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Autoras: Profa. Adriana Morbin Pini Profa. Carmen Lúcia Dalano Colaboradores: Profa. Vanessa Santhiago Prof. Mário André Sigoli Recreação ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 Professoras conteudistas: Adriana Morbin Pini / Carmen Lúcia Dalano Adriana Morbin Pini Cursou bacharelado e licenciatura em Educação Física pela OSEC Universidade de Santo Amaro (Unisa). Fez pós-graduação latu senso em Didática do Ensino Superior e Gerenciamento e Marketing na Universidade Ibirapuera e mestrado em Educação, Arte e História da Cultura na Universidade Mackenzie. É professora universitária há 28 anos e já foi coordenadora do departamento de práticas esportivas e Recreativas da Unisa e professora concursada pelo Estado de São Paulo e atuou em escolas e eventos recreativos para a comunidade na cidade de São Paulo. Foi professora no Centro de Iniciação e Aprendizagem Esportiva do clube Círculo Militar de São Paulo. É também professora de música e gravou 2 CDs para recreação infantil. Leciona na UNIP desde 2007. Carmen Lúcia Dalano Cursou bacharelado e licenciatura em Educação Física pela OSEC Universidade de Santo Amaro (Unisa). Fez pós-graduação latu-sensu em Atividades Físicas de Academia e Mestrado em Psicopedagogia na Unisa. É especialista em Arteterapia Aplicada pela UNIP. Realizou cursos livres de Danças Circulares e Formação em Yoga. É professora universitária há 21 anos. Leciona na UNIP desde 2005. Trabalhou como professora corresponsável pelo Departamento de Estágio em Educação Física da Unisa, onde participou da elaboração do Regimento e do Manual de Estágio do Curso de Educação Física. Atuou como professora no Ensino Fundamental I em escolas da rede pública e em escolas particulares na cidade de São Paulo. Foi professora de atividades aquáticas em três academias. É arteterapeuta e professora de yoga num espaço do qual é também proprietária. © Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Universidade Paulista. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) P654r Pini, Adriana Morbin. Recreação. / Adriana Morbin Pini, Carmem Lúcia Dalano. – São Paulo: Editora Sol, 2016. 160 p., il. Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e Pesquisas da UNIP, Série Didática, ano XXII, n. 2-114/16, ISSN 1517-9230. 1. Recreação. 2. Desenvolvimento. 3. Aprendizagem. I. Dalano, Carmem Lúcia. II. Título. CDU 371.382 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 Prof. Dr. João Carlos Di Genio Reitor Prof. Fábio Romeu de Carvalho Vice-Reitor de Planejamento, Administração e Finanças Profa. Melânia Dalla Torre Vice-Reitora de Unidades Universitárias Prof. Dr. Yugo Okida Vice-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa Profa. Dra. Marília Ancona-Lopez Vice-Reitora de Graduação Unip Interativa – EaD Profa. Elisabete Brihy Prof. Marcelo Souza Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar Prof. Ivan Daliberto Frugoli Material Didático – EaD Comissão editorial: Dra. Angélica L. Carlini (UNIP) Dra. Divane Alves da Silva (UNIP) Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR) Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT) Dra. Valéria de Carvalho (UNIP) Apoio: Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos Projeto gráfico: Prof. Alexandre Ponzetto Revisão: Marcilia Brito Lucas Ricardi ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 Sumário Recreação APRESENTAÇÃO ......................................................................................................................................................7 INTRODUÇÃO ...........................................................................................................................................................7 Unidade I 1 O LAZER E A RECREAÇÃO NA HISTÓRIA ...................................................................................................9 1.1 A Carta Internacional de Educação para o Lazer .................................................................... 14 1.2 Promoção da recreação na comunidade .................................................................................... 22 1.3 Espaços e equipamentos de lazer e recreação ......................................................................... 26 2 HOMO LUDENS ................................................................................................................................................ 29 2.1 Atividades lúdicas e recreação ........................................................................................................ 29 2.2 O brincar .................................................................................................................................................. 33 3 MOTIVAÇÕES PARA DIVERSÃO E INTERESSES CULTURAIS ............................................................. 36 3.1 Fantasia, vertigem, aventura e competição .............................................................................. 36 3.2 Interesses físicos, manuais, artísticos, intelectuais, sociais e turísticos.......................... 43 4 DOMÍNIOS DO DESENVOLVIMENTO ......................................................................................................... 49 4.1 Físico-motor ........................................................................................................................................... 49 4.2 Cognitivo ................................................................................................................................................. 50 4.3 Socioafetivo ............................................................................................................................................ 52 Unidade II 5 RECREAÇÃO COMO MEIO NA EDUCAÇÃO FÍSICA .............................................................................. 59 5.1 No desenvolvimento psicomotor ................................................................................................... 59 5.2 O papel do professor na recreação................................................................................................ 61 6 O JOGO COMO ATIVIDADE LÚDICA E SOCIOCULTURAL ................................................................... 64 6.1 A perspectiva desenvolvimentista de Piaget ............................................................................. 69 6.2 Jogos tradicionais infantis (JTI) ...................................................................................................... 73 6.3 Jogos cooperativos e de socialização ........................................................................................... 80 6.4 Jogos de estafeta .................................................................................................................................. 83 6.5 Jogos pré-desportivos ........................................................................................................................ 84 6.6 Jogos de tabuleiro ................................................................................................................................ 86 Unidade III 7 O BRINQUEDO .................................................................................................................................................. 94 7.1 Material didático versus brinquedo ..............................................................................................96 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 7.2 Construção e brincadeira: oficina recreativa ............................................................................ 97 7.3 Brinquedos cantados .......................................................................................................................... 98 7.4 Brinquedotecas ...................................................................................................................................101 8 ATIVIDADES RECREATIVAS COM A PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE ....................................103 8.1 Gincanas.................................................................................................................................................103 8.2 Gincana de circuito lúdico ..............................................................................................................104 8.3 Gincana de solicitações ...................................................................................................................109 8.4 Gincana aquática ...............................................................................................................................111 8.5 Caça ao tesouro ..................................................................................................................................112 8.6 Caminhadas recreativas ...................................................................................................................117 8.7 Matroginástica ....................................................................................................................................120 8.8 Danças circulares recreativas.........................................................................................................127 8.9 Colônia de férias .................................................................................................................................130 8.10 Ação comunitária: lazer ................................................................................................................139 7 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 APRESENTAÇÃO Nossa disciplina estuda a recreação enquanto atividade lúdica e motivacional, utilizada como instrumento de educação e desenvolvimento humano, buscando um completo entendimento de suas implicações culturais e, portanto, sociais, tornando o aluno capaz de definir os objetivos de seu trabalho e elaborar projetos de ação com as diversas comunidades. Orienta o futuro profissional da Educação Física para um trabalho criativo, buscando integração social, civismo, humanização e valorização da natureza e do serviço à comunidade. Estimula a criação de oportunidades de melhoria da saúde e qualidade de vida através do exercício do lazer e da recreação. O objetivo geral desta disciplina é fazer com que o estudante compreenda a importância da recreação para o desenvolvimento humano nos ambientes de educação e desenvolva competência para a elaboração e a aplicação de atividades lúdicas para diferentes grupos. Nesta disciplina, espera-se que o discente seja capaz de: • entender e valorizar a importância do profissional de Educação Física no contexto da recreação e do lazer; • conhecer as características e motivações das diferentes faixas etárias e grupos sociais; • compreender a atividade lúdica como um meio de educação; • elaborar planos de ação que atendam às necessidades educacionais, por meio de atividades lúdicas; • colaborar nos projetos interdisciplinares da escola de forma criativa, atual e inovadora; • conduzir atividades lúdicas de forma competente, atendendo aos objetivos propostos; • desenvolver trabalhos em grupo de forma cooperativa, solidária e ética. INTRODUÇÃO Caro aluno, durante este curso pretendemos mostrar a você que o profissional de Educação Física está inserido no contexto social e mercadológico com o compromisso de representar a área da saúde, promovendo atividades lúdicas de forma consciente e competente. Estaremos refletindo sobre o tempo de lazer das pessoas, que muitas vezes optam por praticarem atividades físicas que lhes dão prazer, e é nesse tempo que o profissional de Educação Física estará trabalhando, portanto devemos entender qual é o seu papel e sua postura diante desse cenário. Entender o ser humano como um ser lúdico por natureza e ainda saber identificar quais são as possibilidades de motivação para que as pessoas pratiquem suas atividades físicas, de forma lúdica. Além do contexto histórico social do lazer e da recreação, estudaremos as contribuições das atividades recreativas para o desenvolvimento global do ser humano nos seus domínios: cognitivo, 8 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 socioafetivo e físico-motor. Estudaremos a Teoria Desenvolvimentista de Piaget com o objetivo de entendermos as fases do desenvolvimento infantil e suas relações com o jogo. A Educação Física está baseada nos temas: ginástica, esporte, dança e jogo. A recreação pode estar presente em todos os temas, mas é o jogo que iremos estudar como tema principal, conhecendo a sua essência, suas características, classificações e relações com o trabalho do profissional de Educação Física. Fizemos uma seleção do estudo de tipos de jogos que o ajudarão no desenvolvimento de diversos programas recreativos para a comunidade, assim você poderá ampliar seus conhecimentos e torná-los mais significativos na hora de aplicá-los. Discutiremos também a postura do professor de Educação Física no papel de líder e de mediador das atividades lúdicas. Valorizaremos a construção do brinquedo como atividade lúdica, recreativa e socioeducativa, além de outras atividades que também desenvolvem valores humanos e de cidadania, como gincanas, matroginástica, caça ao tesouro, caminhadas recreativas, colônia de férias e ações comunitárias. Enfim, você irá compreender os valores da recreação nos diversos campos de atuação do profissional de Educação Física e ainda estará pronto para desenvolver programas com um rico repertório de atividades lúdicas, de forma consciente e competente. Saudações recreacionistas! 9 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 RECREAÇÃO Unidade I 1 O LAZER E A RECREAÇÃO NA HISTÓRIA Um dos mais importantes estudiosos do lazer contemporâneo, ao se interessar em definir o lazer, nos faz entender que este se insere nas ocupações de livre escolha e que se desvinculam das obrigações profissionais, sociais e familiares. O indivíduo no seu tempo de lazer pode se ocupar por livre vontade para repousar, divertir-se, recrear-se ou entreter-se (DUMAZEDIER, 2001). A palavra lazer faz parte do nosso vocabulário, mas adquire significados, muitas vezes, distorcidos. Ouvimos muitas frases como: “eu pratico meu lazer estudando”; ou então: “agora é hora do meu lazer, não estou trabalhando”; ou: “não tenho tempo para meu lazer”; ou ainda: “eu trabalho nas minhas horas de lazer”. Mas o que significa lazer? Lazer ou loisir (em francês) significa tempo, espaço de que se pode dispor livremente. Vindo do inglês (leisure), quer dizer liberdade dos deveres, responsabilidade ou atitudes que consomem tempo. Na nossa língua portuguesa, o lazer é descanso, folga, senso de prazer, ou seja, tempo de que se pode dispor livremente. Podemos verificar que existe algo em comum em todos os significados e conceitos apresentados sobre o lazer: a liberdade. Essa liberdade está na possibilidade de escolhermos as atividades que vamos fazer para“passar o tempo” e nos entretermos, nos divertirmos ou simplesmente descansarmos. Para exercer essa liberdade, precisamos estar livres de qualquer atividade relacionada ao dever ou à obrigação. Então, lazer é diferente de trabalho, inclusive dos trabalhos domésticos e horas extras, é diferente de cumprimento de atividades cívicas ou sociais e de estudo. Lazer é tempo livre. Os conceitos, valores, reflexões, ações, e tudo o que se refere ao lazer e à recreação foram construídos ao longo da história. Antes da industrialização, no meio rural, o trabalho era longo e cansativo, mas ainda assim respeitavam-se os ritmos naturais do ser humano de acordo com os ciclos e eventos da natureza, como o dia e a noite, as condições do clima e as estações do ano. As famílias permaneciam unidas também no trabalho, pois moravam próximo ao local de trabalho e muitas trabalhavam juntas. Ao longo do dia, o descanso acontecia por motivos naturais relacionados ao cansaço, à mudança de tempo ou outro fator da natureza que impedia prosseguir o trabalho. Além disso, era costume o descanso aos domingos e em feriados religiosos. Nas entressafras, quando não era tempo de plantação ou de colheita, acontecia o descanso imposto pela falta de ter em que trabalhar. Então, na era rural, as práticas de lazer aconteciam de forma natural e o descanso e a contemplação eram a forma mais comum de lazer. 10 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 Unidade I Quanto à recreação, podemos dizer que elas apareciam ao longo do dia, nas músicas assobiadas pelos trabalhadores, nas rodas de conversa, nas brincadeiras das crianças, nas festas tradicionais para comemorar a colheita ou em festejos religiosos. Essas manifestações do trabalho e da recreação aparecem nas danças tradicionais, por exemplo, em que “os gestos do trabalho na terra, na madeira, com companheiros, são incorporados e estilizados, demonstrando a ligação afetiva e lúdica” entre o trabalhador e seu trabalho (CAMARGO, 1992, p. 36). Nos centros urbanos, onde a indústria proliferou, o trabalho também mudou. A jornada de trabalho passou a ser longa, assim como na era rural, porém o trabalhador da indústria estava distante da natureza, da família, do “seu tempo” e do “seu espaço”, num ambiente artificial, hostil e bem diferente do hábitat natural e da vida da roça. O trabalho, geralmente na linha de montagem, exigia esforço físico contínuo e repetitivo, além de atenção constante. Uma mera distração poderia prejudicar todo o trabalho dos outros e comprometer a produtividade. O sono também ficou comprometido com as longas jornadas de trabalho e a possibilidade do uso da energia elétrica nos períodos noturnos. Trabalhava-se 5.000 horas por ano, o que significava jornada diária de 16 horas, de segunda a domingo, quase todos os dias do ano. Saiba mais O filme a seguir, de1936, é do cineasta britânico Charles Chaplin. Nele, o seu famoso personagem “O Vagabundo” tenta sobreviver em meio ao mundo moderno e industrializado. TEMPOS modernos. Dir. Charles Chaplin. Estados Unidos: Charles Chaplin Productions, 1936. 87 min. Exemplo de aplicação Ao assistir o filme Tempos Modernos, perceba que na linha de montagem, a menor distração de um elemento prejudica a produtividade dos demais; os intervalos de descanso são muito reduzidos e controlados rigorosamente; e a polícia é repressora dos chamados “vagabundos”. No entanto, a criatividade do personagem, seu otimismo, persistência, coragem, bondade e bom humor mostram as necessidades humanas de afeto, carinho, proteção e solidariedade. Reflita sobre o processo de industrialização e fique atento aos detalhes como: • cinema mudo – linguagem corporal; • preto e branco – estímulo à memória visual e criatividade; • comédia – prazer, diversão; • o relógio – símbolo dos novos tempos; 11 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 RECREAÇÃO • os operários comparados aos porcos – tratamento desumano; • a produtividade é o que importa – trabalhador explorado, sem descanso; • trabalho insalubre – problemas motores, psicológicos e mentais; • cena clássica – a máquina que engole o homem, que fica “louco” e é internado. O quadro desumano em que os trabalhadores se encontravam fez com que eles passassem a lutar pela redução da jornada de trabalho. Em 1901, no Brasil, foi deflagrada a primeira greve. Nela, os trabalhadores da Cia. Industrial de São Paulo reivindicavam várias coisas, dentre as quais, a regulamentação da jornada de 11 horas. Em 1903, no Rio de Janeiro, os operários da indústria têxtil conseguiram a jornada diária de nove horas e meia. Apesar dos salários miseráveis, a redução da jornada de trabalho sempre foi o item mais saliente da luta dos trabalhadores brasileiros. Em 1907, o primeiro recenseamento industrial Brasileiro mostrava a existência de 3.258 empresas e 150.841 trabalhadores. Esta base humana mais forte conferiu credibilidade à greve que explodiu simultaneamente em 1º de maio, nas principais capitais do país e nas cidades industriais de São Paulo como Sorocaba, Santos e Campinas. A partir daí as principais conquistas da redução da jornada de trabalho, ainda que frágeis, foram sendo pouco a pouco obtidas (CAMARGO, 1992, p. 41). Observação O Dia do Trabalho é comemorado em 1º de maio. No Brasil, e em vários países do mundo, é um feriado nacional, dedicado a festas, manifestações, passeatas, exposições e eventos reivindicatórios. Acreditamos assim que seria justo homenagear o lazer nessa data, pois as conquistas dos trabalhadores propiciaram uma maior valorização do tempo livre, um tempo que para nós é o tempo da criatividade e da evolução cultural. Institucionaliza-se o lazer. É reconhecida a valorização do direito ao lazer, ao tempo livre como um tempo de livre escolha, que deve ser respeitado desde que não prejudique o indivíduo e nem a sociedade. É importante que o lazer deixe um saldo positivo para cada um e para todos. A organização da jornada diária deve se pautar nas necessidades de sono e de lazer, divididas em: oito horas de sono, oito horas de trabalho e oito horas de lazer. 12 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 Unidade I Na realidade, a maioria da população trabalhadora não consegue cumprir essa divisão, sacrificando em primeiro lugar o tempo de lazer. O tempo imposto invade o tempo de lazer, principalmente nos centros urbanos. Lazer é o “tempo livre” de obrigações profissionais, afazeres domésticos, obrigações religiosas e necessidades fisiológicas. O “tempo imposto” é aquele gasto com tarefas não planejadas, mas necessárias para atender ao estilo de vida de cada um, como: filas de banco, transporte etc. (LEFEBVRE, 1991 apud BRUHNS, 1997, p. 106). Depois de muita luta, foi criada a Consolidação das Leis de Trabalho (CLT), no governo de Getúlio Vargas, que trouxe mudanças, como: a institucionalização do salário mínimo, a regulamentação das férias e da aposentadoria e a legalização da jornada de oito horas. Mesmo com a CLT, as indústrias continuavam a explorar os trabalhadores, vinculando a jornada diária a uma produtividade mínima. Em 1917 foi criado o projeto de lei que instituía o final de semana de descanso e a jornada diária de oito horas. Assim, estava efetivado o lazer na vida dos trabalhadores. Surgiram muitas perguntas referentes ao que os trabalhadores iriam fazer nas horas de descanso; a dúvida de se haveria aumento do alcoolismo; o questionamento sobre a moral e os bons costumes e se as empresas e o país suportariam tantas reduções. Exemplo de aplicação O trabalhadorbrasileiro, no início do século XX, chegava a ter uma jornada anual de 5.000 horas de trabalho. Atualmente, com uma jornada semanal de 48 horas, ao longo da jornada anual oficial de 273 dias, o trabalhador cumpre 2.200 horas de trabalho por ano. Os trabalhadores do setor terciário, bancos e escritórios, 1.800 horas. Pensando nessas mudanças e o que elas trariam aos trabalhadores, ficou uma pergunta que podemos repetir até os dais atuais: será que o tempo ganho se transformou em lazer? A implementação do lazer na vida das pessoas devido às mudanças no trabalho fez com que elas, aos poucos, passassem a enxergá-lo como algo necessário ao bem estar e à qualidade de vida pessoal e social. Segundo Dumazedier (2001, p. 32), o lazer tem três funções, conhecidas como os três “Ds”: Quadro 1 Funções do lazer Diversão Descanso Desenvolvimento Toda a atividade que diverte e entretém o indivíduo de forma ativa ou passiva, por exemplo, assistir a uma partida de futebol ou jogar uma partida de tênis. Toda a atividade que promova o relaxamento, a recuperação física e mental, por exemplo, ouvir música, meditar, contemplar uma paisagem ou conversar com amigos. Toda a atividade que desenvolva os talentos e amplie o acervo cultural do indivíduo, por exemplo, aprender a tocar violão, visitar um museu ou ir ao cinema. 13 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 RECREAÇÃO As funções do lazer têm relação direta com a saúde e a qualidade de vida. Segundo a Organização Mundial da Saúde, saúde é “um estado de completo bem estar físico, mental e social e não somente ausência de afecções e enfermidades” (SEGRE; FERRAZ, 1997, p. 539). Para se atingir esse estado, são necessários alguns comportamentos, dentre eles a prática do lazer. Podemos dizer que se falta o lazer, a doença acontece, pois a linha que separa a saúde da doença é bem tênue. Assim, dificilmente alguém ficaria gripado por falta de lazer, mas esta falta acarreta, mesmo indiretamente, a queda da imunidade e falta de ânimo para seguir a vida cotidiana, o que pode gerar ou facilitar a doença. O lazer ainda atua no processo de crescimento e de desenvolvimento permitindo que eles aconteçam de forma plena e satisfatória. Associada ao lazer está a recreação, cuja palavra vem do verbo latino recreare, que significa recrear, renovar, reproduzir, recuperar, ou criar novamente. A recreação está inserida dentre as atividades do lazer. Essas atividades têm objetivos específicos de acordo com as necessidades e os interesses do grupo para o qual elas estão sendo direcionadas. A recreação e o lazer devem estar presentes na rotina das pessoas, na vida familiar, na escola, nas praças, nos clubes, nas diversas instituições sociais. Devem fazer parte da vida cotidiana como as AVDs (atividades da vida diária). Os objetivos da recreação são: • integrar a pessoa no meio social; • desenvolver o conhecimento mútuo e a participação do grupo; • desenvolver ocupação para o tempo ocioso; • descobrir habilidades lúdicas; • promover a busca da convivência com amigos da mesma faixa etária. Sociedades que não dispõem de meios, recursos e possibilidades de fazer com que o lazer e a recreação estejam presentes na vida das pessoas adoecem. Isso porque no lugar das atividades de lazer estão a violência, os desentendimentos e os desajustes em todos os setores. Saiba mais Para aprofundar seus conhecimentos sobre o assunto, leia: CAMARGO, L. O. L. O que é lazer. 3. ed. São Paulo: Brasiliense, 1992. 14 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 Unidade I 1.1 A Carta Internacional de Educação para o Lazer Todos têm direito à educação e à saúde. Então todos têm o direito ao lazer e à recreação. Não se trata aqui de inclusão, de projetos sociais mirabolantes e movidos por interesses políticos, mas do cumprimento de leis e estatutos que garantem ao cidadão o direito de viver bem. É sobre isso que trata a Carta Internacional de Educação para o Lazer, documento elaborado pelo Word Leisure and Recreacion Associacion. A World Leisure and Recreation Association (WLRA) é uma organização não governamental de âmbito mundial que há mais de 40 anos se dedica à pesquisa e à promoção do lazer como um instrumento para o bem estar coletivo e individual. Realiza congressos mundiais, conferências e produz mídias impressas e eletrônicas. Oferece uma série de programas na área e colabora com a ONU, Unesco e Unicef. Situa-se em Okanagan Falls, no Canadá. Carta Internacional de Educação para o Lazer Associação Mundial de Recreação e Lazer – World Leisure and Recreation Association (WLRA) I - Preâmbulo 1. Finalidade A finalidade desta Carta é informar aos governos, às organizações não governamentais e às instituições de ensino a respeito do significado e dos benefícios do lazer e da educação para e pelo lazer. É também orientar os agentes de educação, incluindo as escolas, a comunidade e as instituições envolvidas na capacitação de recursos humanos sobre os princípios nos quais poderão se desenvolver políticas e estratégias de educação para o lazer. 2. Lazer Considerando que: 2.1 Lazer se refere a uma área específica da experiência humana com seus próprios benefícios, incluindo liberdade de escolha, criatividade, satisfação, diversão e aumento de prazer e felicidade. Abrange formas amplas de expressão e de atividades cujos elementos são tanto de natureza física quanto intelectual-social, artística ou espiritual. 2.2 Lazer é um meio privilegiado para o desenvolvimento pessoal, social e econômico; é um aspecto importante de qualidade de vida. Lazer é também um produto cultural e industrial que gera empregos, bens e serviços. Fatores políticos, econômicos, sociais, culturais e ambientais podem ampliar ou dificultar o lazer. 2.3 O lazer promove a saúde e o bem estar geral oferecendo uma variedade de oportunidades que possibilitam aos indivíduos e grupos escolherem atividades e experiências 15 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 RECREAÇÃO que se adequem às suas próprias necessidades, interesses e preferências. As pessoas atingem seu pleno potencial de lazer quando estão envolvidas nas decisões que determinam as condições de seu lazer. 2.4 Lazer é um direto humano básico, como educação, trabalho e saúde, e ninguém deverá ser privado deste direito por discriminação de sexo, orientação sexual, idade, raça, religião, credo, saúde, deficiência física ou situação econômica. 2.5 O desenvolvimento do lazer é facilitado pela provisão de condições básicas de vida, tais como segurança, moradia, alimentação, renda, educação, salários, equidade e justiça social. 2.6 As sociedades são complexas e inter-relacionadas e o lazer não pode ser separado de outras metas da vida. Para atingir um estado de bem estar físico, mental e social, um indivíduo ou grupo deve ser capaz de identificar e realizar aspirações, satisfazer necessidades e interagir positivamente com o ambiente. O lazer é, portanto, visto como um recurso para melhorar a qualidade de vida. 2.7 Muitas sociedades em todo o mundo são caracterizadas pela insatisfação crescente, estresse, tédio, falta de atividade física, falta de criatividade e alienação na vida cotidiana das pessoas. Todas essas características podem ser aliviadas pela participação em atividades de lazer. 2.8 As sociedades em todo o mundo estão passando por profundas transformações sociais e econômicas, que produzem mudanças significativas no padrão e na quantidade de tempo livre disponível para o indivíduo durante o transcorrerda vida. Essas tendências terão implicações diretas para uma gama de atividades de lazer que, por sua vez, influenciarão a demanda pelo suprimento de bens e serviços de lazer. 3. Educação Considerando que: 3.1 A finalidade básica da educação é desenvolver os valores e atitudes das pessoas e provê-las com o conhecimento e aptidões que lhes permitirão sentir-se mais seguras e obter mais prazer e satisfação na vida. Essa perspectiva subentende que a educação, além de ser importante para o trabalho e para a economia, é igualmente importante para o desenvolvimento do indivíduo como um membro plenamente participativo da sociedade e para a melhoria da qualidade de vida. 4. Educação para o Lazer Considerando que: 4.1 Os pré-requisitos e as condições para o lazer não podem ser garantidos somente pelo indivíduo. O desenvolvimento do lazer exige ação coordenada por parte de governos, 16 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 Unidade I organizações não governamentais e voluntárias, indústrias, instituições de ensino e da “mídia”. A educação para o lazer desempenha papel importante na diminuição de diferenças das condições de lazer e na garantia de igualdade de oportunidades e recursos. Possibilita, ainda, que as pessoas atinjam seu maior potencial de lazer. 4.2 A educação para o lazer deve ser adaptada às necessidades locais e às demandas de determinados países e regiões, levando-se em consideração os diferentes sistemas sociais, culturais e econômicos. 4.3 A educação para o lazer é um processo de aprendizado contínuo que incorpora o desenvolvimento de atitudes, valores, conhecimentos, aptidões e recursos de lazer. 4.4 Os sistemas de ensino formal e informal ocupam uma posição central para implementação da educação para o lazer, incentivando e facilitando o envolvimento do indivíduo neste processo. 4.5 A educação para o lazer há muito tem sido reconhecida como parte da área da educação, mas não tem sido amplamente implementada. Tem sido entendida como parte importante do processo de socialização no qual uma variedade de agentes desempenha um papel importante. Nesta Carta, a ênfase será concentrada na escola, na comunidade e na capacitação de recursos humanos. 4.6 O século XXI exige estruturas interdisciplinares inovadoras para oferecimento de serviços de lazer. Os atuais profissionais da área necessitam desenvolver currículos e modelos de capacitação de recursos humanos congruentes com as crescentes necessidades do futuro, preparando os profissionais de amanhã para o desenvolvimento de novas abordagens na oferta de serviços de lazer. Por conseguinte: À luz do papel crítico emergente do lazer e seus benefícios em todas as sociedades, e da importância de todos os agentes envolvidos neste processo, recomendamos a expansão do desenvolvimento de programas de educação para o lazer. A Associação Mundial de Recreação e Lazer (WLRA) advoga a educação para o Lazer em todos os cenários e foros apropriados e convoca todos os países a apoiarem devidamente a implementação de estratégias e programas de educação para o lazer. Se a WLRA e outros órgãos como a UNESCO, os governos nacionais, as organizações não governamentais e voluntárias unirem esforços para introduzir estratégias de educação para o lazer, em concordância com os princípios que formam a base desta Carta, então, os benefícios do lazer ficarão acessíveis a todos. O “Seminário Internacional da WLRA sobre Educação para o Lazer”, realizado em Jerusalém, Israel, de 2 a 4 de agosto de 1993, apresenta esta Carta para levar o lazer a todos através da educação para o lazer até e além do ano 2000. 17 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 RECREAÇÃO II - Educação para o lazer nas escolas 1. Meta A meta geral da educação para o lazer é ajudar estudantes em seus diversos níveis a alcançarem uma qualidade de vida desejável através do lazer. Isto pode ser obtido pelo desenvolvimento e promoção de valores, atitudes, conhecimento e aptidões de lazer através do desenvolvimento pessoal, social, físico, emocional e intelectual. Isto, por sua vez, terá um impacto na família, na comunidade e na sociedade como um todo. 2. Princípios e estratégias Para atingir essa meta, sugere-se: 2.1 Educação para o Lazer é parte integrante de ampla variedade de estudos, atividades e experiências em cada estágio do ensino formal e informal. 2.2 Estruturas formais: Dentro das estruturas formais de educação, o programa propõe: I. detectar o potencial para o conteúdo de lazer que existe em cada matéria, currículo e atividades extracurriculares. II. incluir matérias apropriadas e relevantes para o estudo de lazer, tanto direta como indiretamente. Cada matéria deve ser enriquecida com conteúdo de lazer. III. incorporar o lazer em todas as atividades educacionais e culturais, dentro e fora da escola. 2.3 Estruturas informais: Dentro das estruturas informais de ensino, o programa propõe: I. promover flexibilidade curricular que amplie o envolvimento extraescolar e da comunidade. II. implementar o entendimento mútuo e o compartilhar de experiências culturais de lazer dentro do processo de aprendizagem. III. permitir a liberdade de escolha na seleção e participação em atividades educacionais. IV. incorporar princípios de tentativa e erro, que promovam o prazer sem medo de falhar. 18 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 Unidade I 2.4 Abordagem de ensino e aprendizagem: As abordagens de ensino e aprendizagem da educação para o lazer nas escolas devem incluir a facilitação, animação, criatividade, experimentação pessoal, autoaprendizado, aulas teóricas e orientação. Recomenda-se que a aprendizagem ocorra individualmente e em grupo, dentro e fora da sala de aula e mesmo da escola. Isto permitirá uma variedade de formatos expressivos e instrumentais. A abordagem de ensino deve ser a de estimular mais do que a de instruir. 2.5 Pessoal A implementação da educação para o lazer nas escolas deve envolver uma variedade de profissionais, incluindo coordenadores de lazer na escola e na classe, professores, orientadores e especialistas externos. III - Educação para o lazer na comunidade 1. Metas A implementação da educação para o lazer na comunidade inclui o processo de desenvolvimento comunitário. Comunidade é definida como lugar geográfico e agregado de interesses, que tem afinidade e interconexão mútuas. O desenvolvimento comunitário refere-se a um processo que utiliza o ensino formal, informal e o não formal, bem como a liderança para aumentar a qualidade de vida dos indivíduos e dos grupos que vivem na comunidade. De acordo com as metas globais de ensino de lazer na sociedade, o que se segue são as metas do ensino de lazer na comunidade: 1.1 Capacitação: desenvolver a capacidade do indivíduo e do grupo para melhorar a qualidade de vida através do lazer e ampliar a organização autogerida. 1.2 Acessibilidade: trabalhar com grupos comunitários existentes para minimizar as barreiras e otimizar o acesso a serviços de lazer. 1.3 Aprendizado para a vida toda: promover o aprendizado durante todo o ciclo da vida humana como uma meta viável. 1.4 Participação social: criar a oportunidade para desenvolver inter-relações sociais necessárias a todos os seres humanos 1.5 Redução de obstáculos: prover estratégias criativas para reduzir obstáculos à (minimizar impedimentos) satisfação de necessidades pessoais, familiares e comunitárias. 19 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gram aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 RECREAÇÃO 1.6 Abrangência: promover o desenvolvimento comunitário, respeitando a existência de grupos multiculturais, socioculturais, raciais, sexuais, etários, de habilidades e outros grupos que constituem a sociedade. 1.7 Responsabilidade cívica e moral: desenvolver um senso de comunidade, cidadania nacional e internacional, através de comportamento de lazer responsável e confiável. 1.8 Preservação: intensificar uma conscientização de preservação e conservação naturais e culturais. 2. Princípios e estratégias Para alcançar essas metas, sugere-se os seguintes princípios e estratégias: 2.1 Integração: os serviços comunitários de lazer necessitam promover a integração com outras oportunidades de educação para o lazer. 2.2 Suporte: estimular as organizações comunitárias para incluírem ofertas de educação para o lazer. 2.3 Elos: criar potencial para unir escolas, serviços de recreação e outras organizações comunitárias em todos os níveis. 2.4 Continuidade e Mudança: fomentar tanto a continuidade dos atuais padrões de lazer quanto à aquisição de novos padrões de comportamento de lazer. 2.5 Intervenção Social: desenvolver serviços inovadores de lazer para satisfazer as necessidades específicas das pessoas que vivem em comunidades rurais ou urbanas. 2.6 Envolvimento efetivo: envolver os residentes da comunidade no planejamento coletivo e nos processos de programação de multisserviços e na aceitação de responsabilidade por resultados efetivos. 3. Estruturas comunitárias de Educação para o Lazer São sugeridas as estratégias a seguir: 3.1 Serviços de Educação para o Lazer: centros comunitários, centros de educação de adultos, clubes para jovens, centros de interpretação, ambiental e cultural. I. Desenvolvimento de bases de suporte: consumidores, profissionais e voluntários que podem promover educação para o lazer. II. Estratégias de marketing/comunicação: avaliar necessidade, determinar demanda e promover programas. 20 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 Unidade I III. Facilitação: descobrir, incentivar, possibilitar, apoiar e sustentar iniciativas populares. IV. Redefinição e reordenamento: dar ênfase às prioridades de qualidade de vida da comunidade nas agências prestadoras de serviço. V. Eliminando barreiras, impedimentos e iniquidades: através de programas de intervenção direta, indireta, de fomento e de suporte. 3.2 Serviços de lazer e de turismo (por exemplo, parques, playgrounds, centros esportivos, bibliotecas, teatros, galerias de vídeo). [Nota: as estratégias (itens II a V) em 3.1 acima são aplicáveis a serviços de lazer e turismo.] 3.3 Mídia: televisão, rádio, jornais, entre outros. VI. Informar os cidadãos sobre as oportunidades da educação para o lazer oferecidas pelas agências supracitadas e também prestar serviços de educação para o lazer através da mídia de massa. 3.4 Outros serviços: hotéis, bares, lanchonetes. VII. Incluir ofertas de educação para o lazer em um pacote de serviços de recreação. 4. Abordagens de ensino e aprendizagem na educação para o lazer, mencionadas anteriormente em 2.4 (facilitação, animação, aprendizado experimental e criativo, experimentação individual, autoaprendizado, aulas teóricas e aconselhamento), são também aplicáveis à educação para o lazer comunitário. Entretanto, as estruturas de educação para o lazer comunitário, mencionadas no item 3 acima, sugerem estratégias adicionais, através de técnicas de suporte, estratégias de marketing e de comunicação e programas de extensão. 5. Recursos humanos A liderança no campo da educação para o lazer comunitário abarca um continnum, abrangendo desde profissionais empregados em tempo integral até voluntários, líderes locais e líderes comunitários. Há uma necessidade de influenciar na capacitação dos profissionais e gerentes que não estão envolvidos especificamente em organizações de lazer, para que reconheçam a importância e o potencial da educação para o lazer. IV - Preparação e capacitação profissional em educação para o lazer 1. Metas De conformidade com as metas globais de educação para o lazer na sociedade, o profissional deve estar apto para: 21 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 RECREAÇÃO 1.1 Entender o papel do lazer no meio humano em desenvolvimento. 1.2 Entender as tendências emergentes sociais, ambientais, técnicas e de comunicação, e chegar a conclusões, tendo em vista suas implicações nas ofertas de serviços de lazer. 1.3 Interpretar e integrar o papel da educação para o lazer em diversos ambientes profissionais da sociedade, por exemplo, escolas, meios esportivos, clubes recreativos, centros culturais, polos turísticos, na mídia e outras agências importantes para a área de lazer. 1.4 Garantir que a educação para o lazer complemente, intensifique e se relacione com outras competências importantes como programação, planejamento, administração e liderança comunitária. 1.5 Entender a diversidade etnocultural da sociedade no planejamento de serviços de educação para o lazer. 1.6 Desenvolver os conhecimentos interculturais e a capacidade de ampliar estes conhecimentos a programas de lazer, esporte, cultura, mídia e turismo. 1.7 Entender o papel da educação para o lazer na promoção do desenvolvimento humano (questões relacionadas a sexo, idade, segmentos especais da população) em uma sociedade pluralista de mudanças rápidas. 2. Princípios e estratégias 2.1 Os profissionais da educação para o lazer devem ser preparados para aplicar seus conhecimentos, valores e habilidades nas seguintes áreas de estudo: I. tendências, filosofia, serviços, abrangência, acessibilidade; II. aconselhamentos, animação, ensino, defesa da causa; III. atividades especiais - artes e trabalhos manuais, esportes, música; IV. sistemas de serviço - exemplo: ensino, esporte, cultura, mídia, turismo, abordagem clínica/terapêutica, teatro. 2.2 A integração da capacitação para a educação para o lazer em outros currículos profissionais variará em estrutura, forma e modelos de oferta de acordo com as necessidades e nível de desenvolvimento da sociedade. 2.3 O conteúdo curricular da educação para o lazer pode variar em um continuum desde módulos que fazem parte de currículos de lazer existentes, até opções isoladas ou áreas de concentração. 22 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 Unidade I 2.4 Quando apropriado, os módulos de educação para o lazer podem ser desenvolvidos para refletirem especializações, levando em consideração diferentes populações, metodologias de ensino, sistemas de serviços e grupos culturais. 3. Preparação e capacitação de educação para o lazer devem ser desenvolvidos de forma a transmitir valores, atitudes, conhecimentos e habilidades a indivíduos em outras áreas profissionais de atuação, como ensino, medicina, turismo, arquitetura, enfermagem, serviço social, gerência de hotel e clero. Elaborada e aprovada no “Seminário Internacional da WLRA de Educação para o Lazer”. Jerusalém – Israel. 2 a 4 de agosto de 1993 e ratificada pelo Conselho da WLRA Jaipur – Índia 3 de dezembro de 1993. Fonte: Carta... (2002). Saiba mais Para aprofundar seus conhecimentos sobre a organização, acesse: <www.wordleisure.org>. 1.2 Promoção da recreação na comunidade A Carta Internacional de Educação para o Lazer atenta sobre a necessidade da promoção de atividades recreativas na sociedade. Do micro ao macro, essas atividades proporcionam benefícios à saúde e àqualidade de vida no contexto individual e coletivo. Para que isso aconteça, as atividades devem ser significativas àqueles que a praticam e devem sempre proporcionar o bem estar. As relações sociais são mediadas por esses três elementos: • valores; • normas; • símbolos. Os valores estão impressos na conduta moral particular, no modo de lidar com sentimentos, pensamentos e ações pessoais e interpessoais. Eles estão relacionados com o comportamento individual. As normas envolvem as regras de conduta necessárias para viver e conviver em sociedade. 23 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 RECREAÇÃO Os símbolos são formas de representação de um grupo social que nos permite identificá-lo e diferenciá-lo de outros grupos. Podemos dar como exemplo os jogos tradicionais: eles foram criados a partir de um contexto histórico cultural regional que pode ser observado na simbologia usada em sua construção, nas formas geométricas que neles aparecem e nas regras para jogar. Um exemplo são os jogos de combate que representam estratégias de guerra utilizadas pelos soldados na Segunda Guerra Mundial. Atualmente, esses jogos adquiriram outros significados, sem perder, no entanto, a essência do que representam. Esse conhecimento acerca da sociedade é fundamental para a implementação das políticas públicas de lazer e para a escolha das atividades recreativas que dela farão parte. Assim, alguns aspectos devem estar presentes na implantação de políticas públicas para o lazer: • o conhecimento do modo de vida daquela sociedade; • sua história, sua origem, as transformações pelas quais passou, o modo de vida das pessoas; • a geografia da região; • as condições de saneamento e saúde. Por fim, é preciso atender o micro e o macro, ambos entrelaçados na trama social, e saber a que é preciso dar prioridade. A seguir são apresentados os desafios atuais que justificam propostas de trabalho que atendam a todos: • A urgente recuperação do meio ambiente, lembrando que o meio ambiente começa no meio da gente, implicando na busca de um desenvolvimento sustentável. • A redistribuição dos bens comuns da humanidade (água, terra, alimento, moradia, informação, conhecimento etc.). • O resgate de valores humanos (bondade, amizade, honestidade, confiança, autonomia, compaixão, alegria, convivência, amor etc.). • A aproximação dos diferentes (norte-sul, oriente-ocidente, pobres-ricos, homens-mulheres, primitivo-civilizado, ciência-espiritualidade etc.). • A dignificação do trabalho, mais apoiado na vocação e menos na ocupação. • O desfrutar do tempo livre e a vida em comum-unidade. • E o despertar da consciência planetária, apoiada no sentido de corresponsabilidade e coevolução com todas as formas de vida (BROTTO, 1999, p. 89-90). 24 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 Unidade I Esses desafios devem ser analisados sempre antes de se propor uma política pública para o lazer. Todas as propostas devem visar à totalidade, e não apenas atingir parte desse todo. Não tem como pensarmos em implantar atividades recreativas e de lazer se não conseguimos ter esta visão mais ampla da sociedade. Precisamos ter uma meta e um ponto de partida. Num grupo social, devemos refletir: o que, naquele momento, é mais necessário? A quem vamos direcionar o projeto inicialmente? De um modo geral, nos países desenvolvidos ou em desenvolvimento, a recreação é promovida por diversos agentes, conforme veremos a seguir. Poder público Por meio de entidades governamentais nas instâncias federal, estadual e municipal. Figura 1 A essas entidades cabe, prioritariamente, a promoção da recreação nas comunidades. A política e a filosofia recreacionais devem partir do governo, traçando um plano racional de maior profundidade, abrangendo não só a criação de oportunidades recreacionais, mas também a formação de uma consciência recreacional através da educação, integrando os valores da recreação na cultura popular. Voluntários De iniciativa particular, constituída por pessoas da comunidade, que se associam para esse fim, para colaborar com a recreação da sua comunidade. Entidades fechadas Constituídas por clubes sociais que promovem a recreação para os seus associados. 25 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 RECREAÇÃO Figura 2 Empresas comerciais e industriais Promovem a recreação para seus funcionários. Recreação comercializada São empresas que se estruturam, juridicamente, para comercializar exclusivamente atividades recreativas. Família e escola Essas duas instituições são preponderantes na promoção da recreação e ambas se completam. Os pais são os primeiros orientadores dos filhos, no contexto recreacional. As técnicas e regras de um jogo dão aos pais um firme relacionamento com os filhos e enriquece a vida familiar. A escola, por sua vez, continua e completa a educação e instrução iniciadas na família, se preocupando em manter o mesmo entusiasmo e prazer e promovendo atividades recreativas que vão colaborar para a educação da criança, do adolescente e do jovem. A implantação da política pública para o lazer implica na utilização de recursos disponíveis como espaço e materiais, os chamados equipamentos de lazer. 26 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 Unidade I 1.3 Espaços e equipamentos de lazer e recreação Segundo Marcelino (2006), na política pública do lazer, os espaços e equipamentos são componentes dinâmicos. Esses equipamentos podem ser específicos (locais preparados exclusivamente para a prática do lazer) ou não específicos (locais não destinados à pratica do lazer, mas que podem ser usados para este fim). São exemplos de equipamentos específicos as praças, os parques, as academias ao ar livre, as quadras de esportes, os clubes, os teatros, os cinemas, dentre outros; dentre os equipamentos não específicos está a escola (ótimo equipamento, pois possui quadra, pátios, salas, biblioteca, dentre outros espaços adequados ao lazer). Da nossa parte, somos partidários da opinião de que a bela cidade constitui o equipamento mais apropriado para que o lazer possa se desenvolver. É aí, onde se localizam os grandes contingentes da população, que a produção cultural pode ser devidamente estimulada e veiculada, atingindo um público significativo (MARCELINO, 2006, p. 57). Infantil Fim do dia Juvenil Fim de semana Adulto Fim do ano Idoso Fim da vida Figura 3 – Tempo disponível e fases da vida Características dos equipamentos Específicos Aos objetivos a que se destinam Não específicos • Especializados Ex.: academia de ginástica, cinema • Polivalentes Ex.: parques, centros culturais (Grandes: parque estadual, parques temáticos) • De turismo Ex.: hotéis, acampamentos • Casa • Escola • Rua • No trabalho • No transporte Figura 4 27 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 RECREAÇÃO O lazer pode ser desenvolvido em qualquer espaço dentro de uma cidade, mas como os autores dizem, a cidade bela é o equipamento mais adequado para a construção destes equipamentos. É para essas cidades que a população se dirige, para morar, trabalhar e se divertir. Então, toda atividade em prol do lazer deve atingir um público significativo. Lembrete Para a efetivação das características do lazer, é necessário,antes de tudo, que o tempo disponível corresponda a um espaço disponível. Os equipamentos de recreação e lazer classificam-se segundo: • características físicas de construção: aspectos estéticos e dimensões proporcionais aos locais geográficos; • aceitação daqueles que os utilizam, inspirando confiança. Para que realmente todos possam usufruir das atividades de lazer, deve existir o interesse por parte do governo em favorecer essas práticas. Mesmo quando há esforço dos órgãos públicos para implementação dos equipamentos de lazer, nem todos são atingidos, pois a população da “cidade bela” cresce e os espaços para o lazer diminuem. Ainda há o problema no investimento financeiro que em grandes centros está direcionado a outros setores, como educação, saúde e transporte. O lazer é então deixado de lado. Enquanto isso, a cidade cresce, mais e mais, e o lazer vai perdendo espaço e tempo em relação às necessidades de trabalho, de ocupação dos espaços para a construção de moradias e em relação ao interesse da população pelo que é imediato e descartável. Isso acontece tanto na micro quanto na macro sociedade, da família à escola, da escola ao bairro, até atingir toda a “bela cidade”. Esses fatores estimulam a “máquina do lazer”, ou seja, o lazer transformado em negócio rentável para empreendedores, o que é aceito pela maior parte da população que passou a pagar para exercer seu direito ao lazer. Figura 5 – Relação entre lazer e tipo de trabalho 28 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 Unidade I Há necessidade urgente de democratizar o lazer, e democratizar o lazer implica democratizar o espaço (MARCELINO, 2006). O investimento nos equipamentos de lazer é insuficiente e precário, mas, por outro lado, a população não faz uso adequado desses espaços ou até dá preferência ao lazer pago. Exemplo de aplicação Faça uma reflexão sobre as questões: Como ativar os equipamentos de lazer? Como aprimorá-los e transformá-los em espaços de encontros, diversão e troca de experiências? A resposta para essas questões está na política pública do lazer, que do ponto de vista do Estado, são propostas que buscam o enfrentamento das desigualdades sociais, a busca da equidade social e o bem estar dos cidadãos, independentemente de sua classe econômica. Elas são organizadas, elaboradas e implantadas tendo como base a memória do Estado que a constrói, sendo carregadas de simbolismo que integram os aspectos cultural, social e histórico da sociedade, pois são construídas a partir de suas representações sociais. Assim, as políticas públicas são ações que guardam intrínseca conexão com o universo cultural e simbólico, ou melhor, com o sistema de significados que é próprio de uma realidade social. Requixa (1980 apud MARCELINO, 2006, p. 57) enfatiza “a necessidade de integração, numa política de lazer, de equipamentos privados e públicos, de um lado, e, de outro, de equipamentos específicos e não específicos”. Essa ideia de integração entre o público e o privado, equipamentos específicos e não específicos e a união de esforços no macro para tentar amenizar os problemas dos espaços para o lazer proporciona resultados favoráveis à população. Nesse contexto, temos o exemplo da nossa universidade, a UNIP, que promove várias ações relacionadas às necessidades das comunidades, incluindo o lazer e a recreação, por meio das chamadas ações comunitárias, programadas em parcerias com outras instituições e que acontecem em datas predeterminadas. Fazem parte desse evento as atividades recreativas, de prevenção e de promoção da saúde. Também está alinhado aos equipamentos de lazer e recreação na comunidade, o projeto Escola Comunidade. Nessa proposta, os alunos criam projetos de ação que levam a comunidade a utilizar os equipamentos de lazer, de forma consciente. 29 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 RECREAÇÃO Observação A missão do educador é sensibilizar os sujeitos para que aprendam a enxergar, por meio de um processo consciente, os lugares, espaços e equipamentos em busca de lazer. Nas cidades existem muitas propostas interessantes realizadas nos espaços de lazer. São ações muitas vezes organizadas pelas comunidades locais em parceria com instituições públicas e privadas. Há exemplos de projetos de revitalização de praças; de limpeza de repesas e de incentivo à reciclagem; palestras e atividades recreativas direcionadas à preservação do meio ambiente; cursos técnicos gratuitos; trabalho voluntário com atividades recreativas em parques e praças, dentre muitas outras propostas que visam criar e recriar espaços de lazer para todos. Para nós da área de Educação Física, o mais importante a ser considerado com relação aos equipamentos de lazer é a possibilidade de trabalharmos uma necessidade primordial do ser humano: a ludicidade. 2 HOMO LUDENS 2.1 Atividades lúdicas e recreação O ser humano tem recebido várias designações: • Homo sapiens, na sua capacidade de raciocinar para aprender e conhecer o mundo. • Homo faber, porque é capaz de fabricar objetos e utensílios. • Homo ludens, porque é capaz de dedicar-se à atividade lúdica, ao jogo. A denominação homo ludens revela a capacidade inata do homem de se dedicar à atividade lúdica, ao jogo. Portanto, as pessoas já possuem dentro de si a motivação para atividades recreativas, basta que nós, os agentes promotores das atividades lúdicas, em primeiro lugar, acreditemos nesse potencial humano. Acreditar no jogo como uma forma de entretenimento prazeroso e sadio, que leva o indivíduo a agir com espontaneidade, sentindo prazer no que faz, além de proporcionar que cada indivíduo possa trocar experiências com outros por meio de jogos e brincadeiras. O ato de jogar é tão antigo quanto o homem, pois este sempre manifestou uma tendência lúdica, um impulso para o jogo. Alguns autores afirmam que o jogo não se limita apenas à humanidade, seria anterior, inclusive, ao próprio homem, pois já era praticado pelos animais. 30 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 Unidade I Os animais brincam tal como os homens [...] Convidam-se uns aos outros para brincar mediante um certo ritual de atitudes e gestos. Respeitam as regras que os proíbem morder, ou pelo menos com violência, a orelha do próximo. Fingem ficar zangados e o que é mais importante, eles, em tudo isso, parecem experimentar um imenso prazer e divertimento (HUIZINGA, 2008, p. 3). Figura 6 – Animais brincando Podemos então dizer que o brincar do animal é puro prazer, enquanto para o ser humano é também uma forma de conhecer, aprender e desenvolver-se. Quando a criança brinca, ela aprende, e esse aprendizado se torna útil na evolução do seu pensamento, tanto é que a criança, muitas vezes, cria novas versões do brincar, ampliando o seu repertório de brincadeiras e desenvolvendo sua criatividade. Sendo parte integrante da vida em geral, o jogo tem uma função vital para o indivíduo, não só para distensão e descarga de energia, mas principalmente como forma de assimilação da realidade, além de ser culturalmente útil para a sociedade como expressão de ideais comunitários. Saiba mais Para aprofundar seus conhecimentos sobre a natureza lúdica do jogo, leia: HUIZINGA, J. Homo ludens. 5. ed. São Paulo: Perspectiva, 2008. Vamos estudar a origem do jogo que se encontra dentro de características definidas, diferenciando da afirmação filosófica de que toda ação humana é um jogo. 31 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F abio - 0 7/ 07 /2 01 6 RECREAÇÃO As características definidas são as colocadas pelo autor: O jogo é uma atividade ou ocupação voluntária, exercida dentro da certos e determinados limites de tempo e de espaço, segundo regras livremente consentidas, mas absolutamente obrigatórias, dotado de um fim em si mesmo, acompanhado de um sentimento de tensão e alegria e de uma consciência de ser diferente da vida cotidiana (HUIZINGA, 2008, p. 33). Nesse caso, entendemos que o jogo é uma opção de lazer e que dentro de suas funções, o jogo cumpre as funções de entretenimento, divertimento e desenvolvimento, já que podemos constatar na citação de diversos autores em suas teorias, como: “o jogo constitui uma preparação do jovem para as tarefas sérias que mais tarde a vida dele exigirá, segundo outra, trata-se de um exercício de autocontrole indispensável ao indivíduo” (HUIZINGA, 2008, p. 4). O jogo colabora para o bom aproveitamento do tempo livre em qualquer circunstância. Através do jogo, podemos chegar a diversos objetivos socioeducacionais. O elo entre as atividades lúdicas são a liberdade de escolha e a satisfação pessoal. Assim, podemos aqui compreender que o conceito de recreação está intimamente relacionado com o lúdico e o jogo. O mundo contemporâneo se apropriou de estruturas, impostas pelo progresso, que automatizam o ser humano. Muitas vezes, não sobra tempo de encontrarmos o espaço para o divertimento. A recreação nada mais é do que a atividade lúdica na prática, seja ela com o objetivo de renovação das energias para o trabalho ou então na forma de tornar mais leve e divertida a habilidade a ser apreendida. É tudo quanto diverte e entretém o ser humano e que envolve ativa participação. Emprego de energia que emana de impulso interno, mas também condicionado a estímulo externo [...] A atividade recreativa, força propulsora do desenvolvimento da personalidade, tem grande influência sobre a saúde física mental do ser humano [...] (GOUVÊA, 1963, p. 19). Além da promoção da saúde, a disciplina de Educação Física também deve estar preocupada com a educação para o lazer, oferecendo oportunidades de práticas que ensinem o valor da atividade motora na promoção e melhoria da qualidade de vida. O homem é muito mais do que uma máquina e suas necessidades envolvem o conhecer, o descobrir, o aventurar-se e o desafiar-se (BRUHNS, 1997). Grande parte da população brasileira, quando faz uma opção por uma atividade corporal, não busca rendimento e nem profissionalismo, mas uma forma de se exercitar no tempo de lazer. Partindo dessa consideração, questões surgem como indagações para a Educação Física, área articuladora dos elementos jogo, esporte, dança e ginástica. Tais elementos trabalhados pela Educação Física vão receber o perfil de recreação, de atividade lúdica. 32 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 Unidade I Esporte Jogo Dança Figura 7 A diversidade de atividades lúdicas, recreativas, promovidas, como jogos, brincadeiras, oficinas, rodas cantadas, entre outras, oferecem a oportunidade de identificação de valores e conceitos que vão colaborar para a formação do cidadão. O lazer, de forma criativa e prazerosa, deixa um saldo positivo para o indivíduo e para a sociedade. As atividades recreativas, segundo Fritzen, servem para: • Integrar a pessoa no meio social. • Desenvolver o conhecimento mútuo e a participação grupal. • A busca da convivência com colegas da mesma idade. • Desenvolver ocupação para o tempo ocioso. • Adquirir hábitos de relações interpessoais. • Desinibir e desbloquear. • Desenvolver a comunicação verbal e não verbal. • Descobrir habilidades lúdicas. • Desenvolver adaptação emocional. • Descobrir sistemas de valores. • Dar evasão ao excesso de energia e aumentar a capacidade mental (FRITZEN, 1996, p. 9). Lembrete Predomina no jogo uma atmosfera de espontaneidade. Sem motivação, o jogo não acontece. Se a pessoa não está com vontade de jogar, ele irá fazer de tudo para o jogo terminar logo, ou seja, o lúdico se perde. 33 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 RECREAÇÃO 2.2 O brincar Podemos dizer que o brincar é um alimento para a criança, sem ele o seu desenvolvimento fica comprometido. O ato de brincar faz com que a criança se expresse de forma espontânea. Ao observarmos uma criança brincando, podemos colher informações elementares a respeito da criança, como: de que forma ela se relaciona com os amigos; como são suas emoções, suas capacidades e habilidades motoras, seu estágio de desenvolvimento, seu nível de comunicação e sua formação moral quanto aos valores humanos. A brincadeira acontece em determinados momentos da vida da criança. Podemos constatar que o tempo de brincar está ficando cada vez mais escasso. Na escola, a criança tem o tempo cronometrado pelo plano curricular, sobrando pouco tempo para o recreio, para as brincadeiras. No período fora da escola, atualmente, as crianças têm diversos compromissos e até contratempos que consomem seu tempo de brincar. Compromissos com cursos, consultas, lições de casa, entre outros, e contratempos relacionados ao seu contexto histórico-social, como aquelas crianças que moram em lugares distantes das suas escolas e enfrentam horas no trajeto de ida e volta para suas casas. Além disso, nos dias atuais, as crianças têm um elenco de ofertas de jogos eletrônicos que também invadem o tempo da brincadeira compartilhada, provocando um isolamento, podendo prejudicar o desenvolvimento infantil, principalmente, nos domínios físico-motores e socioafetivos. Observando tais tendências que levam a criança a dedicar menos tempo ao brincar, devemos lembrar que cabe ao adulto saber dosar o tempo das atividades infantis e estimular a criança nas atividades lúdicas espontâneas e compartilhadas. Sendo que a atividade lúdica espontânea é o brincar por pura diversão, distração, sozinho ou com amigos (reais ou imaginários), com ou sem brinquedos e objetos. A criança precisa ter seu tempo de brincar como quiser e do que quiser. E as atividades lúdicas compartilhadas são aquelas com a participação de amigos, parceiros de brincadeira. Sempre de forma voluntária, prazerosa por motivação própria. Além do tempo, devemos refletir sobre os espaços do brincar. Nos grandes centros urbanos, as crianças enfrentam muito mais dificuldade em relação aos espaços do brincar, se as compararmos às crianças que moram nas periferias. A criança urbana não pode brincar na rua por questões de segurança e saúde. Elas estariam expostas aos perigos de atropelamento, assaltantes, meliantes, poluição, dentre outros. São limitadas aos espaços reservados em casa, no pátio da escola, no clube e alguns espaços especializados, como parques temáticos dentro de shopping centers, brinquedotecas de bairro ou institucionais. As crianças que têm a oportunidade de brincar nas ruas com segurança levam certa vantagem em relação aos aprendizados, já que os espaços são por elas transformados e/ou adaptados para a ação do brincar. Árvores são esconderijos ou piques, muros são delimitadores de território ou campo, as brincadeiras de perseguição incluem correr em diversos tipos de solo, de nível e desnível, pular, desviar etc. Observar o espaço e torná-lo cenário da brincadeira desenvolve a criatividade e a inteligência da criança. 34 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 Unidade I No entanto, como o brincar é inato e a criança tem grande capacidade imaginativa, podemos transformar pequenos espaços em grandes territórios debrincar. Os limites presentes no brincar, na brincadeira, no jogo, mostram seu movimento e temporalidade, já que se tem um início e chega-se a um fim. O espaço, ou seja, o local de jogo, deve ser respeitado pelos jogadores, pois sem ele não é possível sua realização. Em suma, devemos valorizar e dar a devida atenção ao tempo e ao espaço do brincar, oportunizando a criança a desenvolver sua capacidade criativa de forma segura e sadia. É importante dosar o tempo entre os deveres e o brincar, obedecendo às fases do desenvolvimento de forma lúdica e prazerosa, e oferecer espaços seguros para o seu crescimento e desenvolvimento. O espaço e o tempo definem, pois, as características de cada brincadeira. O tempo e o espaço são elementos que se apresentam como parte de um conjunto de regras que são estabelecidas, sem as quais não podemos nos referir ao jogo de que estamos tratando. As regras são parte integrante até dos jogos dos animais, que sabem dosar a força da mordida quando se trata de uma situação de jogo ou brincadeira. Cumprir regras também faz parte da vida em sociedade, portanto esse elemento nos mostra a importância do jogo em um contexto social. O brincar é um meio ou um fim? O brincar é um fim sempre que se brinca só por diversão, entretenimento, passatempo. Ou seja, não queremos mais nada além do divertimento, simplesmente estamos nos divertindo por livre e espontânea vontade, motivados pelo contexto do momento. O brincar é um meio quando se torna um instrumento de aprendizado, quando ele está sendo usado como ferramenta que motiva o aprendizado. A criança aprende por meio da brincadeira, ou seja, se quisermos ensinar algo para uma criança, podemos fazê-lo em forma de jogos, canções, rimas, brincadeiras, que despertarão o interesse da criança ao mesmo tempo em que ela estará aprendendo novos conceitos, valores ou gestos que serão importantes para seu desenvolvimento global ou específico. Observação A criança pode brincar com um barquinho de papel só para vê-lo navegar pelo rio. Com certeza é uma brincadeira muito divertida, que nesse caso é um fim em si mesma. Mas o professor pode ensinar a fazer um barquinho de papel para que os alunos entendam as diversas formas geométricas que se formam durante a construção do barquinho; ou ainda para ensiná-los sobre a geografia das marés em uma vivência prática, soltando os barquinhos em um rio. Isso tornaria o brincar um meio de aprendizado. 35 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 RECREAÇÃO As crianças na terceira infância, na faixa etária entre 7 e 12 anos, já gostam de jogar o popular jogo da queimada, aquele que se joga em dois times, em que a bola é arremessada com uma das mãos para o campo adversário a fim de “queimar”, ou seja, acertar um jogador do time adversário, que será eliminado. Se as crianças escolhem o jogo para preencher o seu tempo livre na escola ou fora dela, esse seria um exemplo do brincar com um fim. Porém, a queimada também pode ser usada como um meio para o professor de Educação Física começar a desenvolver os gestos para o aprendizado da modalidade handebol. Os jogos de tabuleiro são muito usados como uma forma de motivação ao aprendizado, trabalhando os conteúdos curriculares. Nesse caso, o brincar de jogar Banco Imobiliário, por exemplo, é um meio de aprender questões de matemática financeira. Porém, quando o jogo de tabuleiro é usado como forma de diversão ou passatempo, é o brincar como um fim. A brincadeira deve fazer parte do universo da criança, do jovem e do adulto também, pois a forma lúdica pode ser um meio de se alcançar objetivos e, portanto, pode ser usada desde que seja compatível com os objetivos a serem alcançados. Anteriormente discutimos: porque brincar? Quando? Onde? Para quê? Agora surgem outras questões: o brincar precisa de um parceiro? Brincar com quem? De quê? Sim, o brincar sugere um parceiro, mas este não precisa ser sempre alguém, pois podemos brincar com o próprio corpo, com sons, objetos, com o imaginário. Na fase da segunda infância, entre 2 e 6 anos, as crianças tendem ao egocentrismo que é natural para a fase, e por isso brincam mais sozinhas, fantasiam mais, criam amigos imaginários e se utilizam do animismo, que é a habilidade de atribuir características humanas a elementos da natureza ou objetos – por exemplo, a criança diz: “A árvore disse que está com sede, vou dar água para ela”. E então começa a brincar de dialogar com a árvore. A presença de outra pessoa na brincadeira traz muitos benefícios, pois a criança se comunica verbalmente ou através de gestos, dialogando e trocando experiências. É nas interações estabelecidas com outras pessoas que o jogo acontece e assume características únicas. Durante essas trocas, a criança tem a oportunidade de assumir diversos papéis, experimentar, se colocar no lugar do outro, realizar ações mais ou menos prazerosas e expressar-se (FRIEDMAN, 1998, p. 17). 36 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 Unidade I Lembrete O imaginário infantil supera as dificuldades e transforma qualquer coisa em brinquedo. Um pedaço de madeira pode ser uma espada, uma caixa de fósforos transforma-se em um carrinho, uma embalagem pode transformar-se em boneco. Apesar de atualmente as crianças terem uma vasta indústria de brinquedos a sua disposição, não é a falta deles que impede a criança de brincar. Posteriormente, falaremos da importância dos brinquedos (objetos). Saiba mais A International Association for the Child’s Right to Play (IPA) é uma organização interdisciplinar não governamental que proporciona um fórum internacional e que defende a promoção de oportunidades de brincar. Aconselha governos nacionais e agências das Nações Unidas sobre assuntos e problemas relacionados à implementação do direito de brincar. Para conhecer melhor o trabalho da IPA, acesse: <http://ipaworld.org/>. 3 MOTIVAÇÕES PARA DIVERSÃO E INTERESSES CULTURAIS 3.1 Fantasia, vertigem, aventura e competição Magill (1984) se refere à motivação como causa de um comportamento, e ainda define motivação como alguma força interior, impulso ou uma intenção que leva uma pessoa a fazer algo ou agir de certa forma. Ao entendermos a denominação homo ludens, percebemos que a diversão está atrelada às atividades lúdicas, ao jogo. Caillois (1990) estudou o jogo e apontou quatro categorias do lúdico, ou seja, as quatro grandes motivações para a diversão: a fantasia, a vertigem, a aventura e a competição. Muitas vezes, a mesma atividade pode atender a diferentes motivações. A classificação torna-se útil para podermos refletir sobre o significado do lúdico em nossas vidas. 37 ED FI S - Re vi sã o: M ar cí lia - D ia gr am aç ão : F ab io - 0 7/ 07 /2 01 6 RECREAÇÃO Figura 8 – Imaginação Fantasia A nossa imaginação é fruto do pensamento que permite sermos diferentes, sermos o outro, e de estarmos em qualquer lugar que a nossa mente puder nos levar, como um devaneio, um pensamento sem amarras. O poder da imaginação se manifesta logo na segunda infância. As crianças com mais de dois anos são motivadas pela fantasia, pelo faz de conta. Estão sempre querendo imitar, fantasiar-se. Com isso, vão aprendendo mais sobre o mundo. Porém, em todas as fases da vida, a fantasia pode ser uma motivação para a diversão. As pessoas motivadas pela fantasia estão sempre exercitando o pensamento imaginário, desenvolvendo sua criatividade imaginativa. A fantasia, portanto, é um ótimo meio de se trabalhar o desenvolvimento cognitivo em todas as idades. Uma música pode nos levar ao mundo de fantasia
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