece alguma criança que não seja curiosa? Você foi, ou ainda é curioso? Fonte: http://migre.me/3VyTZ Pois é, a curiosidade é o primeiro passo para a aprendizagem, quanto mais curioso, mais aprendiz. Porém, os aprendentes são todos os que perpassam o processo de aprendizagem, mas autores são poucos, porque autoria sugere autonomia. Segundo Fernández (2001, p.105), “a autoria de pensamento supõe diferenciação, agressividade saudável, ‘re-volta íntima’ a partir da qual há a possibilidade de reencontro com o outro. Acesso a nós mesmos”. Em outras palavras: nos tornamos autores quando permitimos concretizar o nosso desejo de conhecer, sem que queiramos aprender de maneira fácil, mas sim de maneira provocativa, misteriosa e excitante. Nesse sentido, somos atraídos para a aprendizagem porque tudo que nos salta aos olhos tem um significado imposto e um significante que o explica. Isso não será difícil de entender, por exemplo, se antes de querer ensinar a uma criança como se escreve a palavra “gato”, remeter a imagem de um felino, descrever como é esse animal e qual som emite. 38 www.eunapos.com.br Assim, a criança terá um significado (descrição) e a imagem (um significante), que auxiliarão para que ela, já reconhecendo cada uma das letras, tenha condição de escrever a palavra “gato”. Portanto, aprender é, também, sempre uma necessidade intencional, pois a intenção do aprender é atingir seu significado e, a partir do conhecimento estabelecido, formar novas aprendizagens, recomeçando o círculo inicial da aprendizagem. Fonte: http://migre.me/3VyZ8 Mas, para que além de aprendente, o sujeito seja autor, faz-se importante permitir que ele tenha consciência de seu aprender, bem como, levá-lo a interpretar seu processo de conhecimento articulando-o a todos os que já possuía e, fazê-lo reconhecer que seus conhecimentos são aplicáveis em uma realidade conhecida. Quando digo que alguém deve permitir, me refiro à família, aos pais, à escola e aos professores – todos os adultos têm uma grande parcela de responsabilidade nessa permissão. Dolto (apud Fernández, 2001, p.115), afirma que “...se os adultos fazem pela criança o que ela quis fazer e não pode, é grave, porque, ao proporcionar o resultado imediato da experiência, estão suprimindo o desejo...” Isso não quer dizer que se deva permitir que a criança faça tudo o que queira, com a desculpa de que ela está aprendendo. Esta premissa me fez lembrar uma situação que presenciei numa instituição escolar na qual fui orientador educacional, alguns anos atrás. Estava quase terminando o recreio das crianças quando a supervisora adentrou na minha sala, trazendo pelas mãos um jovenzinho de uns seis anos. A supervisora esclareceu-me que a criança em questão estava “batendo” em outra criança, e pediu minha orientação quanto ao caso. Sugeri que a profissional voltasse a suas tarefas, deixando a criança comigo; assim, expliquei para o jovenzinho que aquilo não era certo e... No final do expediente escolar, encontrei com a mãe do mesmo aluno no portão de saída quando veio buscá-lo. Na oportunidade, a convidei para irmos à minha sala e lhe relatei o ocorrido, inclusive falei de minha conversa com o mesmo. A mãe, radiante de alegria, não teve papas na língua ao me falar – “Que bom saber que ele está ficando independente!” 39 www.eunapos.com.br Permitir que a criança faça o que quiser, não é fazê-la autônoma, mas torná- la incoerente frente à sua aprendizagem, pois de nada adianta os dentes se não sabe mastigar, saberá apenas morder – assim, morrerá de fome. Claro que falo em tom de analogia, mas sem alguém que ensine, não haverá aprendizado. E, todos têm condições de aprender, independente de quaisquer condições e, ansiosamente, aprendemos porque nos descobrimos como parte de um todo e que esse todo faz parte de nós. Isso significa que prezamos pela nossa autonomia, portanto, a autoria do pensar que leva a aprender, que leva ao conhecer e que, finalmente, provoca o sujeito a ensinar... faz nascer, assim, o Autor! 3.2 Modalidade de Aprendizagem e Ensinagem Uma das melhores maneiras de o professor intervir nas dificuldades que seus alunos possam apresentar na aprendizagem, é estar atento à modalidade de aprendizagem de cada aluno. Não se trata de uma técnica, nem de um recurso, mas de uma forma de manifestação do aluno ante o seu exercício de aprender. Essa manifestação é revelada no modus operacional do aluno, ou seja, ele age dessa ou daquela forma frente ao que espera aprender. Fernández (2001, p.79) chama isso de molde relacional, explicando-o: Quando digo que a modalidade de aprendizagem supõe um molde relacional que cada sujeito utiliza para aprender, estou referindo-me a uma organização do conjunto de aspectos (conscientes, inconscientes e pré-conscientes) da ordem da significação, da lógica, da simbólica, da corporeidade e da estética. Situando a premissa da autora, pode-se perceber que o conceito de modalidade aplica-se a um conjunto de comportamentos, espontâneos e não espontâneos, manifestado pelo aluno no processo de seu aprender. Para ilustrar, esse conceito tome como exemplo uma sala de aula; quando a professora começa a apresentar o conteúdo no quadro, os alunos copiam; antes de terminar essa passagem de conteúdo, já tem alunos perguntando se “aquilo” é difícil, se ela (professora) vai explicar, se vai precisar copiar tudo, etc. Percebe? Há muita ansiedade no ar, uma inquietude, uma movimentação dos alunos. Essas 40 www.eunapos.com.br manifestações contemplam o medo do desconhecido, o anseio pelo real e o prazer pelo conhecimento. A reflexão que emerge disto é: como aprendo, para que aprendo e o que farei com isso. Isto é a modalidade de aprendizagem supõe uma
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