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1 Standards de prova: a modéstia necessária a juízes na decisão sobre os fatos por Janaina Matida12 Palavras-chave. standard de prova, racionalidade da decisão, convencimento do julgador, identificação pessoal. Resumo. O presente artigo visa pôr em discussão a (in)compatibilidade do modelo de decisão penal com a adoção de um standard de prova racional. Para tanto, partirei do exame de decisões condenatórias fundadas em identificação pessoal (realizadas por vítima/testemunha) nas quais não se observam as formalidades dispostas no artigo 226 do Código de Processo Penal. Nessas condenações, a convicção do juiz é alçada à condição de prova suficiente para corroborar a hipótese de acusação, a despeito da questionável confiabilidade dos resultados das provas de identificação. A análise da confiabilidade é realizada a partir de pesquisas executadas pela chamada psicologia cognitiva aplicada. Se a tomada de decisão com base em algum standard de prova racional é objetivo institucional, então há que se proceder a ajustes que reflitam o abandono da supervalorização do convencimento do julgador. I. Introdução Começo esse artigo propondo um exercício hipotético. Imaginemos um mundo no qual os sistemas de justiça não experimentam cenários de dificuldades para a determinação dos fatos. Tais sistemas de justiça contam com a ajuda de uma espécie de “oráculo”. Os casos são levados a Juízo e as narrativas das partes são oferecidas ao oráculo. Após ouvi-las, o oráculo emite a sua decisão, sempre baseada em proposições fáticas que se correspondem à realidade, descrições verdadeiras dos fatos sobre as quais não sobrevive qualquer dúvida. O oráculo é 1. Professora de Teoria do Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Doutoranda em Direito da Universitat de Girona (Espanha) e Mestre em Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. 2. Agradeço a leitura cuidadosa de Daniel González Lagier, Adrian Sgarbi, Rachel Herdy, Guilherme Almeida, Juliana Dias, Fabio Shecaira, André Coelho e Gabriel Cabral. Espero haver incorporado adequadamente as fundadas objeções que recebi deles. Também gostaria de agradecer a atenção destinada à sua apresentação no 24o Seminário Internacional de Ciências Criminais do IBCCrim (agosto de 2018, em São Paulo) e no 7o Seminário Nacional do IBADPP (setembro de 2018, Salvador). Discutir as teses aqui apresentadas com os outros participantes e ouvintes, sem dúvidas, contribui para afiná-las ao contexto do sistema de justiça brasileiro bem como para refletir sobre estratégias de concretização dos compromissos epistêmicos que não apenas os brasileiros queremos que sejam assumidos institucionalmente. 2 imparcial, não sensível a vantagens pessoais. Ele conhece a verdade e cuida de revelá-la no ambiente judicial. Um mundo de certezas absolutas no qual a resolução dos conflitos individuais não esbarraria em indesejáveis obstáculos de caráter cognitivo. Hipotetizado o mundo do oráculo, voltemos ao mundo real. As jurisdições reais são marcadas por limitações no contexto da determinação dos fatos, a busca pela verdade encontra obstáculos importantes. Construir a premissa menor do raciocínio que o juiz desenvolve no contexto decisório é tarefa que não se confunde com a revelação dos fatos feita pelo oráculo3. Para começar, o juiz real não é onisciente e, à falta de um prévio domínio de tudo o que ocorreu e que é relevante para a decisão que deve tomar, cabe-lhe o labor de formar e valorar um conjunto rico de informações. Testemunhos, depoimentos, documentos, gravações, laudos periciais e outros recursos integram o contexto no qual o juiz tem o objetivo de determinar corretamente os fatos. À diferença do oráculo, o juiz real tem de estar atento ao risco de considerar como verdadeiro algo em realidade falso, pois, o contato que faz com os fatos é intermediado por alegações4 (as mentiras e os erros de percepção são fortes obstáculos à construção de uma premissa menor justificada). Não fosse o bastante, além de precisar saber desviar das falsidades, diante da falta do contato direto com os fatos juridicamente relevantes (disponível ao oráculo), o juiz deve determinar a ocorrência deles através de inferências de caráter indutivo. Mediante raciocínio inferencial, o juiz, no melhor dos casos, alcança a hipótese fática provavelmente verdadeira5. Como bem nos recorda FERRER BELTRÁN, 2007, p. 91, “nunca um conjunto de elementos de juízo, por grande e relevante que seja, permitirá ter certezas racionais sobre a verdade de uma hipótese”6. As 3. GONZALEZ LAGIER, 2013; GONZALEZ LAGIER, 2014; MATIDA; HERDY, 2016. 4. Sobre o perigo a valorização excessiva do contato que o juiz tem ao examinar as provas diretas, verANDRÉS IBÁÑEZ, 2007. 5. Uso a expressão recorrendo ao sentido a ele atribuído por TARUFFO, 2012, 113: “No âmbito do processo, em que as informações disponíveis são oferecidas pelas provas, pode ocorrer que essas forneçam um determinado grau de confirmação ao enunciado que concerne a um fato relevante para a decisão. Poder-se-á, então, dizer que esse enunciado é ‘provavelmente verdadeiro’, com a condição de que se queira dizer com essa expressão que as provas produzidas no processo fornecem razões suficientes para que se considere confirmada a hipótese de que aquele enunciado seja verdadeiro”. 6. No entanto, como esclarece Ferrer Beltrán, da impossibilidade de se alcançar certezas absolutas não se deve concluir, precipitadamente, pela impossibilidade de se formar crenças racionais. p. 92: “Como bem indica Popper, não é possível verificar uma hipótese, mas isso não implica que não possamos preferir racionalmente uma hipótese sobre outras a partir da maior corroboração da primeira” (tradução livre). Na mesma linha argumentativa que valoriza os juízos de probabilidade, Taruffo, TARUFFO, 2002, p. 30, também aponta que a impossibilidade de certezas absolutas não autoriza concluir, como um ‘perfeccionista desiludido’, pela impossibilidade de qualquer conhecimento racional. 3 informações colhidas por meio das provas praticadas funcionam como pontos de partida para o raciocínio - de caráter não dedutivo - através do qual o juiz busca confirmar/refutar as hipóteses fáticas ao redor das quais a disputa judicial se desenvolveu. Esse é o esquema da inferencial, de autoria de TOULMIN, 2003, e adaptado por GONZÁLEZ LAGIER, 2003, ao contexto jurídico probatório. Assim, o mundo real de juízes reais é um mundo de limitações cognitivas, sendo, portanto, inadequada qualquer tentativa de compreensão da atividade intelectual a partir da apreensão de certezas absolutas. Por outras palavras, dizer que há prova suficiente porque se atingiu a convicção do julgador é abrir mão de qualquer controle da racionalidade judicial, deixando o caminho aberto às condenações arbitrárias e caprichosas7. Tratar o contexto decisório de modo responsável implica reconhecer a comissão de erros judiciais como uma realidade concreta que deve ser tomada de frente8. Os standards de prova integram precisamente um horizonte de reflexões sobre soluções institucionais às limitações cognitivas que acometem os juízes; são barreiras que o desenho institucional pode - e deve - colocar à irracionalidade judicial. Desenvolver teorias sobre standards é, nesse sentido, em primeiro lugar, reconhecer a necessidade de se refletir sobre a suficiência das hipóteses fáticas produzidas em Juízo e a partir de quê ponto, de quê patamar, elas podem justificadamente ocupar a função de premissa menor de uma decisão condenatória e, em segundo lugar, determinar em quê ponto de exigência determinado sistema jurídico deve fixar o seu próprio standard de prova. Em outras palavras - ou dado que não contamos com oráculos -, não sobra qualquer racionalidade em se preservar um desenho institucional que possibilite decisões condenatórias fundamentadas numa supervalorizada 7. Aliás, a certeza do julgador nãogarante a verdade da proposição (sobre a qual se tem certeza), ver TARUFFO, 2012, p. 109-110: “[...] Pode-se observar que a credibilidade da certeza de um sujeito sobre o conteúdo de uma afirmação depende da seriedade das justificativas que ele está em condições de dar. Se as justificativas são do tipo ‘estou certo disso porque estou profundamente convencido’(ou seja, não justificativas), trata-se, então de argumentos que têm a mesma força demonstrativa de borras de café.”...“Quando se afirma, por exemplo, que a condenação de um acusado justifica-se quando o juiz tem certeza absoluta de sua culpabilidade, ou quando se diz - como ocorre comumente - que o juiz debe obter a certeza moral sobre a existência dos fatos da causa, comete-se um erro duplo: de um lado deixa-se a ideia da verdade, excluindo-se a necessidade de que a decisão funde-se em uma apuração verdadeira dos fatos; por outro lado, fortalece-se a ideia de que o que deve fundar a decisão do juiz é o grau de persuasão subjetiva que ele deve obter”. 8. Tomarei a definição de Laudan, LAUDAN, 2013, p. 34, entre falsas condenações e falsas absolvições. “‘Erro’, no sentido que atribuo a essa expressão, não tem nada a ver com determinar se o sistema jurídico seguiu pontualmente ou não as regras jurídico-processuais (isto é, nada a ver com o sentido de ‘erro’ empregado pelos tribunais de apelação) e tudo a ver com se determinar se as decisões condenatórias efetivamente condenam o culpado e absolvem o inocente”. (Tradução livre) 4 referência ao “convencimento do juiz”; num suposto estado mental de convicção. O caminho de apreço à racionalidade envolve o abandono da convicção do julgador entendida como prova suficiente para a condenação. Já é tempo de substituir o “há prova porque há convicção” por “há convicção porque há prova”. Esse é o sentido racional da relação entre prova e convicção. A primeira parte do artigo (II.) presta-se a reconstruir o estado atual de coisas no discurso jurídico judicial, que, se bem já apresenta de modo frequente uma referência à noção de “prova suficiente”, por outro lado, será possível concluir que a mera referência a provas suficientes não garante decisões justificadas (não há mais lugar para o “standard” de convencimento do julgador). Na sequência, a segunda parte (III.) serve à reflexão sobre os ajustes que devem ser realizados de modo a compatibilizar os procedimentos probatórios previstos no sistema jurídico brasileiro à futura adoção de standard de prova intersubjetivamente controlável. Qualquer que seja o ponto de exigência ao qual fixemos o nosso standard de prova, será necessário proceder a ajustes à produção e valoração da prova. Só assim o standard de prova poderá cumprir a sua função. Para tanto, serão examinadas as decisões condenatórias fundamentadas em prova de identificação do culpado sem a observância no disposto pelo artigo 226 do Código de Processo Penal (que estabelece formalidades para a realização de tal ato). Na parte (IV.) proponho um exame do valor probatório da memória a partir das ferramentas de análise fornecidas pela chamada psicologia aplicada. Finalmente, a título de conclusão, em (V.) serão realizadas algumas últimas reflexões sobre o procedimento, a valoração e os standards probatórios. Enfim, à carência de oráculos, num cenário de pouca modéstia judicial, a determinação dos fatos requer esforços redobrados. II. O estado atual: um mundo sem oráculo e sem modéstia Reflexões sobre a temática dos standards de prova podem ser iniciadas a partir de diversas perspectivas. Assim, esclareço que, para fins de análise, assumo a hipótese de que a sociedade brasileira tem o interesse político-moral de diminuir os riscos de que inocentes venham a ser condenados. Entre o risco de se condenar inocentes e o risco de se absolver culpados, a nossa sociedade convenceu-se pela maior gravidade do primeiro. Isso dotaria de 5 sentido um desenho institucional que dificultasse a condenação de inocentes, mediante o estabelecimento diversos mecanismos, e, entre eles, pela adoção de um standard de prova penal mais exigente. Logo, se em âmbito civil pode fazer sentido pensar que demandante e demandado, na maior parte das situações, devem repartir igualmente o risco de decisões injustas (standard de probabilidade preponderante), no contexto criminal, o que se entende desde a contribuição de Blackstone9, Voltaire10, Benjamin Franklin11 e tantos outros12, é que a condenação de um inocente representa um erro mais grave que a absolvição de um culpado, não cabendo, portanto, repartir igualmente os riscos de condenações e absolvições injustas. Com isso em mente, convido o leitor a refletir sobre a temática do standard no contexto de decisões condenatórias fundadas em prova de reconhecimento pessoal. Nesses casos, os magistrados argumentam que a certeza da vítima e a narrativa detalhada são suficientes à formação de seu convencimento. O problema é que a convicção do juiz não é, ela mesma, a prova de que algo é verdadeiro. Vejamos. De acordo com o artigo 226 do Código de Processo Penal (de agora em diante, CPP), o reconhecimento pessoal deverá ocorrer da seguinte forma: I - a pessoa que tiver que fazer o reconhecimento será convidada a descrever a pessoa que deva ser reconhecida; II - a pessoa, cujo reconhecimento se pretender, será colocada, se possível, ao lado de outras que com ela tiverem qualquer semelhança, convidando-se quem tiver de fazer o reconhecimento a apontá-la; III - se houver razão para recear que a pessoa chamada para o reconhecimento, por efeito de intimidação ou outra influência, não diga a verdade em face da pessoa que deve ser reconhecida, a autoridade providenciará para que esta não veja aquela; IV - do ato de reconhecimento lavrar-se-á auto pormenorizado, subscrito pela autoridade, pela pessoa chamada para proceder ao reconhecimento e por duas testemunhas presenciais. 9. “It is better that ten guilty persons escape than that one innocent suffer.” Commentaries on the Laws of England, Livro IV, cap 24, 1765-1769. 10. “Il vaut mieux hasarder de sauver un coupable que de condamner un innocent”, Voltaire, Zadig ou la Destinée, 1747. 11. “It is better 100 guilty persons should escape than that one innocent person should suffer”, Works, Letter from Benjamin Franklin to Benjamin Vaughan, 1785. 12. Laudan menciona diversas formulações dessa distribuição desigual como forma de ilustrar ao leitor as consideráveis variações que a razão entre condenar inocentes e absolver culpados apresentou no decorrer da história. LAUDAN, 2013, cap 3. 6 Parágrafo único. O disposto no III deste artigo não terá aplicação na fase de instrução criminal ou em plenário de julgamento. Do texto normativo, é possível concluir que o legislador teve a preocupação de que se buscasse construir um cenário neutro à hora de se realizar o ato. Não é difícil de perceber que o legislador pretendeu resguardar protagonismo à memória daquele que se presta a reconhecer, tentando evitar sugestões indesejadas que pudessem pôr em xeque a confiabilidade do resultado. Daí é que se compreende o inciso II, que determina a realização de um enfileiramento composto por mais pessoas além da pessoa do suspeito, todas semelhantes entre si. Realizar o procedimento dessa forma serviria à redução do risco de que a vítima fosse induzida ao erro de apontar um inocente como causador de seu sofrimento. A jurisprudência, contudo, passou a interpretar que se trata de um conjunto de “meras recomendações” e, como tais, desnecessárias para a regularidade do reconhecimento. É relevante mencionar, ainda, que o dispositivo previsto no art. 226 do Cód. de Processo Penal não contém mandamento absoluto , cogente e i n c o n t o r n á v e l . . . ” ( T J - S P, A p e l a ç ã o , 0000884-11.2017.8.26.0559, Min. Costabile e Solimene)13. . A interpretação como recomendação, por sua vez, serviu para eliminar as dúvidassobre a legalidade do procedimento de identificação através de fotografia. O reconhecimento fotográfico não é inválido como meio de prova, pois, conquanto seja aconselhável a utilização, por analogia, das regras previstas no art. 226 do Código de Processo Penal, as disposições nele previstas são meras recomendações, cuja inobservância não causa, por si só, a nulidade do ato. Precedentes”. (STJ, HC 427051, 2017/0311185-5, Min. Felix Fischer, 5 de abril de 2018). 13. A consolidação dessa interpretação em sede jurisprudencial resultou na publicação do seguinte enunciado por parte do Superior Tribunal de Justiça: “O reconhecimento fotográfico do réu, quando ratificado em juízo, sob a garantia do contraditório e ampla defesa, pode servir como meio idôneo de prova para fundamentar a condenação”, in Jurisprudência em teses, n. 105. acesso em agosto de 2018: http://www.stj.jus.br/internet_docs/ j u r i s p r u d e n c i a / j u r i s p r u d e n c i a e m t e s e s / J u r i s p r u d ê n c i a % 2 0 e m % 2 0 t e s e s % 2 0 1 0 5 % 2 0 - %20Provas%20no%20Processo%20Penal%20-%20I.pdf. 7 Além de reforçar o caráter meramente recomendatório dos requisitos dispostos no artigo 226, as decisões condenatórias que se fundamentam em reconhecimento pessoal apresentam uma linha argumentativa comum: i. valoriza-se a riqueza de detalhes da narrativa constante na prova oral (o que supostamente complementaria o reconhecimento pessoal), ii. o elevado grau de convicção com que se reconhece o culpado, iii. a repetição do reconhecimento em juízo. Esse último aspecto discursivo deve-se à preocupação de se tentar evitar recursos com base no artigo 155 do CPP. Como é sabido, a disposição em questão estabelece limites à livre convicção, dado que o juiz deve formá-la a partir de provas produzidas em contraditório; o magistrado não pode fundamentar a sua decisão exclusivamente em elementos informativos colhidos na investigação. Nesse sentido, jurisprudencialmente consolidou-se o entendimento segundo o qual a repetição em audiência é bastante para eliminar eventuais defeitos da produção da prova na fase de investigação. Observe-se que naquela ocasião não havia outros presos para serem apresentados juntamente com o réu para que a vítima Samuel Marcelo procedesse ao reconhecimento, motivo pelo qual a Defesa requereu seu adiamento, que foi indeferido pela magistrada em razão do ato ter sido requerido pelo Ministério Público e por considerá-lo desnecessário especialmente em razão de a já citada vítima ter afirmado em juízo que na data do fato reconheceu com absoluta certeza o apelante como um dos autores do crime. No mais, as formalidades do art. 226 do CPP são m e r a s r e c o m e n d a ç õ e s l e g a i s . ( T J - D F, 0003631-45.2017.8.07.0014, Min Relator Roberval Casemiro Belinati) O crime de roubo restou cabalmente demonstrado pela prova oral. A vítima narrou de forma clara toda a dinâmica delitiva, inclusive o emprego de arma de fogo, além de esclarecer que levou um tapa no rosto. A defesa alega que o reconhecimento em sede policial não observou as regras previstas no art. 226, do Código de Processo Penal, pois o reconhecimento do Apelante pela vítima foi feito através de fotografia. Ocorre, porém, que em Juízo, sob o crivo do contraditório, a vítima confirmou o reconhecimento e não teve dúvida em identificar o Apelante como um dos autores do crime sob a n á l i s e ” . ( T J - R J , A p e l a ç ã o c r i m i n a l 0359848-80.2013.8.19.0001, Des. Marcia Perrini 8 Bodart, 07 de agosto de 2018)14. O reconhecimento dos réus foi realizado pelo ofendido em Juízo, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, restando assim superada a alegação de nulidade pela inobservância das formalidades previstas no artigo 226 do CPP, aplicável em sede inquisitorial. Versão acusatória consiste no depoimento firme e seguro do lesado que narrou com riqueza de detalhes a empreitada criminosa. Nos crimes patrimoniais, a palavra da vítima, quando firme, coerente e ratificada pelos demais elementos dos autos, tem valor relevante na formação da convicção do juiz, dado o contato direto que esta tem com o autor dos fatos, sendo apta para embasar a condenação”. (TJ-RJ, Apelação criminal 0014783-66.2015.8.19. 0066, Des. Suimei Meira Cavalieri, 28/03/2017)15. III. Standards, valoração e produção das provas O leitor pode se questionar como a produção e valoração das provas relacionam-se com os standards de prova. A resposta reside no exame de de dois tipos de preocupação que o responsável pelo desenho institucional deve ter: uma preocupação de corte epistêmico somada a uma preocupação de corte político-moral. A partir de uma perspectiva epistemológica, um processo penal comprometido com a busca pela verdade deveria contar com regras que expressassem o objetivo de redução de erros; isto é, deveria se preocupar em reduzir os riscos de condenar inocentes e de absolver culpados. Para tanto, desenvolver regras para selecionar como verdadeiras as hipóteses fáticas mais provavelmente verdadeiras - independente de se a hipótese seja de defesa ou da acusação. Caberia ao responsável pelo desenho institucional processual criminal a adoção de procedimentos probatórios formulados a partir de metodologias com maior potencial veritativo. Os procedimentos destinados à prova deveriam incorporar a preocupação com a busca pela verdade e, portanto, refletir os conhecimentos técnicos e científicos já acumulados pela experiência social (a adoção do teste do DNA como prova nos processos em que haja material genético que possa ser analisado é um exemplo disso). Não aproveitar essa técnica de investigação - com alto potencial de conduzir à verdade (truth-conducive) -, seria o mesmo que descartar o objetivo de redução de erros. 14. grifei. 15. grifei. 9 No entanto, a partir de uma perspectiva moral ou política, é possível que se entenda que o processo penal teria de se comprometer em “reduzir” uma classe de erros (a condenação de inocentes) com maior intensidade do que se compromete a reduzir a outra classe de erros (a absolvição de inocentes)16. Significa assumir que, entre o cômputo total de erros, deveria haver uma preocupação em que as condenações injustas fossem em menor proporção se comparadas às absolvições injustas. Isso implicaria, em outras palavras, assumir que temos o objetivo de distribuir assimetricamente essas duas classes de erros. Um standard de prova penal mais elevado serve ao objetivo de reduzir a condenação de inocentes porque dificulta as condenações em geral. Em todos os processos, exige-se mais da hipótese acusatória para que seja considerada verdadeira. Como consequência direta da maior dificuldade imposta à hipótese condenatória, a ocorrência de absolvições de culpados seria facilitada. Evita-se a produção de uma classe de erro a partir da facilitação do erro considerado “menos pior”17. Por outro lado, caso se optasse por um standard de prova menos elevado (por exemplo aquele conhecido como “probabilidade prevalecente”), isso expressaria a compreensão de que condenações injustas e absolvições injustas são erros da mesma ordem de importância, não havendo algum cuja eliminação devesse ser preferida. O compromisso de se evitar as condenações de inocentes e o compromisso de se evitar a absolvição de culpados seriam da mesma intensidade. Ora, se não enxergamos como pior a condenação de inocentes, não há porque fixar a exigência de prova da hipótese acusatória em patamares especialmente mais altos. Ou seja, levar a sério a adoção de um standard de prova significa ter em consideração duas perguntas: a pergunta sobre se existe preferência por evitar alguma classe de erro frente a outra e, em caso positivo, a pergunta sobre onde fixar a exigência do standard 16. Diversas são as formulações que, ao longo da história, trataram de expressar a preferência moral de se evitar condenaçõesinjustas mesmo que às custas de se produzir absolvições injustas. Como vimos, em Blackstone, a razão entre absolvição de culpados e condenação de inocentes é de 10 para 1; em Fortescue, de 20 para 1 ; em Hale, de 5 para 1; em Benjamin Franklin de 100 para 1 etc. 17. Standards de prova mais exigentes devem garantir que as condenações são fundamentadas nas hipóteses fáticas as quais mais provavelmente sejam verdadeiras, mas as absolvições não necessariamente são fundamentadas em hipóteses fáticas de mesmas características. Pode acontecer que a hipótese da acusação, embora seja provavelmente verdadeira, não tenha satisfeito o patamar de exigência estabelecido por determinado sistema jurídico. Nesse caso, o juiz será obrigado a decidir incorporando em sua premissa menor a hipótese da defesa como se verdadeira fosse; não porque há elementos probatórios que lhe ofereçam valor de verdade, mas porque faltam elementos de prova suficientes a satisfazer o standard elevado à hipótese da acusação. Logo, as condenações são epistemicamente comprometidas, mas as absolvições não. Nesse sentido, ver GOLDMAN, 1999, p. 284. 10 (de modo a que o patamar onde o standard seja fixado reflita a proporção dos erros que estamos dispostos a experimentar na vida em sociedade). Esclarecida a função de um standard de prova, é preciso compreender que ele é apenas uma das ferramentas para a determinação dos fatos. Para que ele possa, nos casos individuais, oferecer-nos a resposta sobre se a hipótese acusatória está suficientemente provada, é preciso entendê-lo como uma peça operativa pertencente a uma etapa posterior à seleção das hipóteses mais prováveis. Qualquer que seja o standard, ele se aplica às hipóteses já valoradas pelo julgador. Não por outra razão, a aplicação de um standard pertence ao momento da decisão, e não ao momento da valoração. O terceiro momento (referindo-se ao momento da decisão sobre os fatos) é ao que corresponde a tomada da decisão. A valoração da prova já terá permitido outorgar a cada uma das hipóteses em conflito um determinado grau de confirmação que nunca será igual à certeza absoluta. Será então necessário decidir se a hipótese h pode ou não ser declarada provada com o grau de confirmação que ela dispõe. (...) Convém insistir que o resultado da valoração da prova que se obtenha no segundo momento (referindo-se ao momento da valoração dos elementos de prova) não implica, por si só, nada a respeito da decisão a ser tomada. (FERRER BELTRÁN, 2007, pp. 47-48. Tradução livre) Portanto, insisto: a tarefa que é asignada ao standard de prova só pode ser adequadamente entregue pelo sistema de Justiça uma vez que a produção e a valoração probatórias já tenham se mostrado idôneas à seleção da hipótese fática mais provável. Isso explica a necessidade de se compatibilizar a produção e a valoração probatórias à adoção de um standard de prova racional. Seja mais exigente, seja menos exigente, num sistema genuinamente comprometido com a busca pela verdade, o standard age sobre hipóteses selecionadas como provavelmente verdadeiras. Se as hipóteses selecionadas não são as hipóteses provavelmente verdadeiras, a aplicação do standard não logrará reproduzir a distribuição de erros previamente escolhida. IV. A psicologia cognitiva aplicada como ferramenta adequada 11 Feitas essas observações conceituais, centro minhas atenções em alguns trabalhos desenvolvidos a partir da psicologia aplicada na temática do testemunho (eyewitness testimony). À falta de dados sobre certo evento do qual se quer mais informações, estaríamos justificados em crer no que as pessoas nos dizem ter ocorrido? A memória é uma fonte confiável de informação sobre a realidade? Não é difícil intuir que as pesquisas de psicologia aplicada são sumamente úteis à reflexão a respeito do valor epistêmico das provas orais e do procedimento de identificação do ofensor - as provas nas quais as condenações aqui analisadas se fundamentam. Tais pesquisas ganharam especial destaque a partir do surgimento do teste de DNA, na década de 90. De acordo com (WELLS, MEMON; STEVEN, 2006, p. 48), foi a possibilidade de se comparar o DNA do inocente condenado com o material genético do real culpado pelos crimes em questão que rapidamente trouxe à luz uma considerável quantidade de condenações injustas. Condenações cujo fundamento residia em testemunhos e depoimentos equivocados18. Uma série de relatos fornecidos a partir do estado mental de certeza de seus declarantes. Relatos autênticos, porém falsos: autênticos pois correspondiam-se à representação que as vítimas/testemunhas genuinamente tinham dos eventos em questão, falsos porque o conteúdo afirmado simplesmente não se correspondia à realidade. [...] Foi o desenvolvimento do teste de DNA nos anos 90 que permitiu que casos de condenações de pessoas inocentes nos Estados Unidos pudessem ser em definitiva descobertos. Os advogados de defesa Barry Scheck e Peter Neufeld, co-fundadores do Innocence Project na cidade de Nova Iorque, tomaram a liderança e ainda são as figuras centrais na facilitação de uso do teste de DNA para corroborar as alegações de inocência por pessoas que foram condenadas pelo Júri. Scheck e Neufeld foram rápidos em detectar o padrão: o erro na identificação por testemunha ocular (eyewitness- identification) estava no coração da prova usada para condenar a vasta maioria de pessoas inocentes. (WELLS, MEMON; STEVEN, 2006, p. 48. Tradução livre) 18. Em 1996, 26 dos primeiros 28 casos de revisão das condenações eram casos de erros na identificação, Em 1998, 36 dos primeiros 40 casos; em 2000, 52 dos 62. Segundo WELLS, MEMON; STEVEN, 2006, a proporção que envolve erro na identificação continua a tocar os 75%. 12 Próximo de 75% do número total de condenações rescindidas devem-se a erros na identificação de inocentes como culpados por parte de testemunha/vítima (ZIMMERMAN, AUSTIN; KOVERA, 2012, 127; WELLS, MEMON; STEVEN, 2006, 48). Kirk Bloodsworth19, Marvin Anderson20, Steven Barnes21 são apenas alguns dos inocentes que terminaram prejudicados pela errônea identificação22. Isso, porque, confirmando as conclusões que a psicologia aplicada já havia antecipado, é possível que uma pessoa esteja absolutamente confiante e ao mesmo tempo absolutamente equivocada23. Assim, pesquisas da psicologia cognitiva aplicada têm se dedicado a investigar fatores psicológicos que afetam a produção da memória. Há esforços com vistas a dissecar quais variáveis podem interferir na precisão (accuracy) da memória. Nesse sentido, pesquisadores24 distinguem as 1. estimator variables entre entre 1.1. as que não estão sob o controle do sistema de justiça e que se referem ao evento observado ou 1.2. à pessoa do observador/ participante (ambas de tipo estimator variables) e 2. variáveis que estão sob o controle do próprio sistema de justiça (systemic variables). 1.1) Entre as estimator variables referentes ao evento, apontam para: a. Tempo de exposição, distância e iluminação; b. Presença de arma; c. Disfarce; d. Transcurso temporal; a. Quanto maior o tempo de exposição da vítima/testemunha ao ofensor, mais provável a acurácia da identificação; mais preciso o relato. Exposições rápidas incrementam os riscos de imprecisão na identificação25; quanto maior a distância da testemunha, menos 19. https://www.innocenceproject.org/cases/kirk-bloodsworth/ 20. https://www.innocenceproject.org/cases/marvin-anderson/ 21. https://www.innocenceproject.org/cases/steven-barnes/ 22. Mais de 300 outras histórias de inocentes condenados podem ser encontradas em: https:// www.innocenceproject.org 23. É do início do século passado a denúncia feita Münsterberg da supervalorização do senso comum por parte dos juízes. MÜNSTERBERG, 1908. O equívoco de tomar o declarado com convicção como a verdade dos fatos é abordado pelo pesquisador. Já na contemporaneidade, pesquisas sobre “maleabilidade da convicção”concluíram, de forma quase unânime, que a convicção pode ser manipulada pelo oferecimento de feedback’s por parte dos oficiais responsáveis por um procedimento de reconhecimento, por exemplo (“Bom, você identificou o suspeito!), de modo que a vítima/testemunha inocula o que ouviu de si mesma e substitui o estado mental que tinha por um estado mental de maior confiança. DOUGLASS; PAVLETIC, 2012. 24. A distinção de Wells (WELLS, 1978) é amplamente empregada pelos pesquisadores da psicologia, a exemplo de PEZDEK, 2012 e ZIMMERMAN, AUSTIN; KOVERA, 2012, entre outros. 25. É incorreta a compreensão de que a memória funciona como uma “máquina fotográfica” que tira fotos e armazena na memória (PEZDEK, 2012, 114). De acordo com MEMON, HOPE; BULL, 2003, a probabilidade de identificação correta varia conforme o tempo de exposição. As testemunhas do experimento assistiram um vídeo no qual o ofensor era visível por 12s ou 45s (para algumas testemunhas, video de visibilidade por 12s, para outras, por 45s). 40 minutos depois, as testemunhas tinham de identificar o ofensor numa fila (no qual ele estava 13 acurada a identificação, quanto menor a iluminação, maior o risco de imprecisões quanto aos detalhes descritos. b. A presença de uma arma tende a capturar a atenção da vítima/testemunha, o que, por sua vez, pode comprometer a identificação do ofensor (LOFTUS, LOFTUS; MESSO, 1987); c. O uso de disfarces, ou outros fatores para modificar a aparência, também pode comprometer a identificação. A obstrução de traços da parte superior do rosto (olhos, testa, cabelo) compromete mais a identificação do que a obstrução de traços da parte inferior do rosto (boca, queixo, bochechas), (DAVIES, SHEPHERD; ELLIS, 1979); d. Quanto maior seja o lapso temporal entre o evento criminoso e a identificação ou tomada de depoimento, maiores os riscos de imprecisões nesses procedimentos. (SHAPIRO; PENROD, 1986). 1.2) Entre as referentes ao observador/participante, listam: a. Alto grau de confiança; a. Identificação de pessoa de raça diferente (cross-race identification); c. Estresse. a. De acordo com estudos de MEISSNER; BRIGHAM, 2001; PEZDEC, BLANDON-GITLIN; MOORE, 2003, a raça ou etnia da vítima/testemunha também é uma estimator variable e pode interferir na acurácia da identificação: a acurácia é menor quando a pessoa a ser identificada é de raça/etnia diferente da raça/etnia da vítima/testemunha (esse é o chamado cross-race effect, ou own-race bias. “Eles todos (pessoas de outra raça/etnia) parecem iguais”). A análise realizada por Meissner e Bringham indica que o onw-race bias (ORB) incrementa os erros de identificação realizadas por pessoas brancas (2001, p. 21). b. Um alto nível de estresse também pode aumentar o risco de identificações errôneas. Ao contrário do que a regra de experiência segundo a qual “o estresse nos coloca mais atentos”, os estudos de psicologia cognitiva indicam que o fator ‘estresse’ prejudica a memória. MORGAN, HAZLETT, DORAN, GARRET, HOYT, THOMAS, BARANOSKI, presente): as taxas de acerto das testemunhas com 45s de exposição foi de 90% vs. 32% das taxas de acerto das testemunhos que viram o ofensor por apenas 12s. A probabilidade de identificação incorreta em filas que não contavam com a presença do suspeito foi consideravelmente superior para os que tiveram exposição de 12s: 85% de erros vs. 41% de erros entre os que estiveram exposição de 45s. 14 MADELON; SOUTHWICK, 2004 realizaram experimentos com 530 oficiais militares ativos (com idade média de 25 anos, tempo de serviço médio, 4 anos). Aproximadamente 12h depois de treinamento em campo de simulação de guerra, os participantes foram interrogados. Todos os participantes passaram por interrogatórios com alto stress e com baixo stress, conduzidos por instrutores diferentes. Os in terrogatór ios foram separados por aproximadamente 4 h, realizados por diferentes interrogadores, e tiveram duração igual (de 40 min). Para controlar a possibilidade do efeito da ordem, os sujeitos foram entrevistados randomicamente, de maneira que uma metade passou por interrogatorio de alto stress antes do interrogatório de baixo-stress e vice-versa. (MORGAN, HAZLETT, DORAN, GARRET, HOYT, THOMAS, BARANOSKI, MADELON; SOUTHWICK, 2004, p. 268) (tradução livre) Um dia depois, recuperados das privações sofridas, tinham de reconhecer seus respectivos entrevistadores em line up viva (fila com diversos componentes e com o suspeito) ou line up fotográfica (oferecimento de fotos). Entre os resultados, a taxa de respostas positivas verdadeiras (identificação correta) é de 62% contra 30% (baixo estresse, alto estresse, respectivamente); entre respostas positivas falsas (identificação incorreta de alguém como suspeito), de 38% contra 56% (baixo estresse, alto estresse, respectivamente), (Morgan et al, p. 272). c. Finalmente, é preciso atentar para o fator confiança, pois, como sabemos, a confiança de quem fala é um aspecto muito persuasivo do discurso. Até que ponto o grau de confiança atestado pela vítima reflete acurácia do que foi atestado? Há correlação entre graus de confiança e acurácia? De acordo com WIXTED E WELLS 2017, com base em experimentos da psicologia aplicada, é possível afirmar-se correlação entre confiança e acurácia a partir da combinação de estimator variables e systemic variables favoráveis a memória. Significa dizer que, quanto mais favoráveis à memória sejam os chamados estimator variables (o evento aconteceu em área iluminada, houve exposição ao ofensor por longo período de tempo, não havia arma, ofensor e vítima eram da mesma raça, a vítima não estava especialmente estressada...), mais confiável é o conteúdo relatado. No entanto, a confiabilidade da memória da vítima pode ser contaminada se o 15 procedimento de identificação não é “prístino” (pristine procedure - que vou traduzir como procedimento epistemicamente ótimo). Trata-se, pois, de desenhar procedimentos epistemicamente ótimos para produzir systemic variables capazes de produzir identificações confiáveis. A correlação entre confiança e acurácia responde à combinação de condições importantes de formação e detecção da memória sem as quais abre-se a porta para que a alta confiança da vítima/testemunha venha desacompanhada da acurácia. 2) Já entre as systemic variables, indicam: a. Instruções enviesadas sobre a presença do suspeito na fila (line up); b. Seleção de componentes para a fila; c. Conhecimento da identidade do suspeito pelo oficial responsável pela fila; d. Mais de uma apresentação do suspeito. a. Pesquisas da psicologia aplicada indicam que a instrução enviesada referente à presença da fila (line up instructions) daquele que deve ser identificado aumenta a probabilidade de falsa identificação quando o suspeito em realidade não está presente (target-absent). De acordo com MALPASS E DEVINE, 1981, mesmo que a instrução enviesada sirvam para aumentar identificações falsas nas filas que contam com a presença do suspeito (target-present), ela contribui para tal resultado quando o suspeito é ausente. Isso foi confirmado por experimentos nos quais ora se ofereceu uma instrução enviesada (que pressupunha o fato de que uma daquelas pessoas era a pessoa que deveria ser identificada, não dando a alternativa explícita de não- identificação), ora se ofereceu uma instrução não enviesada (que assumia a possibilidade de ausência do suspeito, dando a alternativa explícita de não se identificar ninguém). Ou seja: afirmar a presença de alguém a ser identificado na fila produz sugestão na vítima/testemunha e aumenta os riscos de que identificação positiva errônea quando o suspeito não está na fila. Como nos contextos de identificação penal não são raras as situações em que a certeza da presença do ofensor está fora de alcance, convém evitar as instruções enviesadas que sugerem a presença do suspeito. 16 b. Em segundo lugar,a composição da fila que será fonte de identificação do suspeito também influencia a probabilidade de acertos (isto é, as chances de que a vítima/ testemunha identifique o ofensor e apenas ele). De acordo com (ZIMMERMAN, AUSTIN; KOVERA, 2012, p. 134,) a fila deve ser montada de acordo com a descrição que a vítima/testemunha faz do ofensor, e não conforme a semelhança que outras pessoas tenham com o suspeito. Além disso, com todos os problemas que podem surgir da construção da fila, a opção por reconhecimento com alguma fila sempre é melhor do que o reconhecimento sem fila (no qual o responsável mostra somente o suspeito e ninguém mais para a vítima). De acordo com Zimmerman e seus colaboradores, a indicação do suspeito sozinho produz mais sugestibilidade se comparado ao procedimento com fila. [...] É absolutamente claro que uma fila formada com um único suspeito e outros membros é menos sugestiva que uma fila única, também referida como show up. O show up é o procedimento no qual mostra-se à vítima/testemunha uma única pessoa ou uma única fotografia (invariavelmente do suspeito) sem mostrar quaisquer outros membros. Show up’s são sugestivas porque a vítima/testemunha tem absoluta certeza de quem é o suspeito de ter cometido o crime que ela presenciou. (ZIMMERMAN, AUSTIN; KOVERA, 2012, 134, Tradução livre). c. Muito embora ainda não haja consenso acerca da maior confiabilidade do resultado de uma identificação realizada sem o prévio conhecimento da identidade do suspeito por parte do responsável pelo procedimento, há recomendação para que se institucionalize o double blind line up. A terminologia se deve a que nem a vítima, nem o oficial responsável pelo procedimento da identificação têm prévia informação de quem seja o suspeito ou se ele está de fato na fila. A recomendação de que o oficial também seja “cego” quanto à identidade do suspeito deve-se ao risco de o oficial que sabe da identidade do suspeito sugira a identidade do suspeito, ainda que de forma não intencional (ZIMMERMAN, AUSTIN; KOVERA, 2012, 135; WIXTED, WELLS, 2017). d. Apresentar o suspeito em múltiplas filas (seja por foto, seja em fila presencial) produz sugestão, tendência a que se identifique ele como culpado. Abre-se oportunidade para 17 que a memória do evento criminoso confunda-se com a memória da fila anterior também integrada pelo suspeito (ZIMMERMAN, AUSTIN; KOVERA, 2012140). Em suma, a forma como o procedimento de identificação influi na confiabilidade do seu resultado. Retomando os termos de Wixted e Wells, por essa razão é que a identificação do suspeito pela vítima/testemunha deveria ocorrer através de procedimentos epistemicamente ótimos de identificação. Para alcançar esse grau ótimo, há que se satisfazer as seguintes condições: incluir apenas um suspeito por fila (protege inocentes pois deixa sempre aberta a possibilidade de que a vítima/testemunha selecione alguém que não é o suspeito), formar filas nas quais o suspeito não se destaque de modo especial na (não é apenas o suspeito que preenche as características que a vítima indicou como as características de seu ofensor pois houve a preocupação em se escolher outros membros para a formação da fila o qual compartem características semelhantes.), oferecer de uma instrução não-enviesada (alerta-se a vítima/testemunha da possibilidade de que a fila pode conter apenas inocentes; isto é, que o suspeito pode estar ausente da fila); formar filas por double-blind (nem a vítima recebeu indicação da presença do suspeito, nem o oficial responsável pela formação da fila sabe se o suspeito está ou não presente), coleta do grau de confiança ao momento da primeira identificação (logo após a identificação, perguntar e registrar qual o grau de confiança da vítima de haver reconhecido corretamente o seu ofensor. Por ex., “Numa escala de 1 a 7, 7 expressando o maior grau de confiança e 1 o menor grau de confiança, qual o seu grau de confiança de que o sujeito identificado é o ofensor?”). Mais sobre systemic variables será dito no ponto seguinte. O importante agora é atentar para a conclusão de que alto grau de confiança só é indicativo de acurácia quando há a combinação de condições favoráveis para a formação de uma memória não-confusa (estimator variables) e, posteriormente, para a sua detecção (systemic-variables). Satisfeitas essas condições, consegue-se garantir que o atestado pela vítima/testemunha não seja contaminado por sugestões e enviesamentos que os operadores do sistema de justiça, mesmo não intencionalmente26, são capazes de produzir. Como a fenômeno da maleabilidade da confiança, que, segundo estudos (DOUGLASS; 26 Wixted, Wells (2017, p. 18) informa que é possível que comportamentos não-verbais e paralinguísticos podem contaminar o procedimento. Por isso, a melhor estratégia é de que o responsável por realizar o procedimento da identificação não tenha conhecimento prévio da identidade do suspeito e se o mesmo encontra- se ou não na fila. 18 PAVLETIC, 2012, pp.149-165); (WELLS; BRADFIELD, 1998), acontece quando modifica-se a confiança inicial da vítima/testemunha através de alguma atitude confirmatório. Como quando, por exemplo, um oficial de polícia dá um feedback positivo à vítima/testemunha, informando-lhe que ela escolheu corretamente o elemento da fila que era o suspeito. Assim, para além das estimator variables, há que se cuidar de lidar com systemic variables mediante procedimentos epistemicamente ótimos. Talvez a maior ameaça à possibilidade de apoiar na confiança da identificação pessoal feita pela testemunha ocular ocorre quando as testemunhas recebem feedback pós-identificação que sugerem que elas realizaram uma identificação acurada. Existem uma grande quantidade de estudos sobre identificação por testemunha ocular mostrando que um simples comentário feito à testemunha que realizou uma identificação errônea (por ex: “Bom, você identificou o suspeito”) pode levar à imediata supervalorização da confiança da testemunha por ela mesma. (Wixted, Wells, 2017, p.18, tradução livre) V. Breves conclusões: a adoção de um standard de prova (a inclusão da modéstia intelectual dos juízes em nosso desenho institucional) Vistas as diversas variáveis que podem comprometer a produção e a valoração da prova referente à identificação pessoal do culpado, que reflexões estão ao nosso alcance? Em primeiro lugar, se queremos compatibilizar o sistema de justiça penal brasileiro com algum standard racional de prova, é preciso afastar, de uma vez por todas, a compreensão de que o convencimento do juiz pode constituir, em si mesmo, prova suficiente para a condenação. Trata-se de uma condição negativa que deve ser satisfeita. Pois bem, abandonada a convicção do juiz como prova suficiente, resta enumerar duas etapas necessárias para a adoção de um standard de prova racional. A justificação da decisão condenatória deve se fundar em provas que corroborem que a hipótese da acusação é provavelmente verdadeira (o objetivo epistêmico de se buscar reduzir erros seria atendido na medida em que o julgador seleciona a hipótese fática que mais provavelmente reflete a realidade objetiva). 19 Quanto a isso, não há dúvidas de que as decisões condenatórias aqui examinadas são sobradamente deficitárias. Nelas, inexiste fundamento probatório capaz de elevar as hipóteses fáticas acusatórias à condição de hipóteses mais prováveis dentre as hipóteses examinadas em juízo. Muito pelo contrário: ao examinarmos as ferramentas conceituais propostas no interior da psicologia aplicada, foi possível concluir pela baixa confiabilidade dos reconhecimentos pessoais realizados sem a observância do artigo 226. Se sequer a realização da fila (line up) foi preservada como exigência formal da identificação pessoal no nosso sistema jurídico, não há razões para concluir, de maneira otimista, que os oficiais responsáveis pelo procedimento,sejam cobrados de ser cuidadosos em não sugerir suspeitos, ou que sejam preocupados em não reproduzir a maleabilidade do estado de certeza das vítimas/testemunhas. O cenário atual “aperfeiçoa” a indiferença institucional destinada à identificação pessoal com a atitude intelectual nada modesta dos julgadores, os quais não hesitam em conferir suficiência probatória a conclusões de procedimentos que estão em completo descompasso com a busca pela verdade. As decisões condenatórias tomadas a partir da confiança que o juiz atribui de modo absoluto à confiança da vítima/testemunha representam atuações que vão na contramão da realização de qualquer objetivo de corte epistêmico (que busque a redução de erros). Não há como se aproximar da verdade desprezando as ferramentas mais adequadas para tanto e a mera exigência de que se repita o procedimento identificatório em audiência não supre a indiferença epistêmica prévia - posta em movimento durante a fase investigativa. A condenação de um suspeito pode fundamentar-se numa identificação epistemicamente viciada; para isso, basta que ele volte a ser “identificado” pela vítima/testemunha em audiência. A sugestão não pode ser mais evidente, uma vez que aquele que deve ser “identificado” já se encontra sentado no banco dos réus. Mas, vou além. Se queremos que a redução de erros converta-se em um genuíno objetivo institucional, então de fato seria necessário rever as formalidades constantes do art. 226 do CPP, mas, para robustecê-las. A regra referente ao reconhecimento deveria refletir conhecimentos alcançados por outras ciências. Evitar a sugestão do suspeito por parte dos oficiais responsáveis pela identificação (obrigando-os que dê o aviso da possibilidade de que o suspeito não esteja na fila), formar filas em qualquer caso (eliminando show up’s), formá- las a partir das características relatadas pela vítima/testemunha, não oferecer feedback’s de 20 nenhum tipo (evitando, assim, o risco de que uma certeza maleável venha a contaminar o conteúdo do afirmado em Juízo pela vítima/testemunha) são alguns dos ajustes que deveriam ser incorporados de modo a garantir mais confiabilidade ao resultado do procedimento. O procedimento tal como é realizado hoje não oferece qualquer fundamento probatório confiável à hipótese acusatória e as condenações nele fundadas, por ser indiferentes à busca pela verdade, não podem entregar aos jurisdicionados o objetivo de reduzir erros. Um sistema de Justiça precisa ter ferramentas capazes de reduzir erros no geral para que, então, caiba calibrá-las à distribuição de erros com a qual queira comprometer-se. Em outras palavras, se bem a corroboração da hipótese acusatória em procedimento que respeitasse formalidades mais robustas para um versão mais forte do art. 226 fosse bastante para compatibilizar-se com o objetivo de redução de erros (no geral), isso ainda não seria suficiente para que se pudesse dizer que em nosso sistema de justiça, a partir de então, teríamos passado a adotar um standard de prova racional que represente alguma distribuição dos erros (condenações de inocentes vs. absolvição de culpados). Para isso, seria preciso que fixássemos ex ante um ponto de exigência quanto às provas necessárias para a condenação. A hipótese acusatória tem de ser mais provável que a hipótese da defesa? Sim. Mas, quão mais forte ela precisa ser? Essa decisão deve refletir uma escolha a respeito da gravidade que atribuímos à condenação de inocentes quando comparada à absolvição de culpados. Na hipótese de que genuinamente encontrássemos que condenações injustas são piores que absolvições injustas, devendo ser evitadas com mais intensidade, então, à exigência de que a hipótese acusatória seja corroborada como a mais provável, deverá ser somada a exigência de que os fatos confirmados em juízo não sejam compatíveis com a hipótese da defesa. É certo que a formulação de um standard nesses termos ainda carece de precisão e apresenta vagueza incontornável. Reconheço tal defeito e creio, acompanhada por outros teóricos e processualistas (FERNÁNDEZ LÓPEZ, 2007; GONZALEZ LAGIER, 2018), que a saída mais frutífera pode ser o de concretizar requisitos que devem ser satisfeitos por cada meio de prova se se quer afirmar a observância de um standard de prova exigente por determinadas decisões. Aqui tentei especificar as condições nas quais as condenações fundadas em identificação pessoal expressariam um compromisso com a verdade e, nesse sentido, seriam 21 compatíveis com a aplicação de algum standard de prova racional. As condenações produzidas nessas condições deixariam-nos, enquanto cidadãos, menos expostos à falta de modéstia intelectual dos magistrados. No entanto, as reflexões sobre standards probatórios (em particular) e sobre racionalidade das decisões judiciais (de modo mais geral) estão longe de terminar. Especificamente sobre os standards, à parte o desafio de formulação, e na estratégia de concretização dele por intermédio de requisitos a cada meio de prova, ainda há que refletir sobre o desafio que os tipos penais de difícil prova representam para a adoção de um standard de prova mais exigente em matéria penal. Um exame da variação da gravidade das penas também sugere mais reflexão quanto à adoção de um único e exigente standard penal. Deixarei essas questões para serem examinadas em outra ocasião. Referências bibliográficas. ANDRÉS IBÁÑEZ, P., ‘Sobre el valor de la inmediación (una aproximación crítica)’ in En torno de la jurisdicción, Editores del Puerto, Buenos Aires, 2007. DAVIES, G.M.; SHEPHERD, J.W.; ELLIS, H.D., ‘Similarities effects in face reccognition’, The American Journal of Psychology vol. 92, 507-523, 1979. DOUGLASS, A.B.; PAVLETIC, A., ‘Eyewitness Confidence Malleabilty’ in Conviction of the Innocent: Lessons From Psychological Research, American Psychological Association, Washington, DC, 2012. FERNÁNDEZ LÓPEZ, M., ‘La valoración de pruebas personales y el estándar de la duda razonable’, Cuadernos Electrónicos de Filosofía del Derecho vol. 15, 2007. FERRER BELTRÁN, J., La valoración racional de la prueba, Marcial Pons, Madrid, 2007. GOLDMAN, A.I., Knowledge in a social world, Oxford University Press, New York, 1999. 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