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A FORMAÇÃO DO GESTOR ESCOLAR OGAWA, Mary Natsue1 - PUCPR FILIPAK, Sirley Terezinha2 - PUCPR Grupo de Trabalho - Políticas Públicas, Avaliação e Gestão da Educação Agência Financiadora: não contou com financiamento Resumo As diversas mudanças que vem ocorrendo na sociedade, decorrentes dos avanços nos meios científicos e tecnológicos acabam por determinar mudanças nas formas como as pessoas vivem, se relacionam, trabalham e estudam. Essas alterações vão inovar particularmente as instituições sociais e a forma como estas se organizam. A escola como uma das principais instituições sociais, passa a identificar mudanças em seu aluno, na formação das famílias, nas relações entre professor e aluno, o que irá exigir mudanças também em sua estrutura para atender essas novas demandas. Emerge a necessidade de um gestor que apresente as qualificações necessárias para gerir o cotidiano escolar a partir da perspectiva democrática, partilhando decisões, liderando ações e exercendo a gestão democrática de forma qualitativa. Contudo é preciso uma reflexão acerca de que formação tem sido propiciada ao gestor escolar. Este trabalho procurou investigar de que forma os sistemas educacionais têm articulado a formação continuada dos gestores escolares para o desempenho de suas funções. Para identificar como a formação continuada tem sido realizada, foi utilizada a revisão sistemática a partir de teses e dissertações que investigam a formação do gestor escolar. As pesquisas estudadas indicam mudanças nos conhecimentos que têm sido ministrados nestes cursos, para desenvolver importantes competências como a liderança, mas que, no entanto tem exercido também a função de controle, ressaltando muito fortemente a ideologia das entidades mantenedoras, minimizando assim as possibilidades de autonomia política do gestor. Tal premissa leva a necessidade de repensar a formação do gestor escolar sob o prisma da criticidade necessária a quem é responsável pela formação de cidadãos, e a partir de conhecimentos que possibilitem articular de forma democrática as políticas educacionais e as ações na escola, valorizando e respeitando as decisões do coletivo da escola. Palavras-chave: Gestor escolar. Formação continuada. Escola. 1 Mestranda em Educação pela PUC/PR, Pedagoga graduada pela UFPR, Especialista em Projetos Educativos em âmbito escolar e não escolar pela PUC/PR, Especialista em Educação Especial pelo CIPPEX. Email: mogawactba@gmail.com 2 Pedagoga e Mestre em Educação pela UFPR. Doutora em Educação pela PUCPR. Professora da PUCPR no curso de Pedagogia e no Programa de Mestrado e Doutorado em Educação. E-mail: sirley.filipak@pucpr.br 95 Introdução O contexto de constantes mudanças na sociedade, fruto de inúmeras inovações em âmbito científico e tecnológico, tem imposto às instituições sociais, mesmo as mais tradicionais a necessidade adaptar-se, de alterar seu modo de atuar, de rever a forma de se relacionar com seu público e em especial, criar novas formas de atender as demandas sociais, que por sua vez também se transformam dentro de novo cenário que se desenha. A escola ao contrário das demais instituições empreendeu poucas mudanças ou ainda alterações pouco significativas no sentido de adequar suas ações às novas demandas sociais, mantendo metodologias e posturas que contradizem não somente as exigências e necessidades da atual sociedade como também se opõem as características de seu alunado, que agora se forma a partir de diferentes estruturações familiares, com novos valores e atitudes, e também com diferentes formas de aprender. Esta nova configuração social que se delineia a partir de diversas transformações, em especial quanto às inovações tecnológicas tem alterado as relações particularmente junto aos jovens e adolescentes, o que irá exigir um novo olhar sobre a gestão da escola. Na escola, o gestor, é o responsável pela organização e administração das relações e do trabalho pedagógico. É quem deve articular os processos formativos da escola em consonância com a realidade social, sendo, portanto, necessário a este profissional não apenas o domínio técnico de procedimentos administrativos, mas também a capacidade de diálogo com seus pares e uma clara percepção do contexto social e das inovações exigidas à escola, por estes novos contextos que se formam na gestão dos processos pedagógicos. Mudanças na sociedade e na escola implicam necessariamente também em mudanças na postura do gestor escolar, o que envolve muitos desafios, pois “[...] introduzir mudanças ou ampliações no papel do gestor não é simples, esbarra em dificuldades e resistência dos educadores presos à concepções funcionalistas e burocrática da escola” (ALMEIDA, 2007, p. 31). e são, ainda bastante insípidas as iniciativas no sentido de propiciar a esse profissional uma formação que satisfaça as suas necessidades na tarefa de organizar e administrar uma escola em que haja uma articulação entre o pedagógico e o administrativo no sentido de promover o aprendizado e a construção cidadã a partir de elementos, como a tecnologia, ponto gerador de transformações nas diversas esferas sociais (ALMEIDA, 2007, p. 31). 96 Portanto, analisar a formação do gestor significa trazer a tona reflexões e contribuições para a efetivação de ações calcadas no desenvolvimento humano, entendido como o acesso aos bens culturais, as inovações tecnológicas e à qualidade de vida, e na aprendizagem significativa. Diante desta perspectiva, se apresenta o seguinte problema: de que forma os sistemas educacionais têm articulado a formação continuada dos gestores escolares para o desempenho de suas funções? Para iniciar esta investigação buscou-se um referencial teórico sobre a constituição da função e da identidade do gestor e seu papel enquanto articulador dos processos formativos no interior da escola, e ainda apresentar uma dimensão política para o histórico da formação do gestor, contribuindo com elementos que caracterizam o percurso deste profissional. Recorreu-se também, aos elementos de uma pesquisa de revisão sistemática, realizada com auxilio do software de análise de dados Atlas Ti, por meio da qual foram mapeadas pesquisas, em teses e dissertações, que tinham como objetivo investigar o processo de formação e as competências apontadas pelos diretores de escola como sendo necessárias para o exercício da função. De acordo com Davies (2007) a revisão sistemática é uma forma de síntese de pesquisa que contribui para tomada de decisões baseada em evidências, ou seja, possibilita ao pesquisador direcionar o objeto de sua pesquisa a partir dos resultados obtidos na revisão sistemática. Histórico da formação do gestor escolar Na perspectiva de compreender as concepções arraigadas na figura do gestor escolar faz-se necessário retomar a compreensão do termo gestão escolar, que embora em muitos momentos seja utilizado com o mesmo sentido de administração escolar, difere na construção política que carrega em seu bojo, trazendo ainda subsídios bastante específicos quanto à perspectiva de mobilização do elemento humano. Diferentemente da administração que supõe um administrador como centro de comando, a gestão escolar traz implícito a participação como processo de construção das ações e procedimento que envolve o fazer pedagógico no âmbito escolar. A gestão escolar em sua construção histórica, parte do coletivo como premissa para constituição da identidade da instituição escolar, envolvendo todos os segmentos na discussão e validação dos processos 97 educativos, desta forma “a gestão escolar promove a redistribuição das responsabilidades que objetivam intensificar a legitimidade do sistema escolar” (LUCK, et al. 2011, p. 16). A gestão democrática surge de inúmeras discussões ao longo da história da educação. “Os primeiros movimentos de participaçãona gestão da escola pública que se tem notícia foram dos estudantes secundaristas no antigo Distrito Federal, durante a gestão de Anísio Teixeira como secretario de educação, nos anos de 1931-1935” (BASTOS, 2002, p. 19), contudo a gestão democrática passa a ter força de lei a partir da Constituição Federal de 1988. No contexto da gestão democrática, a figura do gestor passar a ter outra dimensão que se materializa nas relações com a comunidade escolar, implica em partilhar decisões e ações. A função do gestor passa a ter viés mais político, em que o diálogo se constitui em um importante instrumento para executar a gestão escolar. Esse formato de gestão traz implícita a necessidade de uma atuação diferenciada por parte do gestor. Requer não somente um profissional que saiba administrar recursos financeiros, gerir ações administrativas e ou mesmo pedagógicas, mas também que tenha condições de liderar, de organizar, de influenciar, mobilizar e articular os profissionais da escola no que diz respeito ao aprendizado do estudante e de sua consequente formação como membro da sociedade. Entretanto, em geral constata-se a falta de referenciais formativos que orientem os gestores quanto a realização de seu trabalho nos mais diversos aspectos. O processo de formação especifica de gestores é bastante recente na história da educação brasileira. Segundo Antunes (2008), somente a partir de 1847 a legislação brasileira viria reconhecer a necessidade de um diretor escolar. E ainda segundo a mesma autora, essa discussão seria retomada somente em 1890, após a proclamação da República no Brasil, marcando, ainda que timidamente, um novo entendimento sobre educação no Brasil. De acordo com Souza (2006), a década de 1930 com os eminentes processos de industrialização que já deixavam sua marca na sociedade brasileira trouxeram novamente à tona a necessidade de um administrador escolar, embora a tônica fosse o aspecto administrativo em detrimento do pedagógico. Esta concepção de administrador escolar recebia uma forte influência do modelo de administração empresarial, científica e burocrática de Taylor, Fayol e Weber. Neste período, a luta dos educadores pela construção de um Plano Nacional de Educação resultou na apresentação de um “Plano de Reconstrução Educacional”, que ficou 98 conhecido como Manifesto dos Pioneiros da Educação. O documento defendia os princípios de laicidade, obrigatoriedade, gratuidade, universalização e nacionalização do ensino fundamental, além de conter reflexões relacionadas à Administração Escolar. No que diz respeito à formação do diretor, propunha-se que fosse pautada no conhecimento filosófico e científico. Já com relação à sua função, defendia-se a necessidade de autonomia para romper com a centralização das decisões educacionais (ANTUNES, 2008, p. 7). Por meio do Decreto-Lei n.1.190 de 4 de abril de 1939 foi criado o curso de Pedagogia, reformulado em 1962, por meio do Parecer CFE n.º 251, depois em 1969, por meio do Parecer CFE n.º 252, do Conselho Federal de Educação, ambos de autoria do Conselheiro Valnir Chagas. Na parte diversificada do curso de Pedagogia foram previstas as habilitações: ensino das disciplinas e atividades práticas dos cursos normais; orientação educacional; administração escolar; supervisão escolar e inspeção escolar (SILVA, 1999, p.28-29). De acordo com o que indicavam os pareceres, por muitos anos, a formação inicial do diretor escolar esteve contemplada no curso de Pedagogia, no entanto, para assumir o cargo em uma escola, ter concluído o curso com a habilitação de especialista em administração escolar não era condição essencial. A década de 1960 iria trazer inserções significativas na construção da figura do diretor escolar, por meio da aprovação da LDB 4.024/61 que em seu artigo 42 afirma que “o diretor de escola deverá ser educador qualificado”, sem, contudo especificar o caráter desta qualificação (Antunes, 2008). Em 1962, o Conselho Federal de Educação normatiza por meio do Parecer nº 93/62, que O educador qualificado seria aquele que reunisse qualidades pessoais e profissionais que o tornassem capaz de infundir à escola a eficácia do instrumento educativo por excelência e de transmitir a professores, alunos e à comunidade sentimentos, ideias e aspirações de vigoroso teor cristão, cívico, democrático e cultural (ANTUNES, 2008, p. 7). A LDB nº 5.692/71 viria para definitivamente instituir o cargo de diretor escolar, tendo nesse a imagem de um profissional responsável por gerenciar os espaços e a equipe escolar (Antunes, 2008). As décadas de 1980 e 1990 serão marcadas pelas discussões em torno da redemocratização (Teixeira, 2011) que incidem em uma maior abertura na participação dos 99 profissionais da gestão nas decisões, sendo os conselhos colegiados frutos destas discussões e mobilizações. Neste período ganha vazão o termo gestão escolar, imbuído de um cunho eminentemente político. Neste contexto, emerge a necessidade de profissionalização do gestor, concedendo maior organicidade a este profissional e preparo para tornar a gestão da escola, verdadeiramente democrática e com foco na qualidade de ensino da educação básica. Em 2006, a Resolução CNE-CP n.º 1, instituiu as diretrizes curriculares nacionais para o curso de graduação em Pedagogia, licenciatura e estabeleceu no artigo 4º que, além da função de docência, o egresso do curso participará na organização e gestão de sistemas e instituições de ensino. O egresso da Pedagogia passou a não ter mais o título de especialista em educação, por ter cursado uma das habilitações expressas nos pareceres, já citados anteriormente, mas permaneceu o preparo para a administração, planejamento, inspeção, supervisão e orientação educacional para a educação básica (artigo 64 da LDB nº 9.394/96). De acordo com Teixeira (2011) em 2005, tendo como meta melhorar os indicadores de qualidade da educação básica, o governo federal lança o programa “Escola de Gestores da Educação Básica”, sob responsabilidade do MEC. Qualificar o gestor escolar supõe não somente instrumentalizá-lo quantos aos aspectos técnicos e pedagógicos da gestão escolar, mas relaciona-se a um projeto maior de fomentar a ampliação do entendimento escolar no Brasil, que implica em transformar todos os processos que objetivam a qualidade de ensino na escola pública brasileira. Outro objetivo visado é o fomento do uso de ferramentas tecnológicas e desenvolver a criatividade desses sujeitos com vistas a propor inovações em suas práticas. E por fim, merece destaque a preocupação com o desenvolvimento da capacidade para analisar e refletir diante de situações problema, na busca por resoluções possíveis em seu dia a dia (SOUZA & TEIXEIRA, 2010, apud TEIXEIRA, 2011, p. 20). Na perspectiva da inserção das tecnologias no meio educativo, novos formatos de capacitação e formação para os gestores escolares têm sido formulados e serão apresentados neste trabalho, com o intuito de identificar os saberes e conhecimentos necessários no sentido de melhor qualificar o gestor para o exercício de sua função. É importante a clareza quanto à importância do papel do gestor escolar na promoção de uma nova cultura no ambiente escolar. Eleger novos conhecimentos, inserir novos contextos e trilhar novos caminhos metodológicos no cotidiano escolar é tarefa que esbarra em muitos percalços e resistência, o que requer do gestor uma habilidade em administrar 100 conflitos e dialogar com seus pares, exigindo conhecimento que construa a argumentação do gestor e consequentemente amplie as suas condições de diálogo. Construir uma gestão centrada no desenvolvimento do cidadão a partir de uma ação formativa que lhe permita a intervenção real em uma sociedade cuja marca é a velocidade com que a informação e os avanços tecnológicos se sucedem, implica necessariamente em formar profissionaisque tenham conhecimento de sua função e clareza quanto às necessidades que são demandas à escola e são de responsabilidades do gestor junto à comunidade. Formação continuada do gestor escolar Libâneo (2004) afirma que o diretor é o responsável pelo funcionamento administrativo e pedagógico da escola” cabendo a esse, portanto, estimular junto à comunidade a visão da instituição escolar como um ambiente educativo em todos os seus aspectos, o que envolve novos olhares sobre as relações no interior da escola e requer a inovação nos processos educativos. A inovação da escola é reflexo das mudanças sociais e implicam na necessidade de uma nova postura em relação à forma como buscamos conhecimento e como lidamos com as informações, implica em gerenciar novas formas de se relacionar, de compreender o mundo, de aprender o que requer também novas formas de ensinar. A formulação de novas exigências inerentes ao trabalho do gestor escolar, que vão se delineando a partir das mudanças na sociedade e consequentemente da escola, traz a tona o questionamento quanto à formação necessária para gerir um espaço escolar diante dessa nova configuração que se apresenta acompanhada dos anseios de uma sociedade, com características de inovação constante, que, no entanto se educa em escolas ainda tradicionais no sentido extremo da palavra. O quadro que se desenha a respeito das novas competências e habilidades necessárias ao gestor escolar no desempenho de suas atividades, nos remete a uma reflexão sobre o preparo a partir da formação inicial e continuada do gestor escolar, que possibilite ao mesmo articular os diferentes elementos sociais que incidem diretamente sobre diversos contextos educativos. No Brasil o principio de gestão democrática na educação, de forma geral, orienta a eleição como forma de provimento para a função de gestor escolar, pois conforme Paro (2003, 101 p. 26) “à medida que a sociedade se democratiza, e como condição de democratização, é preciso que se democratizem as instituições que compões própria sociedade.” Como consequência deste processo de democratização, os critérios para eleger o gestor escolar estão pautados muito mais em preceitos políticos do que técnicos, envolvendo mais habilidades de articulação e aceitação por parte dos pares, do que em competências técnicas e pedagógicas, necessárias para o exercício da função. Outra característica da função é a inexistência de uma carreira como gestor em grande parte dos municípios e estados. Os gestores são profissionais da educação, em geral professores, que por meio de eleição, ou outro método como indicação, passam a exercer a função de gestor escolar. Logo a sua formação está pautada na área de conhecimento em que o mesmo leciona, não havendo nas licenciaturas, com raras exceções, o preparo para formar um gestor escolar. Estes conhecimentos são trabalhados nos cursos de pedagogia ou em pós- graduação (artigo 64 da Lei nº 9.394/96). Desta forma são os sistemas escolares os órgãos responsáveis pela formação em serviço dos gestores escolares. Mas de que forma vem se desenvolvendo esta formação continuada, que recursos têm sido utilizados, que conteúdos trabalhos e que competências pretendem-se desenvolver para o exercício da gestão escolar? Esta pesquisa de revisão sistemática desenvolvida apontou algumas ações realizadas pelos estados e municípios na perspectiva de capacitar o gestor escolar. Algumas dessas ações tem sido de iniciativa e investimentos do próprio município, cursos ofertas pelas secretarias de educação municipais ou mesmo estaduais, com utilização de seus técnicos ou de convidados externos que, contudo se orientam pela proposta da mantenedora. Campos (2010) descreve em sua dissertação a experiência de formação de Secretaria municipal de educação – SEMED em parceria com a Universidade Regional de Blumenau – FURB. Segundo a autora, a Secretaria Municipal de Educação, por meio da Diretoria do Ensino Fundamental e do Centro de Estudos Pedagógicos (CEMEP), centro este, responsável pela logística dos eventos e expedição dos certificados, elaboravam a formação continuada dos professores e gestores, pautada numa concepção de formação como um processo contínuo e permanente de desenvolvimento pessoal e profissional do professor e do gestor. Era dada ênfase também, à dimensão pessoal do profissional, os quais podiam optar por aquelas que tivessem interesse (CAMPOS, p. 105). 102 Estes cursos ofertados pela SEMED de Blumenau envolvem diversos encontros previstos no calendário escolar, com realização de conferências, seminários e oficinas, contemplando as diversas áreas do conhecimento e as funções específicas. Para os gestores, também consta na programação uma ou mais oficinas de interesse para a área da gestão escolar. Campos relata ainda, em sua pesquisa, que existe certo comodismo por parte dos gestores, quanto à procura por cursos específicos de preparo para a gestão escolar. Segundo a autora, os gestores estão acostumados a esperar pelos órgãos públicos pela oferta destas capacitações, e, contudo, caso não exista tal oferta, as capacitações se tornam bastante escassas. Galvão (2010) em sua dissertação, que pesquisa o desenvolvimento de competências gerenciais de diretores de escolas públicas estaduais de João Pessoa/PB, relata que gestores consideram que o aprendizado para a função muitas vezes se dá na própria prática do dia a dia e na cooperação com os colegas, na interação com gestores mais experientes. Contudo, a autora lembra que: ainda que se considerem múltiplas formas de aprendizagem, é relevante analisar a repercussão da educação formal na formação dos gestores, porquanto existe uma responsabilidade atribuída às agências formadoras, notadamente às universidades públicas, que têm o dever de elaborar currículos mais significativos no que tange às competências dos gestores escolares (GALVÃO, 2010, p. 127). Outras propostas de capacitação tem se dado em parceria com instituições públicas e privadas. Entre essas iniciativas tem destaque o Progestão. No final da década de 1990 intensificaram as discussões sobre a necessidade de capacitar o gestor escolar na perspectiva de atender as demandas da sociedade por maior qualidade na educação. Neste contexto, surge o Progestão - Programa de Capacitação a Distância para Gestores Escolares - desenvolvido pelo CONSED – Conselho Nacional de Secretários de educação – realizada em parceria com as Secretarias Estaduais e Municipais de Educação, com o apoio de alguns instituições privadas. O Progestão tem como proposta a capacitação dos membros da equipe de gestão escolar, diretores escolares, vice-diretores, supervisores escolares, coordenadores de área, professores líderes, candidatos à função de dirigentes e outras lideranças, para a realização das diversas tarefas e situações do cotidiano escolar. 103 Dentre os 09 trabalhos pesquisados, 04 apresentam o Progestão como objeto de estudos e outros o citam como referência para formação de gestores. Souza (2008) em sua dissertação, A FORMAÇÃO CONTINUADA DE GESTORES EM MINAS GERAIS: um estudo a partir da experiência do progestão no município de Uberaba de 2003 a 2006 aborda os aspectos positivos trazidos pelo programa e as contribuições para o trabalho do gestor, segundo relato dos gestores entrevistados para a pesquisa que avaliou o programa no município. Nas entrevistas, os cursistas do PROGESTÃO, relatando que este trouxe importantes contribuições para as atividades práticas, pois os módulos e intermódulos são como guias que, passo a passo, demonstram na prática como proceder para a formação de conselho, prestação de contas, licitação, avaliar recursos humanos e a instituição, com o subsidio da legislação vigente (SOUZA, 2008, p. 107). A dissertação de Igreja (2008) também faz uma análise do Progestão ressaltando as possibilidadese contribuições do programa para a formação do gestor escolar, destacando, contudo um forte teor político implícito no programa. A exemplo de vários países que vêm implementando programas de qualificação para suas lideranças e seus dirigentes escolares e, como não havia 40 programas no país de formação continuada e em serviço que fossem dirigidos às equipes de gestão escolar, o curso Progestão se justifica como forma de capacitação completa e não fragmentada, uma vez que vem atingir a todos os gestores desde diretores, vice- diretores e coordenadores da rede estadual de educação de São Paulo, objeto deste estudo. É de se esperar que o ideário do curso venha corroborar o perfil do profissional que a SEE. pretende ter à frente das escolas públicas estaduais, fornecendo minimamente instrumentos a esses gestores para atuarem como representantes do governo no que tange a implementação das políticas educacionais (IGREJA, 2008, p.40). A respeito deste teor eminentemente político, outros autores tem se manifestado, como Araujo (2006) em sua dissertação intitulada o “progestão” no contexto da Modernização do estado brasileiro: mediação para a democratização da gestão escolar ou para a implantação da lógica gerencial na escola? A autora traz uma importante reflexão sobre os aspectos ideológicos e mercantis do programa: no Progestão, sob a égide da política de capacitação de gestores escolares, a proposta implementada exerce não só o caráter de aperfeiçoamento, como também o de controle da qualidade, inclusive estabelecendo um sistema integrado de informação, acompanhamento e monitoramento, o que foi implementado por meio da utilização da modalidade de ensino a distância, que cumpre, segundo o Programa, a tarefa de facilitadora de comunicação (ARAUJO, 2006, p.154). 104 Evidencia-se na análise da autora, a preocupação com uma real autonomia e com espaços formativos que proporcionem ao gestor escolar capacidade técnica e pedagógica, mas também criticidade, e possibilidade de escolha quanto ao direcionamento das ações na escola, de forma democrática, e não sobre uma lógica gerencial. Nesta perspectiva, é preciso compreender que a gestão de uma instituição escola envolve conhecimentos, saberes e clareza quanto à forma de perceber as relações sociais. Souza (2008), afirma que o trabalho do gestor escolar não se pauta unicamente nos aspectos pedagógicos devendo, portanto esse profissional estar apto também para a gestão financeira, dos recursos humanos, terem conhecimentos sobre legislação educacional, preservação do patrimônio e bens públicos, e capacidade de diálogo para estabelecer parcerias e criar vínculos entre escola e comunidade. As secretarias municipais e estaduais têm atuado no sentido de assegurar aos gestores, por meio das capacitações, os conhecimentos que possibilitem a dimensão técnico- administrativa, pedagógica e todos os aspectos necessários ao exercício da função, contudo as discussões em torno da politização da função tem se pautado nas diretrizes emanadas da mantenedora, o que por vezes pode não atender as expectativas da comunidade escolar. Quanto aos conhecimentos e competências que tem recebido destaque nos currículos dos cursos de capacitação, estes apontam para uma mudança paradigmática quantos às atribuições do gestor, em consonância com as transformações sociais altera-se a esfera de atuação do gestor e igualmente ocorre uma modificação quanto aos conhecimentos necessários ao gestor escolar para administrar a escola em todas as suas dimensões. É preciso também considerar o próprio principio da gestão democrática, que traz em seu bojo a necessidade de um novo gestor e de uma diferente forma de administrar, que envolve a coletividade, a participação de todos os segmentos da comunidade escolar. Esses novos saberes necessários aos gestores envolvem dimensões não apenas pedagógica, técnicas, não apenas conhecimentos dos aspectos legais, ou administrativos, mas requer capacidade de liderança. A competência técnica abre espaço para a cooperação e a participação, Nesta perspectiva, torna-se relevante ouvir da comunidade escolar quais conhecimentos e características consideram importantes ao gestor escolar. Westrupp (2003) em sua dissertação Gestão Escolar Participativa: Novos Cenários de Competência Administrativa entrevistou um total de 86 membros de uma comunidade 105 escolar, sendo 13 professores, 03 funcionários, 35 pais e 35 estudantes, questionando a respeito do entendimento dos professores sobre as habilidades e competências necessárias ao gestor, o que resultou na seguinte conclusão por parte da autora: os respondentes parecem ter corroborado, direta ou indiretamente, a importância dos seguintes aspectos na atuação da gestão escolar: - possuir consciência clara de sua missão; - ter visão de futuro; - estar ligado ao cotidiano da sala de aula; - conhecer os alunos, professores, pais e funcionários; - promover a comunicação aberta; - construir equipes participativas; - incentivar a capacitação e o desenvolvimento de todos os segmentos envolvidos no processo educacional; - criar um clima de confiança e receptividade; - ser paciente, motivador, entusiasta e dinâmico; - definir objetivos e focalizar as metas; - ser ético e compreender as diversidades; - apresentar flexibilidade para mudanças; - fazer-se presente e maestrar todos os processos, salvaguardando para que todos os pontos de vista sejam respeitados e considerados (WESTRUPP, 2003, p, 143). Tais competências têm também, sido apontadas na análise do curso Progestão, o que vem corroborar a importância de conhecimentos que possam instigar o desenvolvimento destas competências com forma de melhor qualificar o trabalho do gestor escolar, elevando, consequentemente a qualidade da educação básica. Considerações finais Os trabalhos aqui analisados com o objetivo de investigar, como tem se dado a capacitação dos gestores, apontam, de forma geral o desejo dos gestores por mais capacitação e que os mesmos compreendem a necessidade de ampliar os conhecimentos de forma que atendam as necessidades inerentes ao desempenho da função. Considerado o fato de que a formação inicial dos gestores, a licenciatura, de forma geral não apresentem conteúdos curriculares que subsidiem o trabalho do gestor escolar, é importante uma reflexão quanto à forma como o gestor vem adquirindo tais conhecimentos, necessários à gestão escolar, ao longo de sua trajetória. Ao serem nomeados ou eleitos gestores, muitos recebem das secretarias de educação uma breve capacitação com o que consideram ser essencial a condução dos trabalhos escolares, em geral conteúdos relacionados à legislação, questões administrativas e financiamentos, sendo os aspectos pedagógicos relevados. Cabe lembrar que, há uma diferença importante na forma de condução ao cargo de gestor, nas escolas públicas e privadas. Nas escolas privadas, a indicação é feita pelas entidades mantenedoras por um prazo indeterminado e não são amplamente divulgados os 106 critérios para esta indicação. Em geral, são professores, egressos das licenciaturas, já mencionado anteriormente, no entanto, quer a instituição seja pública ou privada, é imprescindível uma formação continuada para o desempenho das funções de gestor. Da mesma forma, é importante pensar no preparo dos futuros gestores. As pesquisas aqui apresentadas apontam que há uma intencionalidade dos sistemas escolares de capacitar os gestores com vistas à melhoria na educação brasileira, contudo tais pesquisas indicam também que embora as capacitações que vem sendo desenvolvidas como o Progestão, estejam contribuindo para um melhor desempenho do gestor, também acabam por limitar a autonomia de decisões, no momento em que incide fortemente sobre o ideário político do gestor escolar, o que muitas vezes esbarra na estrutura democrática que vem sendo construída nas escolas,particularmente desde a LDB n.º 9.394/96. Com a consagração da gestão democrática no final dos anos de 1990, emergem novas possibilidades para a gestão escolar advindas da participação da comunidade escolar, mas também surgem novos desafios, que irão exigir do gestor novas formas de conhecimento. Nesta perspectiva, é fundamental ao gestor uma formação que o prepare adequadamente não somente para as dimensões pedagógicas e administrativas do dia a dia da escola, mas também, sobre um viés político, a partir de discussões que envolvem as políticas educacionais, o seu impacto no cotidiano escolar e que o possibilitem articular ações e debates no interior da escola, no sentido de encaminhar e refletir sobre estas políticas educacionais. É preciso uma franca reflexão sobre a formação do profissional que é responsável pelos processos formativos que ocorrem na escola. Faz-se relevante pensar uma formação que proporcione condições de que o gestor conduza de forma qualitativa as ações, discussões e rumos da educação em nossas escolas. REFERÊNCIAS ALMEIDA, M. E. B. (org.); ALONSO, M. (org.). Tecnologias na Formação e na Gestão Escolar. São Paulo: Avercamp, 2007. 132 p. ANTUNES, R. T. O gestor escolar. Maringá, 2008, Programa de desenvolvimento educacional: Caderno de Gestão. 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