Prévia do material em texto
CAPÍTULO 1 ConCepções de Letramento em Língua portuguesa para surdos A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: 3 Conhecer as diferentes concepções de letramento em Língua Portuguesa utilizadas na educação de surdos. 3 Escolher entre as diferentes concepções a que melhor se adéqua a sua prática de ensino. 10 Práticas Sociais de Leitura e de Escrita em Libras 11 ConCepções de Letramento em Língua portuguesa para surdos Capítulo 1 Ao retomarmos tais conceitos podemos antecipar que LIBRAS não é uma linguagem e sim uma língua, como o próprio nome – Língua Brasileira de Sinais – revela.(olho do caderno). ContextuaLização Este capítulo aborda algumas percepções acerca de língua e linguagem, atenta para o processo de aquisição da linguagem, a relevância da primeira e segunda língua na educação de surdos. Discorrer sobre a importância da relação entre a aquisição da linguagem e a interação social permite uma reflexão no ambiente social, educacional e familiar do surdo. Para tanto, trataremos as concepções de autores como Saussure, Chomsky e Bakhtin. A seguir, discutiremos as percepções de letramento e a prática com alunos surdos. É apropriado refletir acerca destas concepções, uma vez que, orientam o trabalho e o discurso do professor em sala de aula. Permitindo reflexões acerca das diferentes concepções e abordagens em sala de aula, possibilitando repensar algumas práticas pedagógicas. Contribuindo também para reflexões acerca do letramento do sujeito surdo, mas esse assunto fica reservado para o segundo capítulo. Língua e Linguagem, aLgumas perCepções O que é língua e linguagem? A princípio, parece ser uma pergunta fácil de responder, mas é importante pensarmos um pouco sobre ela. É conveniente lembrar que não raras vezes língua e linguagem são utilizadas indistintamente. Ao retomarmos tais conceitos podemos antecipar que LIBRAS não é uma linguagem e sim uma língua, como o próprio nome – Língua Brasileira de Sinais – revela.(olho do caderno) De acordo com as concepções de Quadros (1997) existe uma série de fatores que diferenciam língua e linguagem. Primeiramente pode-se dizer que a língua está diretamente ligada a um sistema complexo de regras gramaticais, e a linguagem a uma diversidade de sentidos. Veja como Quadros (2004, p. 24) destaca algumas formas como as pessoas pensam em linguagem: Figura 1 – Linguagem Musical Fonte: Disponível em: <http://catequesekids.blogspot. com.br>. Acesso em: 02 dez. 2012. 12 Práticas Sociais de Leitura e de Escrita em Libras Figura 2 – Linguagem das Abelhas Fonte: Disponível em: <http://www.uirauna.net/site/ noticias>. Acesso em: 02 dez. 2012. Figura 3 – Linguagem Corporal Fonte: Disponível em: <http://seminariouab.no.comunidades. net/índex>. Acesso em: 02 dez. 2012. As figuras acima representam algumas das diversas formas de linguagem, a musical, a das abelhas e a corporal. Entretanto, Quadros (1997, p.23) utiliza a expressão linguagem para “(...) significar o sistema linguístico que é geneticamente determinado para desenvolver-se nos humanos”. A autora acrescenta que: Os seres humanos podem utilizar uma língua de acordo com a modalidade de percepção e produção desta: modalidade oral-auditiva (português, francês, etc.) ou modalidade viso-espacial (língua de sinais brasileira, língua de sinais americana, língua de sinais francesa, etc.) (QUADROS, 2004, p. 24). Quadros (1997) e Karnopp (2004) afirmam que as línguas de sinais não são sistemas linguísticos universais, utilizam a modalidade espaço-visual que 13 ConCepções de Letramento em Língua portuguesa para surdos Capítulo 1 se diferencia da modalidade oral-auditiva utilizada pelas línguas orais, ou seja, as línguas de sinais se utilizam da visão e do espaço, enquanto as línguas orais se valem da fala e da audição. Cabe ressaltar também que, da mesma forma que as línguas faladas, as línguas de sinais apresentam variação linguística. De acordo com as autoras supracitadas, as línguas de sinais são estruturadas semântica, morfológica e sintaticamente, com estrutura própria que independe das línguas orais, como também indica a Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos - FENEIS. Basicamente, podemos pensar que a aquisição da língua permite a interação e a comunicação entre os seres humanos; o conceito de língua, no entanto, não é unânime e pode ser entendido de acordo com diferentes autores e opiniões. Figura 4 – Concepções de língua e linguagem Fonte: A autora. De acordo com Saussure (1995), a língua se distingue em aspectos evolutivos, históricos, ou seja, diacrônicos, e o estudo do estado da língua, da relação existente entre elementos simultâneos, ou seja, sincrônicos. Para o autor, a língua é uma faculdade natural ao homem e, a cada momento, implica 14 Práticas Sociais de Leitura e de Escrita em Libras Mesmo com diferentes concepções, de maneira geral, a língua é o instrumento concreto, que consolida a expressão conectada a um determinado grupo associado por características culturais próprias dentro de um determinado espaço. num sistema constituído e numa evolução, sendo, ao mesmo tempo, uma instituição atual e um produto do passado. Chomsky (1998), diferentemente de Saussure, não analisa a linguagem como fruto de um meio coletivo: para ele, a linguagem é tida como um meio de manifestar pensamentos e não um sistema social de comunicação; é uma faculdade humana, biologicamente inata. Chomsky (1998) indica ainda que os seres humanos possuem predisposição genética que permite a comunicação. Bakhtin (1992), por sua vez, acredita na evolução das línguas através dos tempos, afirma que o indivíduo não é o centro do estudo da linguagem, pois sofre influência do contexto que está inserido, direcionando sua fala para outro sujeito, negando o objetivismo abstrato, assim como o subjetivismo individualista. Para o autor, a palavra é determinada através da interação do locutor e do ouvinte. Para Bakhtin e Voloshinov (1999), a interação acontece pela linguagem, e em todas as relações sociais entre indivíduos organizados em sociedade. Mesmo com diferentes concepções, de maneira geral, a língua é o instrumento concreto, que consolida a expressão conectada a um determinado grupo associado por características culturais próprias dentro de um determinado espaço. Exemplo: A língua Italiana só é compreendida pelo povo italiano ou por quem se dedique a estudar as regras da gramática italiana e também interagir, compreender a semântica da língua. Assim como a linguagem é um instrumento abstrato, que permite ao ser humano se comunicar através de cores, imagens, sons, expressões, palavras, etc. Exemplo: O sorriso é uma linguagem que pode ser entendida por qualquer ser humano, em qualquer lugar do mundo. 15 ConCepções de Letramento em Língua portuguesa para surdos Capítulo 1 Primeiro a criança precisa desenvolver sua língua materna a L1, para depois se apropriar de uma segunda língua, ou seja, a L2. Atividade de Estudos: 1) Com base nas concepções de língua e linguagem apresentadas elabore sua própria concepção de língua e linguagem. ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ o proCesso de aquisição da Linguagem- a importânCia da L1 e L2 para aLunos surdos Estabelecidas as diferenças entre língua e linguagem, é importante enfatizar a necessidade de as crianças surdas dominarem primeiramente sua língua, a LIBRAS, visto que esta é a língua que o surdo é capaz de adquirir de forma natural e espontânea, utilizando o meio espaço-visual. Para após apropriar-se da Língua Portuguesa escrita como segunda língua na formação da criança surda. Segundo diversos autores da área, essa ordem é intransponível, primeiro a criança precisa desenvolver sua língua materna a L1, para depois se apropriar de uma segunda língua, ou seja, a L2. 16 Práticas Sociais de Leitura e de Escrita em Libras Figura 5 – Processo de aquisição da linguagem Fonte: A autora. O processo de aquisição da linguagem tem início no meio familiar, a família desempenha um papel fundamental no desenvolvimento da criança. A criança surda filha de pais surdos, tem um desenvolvimento linguístico semelhante da criança ouvinte filha de pais ouvintes. Porém, a maioria das crianças surdas são oriundas de famílias ouvintes, o que soma às responsabilidades da família aprender e inserir a criança no aprendizado da LIBRAS. Conforme Skliar (1997), as interações entre pais e filhos surdos e pais e filhos ouvintes são semelhantes e permitem à criança contato com a cultura e a comunidade à qual pertence diferente do que acontece no caso de pais ouvintes e filhos surdos. Consoante com esse autor, a partir do momento em que a família diagnostica a surdez, as relações comunicativas podem mudar. É importante a família ouvinte participar ativamente da vida da criança surda, sabendo respeitar sua cultura, suas diferenças e necessidades, estimulando a criança a se comunicar por meio da LIBRAS, tendo o cuidado de, mesmo sem intenção, não excluir a criança surda das trocas familiares, ou seja, sinalizando sempre, mesmo que a interação não ocorra diretamente com o surdo. 17 ConCepções de Letramento em Língua portuguesa para surdos Capítulo 1 Quadros (1997) enfatiza a necessidade de sintonia e clareza entre pais e educadores ao adotarem uma proposta bilíngue.(olho do caderno). Ao longo deste texto, sinalizamos a importância da LIBRAS ser inserida como L1 da criança surda pela família e convivência social. O que nos remete a uma série de questionamentos: • As famílias quando recebem o diagnóstico de surdez são orientadas para essa conduta linguística? • Qual nível de conhecimento de LIBRAS as crianças surdasapresentam ao iniciarem sua vida escolar? • Em qual etapa escolar o aluno surdo deve ter contato com a L2, ou seja, a Língua Portuguesa escrita? • As escolas/profissionais estão preparados para receber a criança surda? A partir desse momento é importante que você tenha presente o conceito do bilinguismo. Brevemente, podemos afirmar que a perspectiva do bilinguismo, enfatiza o direito dos surdos de serem alfabetizados/letrados em LIBRAS e que considera a Língua Portuguesa como L2, ressaltando a importância da Língua Portuguesa escrita na vida dos surdos que interagem diariamente com um mundo ouvinte e escrito, portanto, não pode e não deve ser ignorada. (mascote pesquisa) Quadros (1997) enfatiza a necessidade de sintonia e clareza entre pais e educadores ao adotarem uma proposta bilíngue.(olho do caderno) A autora afirma que os profissionais que se comprometem a informar as famílias acerca da surdez devem estar preparados para explicar que existe uma comunidade de surdos que utilizam a língua de sinais; que a LIBRAS é o meio de comunicação mais adequado à criança surda, que possibilita um desenvolvimento da linguagem, equivalente ao de crianças ouvintes, que essa língua visual-espacial permite que a criança surda faça descobertas e interaja integralmente com o mundo ao seu redor. Assim, a LIBRAS serve de base para o aprendizado da Língua Portuguesa e, como consequência, pode se manifestar na escrita da pessoa surda, no que se refere ao uso de conectores, preposições, na utilização do tempo verbal, na concordância do texto. Conforme Quadros (1997, p. 50), “conhecer e dominar essas relações [sintáticas e semânticas/pragmáticas] e o processo de aquisição das mesmas torna-se imprescindível para se pensar no ensino de uma segunda língua para surdos”. 18 Práticas Sociais de Leitura e de Escrita em Libras Partimos de uma perspectiva que não entende o surdo como anormal ou deficiente, mas como um sujeito cultural e linguisticamente diferente. O texto do sujeito surdo pode causar estranhamento a um leitor desavisado, e muitas vezes, pode não ser compreendido devido a sua estrutura, que se difere em muitos aspectos a da Língua Portuguesa. Trabalhar com alunos surdos requer mais que conhecer sua língua, e certamente, abarca situações que vão além da surdez. Consequentemente, a formação do aluno surdo demanda lidar com questões culturais e sociais que interferem de forma significativa no seu processo de aprendizagem, uma vez que, o surdo está inserido em uma sociedade que ainda não está preparada para recebê-lo. Portanto, você pode perceber a importância de profissionais preparados, fluentes na língua de sinais, inteirados dos mecanismos da aquisição da L2, para que compreendam as hipóteses e construções linguísticas dos alunos surdos, contribuindo assim, para seu processo educacional. aquisição da Linguagem e a interação soCiaL Para nossas reflexões é relevante que você compartilhe com o que postulam autores como Quadros (1997) e Quadros e Karnopp (2004), que consideram LIBRAS como língua materna dos surdos e recomendam que as crianças adquiram, além da língua de sinais, a sua escrita, possibilitando ao surdo aprender a língua e a escrita de sua comunidade para só então iniciar o processo de aquisição de Língua Portuguesa como L2. Respeitando assim, o processo de aquisição de linguagem natural dos surdos. Segundo Góes (1996), a criança está inserida em relações sociais que acontecem através da linguagem desde seu nascimento. Considerando que o input linguístico do surdo e do ouvinte acontecem de formas distintas, deve-se destacar que a interação com as crianças surdas, deve ser diferenciada, uma vez que o acesso à linguagem que dependa da audição não é adequado. No caso de crianças surdas filhas de pais ouvintes, a situação é ainda mais complicada, pois a criança surda não tem contato com a língua de sinais, não ouve, portanto, não se comunica pela língua oral. Para o surdo, que não está inserido em um ambiente que favoreça o seu desenvolvimento linguístico natural, adquirir a Língua Portuguesa escrita parece impraticável. Partimos de uma perspectiva que não entende o surdo como anormal ou deficiente, mas como um sujeito cultural e linguisticamente diferente, vamos destacar a importância da interação, da linguagem e da mediação na aprendizagem do sujeito aluno surdo. 19 ConCepções de Letramento em Língua portuguesa para surdos Capítulo 1 De acordo com Vygotsky (1998), a aprendizagem é fundamental para o processo do conhecimento, implica na relação entre o sujeito que ensina e o que aprende e na relação que é estabelecida entre ambos. É importante que você perceba a linguagem como mediadora das interações e apropriações culturais. Considerando como pressuposto teórico o sociointeracionismo, que entende a linguagem como um processo, uma forma deinteração, tomamos o termo interação como uma ação de construção colaborativa de conhecimentos que chega até o outro e o atinge. Observe alguns conceitos que valorizam a interação no processo de aquisição: De acordo com Vygotsky (1998), a aprendizagem é fundamental para o processo do conhecimento, implica na relação entre o sujeito que ensina e o que aprende e na relação que é estabelecida entre ambos. Para Bakhtin e Voloshinov (1999), a interação acontece pela linguagem, e em todas as relações sociais entre indivíduos organizados em sociedade. De acordo com Vygotsky (1993) A linguagem pode ser pensada como um dispositivo decisivo na formação dos processos mentais da criança, constituindo um fator essencial para que a criança desenvolva aspectos cognitivos, sociais e emocionais. Pesquisas demonstram que as crianças surdas, na sua maioria, chegam às escolas com uma linguagem gestual caseira e só então são apresentadas à aquela que deveria ser sua língua materna. Deste modo, as instituições de ensino têm uma participação importante neste processo de aquisição e aprendizagem de línguas, uma vez que, no caso dos surdos, a escola muitas vezes, é o único ambiente onde a criança terá acesso à Libras e à Língua Portuguesa escrita. Através da interação com seus pares e da mediação com o professor, o aluno internaliza conceitos. A interação e a mediação são práticas que contribuem para o desenvolvimento da criança, que precisa socializar o conhecimento para depois apropriar-se dele. 20 Práticas Sociais de Leitura e de Escrita em Libras Figura 6 – Mediação Fonte: A autora. Estas considerações dizem respeito ao processo de ensino e aprendizagem, independente de a criança ser ouvinte ou surda. No caso da criança surda, há necessidade de contar com a língua de sinais, que propicia seu desenvolvimento linguístico e cognitivo, facilita o processo de aprendizagem, serve de apoio para a leitura, escrita e compreensão (GÓES, 2000). Olhar para a aprendizagem do aluno surdo permite que você perceba que, a interação por meio da língua que a criança usa com colegas e professores contribui efetivamente para a qualidade de sua aprendizagem, colaborando para o seu desenvolvimento cognitivo, afetivo e sociocultural. Podemos então, destacar a importância do aluno surdo ter a língua de sinais como língua materna e depois adquirir a segunda língua. Cabe lembrar que no caso do Brasil, corresponde a LIBRAS e a Língua Portuguesa escrita respectivamente. 21 ConCepções de Letramento em Língua portuguesa para surdos Capítulo 1 O que você não pode fazer é limitar os estudos de letramento à prática de alfabetização. ConCeitos de Letramentos Nesta seção, você poderá refletir sobre alguns conceitos de letramento. Este termo é bastante discutido e observado sob diferentes perspectivas. O que você não pode fazer é limitar os estudos de letramento à prática de alfabetização. O conceito de letramento surgiu a partir de tentativas de aprofundar o conceito de alfabetização, talvez por esse motivo, tais conceitos sejam confundidos. Inicialmente, convêm salientar a diferença entre o conceito de alfabetização e letramento. De acordo com Soares (2003), Alfabetização é basicamente a aquisição da escrita por um indivíduo, decodificar fonemas e grafemas já garante a condição de “alfabetizado”. A partir do desenvolvimento social, as práticas escritas foram mais exigidas, consequentemente, o sentido dado à alfabetização foi ampliado dando espaço para um novo conceito, o letramento. O termo letramento é a tradução para a palavra inglesa literacy que pode ser compreendida como “condição de ser letrado”. No Brasil, a palavra letramento surgiu em 1986, na obra No mundo da escrita: uma perspectiva psicolinguística, de Mary Kato. No entanto, segundo Soares (2009), letrar é mais que alfabetizar, é ensinar a ler e escrever dentro de um contexto onde a escrita e a leitura tenham sentido e façam parte da vida do aluno. Como é possível observar, o letramento vai além do domínio do sistema alfabético e ortográfico e surgiu na medida em que alfabetizar tornou-se um conceito insuficiente para tornar os aprendizes proficientes nas demandas sociais de leitura e escrita. Figura 7 – Alfabetizar e Letrar Fonte: A autora. 22 Práticas Sociais de Leitura e de Escrita em Libras Outra concepção de letramento envolve a capacidade dos aprendizes da língua valerem-se dos recursos da língua escrita em interações mesmo antes de serem alfabetizados. As práticas sociais do cotidiano interferem no aprendizado, seja através da convivência com mediadores mais experientes ou o contato com artefatos sociais como revistas, jornais, outdoors, rótulos de embalagens, etc. No passado, partia-se do pressuposto de que o sujeito iniciava no processo de leitura somente ao ser alfabetizado. Esse pensamento foi revisto a partir de discussões acerca do letramento, uma vez que, entendeu-se que o processo de leitura inicia-se muito antes da alfabetização. Do mesmo modo que é importante salientar a distinção entre alfabetização e letramento, enquanto conceitos, também é importante ressaltar que seus objetos de estudo são diferentes e dessa forma, os processos linguísticos e cognitivos de aprendizagem são igualmente distintos. No entanto, cabe ressaltar que, da mesma forma que são diferentes, alfabetização e letramento são processos inseparáveis, pois a alfabetização só é significativa se for desenvolvida num contexto de práticas sociais de leitura e escrita, ou seja, através do letramento. Atividades de Estudos: 1) Qual sua concepção de alfabetização? ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ 23 ConCepções de Letramento em Língua portuguesa para surdos Capítulo 1 Pensar em uma educação bilíngue requer que professores repensem sua concepção de educação para surdos. 2) Qual sua concepção de letramento? _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ 3) Alfabetização e letramento são conceitos que não podem ser dissociados. Que consequências essa conexão tem para o processo de ensino e aprendizagem? _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ __________________________________________________________________________________________________ _________________________________________________ Letramento e a prátiCa Com aLunos surdos O processo de letramento exige muito tanto do professor como do aluno. No caso de alunos surdos o nível de comprometimento e dificuldade não é diferente, porém, envolve uma questão bilíngue, o uso de uma língua gestual e outra escrita. Conforme Fernandes (2008), o bilinguismo na educação de surdos, faz com que os professores não atentem apenas para a situação linguística, mas também para as concepções axiológicas envolvidas nesta prática, ou seja, pensar em uma educação bilíngue requer que professores repensem sua concepção de educação para surdos. 24 Práticas Sociais de Leitura e de Escrita em Libras A leitura descoberta é o momento de revelação do texto, da leitura e análise, é a fase de leitura que confronta o texto com as hipóteses criadas na pré-leitura. Nessa fase o aluno faz conexões e busca a construção sentidos. Diante de propostas que não surtiram o efeito esperado, houve a necessidade de reformular as políticas educacionais. A partir desta reformulação aconteceram mudanças de metodologias, como a entrada de textos na sala de aula, assim como, questionamentos acerca de práticas de letramento passaram a circular com frequência no ambiente escolar e acadêmico. Porém, ainda assim, não é garantido o processo de letramento. A partir dessa evidência, veremos dois princípios metodológicos apresentados por Fernandes (2008): Observe que o primeiro princípio metodológico, a alfabetização, vai de encontro ao processo natural de apropriação de escrita do sujeito surdo, pois o processo de alfabetização exige a habilidade de identificar letras e sons. Ou seja, a oralidade não é eficaz no ensino de alunos surdos. O segundo princípio metodológico, o letramento, se apresenta como uma possibilidade de ensino de Língua Portuguesa para surdos, através de práticas visuais de leitura e escrita. Um processo semelhante ao de ensino de língua estrangeira. Vamos considerar que alfabetizar exige um processo que envolve trabalhar sons e fonemas, portanto, inadequado a alunos surdos, portanto, destacaremos o processo de letramento para o desenvolvimento efetivo do aluno surdo. Para que você compreenda melhor o processo de letramento na educação de alunos surdos atente para as indicações abaixo, elaboradas a partir dos ensinamentos de Braga (2002). A autora destaca a importância das fases da leitura para um trabalho eficaz de leitura e produção textual. A pré-leitura deve explorar a imaginação e o conhecimento prévio do aluno, proporcionar um clima que desperte a curiosidade do aluno, além de possibilitar que ele crie suas próprias hipóteses. No caso de alunos surdos os recursos visuais, as ilustrações do livro ou as imagens relacionadas à leitura auxiliam na procura de um sentido, faz com que ler um texto seja mais que decifrar códigos, possibilitando descobertas, motivando o interesse pela leitura. A leitura descoberta é o momento de revelação do texto, da leitura e análise, é a fase de leitura que confronta o texto com as hipóteses criadas na pré-leitura. Nessa fase o aluno faz conexões e busca a construção sentidos. A pós-leitura é a fase que o aluno reflete, critica, compara as informações obtidas nas duas fases anteriores, faz relação com leituras anteriores transformando sua leitura efetivamente em conhecimento e exercita seu senso 25 ConCepções de Letramento em Língua portuguesa para surdos Capítulo 1 crítico. Nesse momento, o aluno é convidado a utilizar os conhecimentos adquiridos e construir seu próprio texto, baseado no gênero lido e em outros gêneros que permitam interagir com seu texto. E então, é alfabetizar ou letrar? Para responder essa pergunta não é necessário criar definições ou elaborar conceitos complexos. Porém, precisamos entender esses conceitos e refletir simultaneamente com os diversos conceitos que permeiam a aquisição da escrita. Soares (2004) destaca que uma transformação da sociedade, que vem se tornando cada vez mais focada na escrita, evidencia que ler e escrever não é o suficiente, segundo a autora supracitada, é necessário ir além da decodificação e pensar no letramento como a percepção da importância da escrita no mundo social. Em suma, a autora define letramento como a condição do sujeito que não apenas sabe ler e escrever, mas também sabe ler e interpretar textos que circulam na sociedade, livros, jornais, revistas, contas de água, luz, telefone; sabe escrever bilhetes, cartas, preencher formulários e tantos outros textos que circulam no contexto social. aLgumas Considerações Durante esse capítulo discutimos os diferentes conceitos de letramento, assim, foi possível refletir acerca de percepções e assim, ter subsídios para optar entre as distintas concepções a que mais contribuirá para a prática de ensino. No próximo capítulo as práticas e efeitos do letramento terão um novo olhar, refletiremos sobre as dimensões do ato de ler e escrever, assim como a importância do ensino da língua portuguesa escrita para alunos surdos. referênCias BAKHTIN, M. M. Questões de Literatura e Estética: a Teoria do Romance. São Paulo: Editora UNESP. 1992. 26 Práticas Sociais de Leitura e de Escrita em Libras BAKHTIN, M. M.; Volochínov, V. N. Marxismo e filosofia da linguagem. Trad. Michel Lahud e Yara Frateschi Vieira. 9. ed. São Paulo, SP: Hucitec, 1999. BRAGA, Regina Maria. Construindo o leitor competente: Atividades de leitura interativa para a sala de aula. São Paulo: Peirópolis, 2002. CHOMSKY, Noam. Linguagem e pensamento. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 1998. FERNANDES, S. Letramentos na educação bilíngüe para surdos. In: Letramento. Referenciais em saúde e educação. São Paulo: Plexos, 2008. GÓES, M. C. R. Linguagem, surdez e educação. Campinas, SP: Autores Associados, 2000. QUADROS, R. M. de. Educação de surdos: A aquisição da linguagem. Porto Alegre: Artmed, 1997. QUADROS, R. M. de; KARNOPP, L. B. Língua de sinais brasileira: estudos linguísticos. Porto Alegre: ARTMED, 2004. SAUSSURE, Ferdinand de. Curso de lingüística geral. 18. ed. São Paulo: Cultrix, 1995. SOARES, Magda. As muitas facetas da alfabetização. In: Alfabetização e letramento. São Paulo: Contextos, 2003. SOARES, Magda. Alfabetização e letramento, 2° ed. São Paulo: Contexto, 2004. SOARES, Magda. Letramento: um tema em três gêneros. 2ª Ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2009. SKLIAR, Carlos. Atualidade da educação bilíngüe para surdos 2. ed. Porto Alegre: Mediação, 1997. VYGOTSKY, L.S. Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1993. VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes. 1998.